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108 Unidade II Unidade II 5 PRODUÇÃO E CONTROLE DE QUALIDADE DE DROGAS VEGETAIS 5.1 Produção de drogas vegetais Quando pensamos em fitoterápicos, devemos lembrar que todos os aspectos, desde a produção da planta medicinal até o controle de qualidade do medicamento, são de extrema importância, pois as plantas produzem misturas complexas de compostos ativos, um auxiliando a função do outro. As plantas medicinais produzem esses metabólitos para sua defesa ou adaptação ao meio ambiente, mas nós, seres humanos, utilizamos essas substâncias em nosso benefício, seja na área medicinal, seja na área nutricional (SIMÕES et al., 2004). Para que as plantas consigam sobreviver, elas precisam se adaptar às condições ambientais do modo mais favorável possível – por exemplo, produzindo compostos que servem para a sua defesa. É o caso da planta Leonurus sibiricus L., que tem o nome popular de rubim. Segundo a literatura, essa planta possui muitos alcaloides, um grupo de compostos ativos vegetais que contêm em sua estrutura nitrogênio (N). Esses compostos são utilizados pela planta como proteção, pois apresentam sabor amargo para o animal que dela se alimenta. Em alguns casos, a dose tóxica desses alcaloides é próxima à dose terapêutica eficaz. Os alcaloides podem ser produzidos pela planta como forma de armazenar N (WADT, 2000). Caso uma substância que a planta eventualmente tenha produzido não apresente a função de ajudar na sua proteção ou reprodução, a planta pode deixar de produzir essa substância. Figura 133 – Rubim: Leonurus sibiricus L. 109 FARMACOGNOSIA Wadt (2000), ao estudar essa planta, que cresce facilmente no Brasil apesar de ser asiática, constatou que não apresentava alcaloides em nenhuma fase de crescimento nem em diferentes épocas do ano. No entanto, se consta em literatura científica, como explicar que a planta não apresenta tal composto? O que foi constatado pelo autor é que as plantas estudadas que continham alcaloides eram oriundas de países com inverno rigoroso, isto é, com neve e muito frio. Isso explicava por que as plantas coletadas no Brasil não apresentavam esse composto. O fato de não termos inverno rigoroso, termos facilidade de obter N do solo, após o N ser fixado por microrganismos nitrificantes que estão no solo em simbiose com as plantas, durante todo o ano, torna o composto nitrogenado (alcaloide) um reservatório de N desnecessário. Então, a planta deixa de gastar energia para produzir esse composto. É dessa forma que as plantas fazem sua adaptação ao ambiente, tendo melhor eficiência e menor gasto de energia. A produção de drogas vegetais envolve, além do farmacêutico, o agrônomo, o biólogo, entre outros profissionais, para que se possa ter drogas vegetais com alta qualidade (MATOS, 1998). A primeira etapa na produção de plantas medicinais é a seleção dos melhores espécimes (indivíduos) de uma espécie de planta medicinal que tenha sido identificada botanicamente, pois pode haver diferenças entre os espécimes (TEIXEIRA, 2009; SIMÕES et al., 2004). Uma espécie pode apresentar indivíduos morfologicamente parecidos, mas que possuem diferenças na composição química, seja de caráter qualitativo, seja quantitativo. Devido às variações genéticas entre os indivíduos, é preciso realizar avaliações periódicas da cultura dessa espécie (da qualidade dos espécimes) para identificar possíveis variações na produção dos compostos presentes (OLIVEIRA; AKISUE; AKISUE, 1991). Por exemplo, se os compostos ativos estiverem nas folhas, não basta apenas ter maior quantidade de folhas, e sim verificar a quantidade de ativos presentes nas folhas, como ocorre no caso da erva-cidreira brasileira, Lippia alba (Mill) N.E. Brown. Há variedades com óleos essenciais diferentes que podem ser mais efetivas em determinada atividade farmacológica, como estudou Teixeira (2009). Nesse estudo, foram analisadas três amostras de Lippia alba (Mill) N.E. Brown (I, II, III) colhidas no Horto de Plantas Medicinais Francisco José de Abreu Matos, da Universidade Federal do Ceará, e o rendimento de óleos voláteis foi de 0,08%, 0,40% e 0,25% para os quimiotipos I, II e III, respectivamente (figura adiante). Se tivéssemos que escolher entre as três amostras, a amostra II seria a que teria maior quantidade de ativos, e nesse caso também foi a amostra que apresentou melhor atividade antimicrobiana contra bactérias Gram-positivas, Gram-negativas e leveduras, pois as outras amostras apresentaram inibição somente para bactérias Gram positivas e leveduras. A composição de óleos voláteis era diferente para as três amostras, apesar do aspecto morfológico macroscópico ser muito semelhante, sendo que a amostra I continha principalmente geranial, neral e mirceno; a II, geranial e neral; e a III, carvona e limoneno. Como podemos observar pelos resultados encontrados, plantas da mesma espécie com mesmo aspecto podem apresentar variações de compostos químicos e atividades farmacológicas. 110 Unidade II A) B) C) Figura 134 – Lippia alba (Mill) N.E. Brown: A) quimiotipo I; B) quimiotipo II; C) quimiotipo III Após a seleção dos melhores espécimes, há o plantio, ou cultivo, dessas plantas. Nessa fase, existem os fatores intrínsecos, que são as condições que “a planta gosta”, e os fatores extrínsecos, aqueles que o meio ambiente oferece, como iluminação, oxigenação, temperatura, tipo de solo, entre outros (OLIVEIRA; AKISUE; AKISUE, 1991). Se uma planta não for nativa (por exemplo, uma planta europeia que seja trazida ao Brasil), ela deve ter uma adaptação, muitas vezes em laboratório, para que possa formar espécimes viáveis no local. 111 FARMACOGNOSIA Figura 135 – Crescimento em laboratório Num cultivo em grande escala, é necessário que se combine os fatores intrínsecos com os extrínsecos de tal forma que se ofereça à planta os elementos que ela necessita, adaptando-a às condições climáticas do local. Por exemplo, se pensarmos em um coqueiro, iremos colocá-lo em um ambiente à beira mar, isto é, solo arenoso, clima quente, alta umidade, solo pobre em nutrientes, vento em abundância e dias ensolarados (BERNARDO; SATO; ZONETTI, 2020). Se tivermos que plantar um coqueiro em outro local que não à beira mar, teremos que adequar o solo, tornando-o mais arenoso. Se for uma terra vermelha, por exemplo, escolheremos um local com grande incidência de luz solar e irrigação para manter a umidade alta. Dessa forma, estaremos adequando os fatores intrínsecos (da planta) aos extrínsecos (do local). Um exemplo prático foi o desenvolvimento do medicamento fitoterápico AcheflanR. Esse medicamento tem como insumo farmacêutico ativo vegetal (Ifav) o óleo essencial (volátil) das folhas de erva-baleeira, Cordia curassavica (JACQ.) Roem. & Schult, que tem como sinonímia científica Cordia verbenacea DC, da família Boraginaceae. Essa planta é nativa da região da Mata Atlântica, crescendo próximo às regiões arenosas, principalmente na região Sudeste. É composta principalmente por flavonoides (metabólitos responsáveis pela atividade anti-inflamatória) e óleos essenciais, e estes dão à planta um odor de caldo de carne em pó – por isso a planta é conhecida como catinga-de-barão, entre outros nomes, sendo o alfa-humuleno o ativo principal responsável pela atividade anti-inflamatória (LAPA, 2006; ERENO, 2005). Como a planta cresce próximo ao litoral, para a produção do AcheflanR, seria necessário que se fizesse uma adaptação de local para o plantio da erva-baleeira em grande escala. Afinal, o medicamento fitoterápico teria que suprir o mercado nacional e depois mundial. Para isso, fizeram todos os estudos, sob a supervisão do agrônomo Pedro Mellilo de Magalhães, do Centro de Pesquisas Químicas, Biológicas e Agronômicas (CPQBA) da Unicamp, de qual o tipo de solo, clima, insolação e também quando colher as folhas e realizar o processamento delas, para que o insumo tivesse uma padronização adequada e pudesse ser utilizado na fabricação do medicamento fitoterápico. Estudos maisrecentes mostram que 112 Unidade II pode haver o plantio não só por sementes, como feito no CPQBA, mas também por estacas, garantindo assim a qualidade dos ativos (BERNARDO; SATO; ZONETTI, 2020; HARTWIG; RODRIGUES; OLIVEIRA JR., 2020; ERENO, 2005). Figura 136 – Cordia curassavica (JACQ.) Roem. & Schult Observação A interligação entre os temas é vital para entendermos que todos os assuntos estão relacionados e que o aprendizado de farmacognosia é um todo. No plantio, fatores como pH do solo podem ser importantes quando se quer, por exemplo, produzir alcaloides, ativos nitrogenados com características básicas. Nesse caso, o pH do solo deve ser ácido, fazendo com que a planta produza mais alcaloides (OLIVEIRA; AKISUE; AKISUE, 1991). A profundidade da colocação da semente e o espaçamento influenciam no crescimento do vegetal (OLIVEIRA; AKISUE; AKISUE, 1991), e nesse caso podemos pensar numa plantação de alface que possui sementes bem pequenas (cerca de 2-3 mm). Se, para o caso da alface, fizermos uma cova (orifício) de 2 cm e colocarmos essa semente nela, não vai haver germinação, pois o embrião da semente não terá força para romper esse volume de terra que está acima da semente. Em contrapartida, se tivermos uma semente de abacate (cerca de 5 cm), teremos que fazer uma cova de mais de 10 cm, porque, do contrário, quando a planta estiver crescendo, não terá suas raízes tão aprofundadas e a árvore poderá cair. 113 FARMACOGNOSIA A) B) Figura 137 – Tipos de plantio A adubação de plantas medicinais também deve ser adequada, utilizando-se, de preferência, de adubação orgânica, visando fornecer à planta os nutrientes necessários ao seu crescimento. Nesse