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29/06/2022 10:40 UNINTER
https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 1/25
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
FUNDAMENTOS
TEÓRICOS DA
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LITERATURA
AULA 1
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Prof. Phelipe de Lima Cerdeira
CONVERSA INICIAL
Estimado (a) aluno (a), receba as nossas boas-vindas!
Muito provavelmente, este é um dos primeiros contatos – se
não o primeiro – da área de estudos literários com você. Após uma
trajetória de formação e de estudos no ensino médio, chega o
momento de abrir um novo capítulo em sua história como
estudante: a proposta é estreitar relações com temas que sempre
lhe despertaram interesse; estar aberto para entender que
crescemos a partir do diálogo; deixar-se surpreender por
discussões antes não imaginadas ou pouco aprofundadas; e, ainda,
(re)pensar a cada momento as certezas cristalizadas.
A partir deste material, damos início à discussão da nossa
disciplina, um dos conteúdos que dizem respeito à grade
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obrigatória do nosso curso de graduação. Será possível perceber
que esta disciplina se apresenta como uma grande possibilidade
para rever determinados conceitos e alinhar as principais questões
que terão de fazer parte do seu horizonte crítico. Isso significa que
tudo o que abordaremos em cada um dos encontros terá a
finalidade de lhe deixar mais à vontade, com segurança para cursar
as demais disciplinas que farão parte do módulo relacionado à
literatura.
Ainda que falemos aqui em “disciplina obrigatória”, precisamos
esclarecer um ponto fundamental desde o princípio: o nosso
grande desafio será, a todo momento, desconstruir a sensação de
exigência e de certo monitoramento intelectual atrelada ao texto
literário ao longo de nossa formação na educação básica. Ainda
que ganhe foco de interesse teórico e crítico por conta do
desenvolvimento de uma área específica, os estudos literários, a
literatura precisa existir sempre como manifestação discursiva. A
premissa que, sim, merece valor inicial quando se alude à literatura
é a da fruição, do prazer advindo da leitura. Ainda que se referindo
pontualmente ao livro, ao objeto que personifica o plano literário, o
poeta gaúcho Mario Quintana parece nos ajudar a lembrar sobre o
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poder da literatura: “O livro traz a vantagem de a gente poder estar
só e ao mesmo tempo acompanhado” (Quintana, S.d.).
Para que possamos acompanhar toda a discussão com atenção
e tranquilidade, todas as nossas aulas seguirão uma divisão
bastante intuitiva e pedagógica. A proposta é que todo o raciocínio
possa ser apresentado de maneira clara, facilitando a retomada de
algum tema específico que precise ser revisado ou, ainda, que
acabou lhe despertado maior interesse. Nesta aula, por exemplo, o
conteúdo contará com a seguinte a proposta de seções:
1. Contextualizando;
2. Antes de literatura, littera;
3. Literatura para quê?;
4. A literatura está em perigo?;
5. Literatura, um direito;
6. Na prática;
7. Finalizando;
8. Referências.
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É sempre importante reforçar que, ao falar de literatura,
espera-se que a leitura seja uma ação presente e necessária.
Contamos com a sua participação aqui e também em nossas
conversas a partir de videoaulas, fóruns e atividades extra-
curriculares que possam vir a ser oferecidas. Que possamos
estabelecer um diálogo profícuo até o final deste módulo,
(re)descobrindo um mundo chamado literatura. Bons estudos!
TEMA 1 – CONTEXTUALIZANDO
É muito provável que você tenha ouvido falar em um certo
filósofo grego clássico chamado Sócrates, não é mesmo? O que ele
tem a ver conosco, com as letras e com a literatura? Basicamente,
tudo. Em um momento apropriado, em uma disciplina que verse
sobre a literatura clássica, por exemplo, será possível conhecer as
contribuições socráticas para o desenvolvimento dos estudos
literários. Por enquanto, o que nos interessa aqui é retomar o nome
de Sócrates para demonstrar a importância de tomar a literatura
não com uma leitura ou interpretação pronta, decorada, mas
sempre com uma boa desconfiança, com o interesse de querer ler e
perceber diferentes detalhes.
