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22/08/2022 12:06 Introdução à Avaliação em Saúde - Unidade 3 https://www.unasus.unifesp.br/biblioteca_virtual/MOOCS/IAS_2021/unidade4.html 1/19 Sessão 1 Sessão 2 Sessão 3 Sessão 4 Referências A quarta unidade de aprendizagem foi produzida com o propósito de apresentar discussões e orientações fundamentais para ampliar a qualidade e o valor processual das avaliações no cotidiano dos serviços, bem como seu uso estratégico nas instituições. Tais aspectos foram escolhidos tendo em vista a demanda por avaliações mais úteis e relevantes aos serviços de saúde; em outras palavras, avaliações que favoreçam a melhoria do acesso e da qualidade do SUS. 22/08/2022 12:06 Introdução à Avaliação em Saúde - Unidade 3 https://www.unasus.unifesp.br/biblioteca_virtual/MOOCS/IAS_2021/unidade4.html 2/19 Unidade 4 | Introdução à Avaliação em SaúdeUnidade 4 | Introdução à Avaliação em Saúde Fazemos a você um convite para ler e pensar na situação relatada por um enfermeiro que trabalha em uma Unidade de Saúde da Família (USF) de um município brasileiro. Cícero é enfermeiro dedicado à Estratégia de Saúde da Família. Responde como responsável por sua equipe e é sempre muito comprometido com o processo de trabalho, a relação com os outros profissionais e o cuidado aos usuários. Cícero atua numa equipe composta também por um médico generalista, um auxiliar de enfermagem e Agentes Comunitários de Saúde (ACS), e resume seu dia a dia como uma corrida de obstáculos. Cícero confia na qualidade de suas práticas e reconhece que o cuidado é sua prioridade. Contudo, sabe também como é difícil avançar em certos aspectos e o quanto a equipe, em alguns momentos, se vê sozinha no processo de trabalho. Há alguns meses, a coordenadora da atenção básica foi apresentar o PMAQ à equipe, o que deixou Cícero convencido da importância da iniciativa para superar alguns problemas recorrentes, tanto em termos de infraestrutura, quanto nas questões do trabalho interdisciplinar. Os incentivos financeiros e as avaliações interna e externa poderiam dar suporte para mudanças: o primeiro para aquisição de produtos, melhoria da infraestrutura e gratificações https://www.youtube.com/watch?v=8fAHZYEKim8 22/08/2022 12:06 Introdução à Avaliação em Saúde - Unidade 3 https://www.unasus.unifesp.br/biblioteca_virtual/MOOCS/IAS_2021/unidade4.html 3/19 para a equipe. O segundo para identificar avanços e lacunas em seu processo de trabalho. A equipe aderiu ao programa, mas a experiência não foi exatamente a desejada. Cícero precisava do apoio da gestão para assegurar algumas mudanças, mas a relação com a coordenação não caminhava bem. Não havia amparo para as discussões sobre o processo, ao mesmo tempo que a pressão era grande para que tivessem bons resultados na avaliação. Apesar do cuidado com as relações, sua equipe também passava por um momento difícil, sendo muitos os pontos que mereciam atenção. Em resumo, Cícero achava impossível avançar o quanto era necessário, caso ele fosse o único a desejar e sustentar a avaliação. No dia marcado para a conversa sobre a etapa da autoavaliação, o médico da equipe não compareceu, assim como não houve como garantir a presença do auxiliar de enfermagem, devido a demandas de atendimento sem agendamento que bateram à porta da unidade. A data para a avaliação externa foi então marcada e, ao contrário do que Cícero pensava, a visita se deu em torno de um questionário fechado, o que lhe tirou a possibilidade de partilhar suas ideias e de buscar apoio para as mudanças. Algum tempo depois, a coordenadora da atenção básica foi até a unidade falar sobre o resultado que o programa tinha atribuído à equipe. Não levou relatórios ou gráficos, nem comparações. Apenas congratulou Cícero, que ficou sem entender o porquê dos elogios. Ele queria saber mais: Em que poderiam melhorar? O que se destacava? No que precisavam investir mais força? Como poderiam organizar melhor as informações? Restavam muitas dúvidas. Cícero sabia que era preciso investir em uma avaliação que conseguisse considerar toda a equipe como parte pertencente ao