caso, deve-se tomar cuidado com adubação que utilize estercos de animais, os quais, se não forem bem secos, podem apresentar microrganismos patogênicos, contaminando a planta. Indica-se aqui a preparação do local de plantio em duas a três semanas antes de colocar as mudas, para que o esterco possa ser esterilizado pelo sol, diminuindo a presença de microrganismos patogênicos. O controle de pragas deve ser realizado preferencialmente com inseticidas naturais, como a utilização de alho e cebola como repelente de insetos e no controle de fungos e nematoides, de gergelim no controle de saúvas etc. (SÃO PAULO, 2010; HARAGUCHI; CARVALHO, 2010). Além do plantio correto para garantir a quantidade e qualidade dos ativos, a coleta do órgão vegetal é de suma importância, pois podemos coletar o órgão errado, que não possui os ativos, ou num período em que estes não estão presentes (COSTA, 1994). Um exemplo é o maracujá. É usual a população dizer que tomar suco de maracujá acalma, porém os ativos com atividade calmante não estão nos frutos, e sim nas folhas, tanto no maracujá doce (Passiflora alata) como no maracujá azedo (Passiflora edulis). A) B) Figura 138 – Maracujás A) Passiflora alata; B) Passiflora edulis 114 Unidade II Cada parte da planta a ser utilizada tem a melhor época de colheita (SIMÕES et al., 2004). Há um ditado popular rural que diz: “mandioca deve ser colhida em meses que não têm erre (R)”. Esse ditado é justificado quando se avalia que os meses sem a letra R são os meses de inverno (maio, junho, julho e agosto), e, em se tratando de mandioca, que é uma raiz tuberosa, ela irá armazenar amido nos meses de dormência (baixa atividade metabólica). Já quando se inicia a primavera, ocorre o brotamento de folhas e o aparecimento de flores, o que irá demandar maior metabolismo e maior quantidade de água, que ficará, em parte, nas raízes, deixando-as com menor teor de amido e, consequentemente, mais aguadas, fazendo com que a mandioca fique mais consistente. As flores e os frutos devem ser colhidos após seu total amadurecimento, isto é, com flores abertas e frutos maduros, porém sem a deiscência dos frutos. As cascas devem ser colhidas no período de maior metabolismo (primavera e outono), e as folhas também, quando estiverem em plena fotossíntese. Entretanto, deve-se levar em consideração quais são os metabólitos (ativos) que se quer obter; por exemplo, caso sejam os óleos voláteis, devemos considerar que irão se degradar caso as folhas estejam em plena fotossíntese, durante o período de maior insolação, próximo ao meio-dia, uma vez que a temperatura estará muito elevada (OLIVEIRA; AKISUE; AKISUE, 1991). Quanto às folhas de maracujá, como os ativos calmantes são os flavonoides, elas podem ser colhidas ao meio-dia, no período de maior fotossíntese, garantindo maior quantidade de flavonoides (COSTA, 2002). Quadro 3 – Partes das plantas utilizadas e épocas de colheita conforme recomendação da EMATER-DF (1988) Parte utilizada Quando colher Folhas e planta inteira Pré-floração Flores Bem abertas Frutos Bem maduras Sementes Bem desenvolvidas Cascas e raízes Outono, início de inverno Adaptado de: Simões et al. (2004, p. 61). Na colheita da planta medicinal, vários fatores devem ser avaliados: além do órgão, a idade da planta, a época do ano, a fase de crescimento e a hora do dia. Outro cuidado que se deve ter ao coletar as plantas medicinais é não amassá-las ou lesioná-las, pois isso poderá favorecer o crescimento de microrganismos (SIMÕES et al., 2004). Em relação à idade da planta, o pau-rosa (Aniba rosaeodora Ducke, sinonímia de Aniba duckei Kostermans) é uma árvore da região amazônica da qual se extrai o óleo volátil, rico em linalol, composto muito utilizado em perfumaria (MAGALHÃES, ALENCAR, 1979). Essa árvore, infelizmente, está na lista de espécies em risco de extinção, pois a coleta da planta inteira para a extração do óleo volátil colocou a espécie em perigo. Isso ocorreu porque os óleos essenciais têm a composição adequada para a indústria de perfumaria somente quando a planta tem cerca de 10 anos. Sampaio et al. (2005) fizeram podas 115 FARMACOGNOSIA nas copas das árvores com 22 anos de crescimento e verificaram que, quando podadas dessa forma, há grande rebrota da árvore, preservando assim a espécie, sendo uma boa forma de manejo (LEITE; QUISEN; SAMPAIO, 2001). Figura 139 – Pau-rosa Wadt (2000) realizou o plantio de Leonurus sibiricus L. em local padronizado e fez coletas em diferentes épocas do ano e fases de crescimento, tendo detectado que os flavonoides estavam em maior concentração nas folhas antes da floração. Porém, não houve diferença de concentração de metabólitos nas diferentes épocas do ano. Há plantas cuja variação de metabólitos no decorrer do ano é muito grande, como a Digitalis purpurea L., que possui ciclo de crescimento bianual. Isso significa que ela produz os metabólitos (glicosídeos cardioativos) por um período de dois anos, mas a concentração deles varia durante esse período, sendo a maior concentração de ativos no primeiro ano, entre julho e outubro. Já no segundo ano, a concentração de ativos é menor, e os meses de maior concentração de glicosídeos cardioativos são junho e julho (OLIVEIRA; AKISUE; AKISUE, 1991). 116 Unidade II 140 140S et em br o Se te m br o Ag os to Ag os to Ju lh o Ju lh o Ju nh o M ai o Ab ril M ar ço No ve m br o Ou tu br o 120 120 100 100 80 80 60 60 Figura 140 – Variação do teor de glicosídeos cardioativos da Digitalis purpurea L. frente ao ciclo bianual da planta Schubert et al. (2006) realizaram uma pesquisa na qual colheram mensalmente folhas de Ilex paraguariensis A. St.-Hill, erva-mate, pelo período de um ano, em duas localidades diferentes (Ijuí e Santa Maria), e fizeram a avaliação do teor de metilxantinas no decorrer desse período. Os autores encontraram diferenças nas concentrações de metilxantina, visto que as condições físicas (solo, temperatura, iluminação etc.) eram diferentes, influenciando o crescimento. No entanto, a diferença de concentração de metilxantinas entre espécies de locais diferentes não foi tão grande quanto o momento que se avaliou a concentração nos meses do ano. As amostras de Ijuí mostraram maior concentração nos meses deabril (1) e janeiro (2), e as de Santa Maria nos meses de fevereiro (1) e março (2). Ambas apresentaram a menor concentração de metilxantinas no mês de julho, com as concentrações maiores variando entre 7 e 8,5 mg/g. Já no período de menor concentração de metilxantinas, observou-se concentração de cerca de 2,5 mg/g. Esses dados indicam uma relação com o período de chuva, uma vez que, no inverno, temos menor índice pluviométrico e, no estudo, menor concentração de metilxantinas. m ar /0 1 m ai /0 1 ju l/0 1 se t/0 1 no v/ 01 ja n/ 02 ab r/0 1 ju n/ 01 ag o/ 01 ou t/0 1 de z/ 01 fe v/ 02 0 2 4 6 8 m g/ g 1 3 5 7 9 Santa Maria Ijuí Figura 141 – Teores médios de metilxantinas totais, expressos em mg/g, nas populações de Ijuí e Santa Maria 117 FARMACOGNOSIA O período do dia também tem sua influência, por exemplo, sobre plantas com óleos voláteis e alcaloides, que devem ser colhidas no período da manhã, em que as plantas produzem os óleos voláteis; ao passo que à noite os compostos voláteis ficam armazenados nas glândulas ou nos tricomas glandulares – por isso encontram-se em maior concentração no período da manhã. Quanto aos glicosídeos (aqueles que possuem açúcares em sua estrutura), devem ser colhidos no período da tarde e em dias secos, já que os açúcares sofrem influência da umidade, diminuindo a concentração (SIMÕES et al., 2004; CARNEIRO et al., 2010). Porém, essas não são regras fixas, pois há uma dependência da planta em questão, como demonstraram Oliveira et al. (2012) quando estudaram Mentha x piperita var. citrata e verificaram que o melhor horário para realizar a coleta é em torno das 13 horas. Há um processo de degradação enzimática que ocorre em algumas plantas após a coleta, sendo necessário um tratamento especial para a interrupção ou inativação enzimática, chamado de estabilização, que é a parada da atividade da enzima, podendo ser realizada por aquecimento, que é o mais comum, a cerca de 80 ºC por 15-30 minutos. Outra forma seria através de solventes, como o etanol, porém este pode solubilizar vários metabólitos que sejam polares. Há a possibilidade de utilizar irradiação, mas esse método é mais caro e pode não ser muito efetivo devido à baixa penetração da radiação ultravioleta (UV) (OLIVEIRA; AKISUE; AKISUE, 1991). Um exemplo de estabilização é o caso dos glicosídeos cardioativos da Digitalis sp. Esses compostos possuem em sua estrutura três moléculas de açúcar que são importantes para a eficácia farmacológica, e isso significa que a atividade farmacológica dos glicosídeos cardioativos, que é aumentar a força de contração cardíaca, será melhor se houver pelo menos uma molécula de açúcar. Então, torna-se necessário interromper a ação da enzima que quebra as ligações glicosídicas (SIMÕES et al., 2004; OLIVEIRA; AKISUE; AKISUE, 1991). Contudo, nem sempre é necessária a inativação enzimática. Corrêa, Santos e Finzer (2019) verificaram que um cultivo de carqueja cujas amostras não tinham sofrido inativação enzimática possuíam maior concentração de ativos, e Mendes (2004), em sua pesquisa com extratos de capim-limão – Cymbopogon citratus (DC) Stapf –, verificou que os extratos originários de plantas sem inativação tiveram maior rendimento. Após a coleta (e a estabilização, se necessária), a planta ou o órgão da planta precisa de uma preparação para a retirada de sujidades que vêm do cultivo, como terra, areia, insetos, entre outras. Para isso, há dois métodos mais utilizados: a lavagem e a mondagem (OLIVEIRA; AKISUE; AKISUE, 1991). A mondagem é a retirada do excesso de sujidades a seco; por exemplo, numa raiz, retira-se o excesso de terra ou mesmo a camada externa, deixando-a o mais limpa possível. Prefere-se a mondagem à lavagem, pois quando se lava, aumenta-se a umidade, o que facilita o crescimento de agentes deletérios como bactérias, fungos e enzimas. No caso da utilização de lavagem, é preciso ter cuidado, pois esta deve ser rápida e com água clorada ou ozonizada. Ainda assim, a secagem deve ser muito bem feita para evitar posteriores contaminações (OLIVEIRA; AKISUE; AKISUE, 1991). 