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Com ajuda de muitas das reflexões socráticas, aprendemos
que a única certeza possível é a dúvida. O que isso quer dizer na
prática? Significa que, ao longo de toda a sua formação, você
perceberá o quanto novas leituras podem ajudar a problematizar o
que é apresentado, criando novas perguntas e possibilidades para
se abordar um mesmo tópico. A partir das letras, (re)escrevemos
novos caminhos para o aprender e descobrimos, como diria o
escritor argentino Jorge Luís Borges, que um só jardim pode
apresentar diferentes caminhos que se bifurcam. O estudo da
literatura, assim, apresenta-nos diferentes aspectos que podem ser
estudados e esmiuçados, de acordo com o nosso recorte de
atenção ou objetivo.
Como vimos desde a apresentação desta disciplina, a literatura
– seja a partir de um romance, de um poema, de uma obra
dramática, de um conto, de uma crônica, de ensaio ou de qualquer
outro dos seus gêneros e manifestações possíveis – nos convida a
pensar. Não é segredo algum que a melhor maneira para se
começar a falar sobre a literatura é por meio da própria literatura.
Por conta disso, antes de seguir com as nossas proposições, vale a
pena nos dedicarmos à leitura de um fragmento de um verdadeiro
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clássico da literatura brasileira. A alusão aqui é para o romance
Grande sertão: veredas, de João Guimarães Rosa:
Sou só um sertanejo, nessas altas ideias navego mal. Sou
muito pobre coitado. Inveja minha pura é de uns
conforme o senhor, com toda leitura e suma doutoração.
Não é que eu esteja analfabeto. Soletrei, anos e meio,
meante cartilha, memória e palmatória. Tive mestre,
Mestre Lucas, no Curralinho, decorei gramática, as
operações, regra-de-três, até geografia e estudo pátrio.
Em folhas grandes de papel, com capricho tracei bonitos
mapas. Ah, não é por falar: mas, desde do começo, me
achavam sofismado de ladino. E que eu merecia de ir
para cursar latim, em Aula Régia – que também diziam.
Tempo saudoso! Inda hoje, apreceio um bom livro,
despaçado. (Rosa, 2010, p. 30)
O excerto que você acaba de ler foi retirado de uma das obras
brasileiras mais lidas até hoje e que, sem dúvida alguma, marcou
novos caminhos para o desenvolvimento do gênero romanesco
não somente no Brasil. Publicada pela primeira vez no ano de 1956,
a obra Grande sertão: veredas nos apresenta a realidade sertaneja a
partir da perspectiva da personagem Riobaldo, que é também o
narrador de toda a trama. Sem nos preocuparmos em uma leitura
mais crítica e especializada, ou seja, apenas com o compromisso de
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ter a experiência de ler o texto, o que será que este trecho nos
provoca? Tente responder esta pergunta voltando para a citação e
relendo cada frase como se estivesse buscando o sabor das
palavras. Como você poderia descrever quem está falando? Seria
alguém novo? Viveria em qual parte do Brasil? Conhece outras
realidades? Este narrador está falando com alguém? Se sim, a
pessoa com quem ele fala é diferente? Existe algo que desperte o
interesse deste narrador chamado Riobaldo?
De forma rápida e sem a preocupação de um rigor crítico, fica
evidente como um fragmento de um romance nos permite elencar
diversas perguntas, aguçando a nossa criatividade, conectando-nos
com informações e leituras anteriores, provocando a nossa
imaginação e curiosidade. Assim, fazendo perguntas para nós
mesmos, relacionando conhecimentos, dialogando com demais
leituras, fruindo otexto, ou seja, permitindo realmente ter prazer ao
ler é que nos aproximamos do que deve ser a literatura.
