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Disciplina: Psicologia da Saúde Aula 1: Introdução à psicologia da saúde Apresentação Você já se deparou com pacientes difíceis, deprimidos, resistentes ao tratamento? Os sintomas físicos parecem vir sempre acompanhados de sintomas psíquicos? Esses sintomas são investigados, discutidos e tratados pela Psicologia Clínica. Nesta aula, você aprenderá sobre a origem da Psicologia. A subjetividade vem sendo investigada e discutida desde os filósofos clássicos. Eles contribuíram muito no entendimento da relação que o corpo mantém com a mente. Bons estudos! Objetivos Entender como a Filosofia clássica contribuiu para o estudo da subjetividade; Identificar as diferentes abordagens teóricas em Psicologia; Reconhecer a aplicação prática das abordagens teóricas no campo da saúde. A importância da Psicologia Assista ao vídeo abaixo: Depressão (Fonte: tvminhavida) https://www.youtube.com/embed/eXQWrvS8Wsw Percebeu como a Psicologia é importante para tratar casos como a depressão? Vejamos como se deu a origem da Psicologia. As origens da Psicologia Há mais de dois mil anos, a atenção dos filósofos se voltou para o funcionamento do psiquismo, quando se impuseram a buscar revelar os processos subjetivos, a memória, a aprendizagem e a razão. Desde então, a explicação destes fenômenos é objeto de um constante movimento de acumulação e mudança de paradigmas. Mente humana (Fonte: Shutterstock) Os filósofos clássicos, para conduzir esta análise, pensaram, primeiramente, como a subjetividade se constitui, como se pensa, como podemos entender a dimensão, ou como eles gostavam de intitular, da alma. Assim, aparecem nesta dimensão distintas explicações, portadoras de um tipo de abordagem própria de cada uma. Filosofia Clássica Podemos revisitar o século V a.C. para acompanharmos por um breve momento como a Filosofia Clássica já se preocupava em entender a natureza humana, nosso próprio comportamento, a natureza e os atos humanos. São justamente os filósofos gregos como Platão e Aristóteles que tratam das primeiras tentativas de sistematizar o “estudo da alma", da psyché, que em grego significa “alma”. Sócrates Buscava traçar o limite entre os instintos e a razão. Assim, aparece neste lugar descontínuo do pensamento grego a razão como a própria essência do homem, a consciência. Platão Procurou definir um lugar para a razão. Descrevia então o corpo como sede da alma. Aristóteles A noção de uma continuidade entre corpo e alma toma um lugar importante na Filosofia Clássica com Aristóteles. De forma inovadora, esse filósofo já antecipava o olhar holístico postulando que alma e corpo estão associados. Veremos como esta continuidade nos ajudará a pensar as estratégias de intervenção da prática do cuidado. Interrogações sobre a memória, a aprendizagem, os sonhos e até sobre a Psicopatologia – questões que vieram ocupar a Psicologia Moderna – já eram colocadas pelos filósofos gregos. Afinal, você já deve estar se perguntando: O que separa a Filosofia da Psicologia? O que separa as ficções dos fatos? A Psicologia como campo de saber No movimento de transformações desde a Filosofia até a Psicologia Moderna, vemos que o saber da Psicologia não se fecha em uma única teoria sobre a subjetividade, muito menos em uma única área de atuação. Filosofia X X Psicologia Assim, um conhecimento histórico desta diversidade pode ajudar-nos a relacionar a diversidade de ideias, teorias e projetos de pesquisa da Psicologia no seu percurso histórico e na prática da interdisciplinaridade. Não é demais, entretanto, lembrar que todas as explicações sobre a subjetividade são discursos históricos e constituem, antes de tudo, hipóteses de trabalho. São teorias. Como podemos definir Teoria? Teorias são formações discursivas, não são traduções literais dos fatos. São as teorias, entretanto, que nos ajudam a orientar nossa prática. Uma teoria é um conjunto