118 Unidade II Nas tabelas a seguir, é possível observar a porcentagem de água existente na planta e nos órgãos frescos e após a secagem, bem como a quantidade de água exigida para que os agentes deletérios (microrganismos e enzimas) atuem. Perceba que, se aumentarmos muito a umidade, o processo de secagem, para alcançar uma porcentagem segura de água e não ter os agentes deletérios, deverá ser muito mais rigoroso. Tabela 1 – Teor de umidade em órgãos vegetais Órgão vegetal Umidade no órgão fresco Umidade permitida na droga Casca 50-55% 8-14% Folha 60-98% 8-14% Flor 60-95% 8-15% Fruto 15-95% 8-15% Raiz 50-85% 8-14% Rizoma 50-85% 12-16% Semente 10-15% 12-13% Planta toda 50-90% 12- 15% Adaptada de: Oliveira, Akisue e Akisue (1991, p. 16). Tabela 2 – Porcentagem de água necessária para a atividade dos agentes deletérios Agentes % de umidade Bactérias 40-45% Enzimas 20-25% Fungos 15-20% Adaptada de: Oliveira, Akisue e Akisue (1991, p. 16). Os processos de secagem podem ser naturais ou artificiais e devem ser realizados de acordo com o órgão e o metabólito que se quer preservar, facilitando a conservação. Como vimos nas tabelas anteriores, é necessário atingir, pela secagem, uma umidade inferior a 15%, pois os fungos são os agentes deletérios que necessitam de menor quantidade de água para sobreviver, que seria no mínimo 15% de umidade. Por isso, o ideal é atingir uma secagem com umidade menor que essa porcentagem (SIMÕES et al., 2017; OLIVEIRA; AKISUE; AKISUE, 1991). A secagem pode ser realizada diretamente ao sol, porém a incidência direta dos raios solares pode fazer com que haja uma secagem muito rápida, mantendo uma crosta que preserva a água internamente. Isso faz com que a umidade se mantenha elevada, apesar da aparência externa seca (SIMÕES et al., 2004). Os metabólitos termolábeis (que se degradam com o calor) podem ser secos à sombra, ao abrigo do sol, mas essa é uma secagem mais lenta, mantendo por mais tempo a umidade da planta, o que pode levar a uma contaminação ainda durante o processo de secagem (CORRÊA JR.; SCHEFFER, 2013). 119 FARMACOGNOSIA Tanto na secagem ao sol como à sombra, é necessário que se mantenha a higiene do local, com proteção para que o material a ser seco não sofra contaminações (CORRÊA JR.; SCHEFFER, 2013). A utilização de estufas com circulação de ar aquecido seria uma técnica aconselhável, pois o ar aquecido em temperaturas controladas – por exemplo, 38 ºC para folhas e flores e 60 ºC para cascas e raízes – manteria os metabólitos ativos, sem degradações. Temperaturas maiores que essas podem secar a planta e alterar os metabólitos, até mesmo eliminá-los (CORRÊA JR.; SCHEFFER, 2014; SIMÕES et al., 2004). A secagem mista pode ser uma opção para a agricultura familiar, pois há a secagem ao sol quando as temperaturas e a incidência solar são menores. À medida que a temperatura e as radiações solares vão ficando mais intensas, as plantas são colocadas em lugar protegido do sol, por exemplo, um galpão, até que se diminua o calor e a insolação, voltando a planta ao sol. Normalmente, essa manobra de sol-sombra-sol acelera o processo de secagem, sem a degradação de ativos, sendo uma boa opção, pois os custos são mais baixos que a implantação de estufas de secagem (CORRÊA JR.; SCHEFFER, 2013; OLIVEIRA; AKISUE; AKISUE, 1991). Figura 142 – Secagem ao sol Figura 143 – Secagem em estufa com circulação de ar 120 Unidade II Outra alternativa de secagem é a liofilização. Porém, essa é uma técnica muito cara, mais utilizada para secagem de extratos vegetais ou alimentos. A técnica consiste no congelamento da amostra e posterior vácuo, fazendo com que a água congelada (estado sólido) se sublime, mantendo a integridade da amostra, mas sem a água (WADT, 2000). Na 5ª edição da Farmacopeia Brasileira, os teores aceitos de umidade de drogas vegetaisvariam nas monografias entre 6% e 15%, dependendo da droga (SIMÕES et al., 2017; BRASIL, 2010a). Após a secagem, a droga vegetal (planta ou órgão da planta) precisa ser conservada para que não ocorram perdas qualitativas e quantitativas das substâncias ativas, lembrando que o tempo de armazenamento deve ser o menor possível para evitar posteriores degradações. Em algumas Farmacopeias, cita-se um ano de armazenamento (BRASIL, 2010a; SIMÕES et al., 2004). Preferencialmente, o local de armazenamento deve ser de alvenaria (tijolos), com portas e janelas protegidas com telas, para evitar a entrada de insetos e animais que possam trazer contaminações à droga vegetal. As drogas devem ficar acondicionadas em embalagens que permitam as trocas gasosas, pois há uma umidade residual na droga vegetal que pode evaporar, e, se a embalagem não permitir as trocas gasosas, poderá aumentar a umidade dentro da embalagem, facilitando o ataque de agentes deletérios (CORRÊA JR.; SCHEFFER, 2013). Todas as drogas vegetais armazenadas devem ser muito bem identificadas para que não ocorra a mistura de embalagens, que devem ficar em local preferencialmente escuro (ou iluminação pouco intensa), com umidade baixa (inferior a 15%), temperatura ideal entre 5 ºC e 15 ºC, e não devem ficar em contato com o solo. Aconselha-se colocar armários abertos ou ventilados (OLIVEIRA; AKISUE; AKISUE, 1991). Armazenam-se as drogas íntegras, pois, ao rasurá-las ou moê-las, ocorre o aumento da superfície de contato, o que pode acelerar processos de oxidação, perda de ativos voláteis, entre outros, acarretando a diminuição da qualidade da droga (OLIVEIRA; AKISUE; AKISUE, 1991). Lembrete Todo produto final de qualidade necessita de uma matéria-prima de qualidade. 5.2 Controle de qualidade de fitoterápicos Na farmácia, o termo “qualidade” não é usado à toa. Toda matéria-prima, como produto acabado, necessita estar dentro dos padrões de qualidade. Num conceito mais amplo, qualidade seria a adequação do produto a uma finalidade estabelecida, sob o ponto de vista do consumidor, devendo estar disponível e a preço adequado (desejável) (SIMÕES et al., 2017; PINTO; KANEKO; OHARA, 2000). 121 FARMACOGNOSIA O controle de qualidade “é o conjunto de medidas destinadas a garantir, a qualquer momento, a produção de lotes de medicamentos e demais produtos, que satisfaçam às normas de identidade, atividade, teor, pureza, eficácia e inocuidade” (BRASIL, 2019a). No caso de Ifav, o controle de qualidade é um pouco mais complexo que os ativos alopáticos, pois os Ifav possuem, como vimos, mais de um princípio ativo, sendo muitas vezes difícil garantir a eficácia farmacológica somente pelo controle de qualidade, demandando ensaios pré-clínicos e clínicos (BRASIL, 2014c; SIMÕES et al., 2004). O esquema da figura a seguir apresenta as etapas para a produção industrial de um medicamento fitoterápico ou produto tradicional fitoterápico. Observe que o controle de qualidade deve estar presente em todas as etapas da cadeia produtiva, começando na produção agrícola, depois na droga vegetal e nas etapas posteriores. Planta medicinal Droga vegetal Produto acabado Produto acabado Chá medicinal Derivado vegetal Medicamento fitoterápico ou produto tradicional fitoterápico Fitoterápico (2) (3) (1) (4) (5) (6) Figura 144 – Principais conceitos em fitoterápicos industrializados Neste livro-texto, vamos abordar principalmente o controle das drogas vegetais e do derivado vegetal. A droga vegetal, mesmo tendo origem conhecida, deve ser analisada com todos os parâmetros de qualidade estabelecidos por Farmacopeias ou Compêndios oficiais nacionais ou internacionais, pois algumas plantas não são encontradas na Farmacopeia Brasileira, mas podem ser encontradas nas Farmacopeias e nos Compêndios de outros países. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) autoriza a utilização das Farmacopeias alemã, norte-americana, japonesa, britânica, europeia, francesa, portuguesa, argentina, mexicana e a internacional, que é elaborada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) (SIMÕES et al., 2017). 122 Unidade II Saiba mais Acesse o site da Anvisa e verifique as Farmacopeias. No site, constam desde a primeira edição o Formulário fitoterápico e a Farmacopeia homeopática: Disponível em: www.anvisa.gov.br. Acesso em: 23 abr. 2021. Quando não há monografias, por exemplo, de plantas novas, a empresa deve estabelecer parâmetros de qualidade e elaborar uma monografia, submetendo-a aos órgãos de fiscalização (CARVALHO et al., 2010). O início de todo o controle é a amostragem ou tomada de ensaio, que deve representar o todo, isto é, deve ser representativa de todo o lote. Para isso, uma amostragem precisa ser randomizada (aleatória), pois, se houver falsificações ou adulterações, é mais comum ocorrerem nas embalagens iniciais e nos finais (OLIVEIRA; AKISUE; AKISUE, 1991). O número de embalagens é outro fator a obedecer, pois há critérios que devem ser seguidos para que se obtenha, estatisticamente, uma amostra confiável, que seja representativa do lote inteiro. Lembre-se de que todas as embalagens devem ser vistoriadas antes da amostragem – não devem conter aberturas, lesões ou qualquer dano que possa comprometer a qualidade da droga vegetal (SIMÕES et al., 2017). A tabela a seguir mostra esquemas de amostragens pelo número de embalagens (N). Se tivermos, por exemplo, 16 embalagens com droga vegetal, será necessário que se amostre pelo menos cinco embalagens não seguidas. Tabela 3 – Número de embalagens a serem amostradas FB5 Ph.Eu.8.0 WHO Número total de embalagens (N) Tamanho da amostra (n) Número total de embalagens (N) Tamanho da amostra (n) Número total de embalagens (N) Tamanho da amostra (n) 1 a 3 Todas 1 a 3 Todas 1 a 5 Todas 4 a 10 3 > 3 n = √N+1 6 a 60 5 11 a 20 5 21 a 50 6 51 a 80 8 >50 10% 81 a 100 10 Mais de 100 10% Fonte: Simões et al. (2017, p. 84). 