Entendidos tais compromissos iniciais, podemos nos dedicar a
uma pergunta pontual para o nosso primeiro encontro: caso
tivéssemos lido aquele mesmo trecho, mas sem saber que ele faz
parte do romance Grande sertão: veredas ou mesmo
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desconhecendo a informação de que se tratava de uma obra de
Guimarães Rosa, teríamos as mesmas impressões iniciais?
Embora pareça simples, a provocação feita agora é uma
inquietude que faz parte da vida de teóricos literários dispostos a
refletir sobre a natureza da literatura desde o século passado.
Nomes como Terry Eagleton (1983), Tzvetan Todorov (2009),
Antoine Compagnon (2009) e, no Brasil, Antonio Candido (2004) –
este último, aliás, que será repetido nesta disciplina e na grande
maioria das que você vai cursar ao longo do curso – têm pensado
na natureza e nas propriedades que caracterizam a literatura há
muitas décadas. Em uma de suas reflexões, Todorov esclarece como
“[a] literatura não nasce no vazio, mas no centro de um conjunto de
discursos vivos, compartilhando com eles numerosas
características; não é por acaso que, ao longo da história, suas
fronteiras foram inconstantes” (Todorov, 2009, p. 22, grifo nosso).
A ideia que temos a respeito da literatura, portanto,
corresponde a um determinado tempo, contexto e realidade
discursiva. Para o crítico brasileiro Antonio Candido, por exemplo, a
literatura está ligada diretamente a um acordo social:
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Cada sociedade cria as suas manifestações ficcionais,
poéticas e dramáticas de acordo com os seus impulsos,
as suas crenças, os seus sentimentos, as suas normas, a
fim de fortalecer em cada um a presença e atuação deles.
Por isso é que nas nossas sociedades a literatura tem
sido um instrumento poderoso de instrução e educação,
entrando nos currículos, sendo proposta a cada um
como equipamento intelectual e afetivo. Os valores que a
sociedade preconiza, ou os que considera prejudiciais,
estão presentes nas diversas manifestações da ficção, da
poesia e da ação dramática. A literatura confirma e nega,
propõe e denuncia, apóia e combate, fornecendo a
possibilidade de vivermos dialeticamente os problemas.
Por isso é indispensável tanto a literatura sancionada
quanto a literatura proscrita; a que os poderes sugerem e
a que nasce dos movimentos de negação do estado de
coisas predominante. (Candido, 2004, p. 175)
Diante do que foi evidenciado por Candido, fica mais fácil
perceber como a literatura passou a ser vislumbrada a partir de
diversas facetas, valorizando o quanto ela não se resume apenas a
imitar ou transformar em ficção uma dada realidade, já que ela é,
também, uma das responsáveis por garantir tal existência. À vista
disso, literatura não é nunca um fim, uma resposta, mas,
essencialmente, um meio.
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Se uma definição taxativa da literatura é inviável, por que
grande parte de nós insiste em simplificar a literatura em uma
espécie de produção textual específica? Em uma busca no
dicionário eletrônico Michaelis, será possível encontrar dez entradas
diferentes. Vejamos as definições:
1. Arte de compor escritos, em prosa ou em verso, de
acordo com determinados princípios teóricos ou
práticos: “Os tênues murmúrios suspirosos
desdobravam-se em orquestra de baile, onde se
distinguiam instrumentos, e os surdos rumores
indefinidos eram já animadas conversas, em que damas e
cavalheiros discutiam política, artes, literatura e ciência”.
2. Atividade ou profissão de um homem de letras; o
trabalho, a arte do escritor: A literatura é a mais sedutora
e enganosa das artes. Minha filha pretende fazer carreira
na literatura.
3. O conjunto das obras literárias de um país, um gênero,
uma época etc. que, pela qualidade de seu estilo ou
forma e pela expressão de ideias de interesse universal
ou permanente, têm reconhecido seu alto valor estético:
É um excelente professor de literatura norte-americana.