processo. Entretanto, também seriam necessários o apoio de seus gestores e a participação efetiva dos usuários de sua unidade. Na Unidade 1, você foi apresentado a conceitos fundamentais, tais como os de avaliação e monitoramento, estrutura, processo e resultado, perguntas avaliativas, etc. Na Unidade 2, tratamos das relações 22/08/2022 12:06 Introdução à Avaliação em Saúde - Unidade 3 https://www.unasus.unifesp.br/biblioteca_virtual/MOOCS/IAS_2021/unidade4.html 4/19 entre planejamento, monitoramento e avaliação, ao apresentar o conceito de modelo lógico. Na Unidade 3, apresentamos conceitos no campo dos indicadores e refletimos sobre a importância de produzir informações de qualidade para o monitoramento e avaliação, enfatizando o conceito de informação em saúde. Agora, queremos avançar para o uso das avaliações, sabendo ser esse um dos fantasmas mais presentes na vida de gestores, equipes e avaliadores. Para isso, vamos articular um conjunto de ideias presentes nas Unidades 1, 2 e 3 lançando mão do conceito de Matriz Avaliativa, o que nos ajudará a mergulhar no fenômeno da utilização estratégica das práticas de monitoramento e avaliação nos serviços de saúde. As matrizes são ferramentas essenciais para organizar a lógica de uma avaliação; em outras palavras, para organizar o plano de avaliação. Ao encadear os diferentes componentes de uma avaliação, as matrizes demonstram as relações e a interdependência dos elementos de um estudo, permitindo que aqueles que lideram as avaliações estejam atentos a tais conexões. As matrizes também atuam como importantes peças de comunicação, mostrando o que será avaliado, de que forma e para produzir que tipo de informação. Vejamos uma primeira imagem que exemplifica os componentes de uma matriz avaliativa. Reparem que ele articula elementos advindos das Unidades 1, 2 e 3 e apresenta também novos aspectos, nos quais iremos nos deter a seguir. Desde já, saibamos que as matrizes podem variar em sua forma e componentes, a depender da abordagem teórica, linguagem e estilo de quem a constrói. Observem a Figura 1 enquanto são descritos cada um de seus componentes. Figura 1 - Modelo de matriz avaliativa Dimensões Perguntas Indicadores Critério 22/08/2022 12:06 Introdução à Avaliação em Saúde - Unidade 3 https://www.unasus.unifesp.br/biblioteca_virtual/MOOCS/IAS_2021/unidade4.html 5/19 DIMENSÕES: as dimensões, eixos ou campos costumam representar os aspectos mais abrangentes aos quais um processo de monitoramento ou avaliação deve dar atenção. Considerando elementos tratados nas Unidades 1 e 2, por exemplo, poderíamos ter uma matriz voltada às dimensões de Estrutura, Processos ou Resultados, ou mesmo uma matriz que articulasse componentes de cada um desses elementos. Poderíamos também ter uma matriz voltada à experiência do usuário com o serviço, à incorporação de tecnologias ou à articulação política entre os atores do território. Nesse sentido, as dimensões oferecem um primeiro nível de recorte do objeto de estudo e ajudarão os atores a compreender em que direção estão e querem caminhar. PERGUNTAS: se as dimensões fazem um primeiro e importante recorte do objeto de avaliação, as perguntas farão um segundo recorte, também determinante para os estudos. Como observamos na Unidade 1, as perguntas norteiam, direcionam, elucidam e evidenciam os motivos de uma avaliação. Se, por exemplo, escolhemos realizar uma avaliação tomando a estrutura como dimensão de investigação, as perguntas deverão apontar que aspectos precisamos efetivamente saber para potencializar os processos de aprendizagem, gestão e qualidade de um serviço. Trazendo um exemplo, uma pergunta possível seria: em que medida os insumos e medicamentos voltados à detecção, tratamento e manejo da hipertensão e diabetes estão efetivamente disponíveis para os usuários? E assim sucessivamente, nutrindo sempre a melhor relação possível entre dimensão e pergunta avaliativa. INDICADORES: sea escolha das dimensões e das perguntas avaliativas significam recortes importantes do objeto de avaliação, os indicadores farão o recorte definitivo, atribuindo elevada