123 FARMACOGNOSIA Outros fatores que devem ser observados na amostragem são: o órgão vegetal, o tamanho das rasuras, se em pó ou em pedaços grandes, a profundidade (altura) da embalagem etc. Muitas vezes, durante o transporte, os materiais mais pesados (pedras, areia, galhos) ficam na parte inferior da embalagem, e os mais leves (menos densos) ficam na parte superior. Para obter uma amostra desde o fundo (parte inferior) até a parte superior da embalagem, são necessários aparelhos coletores, como hastes tubulares com abertura na extremidade, que é fechada após a amostragem. É aconselhável que se coletem amostras na horizontal e na vertical, no mínimo três por embalagem (OLIVEIRA; AKISUE; AKISUE, 1991). A tomada de ensaio está relacionada com a massa total do lote. Se tivermos um lote de 100 kg, a quantidade a ser amostrada será de 250 g da amostra; já em lotes com quantidades de 10 kg ou menores, a quantidade mínima da tomada de ensaio será de 125 g (OLIVEIRA; AKISUE; AKISUE, 1991). Após a amostragem, é necessária a sua homogeneização, além da redução de tamanho da amostra a ser analisada. Essa redução é feita por um esquema que se denomina quarteamento, que é dividir a tomada de ensaio em quatro partes iguais e selecionar duas partes nas diagonais. Depois, junta-se essas duas porções e divide-se em quatro novamente, e assim sucessivamente, até que se tenha uma quantidade para realizar a análise (BRASIL, 2019a). Figura 145 – Quarteamento para farmácias de manipulação 124 Unidade II Amostra Figura 146 – Quarteamento da tomada de ensaio A identificação da amostra é o passo seguinte na análise de drogas vegetais. É uma etapa muito importante, pois grande parte das amostras vegetais é obtida por extrativismo e comercializada por pessoas leigas. Mesmo sendo a legislação atual mais rigorosa, diversas falsificações e adulterações ocorrem, muitas vezes por outros órgãos que não o que seria responsável pela atividade farmacológica, como a camomila, cujo órgão de interesse é a flor. Porém,grande parte das amostras encontradas apresenta contaminação por outros órgãos, como caules e folhas. Outras plantas podem ser acrescentadas ao lote, ou mesmo pode acontecer de plantas erradas serem comercializadas (SOUZA-MOREIRA; SALGADO; PIETRO, 2010). A identificação inicia-se pelos aspectos macroscópicos da droga vegetal. Para isso, é necessário que se compare com a monografia da planta em compêndios oficiais ou científicos. Isso é mais difícil de ser realizado quando a droga já vem pulverizada; então, faz-se somente a identificação microscópica, observando estruturas como estômatos, tipos de célula da epiderme, tricomas glandulares e tectores, inclusões, entre outras (CARDOSO, 2009). Segundo Cardoso (2009), na identificação macroscópica, algumas características devem ser observadas. Essas identificações são realizadas por métodos diretos, isto é, sem equipamentos, pois se utilizam de sentidos como tato, visão, paladar e olfato. Deve-se observar qual o órgão a ser analisado e suas características. Se estiverem presentes: • Em um caule: observar a cor, a forma, o tipo de caule, se liso ou rugoso. • Nas cascas: verificar o tamanho, a forma, se na superfície externa há presença de líquens, fungos; na superfície interna, observar a cor, as estrias, o tipo de fratura, entre outras características. • Nas folhas: verificar se são simples ou compostas, pecioladas ou sésseis, o tipo de nervação, a base, o ápice, o contorno, a textura, a cor. 125 FARMACOGNOSIA • Nas flores: verificar se são simples ou compostas (inflorescências), o pedúnculo, o receptáculo floral, onde estão o gineceu e androceu, a cor, a forma. • Nos frutos: observar, além do tamanho, o tipo de fruto (seco, carnoso, simples), a cor, a forma, a presença de sementes, a superfície. • Nas sementes: atentar para o tamanho, a forma, a cor, o embrião, os cotilédones. • Nos órgãos subterrâneos: verificar se são raízes ou rizomas, a forma, a cor, o tamanho, as características externas (cicatrizes, fibras, gemas). O odor das amostras também é importante, pois através dele podemos já ter uma ideia se é determinada droga vegetal, por exemplo, boldo, erva-doce, erva-cidreira, entre outras, que possuem odor bem característico, além do sabor. Observe que, para a avaliação dessa característica, devemos ter cuidado, pois pode haver falsificações ou contaminações com drogas vegetais mais tóxicas, além de contaminações microbianas ou por metais pesados. Por isso, não se recomenda realizar esse tipo de teste, a menos que seja solicitado na monografia, principalmente quando as outras características não estão bem definidas. Se tivermos, por exemplo, boldo-do-chile, este deverá ser amargo, mas antes deveremos verificar a forma da folha e, se estiver em pó, a cor e o odor (BRASIL, 2019a). Ao se analisar a droga vegetal erva-cidreira (Melissa officinalis L.), é muito comum encontrá-la falsificada com a erva-cidreira brasileira – Lippia alba (Mill.) N. E. Br. ex. Britton & P. Wilson –, e, muitas vezes, só há a Lippia alba. Essa planta cresce com facilidade no território nacional e tem um rendimento maior, porque é comum acrescentarem os caules e não somente as folhas. Veja que, nesse caso, teremos uma dupla falsificação, pois não será a droga verdadeira Melissa officinalis e ainda estará adulterada com caules, sendo que o órgão que possui atividade farmacológica são as folhas. Observação O nome científico deve constar em todas as embalagens que contenham a droga vegetal, não somente o nome comum, evitando confusões e erros. Ainda para realizar a identificação, é necessário que se faça a análise microscópica, que é realizada através de método indireto, pois há necessidade de utilização de um equipamento, no caso, o microscópio, e também corantes. Para realizar essa identificação, é preciso verificar as características anatômicas e comparar com monografias, que podem ser encontradas nas farmacopeias ou em literaturas especializadas. As drogas em pó são mais difíceis de se identificar, como já dito, pela necessidade de utilizar elementos de identificação isolados (pelos, estômatos, inclusões) e não um tecido, como no caso de drogas íntegras (OLIVEIRA; AKISUE; AKISUE, 1991). 126 Unidade II Lembrete Os extratos secos em pó, quando observados ao microscópio, não apresentam estruturas anatômicas vegetais. Realizar a determinação de matéria estranha é importante para garantir a pureza do material, garantindo assim que o valor que se está pagando é do material solicitado, e não de impurezas. Matéria estranha é qualquer material que não conste da definição da droga descrita na monografia correspondente. As drogas devem ser isentas de fungos, de insetos e de outras contaminações de origem animal. Salvo indicação em contrário, a porcentagem de elementos estranhos não deve ser superior a 2% (p/p) (BRASIL, 2019a, p. 316). Mas o que são consideradas matérias estranhas? Podem ser outros órgãos da droga que não o descrito na Farmacopeia, como o Ifav, acima do limite de tolerância especificado na monografia, impurezas de natureza mineral (areia, pedra) ou outras sujidades como insetos ou parte destes, quaisquer organismos (fungos) ou produtos de organismos (fezes, pelos) não especificados na monografia. É importante ressaltar que os produtos (Ifav) devem ser mantidos em locais de armazenamento limpos, seja no produtor, seja no consumidor, evitando assim contaminações, principalmente a proliferação de fungos, que podem produzir toxinas (BRASIL, 2019a). Para realizar a análise de matéria estranha, é necessário pesar a amostra, espalhar em papel branco e a olho nu, inicialmente, e depois com auxílio de lupa, retirar as sujidades, pesar as sujidades e calcular a porcentagem de matéria estranha (BRASIL, 2019a). Figura 147 – Inseto encontrado em amostra de orégano 127 FARMACOGNOSIA Figura 148 – Fungo A identificação deve ser feita também por métodos indiretos, através de ensaios físicos (microscopia, luz UV), químicos (histoquímicos e microquímicos) e físico-químicos (cromatografia) (OLIVEIRA; AKISUE; AKISUE, 1991). A microscopia é um método físico, pois há um jogo de lentes que possibilitam a entrada de luz no equipamento e a visualização do material com o aumento escolhido. Outros métodos físicos utilizados são o da fluorescência dos flavonoides em luz UV ou mesmo o amido sob luz polarizada, que apresenta a cruz de Malta (OLIVEIRA; AKISUE; AKISUE, 1991). Figura 149 – Fluorescência de flavonoides em luz UV (fluorescência mais intensa com AlCl3) 128 Unidade II As identificações através de processos químicos podem ser histoquímicas. Quando se cora o tecido vegetal, por exemplo, em uma pequena porção do pó da droga vegetal, adiciona-se gotas de lugol; se tiver amido, a amostra se tornará azul. Já as reações microquímicas são realizadas para identificar os metabólitos das drogas, como flavonoides, taninos, alcaloides, antraquinonas, entre outros. As reações são chamadas de microquímicas porque se utilizam de pequenas quantidades de amostra (0,5 g a 1 g) colocadas no solvente