4. O conjunto das obras literárias de um agregado social,
ou em dada linguagem, ou referidas a determinado
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assunto: As livrarias hoje têm muitos livros bons na área
da literatura infantil.
5. A história das obras literárias do espírito humano.
6. O conjunto dos homens de letras em atuação em
determinada sociedade: A literatura brasileira vem
marcando presença nos colóquios internacionais.
7. O conjunto de conhecimentos relativos às obras
literárias e a seus autores: A minha faculdade tem um
excelente curso de literatura.
8. Disciplina escolar voltada para o estudo da produção
literária e dos escritores: Sempre teve boas notas em
literatura.
9. Qualquer dos usos estéticos da linguagem, mesmo
quando não escrita.
10. Palavreado artificial, desvinculado do que se entende
por realidade: No fundo, todo esse discurso científico
não passa de literatura.
Ao voltarmos às definições do Dicionário Michaelis, não é difícil
notar que, em sua grande maioria, as explicações versam a respeito
da natureza da literatura com o plano escrito, da sua função de
categorização e legitimação ou, ainda, da relação entre a literatura
e uma dada identidade nacional. A entrada 3, pontualmente,
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evidencia a literatura como uma espécie de estabelecimento de
norma, um parâmetro de classificação responsável por definir o
que é bom ou ruim, sendo reconhecida, portanto, pelo seu “alto
valor estético”. Não há dúvidas de que essa proposição é válida e
nos interessará em breve, em aula futura, quando falarmos da
conexão entre a literatura e a língua e da instituição do que
chamamos como cânone literário. Por ora, é prudente apenas
entender que esse “alto valor estético” é um crivo estabelecido por
um determinado grupo, mediante interesses e expectativas de
diversas instâncias.
Ainda no que diz respeito às entradas presentes no dicionário,
vale pontuar como a definição 10 nos ajuda a tomar a outra faceta
relacionada à literatura, a ideia equivocada de que à literatura
competem os assuntos menos importantes, já que não se trata de
uma ciência. A acepção pejorativa fará parte de discussões teóricas
que vamos travar ao longo do curso, por isso vale sempre a
atenção e a leitura crítica sobre tal ponto.
TEMA 2 – ANTES DE LITERATURA, LITTERA
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Como vimos no final da seção de contextualização, a conduta
mais imediata quando se fala de literatura está atrelada ao plano
do texto. O movimento não é, em todo caso, incoerente, afinal a
palavra literatura advém do latim erudito littera, transformado
depois para letera. Está contido nesses dois radicais algo relativo à
arte de escrever ou mesmo à erudição. Tal como relembra a
pesquisadora portuguesa Paula Cristina Lopes,
Nas línguas europeias, a palavra “literatura” designou em
regra, até ao século XVIII, o saber, o conhecimento, as
artes e as ciências em geral. Até à segunda metade desse
século, para designar especificamente a arte verbal, o
corpus textual, eram utilizadas palavras como “poesia”,
“verso” e “prosa” (que hoje reconhecemos enquanto
classificação de géneros literários). (Lopes, S.d., p. 1)
Passa a ser inteligível, portanto, como a origem etimológica do
termo literatura acabou explicando, mesmo que na
contemporaneidade, como muitos passaram a simplificar a
literatura. É bem verdade que, na continuidade da história,
sobretudo por conta das contribuições de Voltaire, o vocábulo
literatura ganhou novas acepções, passando a ficar relacionado a
padrões estéticos. O resultado, como é possível imaginar, parece
vigorar para alguns até hoje em dia. Cabe-nos,no entanto,
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questionar resoluções fáceis, relembrando que, para pensar em
literatura, é fundamental não apenas considerar certa conduta ao
trabalhar com a linguagem, mas, sim, contemplar o contexto no
qual ela é produzida e para quem ela está destinada.