de convenções. São hipóteses a respeito de uma realidade não predeterminada pela natureza ou pelos dados empíricos. Trata- se de uma construção explicativa sobre a estrutura de um dado fenômeno. A observação dos dados empíricos por si nada dizem a respeito de sua natureza e podem ser utilizados de forma diferente por diferentes esquemas teóricos. Livro formado por palavras (Fonte: Shutterstock) Nessa perspectiva, uma teoria é uma escolha convencional; e não algo necessário, inevitável ou preestabelecido pelas relações empíricas. Segundo Myers (2006): Uma boa teoria ajuda-nos a organizar observações. Como o campo da Psicologia, sobretudo o da Psicologia Clínica, é o que mais nos concerne na prática do cuidar, faz-se necessário abordar, de passagem, o que é uma teoria. As construções teóricas Não basta uma teoria ser atraente: ela deve ser útil! 1 Uma teoria útil organiza eficazmente uma série de observações e relatos e faz pressuposições claras para inferir aplicações práticas. No decorrer de seu aparecimento no mundo, a Psicologia estabeleceu parcerias e mantém um vinculo constante com a prática. Myers define as boas teorias como: A capacidade de organizar e estabelecer relações, de implicar hipóteses que oferecem predições testáveis e aplicações práticas. Então, qual é o campo da Psicologia moderna? Como a Psicologia responde às questões que vão desde a psicopatologia das doenças mentais até o horizonte das perturbações afetivas, da somatização, até os transtornos de ansiedade? Psicologia Clínica A Psicologia que queremos enfatizar é a clínica, que concerne à relação interdisciplinar que mantém com o campo da saúde mental em geral, e com o campo do cuidado em particular. Atendimento com psicólogo (Fonte: Shutterstock) Atenção Não devemos esquecer que os psicólogos jamais apreendem diretamente a subjetividade, e que o sujeito que tratamos não pode ser reduzido somente ao somatório de suas expressões ou de seus sintomas, muito menos à soma de seus comportamentos. O que está por trás da soma dos comportamentos é o que deve ser trabalhado pelo psicólogo, para que se revele o sentido da palavra do sujeito. O que, na interdisciplinaridade entre Psicologia e disciplinas da área da saúde, pode auxiliar no entendimento do sofrimento? Uma das contribuições relevantes é a afirmação de que os atos do sujeito não são um simples comportamento, mas têm uma significação. O sujeito com o qual a Psicologia lida não é um ser estático e acabado, mas está em permanente estado de construção. As psicoterapias funcionam? A que se propõe a clínica das diferentes abordagens psicoterapêuticas? Como as premissas das psicoterapias podem ser usadas no processo de curar? Qual é a lógica e funcionamento das clinicas psicoterapêuticas? Vamos prosseguir refletindo sobre esses questionamentos! O processo de cuidar Segundo a Enciclopédia Britânica, a clínica é um conjunto organizado de serviços e práticas, oferecendo um diagnóstico terapêutico ou tratamento preventivo. Esse conceito é usado para designar todas as atividades da clínica geral ou somente uma divisão particular do trabalho. Enfim, a clínica é toda uma inteira atividade de serviços organizada para atender aos sujeitos que a procuram, seja com sofrimento físico ou mental. Nesta perspectiva, o campo da clínica é aquele que se ocupa do sofrimento considerado individualmente. Em outras palavras, trata-se de dispensar aos sujeitos atenção terapêutica ao sofrimento, que muitas vezes ultrapassa a dimensão do puramente somático. Psicólogo em atendimento (Fonte: Shutterstock) Como as psicoterapias entendem, por exemplo, o sintoma? As psicoterapias tomam o sintoma como o que é da ordem da narrativa, como o sujeito fala de suas doenças, como ele a sente. É justamente nesta perspectiva que os sintomaspodem ser interpretados. Eles não são somente o indício de que algo não vai bem, mas sim, que têm um sentido que pode ser traduzido e conscientizado. A diversidade clínica Veremos como cada abordagem terapêutica pensa a condução do tratamento e o papel do psicoterapeuta. É importante assinalar que nas várias abordagens clínicas: 01 Haverá sempre uma possibilidade de reorganização do aparente caos e da desestruturação do sofrimento mental – seja na vertente da ressignificação para a Psicanálise e para a Terapia Humanista Existencial, seja na vertente de um reaprendizado para a Terapia Cognitivo-Comportamental. 