de extração para retirada dos ativos. Depois, na solução que contém os ativos, são adicionados reagentes químicos, como acetato de chumbo, cloreto férrico, lugol, proteínas, alcaloides, entre outros, que irão reagir com o metabólito presente. Essas reações podem ser colorimétricas, de precipitação, de complexação, e devem ser realizadas, mesmo que a identificação macroscópica e microscópica tenha sido adequada. Existem situações nas quais essa informação é importante, pois já foram encontradas drogas vegetais que correspondiam à monografia nos aspectos macro e microscópico, porém não continham os grupos de metabólitos que deveriam estar presentes (CARDOSO, 2009; OLIVEIRA; AKISUE; AKISUE, 1991). Um exemplo dessa ocorrência é no caso das quinas (Cinchona spp.). Quando se realizam os testes de identificação macro e microscópica com as cascas de algumas espécies de quina, estes correspondem à droga vegetal,porém, ao se realizar o teste para detectar a presença de alcaloides, que são o grupo de metabólitos com atividade farmacológica, eles não são detectados. Provavelmente, o metabólito que é utilizado como medicamento e em alimentos (água tônica) é extraído, e, depois, é enviada apenas a casca sem os alcaloides para comercialização. A incineração é a queima total da matéria orgânica, transformando-a em cinzas. Na Farmacopeia Brasileira, há uma análise que se baseia na quantidade de cinzas obtidas, que é denominada de teor de cinzas. Esse método é importante na verificação da presença de materiais inorgânicos, como pedras e principalmente areia. No teste, toda a droga irá incinerar, e, no final, restará somente um resíduo, que é o material orgânico incinerado (carbono elementar). Como esse teor está descrito nas monografias e a quantidade de cinzas para cada droga é conhecida, caso haja alteração da massa de cinzas, isto é, caso a quantidade de resíduo seja maior que a descrita, significa que há contaminação de material inorgânico, que não carboniza (SIMÕES et al., 2004). Atualmente, preconiza-se a realização do teor de umidade, pois o excesso de água permite o crescimento de microrganismos e a ação de enzimas que podem degradar compostos químicos, como os ativos. O teor de umidade nas farmacopeias varia entre 8% e 14%, dependendo da monografia da droga (SIMÕES et al., 2004). Há também a identificação através de processos biológicos, utilizando-se material biológico ou animais (OLIVEIRA; AKISUE; AKISUE, 1991), mas estes não estão sendo muito utilizados atualmente. O índice de hemólise é uma forma de identificação biológica de drogas que contêm saponinas. As saponinas abrem poros na membrana celular, lisando-a, e por isso ocorre a hemólise. Os métodos físico-químicos mais utilizados são os de cromatografia, seja ela em papel, coluna, camada delgada, gás ou líquida. A cromatografia será melhor explicada mais adiante. 129 FARMACOGNOSIA O controle de qualidade de drogas vegetais e seus derivados é importante para garantir os parâmetros que comprovem que determinada droga vegetal terá os componentes que assegurem sua eficácia e segurança farmacológica. Exemplo de aplicação Pesquise na Farmacopeia Brasileira, 6ª edição, uma monografia de planta e analise os parâmetros de qualidade que foram descritos para essa planta. Observação A Farmacopeia Brasileira 6ª edição possui dois volumes, sendo um deles com os métodos empregados em análises e o outro em monografias. 5.2.1 Cromatografia 5.2.1.1 Análise cromatográfica As técnicas que envolvem análises cromatográficas são as técnicas de escolha pelos compêndios oficiais, abrangendo análises de plantas medicinais e seus derivados (SIMÕES et al., 2017). A palavra “cromatografia” tem origem grega chroma (cor) e graphein (escrever), e foi dado esse nome pelo botânico russo Mikhael S. Tswett, em 1906, quando descreveu dois trabalhos de separação de componentes de extrato de folhas (COLLINS; BRAGA; BONATO, 2006). No início, a cromatografia foi utilizada como método apenas de separação, porém, atualmente, é utilizada como método de separação, identificação e quantificação, sendo um dos mais usados em análises farmacognósticas (SIMÕES et al., 2017). A cromatografia é um método físico-químico de separação dos componentes de uma mistura pelo princípio da afinidade polar. É realizada através da distribuição dos componentes da mistura em duas fases: a fase fixa ou estacionária e a fase móvel, que se move através da fase estacionária. Em geral, a fase estacionária é mais polar que a fase móvel. À passagem da fase móvel pela fase estacionária, os compostos da mistura são distribuídos pelas duas fases, de forma seletiva, de acordo com sua afinidade polar, havendo migrações diferenciais desses compostos (PINTO; KANEKO; OHARA, 2000). As cromatografias podem ser por princípio de partição (líquido-líquido) ou por adsorção (sólido-líquido). Um exemplo de cromatografia de partição é a cromatografia em papel, que tem como fase estacionária o papel (PINTO; KANEKO; OHARA, 2000). Mas como o papel é fase estacionária líquida? A celulose que compõe o papel é formada por moléculas de glicose, um açúcar que possui várias hidroxilas que formam ligações de hidrogênio com a água presente na fase móvel, deixando as moléculas da água retidas nessa celulose e formando uma camada de água interligada com a celulose. Então, os líquidos que não são 130 Unidade II tão polares como a água serão repelidos por ela, funcionando como uma fase móvel, carregando os componentes de uma mistura com características mais apolares que a água. Já a cromatografia em camada delgada (CCD), também conhecida como cromatografia de camada fina (Thin Layer Chromatography – TLC), tem por princípio, principalmente, a adsorção. Nessa técnica, a fase estacionária é composta por um material poroso, com capacidade de reter as substâncias que têm afinidade com sua camada externa. Pode haver fases estacionárias tratadas (especiais) que proporcionam a capacidade de realizar essa técnica também por partição ou troca iônica (PINTO; KANEKO; OHARA, 2000). O fundamento é o mesmo da cromatografia por partição, que se baseia na afinidade dos compostos pela fase estacionária ou pela fase móvel, ou seja, a substância ficará retida na fase estacionária ou se moverá com a fase móvel, dependendo de por qual delas a substância terá maior afinidade. A maior diferença na separação por adsorção em relação à separação por partição é que as fases móveis utilizadas na cromatografia por adsorção não têm água na sua composição, mas solventes orgânicos. Alguns dos adsorventes mais utilizados na CCD por adsorção são a sílica alumina e a terra diatomácea. O papel, dependendo do tratamento realizado, pode ser usado na cromatografia de partição ou na cromatografia por troca iônica. Linha final da “corrida“ da fase móvel Linha de base ou partida Figura 150 – CCD de óleos voláteis. Fase móvel: tolueno 96: acetato de etila 4; fase estacionária: sílica gel Os óleos voláteis ou etéreos são compostos por vários componentes de polaridades diferentes, porém com características mais apolares. São solúveis em solventes orgânicos e pouco solúveis em água. Na CCD que utiliza fase estacionária à base de sílica gel, a qual possui características mais polares, ao tentarmos separar os componentes do óleo volátil, os que tiverem maior afinidade com a fase estacionária ficarão retidos nela. No exemplo da figura anterior, como a fase móvel é composta predominantemente por solvente apolar, o tolueno, os componentes do óleo com características mais apolares terão afinidade pela fase móvel e a seguirão na evolução (corrida) da cromatografia. Então, é possível constatar que os compostos mais apolares estão mais próximos da linha final da placa de sílica gel, e os componentes menos apolares estão mais próximos da linha de partida. 131 FARMACOGNOSIA A) 1 2 3 4 B) 1 2 3 4 Figura 151 – Cromatografia de tinturas e extratos: A) Jacaranda decurrens (fase móvel; clorofórmio/metanol, 7/3; marcador: cafeína e revelador luz UV, 365 nm); B) Bauhinia forficata (fase móvel: BAW, rutina e revelador Np/Peg). 1 = Tintura estação chuvosa; 2 = extrato estação chuvosa; 3 = tintura estação seca; 4 = extrato estação seca A CCD é uma ótima técnica para o controle de qualidade em farmácias de manipulação, pois não exige equipamentos tão caros e sofisticados e permite separação e identificação de substâncias (ALVES et al., 2011; CARDOSO, 2009). Nas cromatografias da figura anterior, foi possível realizar a identificação, pois havia padrões que foram utilizados. Note que a substância em que aparece uma única mancha é o padrão (marcador) cafeína, e através da cor e altura da mancha é possível identificar se a cafeína está presente nos extratos e tinturas avaliados. Nesse caso, é uma CCD qualitativa, que serve para detectar a presença da substância. Observe que, com fases móveis diferentes, as substânciastêm comportamentos diferentes, e suas manchas ficam retiradas em alturas diversas. Também, se os reveladores forem diferentes, a cor de detecção é diferente. Na CCD, quando não se tem o padrão para realizar a comparação e identificação de uma substância, é possível fazer a identificação utilizando o fator de retenção Rf (ou retardamento), comparando-o com os dados em literatura especializada. “O Rf é o quociente entre as distâncias percorridas simultaneamente desde o ponto de partida até o centro de maior concentração da mancha do soluto, e até a frente da fase móvel” (COLLINS; BRAGA; BONATO, 2006). De forma simplificada: Rf = distância percorrida pela amostra distância percorrida pela fase móvel 132 Unidade II Na cromatografia em coluna, a fase estacionária fica compactada dentro de uma coluna vertical