TEMA 3 – LITERATURA PARA QUÊ?
Dentre os críticos dispostos a pensar no rumo do ensino da
literatura e na maneira como ela passava a fazer parte da nossa
rotina como estudantes e leitores, merece destaque o nome do
francês Antoine de Compagnon. O que motivava as preocupações
desse pensador? Compagnon percebia que, cada vez mais, a
literatura era tratada de forma secundária, transformando-se em
refém de uma perspectiva que a transformava em ferramenta para
identificação de estruturas ou simplesmente uma replicação de
uma leitura engessada. Ora, como vimos desde o início, tal postura
é exatamente o contrário do que se espera para um discurso como
o literário, que almeja o diálogo constante e o envolvimento dos
leitores. Em uma sociedade cada vez mais utilitária, a perspectiva
humanista e a concepção de que o estímulo à reflexão é a chave
para o desenvolvimento passavam a ser ameaçadas pelo afã
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tecnicista e pela desculpa da não praticidade. Ao perceber todo o
cenário francês de aprendizado – mas que, decididamente, poderia
ser replicado para a grande maioria dos países ocidentais –
Compagnon dedica uma aula inaugural no Collège de France. Dos
seus apontamentos, surge o ensaio Literatura para quê?, traduzido
e publicado no Brasil em 2009.
A ideia de resgatar esse trabalho é demonstrar como o crítico
francês parte da provocação daqueles que minimizam a relevância
da literatura para a formação humana. Ao longo dos seus
argumentos, Compagnon atesta:
Não é que achemos na literatura verdades universais,
nem regras gerais, nem somente exemplos límpidos. [...]
Ora, a literatura age diferentemente dos mandamentos,
mas também das parábolas. [...] A literatura, exprimindo a
exceção, oferece um conhecimento diferente do
conhecimento erudito, porém mais capaz de esclarecer
os comportamentos e as motivações humanas. Ela pensa,
mas não como a ciência ou a filosofia. Seu pensamento é
heurístico (ela jamais cessa de procurar), não algorítmico:
ela procede tateando, sem cálculo, pela intuição, com
faro. (Compagnon, 2009, p. 51)
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Muito mais do buscar números ou resultados, cabe à literatura
o exercício de seguir oferecendo possibilidades, de não se
contentar. É exatamente por conta disso que “A literatura nos
ensina a melhor sentir, e como nossos sentidos não têm limites, ela
jamais conclui, mas fica aberta como um ensaio de Montaigne,
depois de nos ter feito ver, respirar ou tocar as certezas e as
indecisões, as complicações e os paradoxos que se escondem atrás
das ações [...]” (Compagnon, 2009, p. 51-52).
Se insistirmos na mesma pergunta, na razão pela qual
estudamos literatura, será bastante oportuno considerar uma
ponderação mais recente, advinda da Argentina, a partir da
escritora e crítica María Teresa Andruetto:
[…] la literatura es todavía esa metáfora de la vida que
sigue reuniendo a quien dice y quien escucha en un
espacio común, para participar de un misterio, para hacer
que nazca una historia que al menos por un momento
nos cure de palabra, recoja nuestros pedazos, acople
nuestras partes dispersas, traspase nuestras zonas más
inhóspitas, para decirnos que en lo oscuro también está
la luz, para mostrarnos que todo en el mundo, hasta lo
más miserable, tiene su destello . (Andruetto, 2013, p.
25)
[1]
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TEMA 4 – A LITERATURA ESTÁ EM PERIGO?
Da mesma forma que Antoine Compagnon, o teórico Tzvetan
Todorov dedicou espaço para pensar sobre o assunto, utilizando as
suas impressões de como a literatura passou a ser tratada nas salas
de aulas francesas a partir da década de 1960. De forma mais
incisiva, Todorov parece denunciar como a literatura passou a ser
pensada não por conta das leituras das obras e do diálogo entre os
leitores, mas simplesmente pela impressão daquilo que pensavam
os críticos. O perigo passado pela literatura começava a ser,
portanto, que a sua existência estivesse limitada ao conhecimento
do que outro escreveu, não necessariamente do prazer e da
oportunidade de conhecer uma obra (seja ela um romance, um
livro de poesia, de contos, ou uma peça de teatro).