02 A clínica autoriza, portanto, o saber sobre o individual. A clínica surge quando o saber tem como objeto o sujeito. Contorno de uma mulher (Fonte: Shutterstock) 03 A clínica das diferentes abordagens é, portanto, o ponto de partida de um trabalho terapêutico. 04 Em outras palavras, a clínica é a possibilidade de considerar-se que, entre a doença e o sintoma, há um sujeito. Esta perspectiva clínica abre também a possibilidade da elaboração de teorias sobre as causas do sofrimento mental e o desenvolvimento de uma prática que permita maior autonomia e uma nova possibilidade de encarar a existência e modificar a forma do sujeito interpretá-la. A teoria freudiana Você já ouviu falar em Darwin, Copérnico e Freud? O que eles têm em comum é que, de suas teorias, nasceram o que descrevemos anteriormente como teorias, que modificaram a forma de se pensar o centro das coisas. Veja as contribuições de cada um: Charles Darwin O centro do homem como a criação divina. Nicolau Copérnico A Terra como o centro do universo. Sigmund Freud A consciência como o centro da razão sofreram um deslocamento. Depois de Freud, a consciência já não é mais o central no homem: o que determina o sujeito é o inconsciente. Freud sustentou que o psiquismo não estava centrado em uma consciência, mas sim estruturado em torno do esquecimento, e este provocava efeitos na vida do sujeito. Esta é uma postulação que nos permitirá mais adiante retomar a lógica das doenças psicossomáticas. Saiba mais Leia o texto “O inconsciente” <galeria/aula1/anexo/inconsciente.pdf> para saber mais sobre esse assunto. Os objetivos da clínica Dizer que o sujeito com o qual lidamos na clínica é um sujeito atravessado pela linguagem e pelo sentido que imprime em sua realidade é tomar o corpo também na dimensão da linguagem. A incidência da linguagem no corpo transforma o corpo biológico em um corpo idealizado, representado. Esta noção é importante, pois nos permitirá mais à frente buscar entender certos sintomas que implicam o corpo de uma forma radical, como na anorexia e nas doenças psicossomáticas. Atendimento psicológico (Fonte: Shutterstock) A Terapia Humanista Existencial O que é o ser, qual o seu sentido e qual a sua verdade? Contorno de uma pessoa (Fonte: Shutterstock) É dessas questões da Ontologia e da Filosofia existencial que surge uma psicoterapia: a Terapia Humanista Existencial. Para você entender como funciona esta terapia, devemos conhecer alguns conceitos da Filosofia existencial, fonte teórica da prática clínica da Terapia Existencial. O existencialismo Evidencia que o ser humano não tem uma substância; é sim, pura liberdade de escolha. O ponto de partida de toda existência humana é o que o filósofo Heidegger denomina o ser no mundo, um ser sem uma essência prévia, que cria e inventa sua própria existência. Neste sentido, o ser humano não é jamais um ser acabado, mas encontra-se diante de uma série infinita de possibilidades na qual o ser se projeta para o futuro. É justamente baseada nesta filosofia que surgirá uma clínica que trata do sofrimento existencial. 