com o material adsorvente, sendo que na parte superior há o local para colocar a amostra que vai eluindo, descendo com o solvente (fase móvel), por gravidade, fazendo assim a separação dos compostos que são recolhidos na parte inferior por meio de uma torneira (COLLINS; BRAGA; BONATO, 2006). Uma dificuldade dessa cromatografia é detectar a separação das substâncias que forem transparentes, da cor do solvente. Quadro 4 – Solventes em ordem crescente de polaridade Solvente Hexano Éter de petróleo Cicloexano Tolueno Diclorometano Clorofórmio Éter etílico Acetato de etila Piridina Acetona Etanol Metanol Ácido acético Água Adaptada de: Collins, Braga e Bonato (2006, p. 35). Observação O acetato de etila e a piridina são solventes intermediários, têm afinidade tanto por substâncias apolares como por polares. Atualmente, as cromatografias mais utilizadas na indústria farmacêutica são as cromatografias em coluna sob pressão, que são: cromatografia líquida de alta eficiência (CLAE) e cromatografia gasosa (CG). Por serem realizadas sob pressão, são mais rápidas e permitem, além da separação, a quantificação das substâncias analisadas. Muitas vezes, são acopladas a outras técnicas, como a espectrometria de massas e a espectroscopia de ressonância magnética nuclear, que permitem também a identificação química da substância, podendo-se identificar compostos numa mistura complexa, como os extratos vegetais (SIMÕES et al., 2017; COLLINS; BRAGA; BONATO, 2006). 133 FARMACOGNOSIA Figura 152 – Cromatógrafo: CLAE Figura 153 – Cromatógrafo: CG 134 Unidade II A CLAE, ou high performance liquid chromatography (HPLC), é uma técnica que permite separar misturas com grande número de compostos; é mais rápida que a CCD e que a cromatografia em coluna, pois a fase móvel é pressurizada; também tem alta resolução e eficiência na realização de análises quantitativas (MRADU et al., 2012; RITTO; OLIVEIRA; AKISUE, 2019). A fase estacionária pode ser normal (polar) ou reversa (apolar), e a fase móvel pode ser constituída por solventes polares (água, metanol, acetonitrila, tampões) ou menos polares (hexano, diclorometano) (RITTO; OLIVEIRA; AKISUE, 2019). Na CLAE, a fase móvel é pressurizada por uma bomba através da coluna e leva as substâncias com maior afinidade (fase móvel). Essas substâncias são detectadas à medida que passam pelo detector, o qual envia um sinal para registrar o tempo que a substância demorou para fazer o caminho entre a coluna e o detector (RITTO; OLIVEIRA; AKISUE, 2019). 0,00 4,00 6,00 10,00 14,00 18,00 22,008,00 12,00 16,00 20,00 0,00 0,10 0,20 0,30 0,40 050 0,60 0,70 As co rb ic a ci d - 2. 61 4 Ga lli c ac id - 3 .9 11 AU Minutos Re so rc in ol - 7 .4 51 Ca te ch ol - 9 .5 81 El la gi c ac id - 1 2. 61 9 Va ni lli n - 13 .1 23 Ac et yl sa lic yl ic a ci d - 17 .8 05 Be nz oi c ac id - 1 9. 69 9 2,00 Figura 154 – Cromatograma de uma análise por CLAE de padrões de compostos químicos fenólicos As substâncias volatilizáveis podem ser separadas por CG, ou gas chromatography (GC). Nessa cromatografia, a separação é baseada na diferença de distribuição dos componentes da amostra entre uma fase estacionária (sólida ou líquida) e uma fase móvel, que nesse caso é gasosa. As substâncias a serem analisadas em CG devem ser passíveis de se volatilizarem, pois a fase móvel é um gás. A volatilização é realizada por vaporização assim que a amostra é injetada (COLLINS; BRAGA; BONATO, 2006). Essa técnica é muito utilizada, principalmente na indústria de perfumaria. 135 FARMACOGNOSIA A) 60 mV 40 20 0 0 20 40 60 80 min Eu ge no l 8 7, 38 % Ti m ol 6 ,2 7% B) 60 mV 40 20 0 0 20 40 60 min Eu ge no l 7 1, 12 % Ti m ol 1 3, 28 % Figura 155 – Cromatogramas de CG: cromatogramas do óleo essencial de alfavaca (Ocimum gratissimum L.), planta fresca (A) e planta seca comercial (B) 6 PRODUÇÃO DE INSUMOS VEGETAIS 6.1 Métodos de extração a quente e a frio Desde os primórdios da civilização, o homem precisou se adaptar ao ambiente para poder comer e se curar e utilizou a observação dos animais para aprender a selecionar espécies de plantas que fossem comestíveis e evitar as tóxicas (ALONSO, 2008). As plantas medicinais produzem várias substâncias (composição complexa) com atividade farmacológica ou não, e nem todas possuem sabor agradável (ROBBERS; SPEEDIE; TYLER, 1997). Em vista disso, os homens começaram a buscar métodos para extrair as substâncias que lhes interessassem, com sabor mais palatável. 136 Unidade II Vejamos um exemplo: se mastigarmos uma folha de hortelã, no início o sabor será agradável, pois estaremos sentindo os óleos voláteis da hortelã, que tem um sabor refrescante; mas depois o sabor se tornará mais amargo, porque outras substâncias, que não os óleos voláteis, serão extraídas. Com o tempo, o homem aprimorou os processos de extração dos compostos de interesse. Os métodos de extração podem ser a quente ou a frio e dependem do ativo que se pretende extrair, bem como a finalidade desse produto (SIMÕES et al., 2004). Alguns métodos de extração são mais utilizados pela população, e as formas farmacêuticas mais utilizadas são: decocção (chás), infusão, cataplasmas e inalação (MATOS, 2007). As infusões, decocções, entre outras, são soluções extrativas, pois resultam da dissolução parcial da droga vegetal de composição heterogênea num determinado solvente. Este dissolve alguns compostos presentes na droga vegetal (somente os que forem solúveis no solvente), ficando parte dos compostos a dissolver. O resíduo da droga também é conhecido por marco (PRISTA; ALVES; MORGADO, 1990; ANSEL; POPOVICH; ALLEN, 2011). Vamos relacionar o tema ao nosso cotidiano. O café que tomamos é uma solução extrativa, pois, durante o processo de se fazer o café, a água quente que foi adicionada ao seu pó dissolveu as substâncias solúveis. Não somente o ativo cafeína foi dissolvido; se assim o fosse, o café seria transparente. No entanto, o café tem uma coloração marrom, tem o odor característico e o sabor amargo, que estão presentes porque outras substâncias além da cafeína foram dissolvidas na água quente. Mas a borra de café, que é o resíduo, resultado da passagem da água sobre o pó de café, também chamada de droga vegetal, ainda possui substâncias. Portanto, podemos dizer que ela não foi esgotada, ou seja, ainda existem substâncias que não foram extraídas na água quente. Em uma solução extrativa, como no caso do café, não se tem uma concentração definida, pois podemos ter soluções mais ou menos concentradas. Para realizar uma extração adequada, alguns fatores devem ser avaliados, como: • Estado de divisão da droga vegetal: quanto menor o tamanho da droga, maior a superfície de contato e melhor a extração, pois o solvente consegue penetrar com maior facilidade e realizar a dissolução dos componentes. Observação Na farmacognosia, para os processos extrativos, não se recomenda pó em granulometria muito pequena, pois pode entupir os filtros, dificultando a filtração. • Agitação: aumenta a velocidade de troca entre os solventese a droga. • Temperatura: aumenta a solubilidade e, com o aumento de temperatura, diminui a viscosidade dos solventes, facilitando a penetração desses na droga. 137 FARMACOGNOSIA • Ações adicionais exercidas pelos componentes de uma mesma planta: o caso da saponina é um exemplo de outro componente que facilita a extração dos compostos, pois as saponinas, sendo semelhantes a sabões, irão complexar com os lipídeos da membrana, aumentando a porosidade e entrada do solvente. • Natureza do solvente: os compostos polares são mais solúveis em solventes polares, e as substâncias apolares mais solúveis em solventes apolares. • pH: substâncias ácidas e básicas têm pH adequado de extração. • Tempo de extração: normalmente, quanto maior o tempo, melhor a extração, ou até que se atinja a saturação do solvente (COSTA, 2002; PRISTA; ALVES; MORGADO, 1990). Devemos lembrar que as soluções extrativas devem ser seletivas (conter a substância de interesse), econômicas e conservantes (devem manter as características das substâncias, evitando inclusive contaminação microbiana) (PRISTA; ALVES; MORGADO, 1990). As plantas medicinais e as drogas vegetais podem ser utilizadas em preparações de uso oral (interno) ou externo (pele, mucosas) e são chamadas de formas farmacêuticas. A preparação delas requer normas adequadas para cada caso, e a limpeza deve ser prioridade, seja da planta, seja da droga vegetal (MATOS, 2007). Procuraremos utilizar neste livro-texto as mesmas definições utilizadas pelos compêndios oficiais, com as devidas explicações. Infusão: é a preparação que consiste em verter água fervente sobre a droga vegetal e, em seguida, se aplicável, tampar ou abafar o recipiente por tempo determinado. Método indicado para drogas vegetais de consistência menos rígida, tais como folhas, flores, inflorescências e frutos, ou que contenham substâncias ativas voláteis (BRASIL, 2018, p. 10). Esse é um dos métodos mais utilizados pela população para a preparação de chás, como constataram Griz et al. (2017) em uma pesquisa realizada em Recife. Na pesquisa, 55,5% da população utilizavam o método de infusão para preparar os chás de boldo (Peumus boldus Molina), erva-cidreira (Melissa officinalis L.) e hortelã pimenta (Mentha x piperita L.), o que revelou ser a técnica correta, visto que as três plantas têm a folha como órgão que contém os óleos voláteis. As folhas são estruturas mais frágeis e podem ser preparadas por infusão, mesmo a de boldo. Sendo coriácea, poderia ser feito o chá por decocção, porém os pesquisados utilizavam as folhas mais rasuradas. Os infusos devem ser utilizados no mesmo dia em recipientes bem fechados e guardados – preferencialmente, em geladeira. 