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1 Laís Flauzino | FISIOPATOLOGIA | 6°P MEDICINA 3M1 – FISIOPATOLOGIA DO CHOQUE CIRCULATÓRIO DEFINIÇÃO: • Fluxo sanguíneo insuficiente para suprir as demandas metabólicas teciduais • Desproporção entre oferta e demanda de nutrientes e oxigênio. O choque, uma vez iniciado, pode se auto-alimentar tendendo a ficar progressivamente pior. No choque há situações de isquemia onde tem aumento do tempo de enchimento capilar, situações com diminuição do aporte de oxigênio e nutrientes. Há situações em que o choque começa e ele pode se autoalimentar - choque tem mecanismos de retroalimentação positiva. Então um choque que começa não progressivo pode virar progressivo e ter uma situação de choque irreversível. CLASSIFICAÇÃO DO CHOQUE: Todos os mecanismos do choque acabam culminando em um denominador comum: a demanda supera a oferta. Dessa forma, o choque é rotineiramente classificado em: ● Choque hipovolêmico – falta volume/sangue ● Choque cardiogênico – falta bomba/coração ● Choque distributivo – falta distribuição correta do sangue ○ Séptico ○ Neurogênico ○ Anafilático ● Choque obstrutivo – menos comum, situações que impedem o fluxo sanguíneo (tromboembolismo maciço – se todo o pulmão está com êmbolo, o sangue não flui) CAUSAS FISIOLÓGICAS DO CHOQUE: Redução global do débito cardíaco: Qualquer condição que resulte em diminuição acentuada do débito cardíaco pode levar a choque circulatório. Em especial: • Anormalidades que dificultem a capacidade de bombeamento do coração (choque cardiogênico) – infarto agudo do miocárdio, insuficiência cardíaca, chagas, tamponamento cardíaco etc. • Diminuição do retorno venoso – hipovolemia, vasodilatação periférica (anafilaxia), diminuição do tônus vascular (distributivo) CHOQUE COM MANUTENÇÃO DO DÉBITO CARDÍACO OU ELEVAÇÃO DO DÉBITO • Demanda metabólica muito elevada (infecção, inflamações, febre maligna) – há manutenção do débito e as vezes elevação, mas o pct não deixa de estar chocado. O débito pode estar aumentado para tentar corresponder à demanda absurda, mas não consegue. Não se pode associar que choque é igual a hipotensão. • Padrão de perfusão tecidual anormal, com desvio da circulação alvo – pode ter uma área que não recebe sangue, está em isquemia pct tá chocado e mesmo com aumento do débito o sangue não chega lá ainda. Pode ser uma obstrução arterial súbita, e por mais que tenha informação de que o órgão está sofrendo, não consegue compensar, o sangue não chega no local. Atenção: Choque não é sinônimo de hipotensão. Existem potentes mecanismos de reflexos nervosos que impedem a queda da pressão: • Choque com pressão arterial quase normal • Pressão cair até metade do valor basal mantendo a perfusão tecidual No choque hipovolêmico, de acordo com a classificação até o choque grau II não tem hipotensão. Os mecanismos de compensação conseguem manter a pessoa normotensa mesmo perdendo um volume de 1.500mL. Em última escala o choque se sustenta, estado onde o próprio choque produz mais choque • O fluxo sanguíneo inadequado geral lesão nos tecidos, que por sua vez, atinge o sistema circulatório • Com o acometimento cardíaco, ocorre nova diminuição do débito cardíaco, nova isquemia e assim por diante... • O tratamento adequado do choque e a rápida intervenção podem interromper essa cascata de eventos viciosos, revertendo situações clínicas possivelmente fatais. O choque é como se fosse um veneno, uma situação onde tem um tecido que está em estado de aumento da demanda metabólica, o tecido está sofrendo. Se ele sofre, ele manda uma informação para o SNC: aumenta o débito, a FC, melhora a perfusão. Ai acontece isso, mas o tecido continua sofrendo, dai o sistema fala “aumenta mais”, mas continua sofrendo. Chega um ponto que, por mais que tenha o estímulo, não se consegue mais aumentar. E aí o local de isquemia, além de sofrer, vai gerar uma isquemia/depressão cardíaca pq o coração entra em falência – não consegue acompanhar a demanda que está sendo solicitada – o choque gera mais choque. De um choque no tecido periférico em um membro, você leva a um choque cardíaco – exauriu o coração. Por isso tem que se identificar o estado inicial do choque porque entende-se que todo choque se não