especificidade ao estudo e, na maioria dos casos, tornando-o viável. Como pudemos observar na Unidade 3, os indicadores são aspectos da realidade, tomados pela sua capacidade de revelar fluxos, avanços ou retrocessos, conquistas e obstáculos, luzes e sombras. Dando sequência ao exemplo em questão, a pergunta avaliativa apresentada anteriormente poderia ser respondida ao se observarem quais aspectos http://www.scielo.br/pdf/rbem/v33s1/a09v33s1.pdf 22/08/2022 12:06 Introdução à Avaliação em Saúde - Unidade 3 https://www.unasus.unifesp.br/biblioteca_virtual/MOOCS/IAS_2021/unidade4.html 6/19 específicos? Em outras palavras, que elementos da realidade são capazes de demonstrar que os insumos e medicamentos para hipertensão e diabetes estão disponíveis? Poderíamos, nesse sentido, construir o seguinte indicador: taxa de acesso a medicamentos para os usuários que fazem uso contínuo de medicamentos para hipertensão. Nesse caso particular, estaríamos criando um indicador quantitativo com a fórmula retratada na Figura 2. Figura 2 – Exemplo de fórmula de cálculo para um indicador Taxa de acesso a medicamentos para os usuários que fazem uso contínuo de medicamentos para hipertensão = número de usuários de uso medicamentos para hipertens suas prescrições atendida _________________________ número de usuários de uso medicamentos para hip Vários outros indicadores poderiam ser criados, a fim de que a pergunta fosse olhada com a precisão necessária. Como observamos na Unidade 3, poderíamos também criar índices agregando vários indicadores em um único número. As possibilidades, nesse caso, são inúmeras. Ressaltamos, inclusive, que, além do caráter quantitativo, retratado no exemplo que citamos anteriormente, poderíamos trabalhar com o caráter qualitativo. CRITÉRIOS: mesmo com a especificidade alcançada pelos indicadores, é importante observar que apenas os números produzidos por eles não são suficientes para fazermos juízo de valor a respeito de um determinado objeto. Em outras palavras, somente o número obtido mediante a fórmula de cálculo de um indicador, por exemplo a taxa de acesso a medicamentos em 78%, não seria suficiente para determinar a qualidade do serviço e a adotar medidas de correção. Os critérios devem permitir a comparação e julgamento, o que é crucial aos processos de monitoramento e avaliação. Tomando o exemplo do indicador Taxa de acesso a http://www.scielo.br/pdf/rbem/v33s1/a09v33s1.pdf 22/08/2022 12:06 Introdução à Avaliação em Saúde - Unidade 3 https://www.unasus.unifesp.br/biblioteca_virtual/MOOCS/IAS_2021/unidade4.html 7/19 medicamentos para os usuários que fazem uso contínuo de medicamentos para hipertensão, poderíamos fixar as seguintes expectativas para seu desempenho. Figura 3 – Exemplo de critério de classificação de desempenho 100% Entre 99,9 e85% Abaixo de 85% Nesse caso específico, é desejável (do ponto de vista dos gestores e dos usuários) que a taxa de acesso aos medicamentos fosse de 100%, o que significaria que todos os usuários que necessitam do medicamento teriam acesso permanente a ele. Poderia também ser atribuída uma luz amarela para as taxas entre 99,9% e 85%, a representar um sinal de alerta para que os gestores melhorassem a programação de oferta de medicamentos; e um farol vermelho para as taxas inferiores a 85%. Nesses casos, o número alcançado por um serviço, uma unidade ou um município passa a ter um padrão de referência para comparação, o que tende a ser fundamental para pensar a gestão. À medida que se avança nesse exercício, podemos observar que mesmo o uso do indicador Taxa de acesso a medicamentos para os usuários que fazem uso contínuo de medicamentos para hipertensão seria um avanço mas continuaria a deixar dúvidas sobre em que ponto da cadeia de programação de oferta de medicamentos reside o problema. Isso levaria a outra pergunta de avaliação, que poderia ser de caráter qualitativo. Nessa perspectiva, construir a matriz avaliativa traz a possibilidade de enxergar o sentido da avaliação, ajustando o processo, modulando o estudo e alterando a própria matriz. FONTES: as informações emergem sempre de algum