138 Unidade II A) B) Figura 156 – Preparação por infusão Decocção: é a preparação que consiste na ebulição da droga vegetal em água potável por tempo determinado. Método indicado para partes de drogas vegetais com consistência rígida, tais como cascas, raízes, rizomas, caules, sementes e folhas coriáceas (BRASIL, 2018, p. 8). A) B) Figura 157 – Decocção Após o cozimento, deve-se deixar em repouso de 10-15 minutos e coar em seguida. Drogas aromáticas, mesmo de consistência rígida, não devem ser fervidas por longo tempo (MATOS, 2007), e de preferência deve-se tampar. Para todas as preparações aquosas, por qualquer método, recomenda-se preparar nova quantidade de chá no dia seguinte (MATOS, 2007), evitando contaminações microbianas. Maceração: é o processo que consiste em manter a planta fresca ou droga vegetal convenientemente rasurada, triturada ou pulverizada, nas proporções indicadas na fórmula, em contato com o líquido extrator apropriado, por tempo determinado para cada vegetal. Deverá ser utilizado recipiente âmbar ou qualquer outro que elimina o contato com a luz (BRASIL, 2018, p. 10). 139 FARMACOGNOSIA Figura 158 – Maceração Os exemplos de maceração utilizada pela população são vários, como as garrafadas, os “álcoois curtidos da vovó”, as “pingas curtidas”, entre outros. No trabalho realizado por Roque, Rocha e Loiola (2010), as macerações foram técnicas narradas pela população, principalmente em preparações para uso dermatológico. As macerações são realizadas à temperatura ambiente e podem ser simples (uma única porção de solvente) ou fracionadas, com a adição de várias porções de solvente. É uma técnica considerada estática, embora em alguns casos possa se usar agitação para fazer a maceração dinâmica ou fazer uma nova maceração com a mesma droga vegetal, e aí é chamada de remaceração. Os solventes das macerações podem ser álcoois e derivados, óleos fixos ou água (COSTA, 2002; PRISTA; ALVES; MORGADO, 1990). A digestão é um processo semelhante à maceração, mas com aquecimento. É um método que lembra a nossa (humana) digestão. Colocamos a droga ou planta em contato com o solvente por um tempo à temperatura de cerca de 40 ºC. A vantagem da digestão é que, por ter uma temperatura mais elevada que a maceração, há maior energia de ativação e contato entre as moléculas, além de menor viscosidade, o que permite melhor penetração do solvente e maior extração. O inconveniente desse método é que necessita de equipamentos especiais (aquecimento) e, consequentemente, maior custo (COSTA, 2002). Percolação: é o processo extrativo que consiste na passagem de solvente, ou líquido extrator, através da droga vegetal pulverizada, previamente umedecida com líquido extrator, mantida em percolador, sob velocidade de gotejamento controlada. O procedimento para sua realização está descrito nos métodos gerais da Farmacopeia Brasileira (BRASIL, 2018, p. 10). 140 Unidade II A percolação é um método ativo de extração, pois o solvente é adicionado continuamente, após um período de maceração, até o esgotamento da droga. É necessária a utilização de um equipamento chamado percolador (COSTA, 2002). Figura 159 – Percolador de inox 6.1.1 Extrato, tintura e métodos especiais Extrato: é a preparação de consistência líquida, sólida ou intermediária, obtida a partir do Insumos Farmacêuticos Ativos Vegetais, ou Ifav. O material utilizado na preparação de extratos pode sofrer tratamentos preliminares, tais como estabilização, moagem ou desengorduramento. O extrato é preparado por percolação; maceração ou outro método adequado e validado, utilizando como solvente álcool etílico, água ou outro solvente adequado. Após a extração, materiais indesejáveis podem ser eliminados (BRASIL, 2018, p. 8). Extrato fluido: é a preparação líquida obtida de drogas vegetais por extração com líquido extrator apropriado ou por dissolução do extrato seco correspondente, em que, exceto quando indicado de maneira diferente, uma parte do extrato, em massa ou volume, corresponde a uma parte, em massa, da droga vegetal utilizada na sua preparação. Se necessário, os extratos fluidos podem ser padronizados em termos de concentração do solvente; teor de constituintes ou de resíduo seco. Havendo necessidade, podem ser adicionados conservantes (BRASIL, 2018, p. 8). 141 FARMACOGNOSIA Quando necessário, outras substâncias poderão ser adicionadas (por exemplo, glicerol ou solução de amônia) para auxiliar na extração ou na dissolução de um extrato mole ou seco da droga vegetal (os quais devem ser produzidos usando o mesmo solvente de extração que seria utilizado para preparar o extrato fluido por extração direta) tanto em água ou álcool etílico na concentração necessária (BRASIL, 2019a, p. 327). Extratos fluidos podem ser ajustados, se necessário, de modo a satisfazer os quesitos de conteúdo de solvente. Extratos fluidos podem ser filtrados, se necessário. Um leve sedimento pode se formar quando em repouso (BRASIL, 2019a, p. 327). Observação O extrato fluido tem a concentração 1:1. Isso significa que 1 mL de extrato contém todas as substâncias solúveis no solvente, que estavam contidas em 1 g de droga vegetal. Os extratos podem ser moles, com consistência xaroposa, e secos, quando se encontramna forma de pó (BRASIL, 2019a). Saiba mais Para conhecer as metodologias de produção de extratos, consulte os quatro processos na Farmacopeia Brasileira, 6ª edição, volume 1: BRASIL. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Farmacopeia Brasileira. 6. ed. Brasília: Anvisa, 2019a. Tintura: é a preparação etílica ou hidroetílica resultante da extração de drogas vegetais ou por dissolução de um extrato mole ou seco da droga vegetal (que tenham sido produzidos utilizando o mesmo solvente de extração que seria usado para preparar a tintura por extração direta) em álcool etílico na concentração requerida. As tinturas podem ser ajustadas para atenderem aos requisitos de conteúdo de solvente. Tinturas podem ser filtradas, se necessário, e leve sedimento pode formar-se quando em repouso (BRASIL, 2018, p. 11; 2019a, p. 330). São obtidas por maceração ou percolação, utilizando tanto uma parte em massa de droga vegetal e quantidade suficiente do líquido extrator para produzir 10 partes de massa ou volume de tintura ou uma parte em massa 142 Unidade II de droga vegetal e quantidade suficiente de líquido extrator para produzir cinco partes, em massa ou volume, de tintura. Outras proporções de droga vegetal e líquido extrator poderão ser utilizadas. É classificada em simples ou composta, conforme preparada com uma ou mais drogas vegetais (BRASIL, 2018, p. 11). A tintura na proporção 1:5 é utilizada para drogas que não são tóxicas; já a tintura 1:10 são para drogas potencialmente tóxicas. Produção de tinturas por maceração: processo no qual, salvo indicação em contrário, a droga vegetal é moída a uma granulometria apropriada, misturada com o solvente de extração definido e deixada em repouso num recipiente fechado durante um tempo apropriado, com agitação, quando necessário. O marco é separado da solução extrativa e, se necessário, prensado. Nesse caso, o líquido é adicionado à solução extrativa e o volume/massa do produto final é ajustado (BRASIL, 2019a, p. 330). Produção de tinturas por percolação: processo no qual, salvo indicação em contrário, a droga vegetal é moída a uma granulometria apropriada, misturada com uma porção do solvente da extração prescrito e deixada intumescer durante um tempo apropriado. A mistura é transferida para um percolador e o solvente de extração é adicionado até que a droga vegetal esteja completamente coberta com uma camada de solvente de extração. O percolado é deixado fluir lentamente, é recolhido na base do percolador, enquanto mais solvente de extração é lentamente adicionado ao topo do percolador, assegurando que a droga vegetal esteja constantemente coberta com solvente de extração, até que tenha sido adicionado todo o solvente. A percolação continua até que o percolado seja recuperado. Se o marco é prensado, os dois líquidos são combinados (BRASIL, 2019a, p. 330). Tinturas são formas farmacêuticas muito utilizadas desde a Antiguidade (COSTA, 2002). Figura 160 – Tintura 143 FARMACOGNOSIA Quando se pensa em extratos ou tinturas que serão utilizadas via oral, normalmente o solvente é etanólico, pois pode-se diluir a concentração deste ou até adicioná-lo a um sólido e depois evaporá-lo, como no caso de comprimidos. Pode-se pulverizar o extrato fluido ou a tintura no granulado, e, quando este secar, o etanol terá evaporado, ficando só as substâncias desejadas. Já quando for para uso externo, para incorporação em creme ou xampu, é necessário que o solvente seja umectante, isto é, mantenha a umidade da pele ou não resseque o cabelo. Os solventes umectantes mais utilizados são o propilenoglicol, a glicerina e o sorbitol (ANSEL; POPOVICH; ALLEN, 2011). Figura 161 – Cremes Quando queremos extrair somente os óleos voláteis, essa extração pode ser realizada pelo método de Clevenger, também chamado de hidrodestilação. A partir desse método, é possível realizar tanto a extração do óleo como o cálculo de rendimento. Pode ser realizada também por arraste de vapor (BRASIL, 2019a). O método de Clevenger necessita de um equipamento especial, como ilustra a figura a seguir. Aparelho de Clevenger Adaptador Balão de fundo redondo Béquer para colera do óleo essencial Manta aquecedora Figura 162 – Extração de óleos voláteis pelo método de Clevenger 144 Unidade II A extração e determinação de óleos fixos baseiam-se na sua extração por solvente, pelo equipamento de Soxhlet. Após o processo de evaporação do solvente, o resíduo obtido, que é determinado por pesagem, representa a quantidade de óleos fixos presentes na amostra (BRASIL, 2019a). Conector apropriado Conector apropriado Tubo-sifão Tubo de vapor Condensador Extrator de Soxhlet Cartucho contendo a droga vegetal Solvente Figura 163 – Extração de óleos fixos pelo método de Soxhlet Os métodos de extração são importantes, uma vez que esses derivados vegetais podem ser utilizados na fabricação de medicamentos fitoterápicos ou fitocosméticos, ou podem ser eles mesmos utilizados como medicamentos oficinais (BRASIL, 1959, 2018). Resumo A produção de drogas vegetais inicia-se pela seleção dos espécimes das plantas que serão plantadas, pois é necessário haver alta concentração de substâncias de interesse farmacêutico. Para planejar o plantio desses espécimes, é preciso considerar dois fatores: os intrínsecos, isto é, os requisitos exigidos da própria planta, e os extrínsecos, que são as condições ambientais nas quais a planta irá se desenvolver. Além do plantio, a coleta do órgão que tem a maior quantidade de metabólitos desejados é outro fator a se atentar, pois, além do órgão, o período do dia, a época do ano, a forma de coleta, a fase e a idade da planta são fatores que podem influenciar a quantidade de ativos da planta. Após a coleta, há o preparo. A estabilização (inativação enzimática), a verificação da necessidade de fazer a lavagem ou a mondagem da planta são critérios a serem avaliados. 