for corretamente medicado, tem um potencial de 2 Laís Flauzino | FISIOPATOLOGIA | 6°P MEDICINA progredir para um choque progressivo gerando estados onde o choque alimenta-se a si mesmo. ESTÁGIOS DO CHOQUE ● Estágio não progressivo (compensado) ○ Mecanismo compensatórios conseguem recuperar a circulação e normalizar a oferta ● Estágio progressivo ○ Sem terapia o choque se torna pior, eventualmente levando à morte (ciclo vicioso) ● Estágio irreversível o Estágio no qual independente da terapia instituída a vítima não consegue sobreviver, memo que ela ainda esteja viva. Experimento – pegaram 6 animais e fizeram uma hemorragia aguda e de acordo com o quanto retiravam, esse individuo tinha uma resposta compensatória. Indivíduo I – retira sangue de forma abrupta até que a PAM fique entorno de 80. Se recupera rapidamente pois o volume sanguíneo perdido foi pequeno, o organismo consegue compensar mobilizando o retorno a pressão basal. II – a quantidade de sangue foi maior, ele consegue recuperar, mas a pressão basal não volta ao normal – porque apesar dos mecanismos compensatórios estarem atuando no máximo, não tem volume sanguíneo suficiente. Para ter retorno a PA basal demora, precisa aguardar a medula produzir etc. demora dias/semanas III – limiar de quando os animais aguentavam. Abaixo de PAM 50 os animais morriam. A pressão final ficou muito baixa. IV, V e VI – baixou muito a pressão e os mecanismos compensatórios não foram suficientes. As linhas pretas configuram um choque não progressivo, um choque compensado – pois sem a instituição de uma terapia adequada, os mecanismos compensatórios conseguiram segurar. Foi o ideal? Não pois a pressão final ficou muito baixa, mas tá vivo, vai ter tempo de repor. Nesse experimento não considera o choque irreversível pois ele necessita de uma terapia. CAUSAS FISIOLÓGICAS DO CHOQUE: Se o choque não for tão intenso, mecanismos de feedback negativo da circulação conseguem normalizar o débito cardíaco ● Reflexo barorreceptores → potente estimulação simpática da circulação quando o estiramento está diminuído ● Resposta isquêmica do sistema nervoso central → resposta simpática ainda mais potente. Só é ativada quando a pressão arterial cai abaixo de 50 mmHg (estimulação adrenérgica – último recurso que o cérebro tem para tentar sobreviver – tira sangue/contrai e manda para o cérebro) ● Relaxamento reverso por estresse → gera vasoconstrição arterial e venosa no intuito de melhorar a o retorno venoso e o débito cardíaco (pré-carga) Ocorrem de forma simultânea. ● Aumento da secreção de renina pelos rins e formação de angiotensina II → Constrição das arteríolas periféricas e menor excreção de água e sal, diminuindo a perda de líquido Mecanismo renal, é mais lento. Começa quando tem principio de choque, injúria. Se tem ativação do SRAA, a renina é o conversor que pega o angiotensinogenio e vira angiotensina I. a ECA converte a angiotensina I em angiotensina II fazendo vasoconstrição potente que melhora o retorno venoso. A aldosterona atua na questão de diminuir a excreção de sal – retem sal às custas de reter sódio, excreta potássio e H+ e como consequência pega a água e reter por osmose pois onde tem sódio o tecido fica mais concentrado e a água vai lá para diluir esse tecido. Como consequência tem uma menor excreção de sal e diminuição da perda de líquido. ● Elevação da secreção de vasopressina (ADH) → Próprio nome já nos ajuda → Constrição das arteríolas e veias periféricas aumentando de forma acentuada a retenção de líquidos Adh vai lá nos rins e diz “para de perder água,detenha e absorva o máximo de água” – há diminuição da diurese e aumento da retenção de líquido não só por ação da aldosterona, mas por ação da vasopressina também. 