sujeito ou de algum lugar, como um sistema de informações já existente (informações secundárias), ou de informações que serão coletadas em caráter primário na avaliação (informações primárias). As fontes http://www.scielo.br/pdf/rbem/v33s1/a09v33s1.pdf 22/08/2022 12:06 Introdução à Avaliação em Saúde - Unidade 3 https://www.unasus.unifesp.br/biblioteca_virtual/MOOCS/IAS_2021/unidade4.html 8/19 de informação consistem, portanto, nos sistemas de informação ou nos sujeitos (respondentes) que devem ser escolhidos para que uma informação seja recolhida. No exemplo em questão, a Taxa de acesso a medicamentos para os usuários que fazem uso contínuo de medicamentos para hipertensão poderia ser obtida das Fichas de Acompanhamento de Hipertensos, que são objeto diário de trabalho dos agentes de saúde. Nesse caso, trata-se de informação secundária, ou seja, que já está disponível, como vimos na Unidade 3. A depender da qualidade de tais fichas, a informação teria que ser recolhida nova e diretamente mediante consulta aos usuários, o que iria requer uma nova abordagem, um novo instrumento, etc. FORMAS: além das fontes de informação, é sempre preciso definir as maneiras como tais informações serão recolhidas. Os dois conceitos, nesse sentido, são indissociáveis e muitas vezes tratados de forma conjunta nas matrizes. No nosso exemplo, como já afirmamos anteriormente, a coleta pode ser feita mediante a leitura das Fichas de Acompanhamento de Hipertensos, ou mesmo a aplicação de um novo instrumento para os pacientes hipertensos mapeados pela equipe. É fundamental que as formas de coleta de informação sejam as mais adequadas para as fontes de informação. Imaginemos, por exemplo, a violência simbólica contida na ideia de aplicar um questionário escrito para sujeitos com baixos graus de alfabetização. Por isso, a construção de um instrumento para a coleta de informações deve ser um processo cuidadoso de adaptação à realidade que se pretende investigar. PRODUTOS: Todo o esforço empregado em um processo de avaliação deve resultar em boas peças de comunicação para aqueles que estão envolvidos com o que está sendo estudado. Os produtos, nesse sentido, são as peças produzidas em uma avaliação. Tais peças podem ser relatórios formais, apresentações de slides, cartazes ou jornais, notas em blogs, infográficos, spots de rádio ou reuniões de apresentação de resultados. É fundamental, contudo, que os produtos não sejam relegados ao segundo plano, como se a força da avaliação residisse apenas nas fases mais técnicas do processo. Como ainda http://www.scielo.br/pdf/rbem/v33s1/a09v33s1.pdf 22/08/2022 12:06 Introdução à Avaliação em Saúde - Unidade 3 https://www.unasus.unifesp.br/biblioteca_virtual/MOOCS/IAS_2021/unidade4.html 9/19 veremos, os produtos são peças-chave da utilização, elemento fundamental para a concretização do uso da avaliação. Percorridos os exemplos, retomemos a imagem da matriz avaliativa apresentada na Figura 1, agora com os campos preenchidos de acordo com o exercício que realizamos aqui ao apresentar cada um dos componentes da matriz. Figura 4 – Exemplo de matriz avaliativa Dimensões Perguntas Indicadores Cri Estrutura Em que medida os insumos e medicamentos voltados à detecção, tratamento e manejo da hipertensão e diabetes estão efetivamente disponíveis para os usuários? Taxa de acesso aos medicamentos para os usuários que fazem uso contínuo de medicamentos para hipertensão B 1 Raz 9 8 R M qu Na medida em que nas discussões que fizemos até aqui a ênfase se deu em indicadores de natureza quantitativa, o que respeita o fato de que para a maioria dos autores na área de avaliação os indicadores devem ser mesmo sempre quantitativos,trazemos para cá um texto de Maria Cecília de Souza Minayo que discute o sentido, uso e construção de indicadores qualitativos. Boa Leitura! Construção de Indicadores Qualitativos para a Avaliação de Mudanças http://www.scielo.br/pdf/rbem/v33s1 (http://www.scielo.br/pdf/rbem/v33s http://www.scielo.br/pdf/rbem/v33s1/a09v33s1.pdf 22/08/2022 12:06 Introdução à Avaliação em Saúde - Unidade 3 