145 FARMACOGNOSIA A secagem é um ponto extremamente importante, pois a diminuição de água nos órgãos vegetais fará com que esses se conservem com melhor qualidade, evitando ação de agentes deletérios, como fungos e bactérias. Como em todos os produtos, a conservação das drogas vegetais deve obedecer a parâmetros, como local de armazenamento, temperatura, umidade, iluminação, grau de divisão da droga vegetal, identificação e tipo de material com que é feita a embalagem. Devemos nos atentar a essas condições para garantir a qualidade da droga vegetal. O controle de qualidade visa manter a eficácia e segurança da droga vegetal, com alguns parâmetros obrigatórios. Amostragem, identificação macroscópica e microscópica, análise química, grau de pureza e quantidade de resíduo seco, por exemplo, são testes que devem ser realizados e mantidos dentro das especificações para assegurar a qualidade da droga vegetal. Os testes cromatográficos são de extrema importância no controle de qualidade de drogas e derivados vegetais. São testes físico-químicos que têm como característica a afinidade polar. As cromatografias em papel, em camada delgada, a cromatografia líquida de alta eficiência (CLAE) e a cromatografia gasosa (CG) são as mais utilizadas na farmacognosia. Com uma droga de alta qualidade, os processos extrativos necessitam ser adequados para que se tenha o derivado vegetal também com alta qualidade e rendimento. Existem os métodos extrativos mais caseiros, como a infusão e decocção, e os mais sofisticados, para que se possa realizar a extração com concentrações conhecidas, como no caso de extratos, que têm a concentração 1:1, e de tinturas, com concentração 1:5 ou 1:10. O extrato método ativo, o esgotamento da droga. A tintura pode ser elaborada pelo método de maceração (mais comum) e percolação, tendo a concentração, se a droga não for tóxica, 1:5, e se tiver potencial tóxico, 1:10. Os solventes de extração podem ser o etanol, em diversas concentrações, a glicerina ou outro solvente umectante, dependendo da finalidade, secosméticos (solventes umectantes) ou via oral (etanólicos). Se quisermos extrair e quantificar os óleos voláteis, o método mais utilizado é o de Clevenger; se forem os óleos fixos, o método mais usado é o de Soxhlet. O conjunto produção, controle de qualidade e extração adequada faz com que tenhamos derivados vegetais de alta qualidade para serem utilizados na preparação de medicamentos fitoterápicos ou fitocosméticos. 146 Unidade II Exercícios Questão 1. Leia a transcrição parcial da monografia sobre a arnica e analise a figura a seguir. Arnica, flor Arnicae flos A droga vegetal consiste de inflorescências secas, inteiras ou parcialmente fragmentadas de Arnica montana L., contendo, no mínimo, 0,4% (p/p) de sesquiterpenos lactônicos totais expressos em tiglato de diidrohelenalina (C20H26O5, 346,42). (...) Identificação (...) D. Proceder conforme descrito em Cromatografia em camada delgada (5.2.17.1). Fase estacionária: sílica-gel GF254 (0,25 mm). Fase móvel: acetato de etila, metil-etil-cetona, ácido fórmico anidro e água (50:30:10:10). Solução amostra: a 2 g da amostra pulverizada, adicionar 10 mL de álcool metílico e aquecer, em banho-maria, a 60 °C, sob agitação, durante cinco minutos. Resfriar a solução e, em seguida, filtrar. Solução referência: dissolver 2 mg de ácido cafeico, 2 mg de ácido clorogênico e 5mg de rutina em álcool metílico e ajustar o volume para 30 mL com álcool metílico. Procedimento: aplicar na cromatoplaca, separadamente, em forma de bandas de 20 mm, a 1 cm de distância, 15 μL da solução amostra e 15 μL da solução referência. Desenvolver o cromatograma. Remover a cromatoplaca e deixar secar ao ar. Nebulizar a placa com difenilborato de aminoetanol SR, a seguir, com solução de macrogol 400% a 5% (p/v) em álcool metílico e aquecer entre 100 °C e 105 ºC durante cinco minutos. Examinar sob a luz ultravioleta em 365 nm. (...) Doseamento Sesquiterpenos lactônicos totais Proceder conforme descrito em Cromatografia a líquido de alta eficiência (5.2.17.4). Utilizar cromatógrafo provido de detector ultravioleta a 225 nm; coluna de 0,12 m de comprimento e 4 mm de diâmetro interno, empacotada com sílica octadecilsilanizada (4 μm); fluxo da fase móvel de 1,2 mL/minuto. Eluente (A): água. Eluente (B): álcool metílico. Farm. Bras. 6. ed. Plantas medicinais. Disponível em: https://www.gov.br/anvisa/pt-br/assuntos/farmacopeia/farmacopeia-brasileira/arquivos/7989json-file-1. Acesso em: 19 dez. 2020. 147 FARMACOGNOSIA Figura 164 Disponível em: sbq.org.br. Acesso em: 20 dez. 2020. Com base no exposto e nos seus conhecimentos, avalie as afirmativas. I – A quantificação dos sesquiterpenos lactônicos totais da arnica é realizada por cromatografia a líquido de alta eficiência de fase reversa, conforme a monografia da farmacopeia Brasileira. II – A identificação da arnica nos permite quantificar os seus princípios ativos por meio da espectrofotometria no ultravioleta, a 365 nm, de acordo com a sua monografia. III – Pela análise da monografia, os sesquiterpenos lactônicos totais, extraídos da casca da arnica, são quantificados com ajuda do equipamento mostrado na figura, segundo esquema em que a fase estacionária se encontra dentro da coluna (d). É correto o que se afirma apenas em: A) I. B) II. C) III. D) I e II. E) II e III. Resposta correta: alternativa A. 148 Unidade II Análise das afirmativas I – Afirmativa correta. Justificativa: para o doseamento dos sesquiterpenos lactônicos totais da flor da arnica, a Farmacopeia Brasileira recomenda a cromatografia a líquido de alta eficiência em fase reversa (RP), já que a fase estacionária é uma coluna C18 (octadecilsilano ou RP18), de baixa polaridade, e as fases móveis são polares (água e metanol). II – Afirmativa incorreta. Justificativa: a identificação não quantifica; é baseada em testes qualitativos, para confirmar se o material sob análise é aquele que se suspeita que seja. Além disso, no caso específico da flor de arnica, o método de identificação da monografia, mostrado no enunciado, envolve a utilização da cromatografia em camada delgada (CCD) com revelação por meio da luz ultravioleta (UV) a 365 nm. Não se trata da espectrofotometria, que normalmente é usada para quantificação. III – Afirmativa incorreta. Justificativa: de fato, a figura mostra o esquema de um cromatógrafo a líquido, equipamento utilizado para a realização da técnica recomendada pela Farmacopeia Brasileira para a quantificação dos sesquiterpenos lactônicos totais da arnica, e é verdade que, nesse esquema, (d) é a coluna onde fica a fase estacionária. Porém, pela monografia, essa quantificação deve ser feita na flor, não na casca da arnica. 149 FARMACOGNOSIA Questão 2. Considerando os métodos de extração de óleos fixos e voláteis, observe a figura a seguir. Água sai Água entra Figura 165 – Esquema do extrator de Soxhlet Disponível em: https://bit.ly/2RLgTD1. Acesso em: 20 dez. 2020. Com base no exposto e nos seus conhecimentos, analise as afirmativas e a relação proposta entre elas. I – O aparelho de Soxhlet destina-se à extração a frio de óleos voláteis de amostras sólidas. Porque II – As essências são óleos fixos encontrados em plantas aromáticas; trata-se de princípios ativos de grande interesse comercial. É correto afirmar que: A) As duas afirmativas são verdadeiras, e a segunda justifica a primeira. B) As duas afirmativas são verdadeiras, e a segunda não justifica a primeira. C) A primeira afirmativa é verdadeira, e a segunda é falsa. D) A segunda afirmativa é verdadeira, e a primeira é falsa. E) As duas afirmativas são falsas. Resposta correta: alternativa E. 150 Unidade II Análise da questão A primeira afirmativa é falsa, pois, embora utilize amostras sólidas, o aparelho de Soxhlet não se destina à extração a frio (a presença do condensador no esquema da figura é indicativa da necessidade de aquecimento durante o processo) nem à extração de óleos voláteis (essências). A segunda afirmativa é falsa, pois, embora o aparelho de Soxhlet se destine à extração de óleos fixos, as essências são de fato encontradas em plantas aromáticas, mas são óleos voláteis (não fixos), princípios ativos de grande interesse comercial.
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