3 Laís Flauzino | FISIOPATOLOGIA | 6°P MEDICINA ● Aumento da secreção de epinefrina e norepinefrina pela medula adrenal → Contração das arteríolas e veias periféricas e também aumenta a frequências cardíaca (FC) Mecanismos compensatórios que fazem o volume sanguíneo retornar ao normal ● Reflexo simpáticos e elevação da secreção de catecolaminas → Pico de atuação entre 30 segundos a alguns minutos ● Mecanismos da angiotensina e da vasopressina, assim como o relaxamento reverso por estresse → 10 minutos a 1 hora para pico de atuação ● Reajuste do volume sanguíneo pela absorção de líquido dos espaços intersticiais e TGI/ via oral → 1 a 48 horas para pico de atuação À medida que o choque se desenvolve a bomba cardíaca é afetada ● O fluxo sanguíneo para o coração é reduzido, não sendo suficiente para manter seu metabolismo ● Com o passar do tempo, as reservas energéticas do coração se esgotam e o coração tende a falhar além de acumular metabólitos resultantes da fermentação lática → aumento do lactato é um fator de pior prognóstico no choque ● Quando o coração acaba com todo o estoque de moléculas energéticas derivadas de adenosina (ATP/ADP), a morte é quase certa → consumo das reservas de fosfato de alta energia – não consegue repor Se está fazendo fermentação lática é porque o ATP acabou, então o ATP obtido pela respiração celular através da quebra da glicose acabou, isso indica que já esgotou as reservas de glicogênio, já esgotou as reservas de glicose e está entrando em uma demanda muito grande. Dessa forma o músculo cardíaco e demais músculos vão fazer fermentação para ser uma forma de obtenção de ATP por mais que a fermentação seja ruim, que não consegue fornecer um saldo energético muito bom, é necessário obter alguma coisa. Como compensação tem fermentação lática – como resultado tem o lactato – fator de pior prognóstico. O lactato é uma medida indireta da perfusão, porque se está com perfusão ruim, quer dizer que tem isquemia, se tem isquemia é pq não tem oxigênio, se não tem oxigênio não consegue fazer respiração celular (fosforilação oxidativa) e é necessário vias adaptativas de obtenção de energia. Existem 3 tipos de fermentação: lática, alcoólica e acética (vinagre). Um lactato alto quer dizer que a perfusão não está boa. OUTROS MECANISMOS DO CHOQUE CIRCULATÓRIO: ● Insuficiência vasomotora cerebral → PAM abaixo de 30 mmHg – não tem perfusão cerebral, é muito grave. ● Bloqueio de vasos pequenos (capilares) por sangue estagnado – conglomerados/cilindros que ocluem o vaso Indivíduo que tem produção exacerbada de hemácias. ● Aumento da permeabilidade capilar → estágios avançados do choque prolongado – se aumenta a permeabilidade em todo o organismo é muito ruim pois não tem sangue suficiente ● Liberação de toxinas pelo tecido isquêmico → endotoxina por bactérias gram - → depressão cardíaca CHOQUE HIPOVOLÊMICO: ● Hipovolemia significa redução do volume sanguíneo circulante, sendo a hemorragia a causa mais comum desse tipo de afecção Mas não é só a hemorragia. Pode ter choque hipovolêmico por desidratação severa – idosos desidratam muito rápido. ● Esse evento diminui a pressão de enchimento da circulação, gerando queda do retorno venoso (pré-carga) ● Como consequência ocorre a diminuição do débito cardíaco ○ DC (débito cardíaco): VS (volume sistólico) x FC (frequência cardíaca) ○ PA (pressão arterial): DC (débito cardíaco) x RVP (resistência vascular periférica) Com a diminuição do débito, ocorre diminuição da PA. Em casos de emergência hipertensiva, é necessário abaixar a pressão – as estratégias incluem: além de tentar diminuir a quantidade de líquido dentro do vaso para diminuir o volume sistólico (Seca o paciente), tenta diminuir a resistência vascular – dá um vasodilatador – vai diminuir a PA. 4 Laís Flauzino | FISIOPATOLOGIA | 6°P MEDICINA Como a pressão acompanha o débito cardíaco. Á medida que o debito cai, a PA também tem um gráfico similar. A queda da PA inicia mecanismos de compensação nos barorreceptores arteriais e outros receptores de estiramento vascular Essa compensação envolve reflexos simpáticos que estimulam o sistema vasoconstritor ocasionando: ● Vasoconstrição das arteríolas → aumento da RVP ● Venoconstrição → aumento do retorno venoso melhorando o DC ● Aumento da FC → aumentando a FC basal média de 72 bpm para até 160-180 bpm (para compensar o débito) É tudo instantâneo – o organismo não brinca com queda de pressão, pois significa baixa perfusão cerebral. Exemplo de situações clínicas que podem cursar com choque hipovolêmico: ● hemorragia digestiva, hemoptise maciça, dissecção aórtica com ruptura, aneurisma roto, sangramento espontâneo por alteração da coagulação ● perdas pelo TGI (diarreia, vômitos), diurese excessiva (diabetes