2 A singularidade O existencialismo coloca a experiência vivida como fundamental. Esta forma de ver o ser humano implica que o ser humano é entendido não como determinado, mas com as inúmeras possibilidades do “vir a ser”, que a pessoa é singular, livre e responsável por sua existência. Na perspectiva da terapia humanista existencial, há dois conceitos chaves: A liberdade de criar um modo de existir, singular, provindo de uma escolha; A responsabilidade por suas escolhas. São justamente os valores que acabamos de ver que serviram para fundar uma prática terapêutica que acabou por ser denominada terapia existencial. O papel do terapeuta é ajudar a pessoa na experiência de sua existência. A liberdade Na perspectiva existencialista, não há, propriamente falando, desajustes, pois todo modo de existir é uma escolha da qual o sujeito é responsável. O desajuste é o resultado de uma escolha própria e singular. Se somos o produto de nossa própria criação, se somos livres para escolher e, apesar de tudo, temos sintomas como ansiedade e depressão, é porque nem todas as nossas escolhas são sábias. A transformação significa que o sujeito poderá sempre fazer novas escolhas, pois há sempre múltiplas possibilidades. Os objetivos da terapia O principal objetivo da terapia é propiciar uma maximização da autoconsciência e favorecer um aumento do potencial de escolha do cliente para descobrir-se, autocriar-se e aceitar os riscos de suas próprias escolhas e se tornar responsável por elas, aceitando a liberdade. Por que essas noções são importantes tanto para o profissional de saúde quanto para o paciente? Atendimento psicológico (Fonte: Shutterstock) 01 Estas noções são importantes para o profissional de Saúde, que ouve um sujeito singular que subjaz a doenças e cujas posições subjetivas vão além de seus sintomas físicos e cuja reação à doença é proveniente também de uma escolha. 02 Em relação ao paciente, esta posição do profissional de Saúde pode ajudar a criar estratégias no processo de cuidar, sem desconsiderar que esta subjetividade escolha os sentidos de sua própria existência. Terapia Cognitivo-Comportamental A forma como interpretamos o nosso mundo influencia nosso comportamento? Todo comportamento é adaptativo? Há uma forma de medir a eficácia de uma terapia? Se a teoria freudiana supõe que há um sujeito do inconsciente, se a Terapia Humanista Existencial supõe que há um sujeito livre e responsável por suas escolhas, a Terapia Cognitivo-Comportamental baseia-se em um sujeito que possui crenças que influenciam seus comportamentos. Grupo multiétnico (Fonte: Shutterstock) Saiba mais Leia o texto “As crenças centrais” <galeria/aula1/anexo/ascrençascentrais.pdf> para saber mais sobre esse assunto. Atividade Como vimos em nossa aula, na perspectiva existencialista não há desajustes, pois todo modo de existir é uma escolha da qual o sujeito é responsável. Sabendo disso, conceitue a transformação do sujeito e explique por que o desajuste é resultado de uma escolha própria e singular. Notas Myers David G. Myers é um psicólogo norte americano formado pela Universidade de Iowa. Myers leciona psicologia no Hope College, é autor de dezenas de livros. Heidegger Martin Heidegger foi um filósofo alemão. É um dos pensadores fundamentais do século XX. Referências BECK, J. S. Terapia cognitiva: teoria e prática. Porto Alegre: Artmed, 1997. BOCK, A. M. B.; FURTADO, O.; TEIXEIRA, M. L. T. Psicologias: uma introdução ao estudo da Psicologia. 13. Ed. São Paulo: Saraiva, 1999. ERTHAL, Tereza Cristina. Terapia Vivencial: uma abordagem existencial em Psicoterapia. Petrópolis: Vozes, 1989. FREUD, S. 1. Conferência. Introdução. In: ______. Obras Completas. Rio de Janeiro: Imago. Próximos Passos 1 2 • As controvérsias geradas pelo conceito de saúde; • O processo de promoção de saúde para criar estratégias na promoção, prevenção, reabilitação e recuperação da saúde e do bem-estar do indivíduo. Explore mais • O artigo “História doconceito de saúde” <http://www.scielo.br/scielo.php? script=sci_arttext&pid=S0103-73312007000100003> ; • O capítulo 1 – Psicologia da Saúde no Século XXI- Contribuições, Transformações e Abrangências. Valdemar August Angerami - Camom in Atualidades da Psicologia da Saúde, São Paulo: Pioneira Thomsom Learning, 2004.