https://www.unasus.unifesp.br/biblioteca_virtual/MOOCS/IAS_2021/unidade4.html 10/19 Até aqui, a Unidade 4 serviu para um exercício de integração e organização dos elementos apresentados nas Unidades 1, 2 e 3. Em certa medida, queríamos preparar terreno para uma discussão bastante importante, que pode ser resumida na seguinte pergunta: quem será o dono da construção dessa matriz avaliativa? Avaliar a si mesmo ou ser avaliado por alguém? Independentemente da escolha, incômodos atravessam os processos de avaliação. Não é à toa que muitos profissionais da área da saúde e de qualquer outra área sentem-se receosos ou constrangidos com avaliações. Colocar cotidianos de trabalho em análise é um processo intenso e exigente, mas que pode de fato disparar transformações importantes. Tais incômodos, contudo, não são exclusivos às relações dos profissionais ou equipes com uma avaliação, mas, sobretudo, a como as avaliações se inserem em estruturas marcadas por hierarquias, cobranças e disputas. Uma primeira pergunta deve sempre disparar os processos de avaliação: Por que e para quê avaliar? As motivações e propósitos que sustentam esse processo devem estar explícitos e bem definidos entre todos os envolvidos. Silva e Brandão (2013) nos trazem questionamentos sobre o diálogo entre cultura organizacional e avaliação e como a qualidade deste diálogo determina o sentido e o potencial dos processos de avaliação. De que maneira a organização faz e usa planejamento? Que processos de aprendizagem se dão ali? De que maneira a organização lida com erros e acertos, fracassos e sucessos? Há conflitos em torno do projeto ou programa que será avaliado? De que maneira a organização costuma conversar sobre seus projetos, programas e estratégias? Outras avaliações ali realizadas produziram que tipos de fenômenos? (SILVA; BRANDÃO, 2013, p. 22). 22/08/2022 12:06 Introdução à Avaliação em Saúde - Unidade 3 https://www.unasus.unifesp.br/biblioteca_virtual/MOOCS/IAS_2021/unidade4.html 11/19 A fim de provocar reflexões sobre as circunstâncias em que as avaliações acontecem, os questionamentos acima dão pistas de escolhas e manejos para esse processo, além de trazerem aspectos da relação substancial que a avaliação possui com seus responsáveis. Worthen, Sanders e Fitzpatrick (2004) também trazem elementos que enriquecem esse debate: A avaliação serve para identificar pontos fortes e fracos, destacar o que é bom e expor defeitos, mas não pode, sozinha, corrigir problemas, pois esse é o papel da administração e de outros responsáveis, que podem usar as conclusões da avaliação como instrumento de ajuda nesse processo (WORTHEN; SANDERS; FITZPATRICK, 2004, p. 57). No entanto, apesar das estruturas institucionais, ora mais abertas à negociação, ora mais rígidas e inflexíveis, a avaliação pode ser utilizada como dispositivo que cria diálogos muitas vezes inexistente entre os diferentes níveis hierárquicos de gestão e operação das intervenções. Tais espaços poderão produzir leituras e decisões mais comprometidas as necessidades e os atores, mais embasadas em evidências e mais respeitosas aos sujeitos e à dinâmica institucional. Sendo um processo exigente de continuidade, a avaliação pode assumir caminhos diversos, porém seu valor enquanto geradora de movimentos é inquestionável; movimentos esses que podem ser vitais para dinâmicas já endurecidas em si mesmas e cruciais para a provocação de mudanças. Um processo de avaliação comprometido com seu aspecto de contínua aprendizagem e movimentação deve levar em conta que, por exemplo, o desempenho de um serviço está atrelado a muitos outros fatores que não só à atuação em si de uma equipe. Ele está atravessado por múltiplas variáveis constituintes daquele contexto. Serapioni (2009) mostra a importância de tratar os processos de avaliação com um enfoque multidimensional, aí reunindo diferentes grupos que o compõem: 22/08/2022 12:06 Introdução à Avaliação em Saúde - Unidade 3 https://www.unasus.unifesp.br/biblioteca_virtual/MOOCS/IAS_2021/unidade4.html 12/19 A avaliação da qualidade da atenção à saúde, portanto, deve fundamentar-se num enfoque multidimensional, que