Se fôssemos pensar em nosso contexto, talvez seria
exatamente o perigo que poderíamos passar ao limitar a nossa
experiência apenas na leitura de um artigo sobre uma obra ou,
muito pior, basear as nossas impressões simplesmente a partir de
um resumo ou resenha. Isso soa familiar para você? É exatamente
isso o que queremos combater a partir desta disciplina, reforçando
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o quanto o caminho pode – e deve – ser muito mais prazeroso
quando apostamos na literatura como uma experiência discursiva.
Em nossa realidade de estudantes e pesquisadores de letras, é
preciso lembrar que o único e grande perigo que a literatura corre
é quando o direito ao prazer de ler é negado.
TEMA 5 – LITERATURA: UM DIREITO
Por falar no direito ligado à literatura, seria impossível não
reservar a última seção da nossa aula para abordar o nome do
crítico literário brasileiro mais profícuo e presente em nossos
estudos: Antonio Candido. Em sua obra Vários escritos (2004), é
possível encontrar um ensaio chamado O direito à literatura, um
exame minucioso a respeito de como a literatura deve ser encarada
como um verdadeiro bem de primeira necessidade.
Para alicerçar os seus argumentos, Candido retoma a teoria do
sociólogo Louis-Joseph Lebret, baseada na diferença entre os bens
compreensíveis e os bens incompreensíveis. Esses seriam todos e
quaisquer bens que jamais deveriam ser negados a alguém, tais
como alimento, casa, roupa e a própria literatura! Para justificar a
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sua afirmação, Candido endossa exatamente tudo o que discutimos
até aqui, demonstrando a necessidade de se entender como a ideia
de literatura acabou se transformando ao longo do tempo. Para
aclarar, então, a sua perspectiva, o crítico brasileiro define:
Chamarei de literatura, da maneira mais ampla possível,
todas as criações de toque poético, ficcional ou
dramático em todos os níveis de uma sociedade, em
todos os tipos de cultura, desde o que chamamos
folclore, lenda, chiste, até as formas mais complexas e
difíceis da produção escrita das grandes civilizações.
Vista deste modo a literatura aparece claramente como
manifestação universal de todos os homens em todos os
tempos. Não há povo e não há homem que possa viver
sem ela, isto é, sem a possibilidade de entrar em
contacto com alguma espécie de fabulação. Assim como
todos sonham todas as noites, ninguém é capaz de
passar as vinte e quatro horas do dia sem alguns
momentos de entrega ao universo fabulado. (Candido,
2004, 174, grifo nosso)
A relação indissociável entre a nossa vida e a literatura fica
evidente na justificativa crítica de Candido, mas seria mesmo a
literatura um bem incompreensível? Exagero do professor
Candido? Em nossa perspectiva, muito pelo contrário, trata-se de
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um acerto, sobretudo por entender a literatura como um discurso
que viabiliza (re)significar e fazer pensar sobre a realidade. Ao
destacar projetos ficcionais, como a poesia de Castro Alves,
Antonio Candido demonstra como a literatura é capaz de demarcar
um quadro do tempo e seguir sendo atual para a discussão não
apenas do plano estético. Sendo assim, “[u]ma sociedade justa
pressupõeo respeito dos direitos humanos, e a fruição da arte e da
literatura em todas as modalidades e em todos os níveis é um
direito inalienável” (Candido, 2004, p. 191).
NA PRÁTICA
A partir de toda a nossa discussão nesta aula, passa a ser
possível entender como a ideia a respeito da literatura foi se
transformando ao longo do tempo. Com base nessa discussão,
reflita a respeito das duas questões a seguir:
1. A que se deve o fato de que, muitas vezes, as pessoas
acabam simplificando a ideia de literatura para um sinônimo
de texto escrito?