insípidus, hiperglicemia acentuada, diuréticos, nefropatia perdedora de sal), perdas para terceiro espaço (p. ex., pancreatite aguda, obstrução intestinal), queimaduras, síndromes hipertérmicas CHOQUE CARDIOGÊNICO: ● Decorre de insuficiência da bomba cardíaca Coração com falha. ● O sangue não consegue ser bombeado de forma adequada, gerando desproporção entre a demanda metabólica tecidual e a oferta de nutrientes e oxigênio ● A principal causa é o ataque cardíaco agudo (IAM), mas causas que geram deterioração cardíaca progressiva também são comuns (Insuficiência cardíaca, chagas, insuficiência valvar grave, etc) ● Uma vez que a pessoa tenha desenvolvido o choque cardiogênico, o índice de sobrevida pode chegar a menos que 30% ● Em corações que já possuem algum grau de redução do suprimento sanguíneo coronariano, pequenas variações de pressão já podem ocasionar deterioração cardíaca ○ Paciente saudáveis podem tolerar uma pressão de até 45 mmHg antes de deteriorar ○ Paciente com comprometimento coronariano sofrem com pressão abaixo de 90 mmHg ● Muitas vezes o paciente não consegue tratamento em tempo hábil para restabelecer a função cardíaca ○ remoção cirúrgica do coágulo na artéria coronária (pode ser entendido como choque obstrutivo ou cardiogênico) ○ cateterização da artéria coronária bloqueada e infusão de estreptocinase ou de enzimas ativadoras do plasminogênio tecidual CHOQUE DISTRIBUTIVO: • neurogênico – redução da informação nervosa que mantem o tônus vasomotor. • séptico • anafilático/histamínico Neurogênico: ● Neurogênico → É causado pelo aumento da capacidade vascular, resultante da perda súbita do tônus vasomotor ● Como resultado ocorre diminuição do retorno venoso central e queda do débito cardíaco devido a grande dilatação vascular → acúmulo venoso do sangue ● Causas de choque neurogênico ○ Anestesia geral profunda → depressão do centro vasomotor ○ Anestesia espinal → bloqueia a descarga nervosa simpática ○ Lesão cerebral – acidente, dissecção da medula não há tempo para o organismo compensar. Quando há perda do tônus vasomotor, ocorre acúmulo venoso – o vaso está dilatado, a artéria até consegue conduzir um pouco do sangue, mas 2/3 do volume sanguíneo estão nas veias. Então se perco a capacidade de contrair e mandar esse sangue para o coração para melhorar o débito, isso gera impacto na circulação. Quando se faz um bloqueio a nível de medula e consegue bloquear toda a informação nervosa, então tanto a informação motora quanto a sensibilidade vibracional e térmica são bloqueadas. Só que isso é ruim – se bloqueou, o tônus nesse músculo foi perdido. Diagnóstico na prática clínica: Baseado em 3 variáveis: • Presença de hipotensão e taquicardia • Hiperlactatemia (sofrimento tecidual) 5 Laís Flauzino | FISIOPATOLOGIA | 6°P MEDICINA • Hipoperfusãoperiférica – extremidades frias, cianose, oligúria (<0,5 ml/kg/h), baixo débito no SNC (sonolência, torpor, confusão mental) Nem toda hipotensão e taquicardia são choque. Hiperlactatemia: traduz sofrimento tecidual – os tecidos estão fazendo fermentação lática para compensar a falta de O2/hipóxia. Na classe 3 já tem indicação de [] de hemácias. Não é uma indicação forte, mas com certeza deve-se reservar uma bolsa. No choque classe III já tem uma compensação cardíaca – tem uma taquicardia, a FC está acima de 120, mexe no débito para compensar a hipovolemia. O tempo de enchimento já está prolongado, a diurese está ruim, a FR está aumentada e tem que sondar o pct para quantificar diurese. A diurese é um dos melhores marcadores de perfusão periférica porque o rim perfunde bem com até 60 de PAM. O cérebro até 50 de PAM funciona. Nem todo choque é hipotensão – pode ter choque com pressão normal. Classe I e II – expansão volêmica no pct. 3 – entra com protocolo de reposição. Referências: Martins, Herlon, S. et al. Medicina de emergências : abordagem prática. Disponível em: Minha Biblioteca, (12th edição). Editora Manole, 2017. - capítulo 09 Bruce M. Koeppen. Berne e Levy - Fisiologia. Disponível em: Minha Biblioteca, (7th edição). Grupo GEN, 2018. John E. Hall. Guyton & Hall Tratado de Fisiologia Médica. Disponível em: Minha Biblioteca, (13th edição). Grupo GEN, 2017 - capítulo 24
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