implica o envolvimento de diferentes atores (utentes, representantes dos usuários, profissionais, administradores, gerentes, etc.), todos dotados de perspectivas próprias de avaliação (SERAPIONI, 2009, p. 75). . Cabe, ainda, tomar Mendes (2011) para pensar o processo de construção de indicadores. Para ele, a avaliação em saúde deve ser capaz de "'inventar' indicadores capazes de dimensionar e expressar não somente mudanças nos quadros de saúde- doença, mas provocar e buscar outros reflexos e repercussões, em outros níveis de representações e realizações dos sujeitos (em suas dimensões subjetivas, inclusive)" (SANTOS-FILHO, 2011, p. 1000). Como, portanto, favorecer o engajamento, a horizontalidade e o potencial reflexivo das avaliações? Para Silva (2012), nos processos de avaliação, podemos reconhecer um conjunto de variáveis que reafirmam sua relevância. Antes, contudo, de identificar tais variáveis, o autor sugere que estejamos atentos à polissemia do conceito "avaliações relevantes", que não encontra consenso, mas tem sido reconhecido como avaliações capazes de cumprir ao menos três critérios: 1. ter impacto na dinâmica do programa ou projeto que avaliam, sendo capazes de exercer influências mais ou menos sutis em seus destinos; 2. inspirar confiança técnica e compromisso político nos principais atores interessados, ou stakeholders, apoiando diálogos, descobertas, reflexões e produção de saberes; 3. respeitar e zelar pela integridade cultural, ética e moral dos sujeitos e organizações envolvidos na avaliação, sem com isso se furtarem a apontar bons e 22/08/2022 12:06 Introdução à Avaliação em Saúde - Unidade 3 https://www.unasus.unifesp.br/biblioteca_virtual/MOOCS/IAS_2021/unidade4.html 13/19 maus resultados, acertos e erros, falhas, acidentes e limites (SILVA, 2012, p. 10). Seguindo os argumentos do autor, a primeira afirmação diz respeito à definição de quais atores são proprietários da avaliação, ou veem-se a ela vinculados, responsáveis ou curiosos pela sua produção. Silva (2012) argumenta que existe forte tendência de que os gestores dos programas ou financiadores das avaliações considerem-se como seus únicos donos, supondo que a avaliação deva responder exclusivamente a suas perguntas. Para o autor, "na contramão desse pensamento, que não exageramos ao nomear como patrimonialista, o que a dinâmica social nos revela [...] é que sempre há mais de um interesse em questão nos ecossistemas que são as organizações, os programas e as comunidades" (SILVA, 2012, p. 10). Como nos legou Guba e Lincoln (2011), sujeitos e grupos exercem diferentes graus de influência sobre os processos de avaliação e possuem diferentes desejos e demandas, muitas vezes contraditórias, relacionados aos objetos avaliados. Quanto menos escutamos esse complexo conjunto de reivindicações e expectativas, mais elevamos o risco de que uma avaliação não enriqueça os processos reflexivos e decisórios, ou que seja desacreditada pelos atores. Retomando Silva (2012, p. 11), "com extrema velocidade, o processo político mastiga e elimina toda avaliação que não o levou em conta em sua gênese". Tais reflexões ajudam a analisar o caso do enfermeiro Cícero, com o qual abrimos a Unidade 4. Que matriz avaliativa sustentava os esforços do PMAQ para aquela equipe? Que compromissos havia dos diferentes atores locais com aquele processo de avaliação? Quem zelou para que o processo de avaliação operasse de maneira orgânica e abrigasse debates, aprendizagense encaminhamentos para tantas perguntas e dilemas do cotidiano de trabalho? A primeira variável determinante para o uso é, portanto, a forma como se garante que os atores se apropriem dos processos avaliativos, reduzindo as lacunas entre o técnico e o político. Construir matrizes avaliativas com debate e aprofundamento é crucial para assegurar utilidade. http://www.scielo.br/pdf/pe/v9n2/v9n2a10.pdf 22/08/2022 12:06 Introdução à Avaliação em Saúde - Unidade 3 https://www.unasus.unifesp.br/biblioteca_virtual/MOOCS/IAS_2021/unidade4.html 14/19 Podemos acrescentar a todas essas reflexões o fato de estarmos discutindo a avaliação no