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2. Como é possível relacionar as perspectivas de teóricos
como Todorov, Compagnon e Candido para pensar a
literatura? Quais são os principais pontos de contato entre os
três teóricos no que diz respeito à compreensão da literatura?
FINALIZANDO
Como beletristas, estudantes de letras, precisamos estar
atentos para não minimizarmos a literatura apenas como um
amontado de conceitos ou classificações. Ao longo de toda esta
aula, foi possível ponderar como a ideia de literatura é flexível e
mais ampla do que simplesmente um texto que utiliza a linguagem
sob uma proposta não usual. Por meio de reflexões como as de
Antoine de Compagnon, Tzvetan Todorov e Antonio Candido,
começamos a perceber como a compreensão a respeito da
literatura passa a se adaptar conforme o tempo e o contexto de
enunciação, demonstrando, ainda, a relevância do plano ficcional
para tensionar a realidade e fazer com que ela seja questionada a
todo instante.
Tal como lembrado pelo crítico literário Antonio Candido, vale
a pena pensar na literatura também como um direito de todos nós,
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humanos. Que ao final desta disciplina introdutória, esse
sentimento faça parte do seu horizonte de expectativas e que lhe
estimule enquanto leitor (a) e, claro, futuro (a) professor (a)! Nunca
é demasiado lembrar que uma sociedade leitora se faz,
verdadeiramente, quando a literatura passa a fazer parte do nosso
dia a dia, de nossas conversas, não se restringindo a um conteúdo
a ser medido por imposições estruturalistas ou expectativas que
apenas reduzem o potencial de um texto.
Para falar de literatura, temos, portanto, que vivê-la
intensamente! Ou, dito de outra forma, “[a]ssim como não é
possível haver equilíbrio psíquico sem o sonho durante o sono,
talvez não haja equilíbrio social sem a literatura” (Candido, 2004, p.
175).
REFERÊNCIAS
ANDRUETTO, M. T. Hacia una literatura sin adjetivosM.
Córdoba: Comunic-Arte, 2013.
CANDIDO, A. Vários escritos. São Paulo: Duas cidades, 2004.
29/06/2022 10:40 UNINTER
https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 24/25
BANDEIRA, M. Estrela da vida inteira. Rio de Janeiro: Nova
Fronteira, 1993.
COMPAGNON, A. Literatura para quê? Belo Horizonte: UFMG,
2009.
EAGLETON, T. Teoria da literatura: uma introdução. São Paulo:
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LOPES, P. C. Literatura e linguagem literária. BOCC –
Biblioteca On-line de Ciências da Comunicação. Disponível em:
<http://bocc.ubi.pt/pag/bocc-lopes-literatura.pdf>. Acesso em 12
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MICHAELIS DICIONÁRIO BRASILEIRO DA LÍNGUA
PORTUGUESA. Disponível em:
<https://michaelis.uol.com.br/moderno-
portugues/busca/portugues-brasileiro/>. Acesso em: 12 mar. 2019.
ROSA, J. G. Grande sertão: veredas. Rio de Janeiro: Nova
Fronteira, 2010.
TODOROV, T. A literatura em perigo. Rio de Janeiro: DIFEL,
2009.
29/06/2022 10:40 UNINTER
https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 25/25
 “[...] a literatura é ainda essa metáfora da vida que segue
reunindo a quem disse e a quem escuta em um espaço comum,
para participar de um mistério, para fazer que nasça uma história
que, ao menos por um momento, nos cure da palavra, recolha os
nossos pedaços, junte as nossas partes dispersas, transpasse as
nossas zonas mais inóspitas, para nos dizer que, no escuro também
há luz, para nos mostrar que tudo no mundo, até o mais miserável,
tem o seu brilho” (Tradução-livre).
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