contexto de uma política pública, nesse caso de saúde, o que nos coloca em um compromisso de oferecer àqueles que sustentam com seus impostos todos esses serviços um serviço de qualidade, informações e resultados transparentes. Com isso, reafirmamos a importância do que nos trouxe Serapioni (2009) sobre o caráter multidimensional que deve assumir uma avaliação. A participação no processo de avaliação de todos os atores envolvidos em uma intervenção é imprescindível para atingirmos uma visão holística dele. Voltando às afirmação apresentadas por Silva (2012), a segunda delas se refere à qualidade das perguntas avaliativas que servirão de guia aos processos de monitoramento e avaliação, aspecto tratado na Unidade 1. Levando em conta as expectativas dos atores envolvidos em uma avaliação, os chamados atores interessados, Silva (2012) afirma que espera-se que as perguntas de avaliação necessariamente se ancorem em dois elementos-chave para criar raiz e frutificar em descobertas, análises e aprendizagem. Primeiro, as indagações devem ser capazes de traduzir aquilo que os atores querem e precisam compreender melhor, vertendo interesses e desconfianças, em perguntas. Segundo, devem ser capazes de apontar para direções que possam agregar valor ao objeto avaliado, seja por iluminar suas limitações, seja por reconhecer seus resultados. É na associação entre os interesses dos atores e a potência da investigação que as perguntas avaliativas ganham vida e orientam o trabalho (SILVA, 2012, p. 11). Tocando uma vez mais em um tema apresentado na Unidade 1, as perguntas trarão mais sentido às práticas de monitoramento e avaliação à medida que se investigarem, de maneira articulada, tanto a relevância quanto o mérito do objeto avaliado. Para Silva (2012, p. 11), "relevância está definida pelo sentido que uma determinada http://www.scielo.br/pdf/pe/v9n2/v9n2a10.pdf 22/08/2022 12:06 Introdução à Avaliação em Saúde - Unidade 3 https://www.unasus.unifesp.br/biblioteca_virtual/MOOCS/IAS_2021/unidade4.html 15/19 p q intervenção tem no contexto social em que é realizada" e guarda relação com necessidades e demandas, oportunidades e limitações. A relevância passa, ainda, pelo uso inteligente de recursos, pelo uso de métodos mais apropriados e eticamente adequados, de forma que se possa enxergar dimensões intrínsecas aos objetos, ou seja, suas propriedades que antecedem seus efeitos na realidade. Em complemento, o autor nomeia mérito "os resultados alcançados em um determinado programa ou projeto, sejam eles esperados ou não" (SILVA, 2012, p. 12). Os resultados, os impactos, os efeitos, os produtos, ou seja, todos os elementos relacionados ao que uma intervenção produz na realidade, como estudamos na Unidade 2, dizem respeito a mérito (SILVA, 2012). A terceira afirmação diz respeito à utilização de indicadores, com seus respectivos critérios de comparação, que foi objeto da Unidade 3. Na medida em que também são componentes de uma matriz avaliativa, os indicadores devem dialogar de maneira explícita com as demandas e expectativas dos atores e seguirem critérios que os qualifiquem para serem utilizados. Além de comparáveis, os indicadores devem ser pertinentes e relevantes para aquele contexto e objetivos, e devem ser consistentes, fáceis de interpretar, suscetíveis a medidas e acessíveis quanto às formas de coleta de informação. Para Silva (2012) muitas vezes, é ao construir indicadores que um grupo se depara com suas divergências em relação a um projeto, prática ou realidade, abrindo boa oportunidade para construir compreensões mais equilibradas a respeito desses elementos. É também na construção de indicadores que os grupos costumam se deparar com a singularidade da Teoria da mudança que sustenta sua intervenção. Esta troca, tão cheia de contradições, quanto de oportunidades de esclarecimento e pactuação, é um dos maiores ativos que acompanham os indicadores (SILVA, 2012, p. 12- 13). http://www.scielo.br/pdf/pe/v9n2/v9n2a10.pdf 22/08/2022 12:06 Introdução à Avaliação em Saúde - Unidade 3 https://www.unasus.unifesp.br/biblioteca_virtual/MOOCS/IAS_2021/unidade4.html 16/19 Para cada indicador, haverá sempre o desafio de definir o que será considerado como bom resultado, como muito ou pouco, baixo ou alto, e assim por diante. Em certa medida, a construção e pactuação de metas pode ser o critério de comparação necessário, o que permitirá julgar o alcance ou não de determinada meta. Como costumamos dizer em avaliação, quando não há critério de comparação, qualquer resultado é válido e qualquer julgamento é cabível. A quarta variável relacionada ao uso diz respeito à qualidade dos produtos que um processo de avaliação pode gerar. Segundo Silva (2012): Inspiradas pelas melhores tradições acadêmicas, boa parte das avaliações conduzidas atualmente apostam na produção de um relatório final extenso, detalhado e que apresente o conjunto de análises e recomendações depois de meses de trabalho avaliativo. O que as organizações têm nos ensinado é que, em muitos casos, a espera por um documento final não combina com as oportunidades de aprendizagem e decisão que costumam emergir da dinâmica de sua produção (SILVA, 2012, p. 14). Tal aspecto nos leva a reforçar a ideia de que as avaliações sejam marcadas com produtos parciais, por isso mais flexíveis, sendo construídos em linguagens que melhor sentido tenham para os atores interessados. Há um apelo para que a produção de informações seja mais rápida, recortada e sumarizada, e que peças mais simples, acompanhadas de diferentes formas de diálogo, favoreçam os processos de aprendizagem. QUER LER MAIS E SE APROFUNDAR SOBRE OS TEMAS NA UNIDADE 4? SERAPIONI, M. Avaliação da qualidade em saúde. Reflexões teórico-metodológicas para uma abordagem multidimensional. http://www.scielo.br/pdf/pe/v9n2/v9n2a10.pdf 22/08/2022 12:06 Introdução à Avaliação em Saúde - Unidade 3 https://www.unasus.unifesp.br/biblioteca_virtual/MOOCS/IAS_2021/unidade4.html 17/19 Revista Crítica de Ciências Sociais, n. 85, p. 65-82, 2009. SILVA, R. R. Para fazer avaliações relevantes. In: FUNDAÇÃO ITAÚ SOCIAL et al. (Org.). A relevância da avaliação para o investimento social privado. São Paulo: Fundação Santillana, 2012. FERNANDES, A. M. D et al. Avaliação Qualitativa e a Construção de Indicadores Sociais: caminhos de uma pesquisa/intervenção em um projeto educacional. Psicologia em Estudo, Maringá, v. 9, n. 2, p. 243-253, maio-ago. 2004. Disponível em http://www.scielo.br/pdf/pe/v9n2/v9n2a10.pdf (http://www.scielo.br/pdf/pe/v9n2/v9n2a10.pdf Acesso em: 28 jun. 2016. As perguntas a seguir foram preparadas para apoiar a sistematização de saberes e aprendizagens a ser realizada pelos alunos a respeito da Unidade 4. 1. Quais aspectos podem potencializar o uso de uma avaliação? 2. Quais aspectos podem reduzir o uso de uma avaliação? 3. Quem são os atores essenciais para construir uma matriz avaliativa? 4. Como a avaliação pode disparar mudanças na dinâmica de trabalho? 5. Que cuidados devem ser tomados com a comunicação dos resultados de uma avaliação? http://www.scielo.br/pdf/pe/v9n2/v9n2a10.pdf 22/08/2022 12:06 Introdução à Avaliação em Saúde - Unidade 3 https://www.unasus.unifesp.br/biblioteca_virtual/MOOCS/IAS_2021/unidade4.html 18/19 FERNANDES, A. M. D et al. Avaliação Qualitativa e a Construção de Indicadores Sociais: caminhos de uma pesquisa/intervençãoem um projeto educacional. Psicologia em Estudo, Maringá, v. 9, n. 2, p. 243-253, maio-ago. 2004. Disponível em http://www.scielo.br/pdf/pe/v9n2/v9n2a10.pdf (http://www.scielo.br/pdf/pe/v9n2/v9n2a10.pdf) Acesso em: 28 jun. 2016. GUBA, E.; LINCOLN, Y. Avaliação de quarta geração. Tradução de Beth Honorato. Campinas: Editora da Unicamp, 2011. MINAYO, M. C. S. Construção de Indicadores Qualitativos para a Avaliação de Mudanças. Revista Brasileira de Educação Médica, v. 33, n. 1 supl. 1, p. 83-91, 2009. 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São Paulo: EDUSP/Gente, 2004. © 2016 Universidade Federal de São Paulo - Unifesp http://www.scielo.br/pdf/pe/v9n2/v9n2a10.pdf http://www.scielo.br/pdf/rbem/v33s1/a09v33s1.pdf http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-81232007000400021
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