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Dermatoviroses: Molusco Contagioso e Verrugas

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Dermatoviroses
Dermatoviroses são, como o próprio nome deixa claro, afecções dermatológicas
provocadas por infecções virais. Via de regra, são condições autolimitadas.
➽ Molusco Contagioso
É uma dermatovirose causada pelo Poxvírus, muito comum,
principalmente em crianças (incidência entre 1,2-22%). O paciente
costuma contrair a doença através de contato direto com a lesão,
assim como através de fômites, banho em piscinas contaminadas e,
eventualmente, na forma de IST.
Os picos da doença ocorrem entre os 3-9 anos e entre os 16-24 anos
(imunossuprimidos), com dermatite atópica, HIV e uso de
imunossupressores como fatores de risco para o desenvolvimento da
doença. O poxvírus pode permanecer incubado por cerca de 6
meses.
São caracterizadas por pequenas pápulas brilhantes, graças à distensão rápida da pele.
As pápulas também possuem uma pequena umbilicação central. Mesmo sendo uma
condição autolimitada, é possível realizar o
tratamento com a curetagem das pápulas,
pensando em pacientes com poucas lesões.
Pode ser feita a aplicação de anestésico tópico nas
lesões antes da curetagem, que irá remover as
pápulas pela base. Após a remoção das pápulas,
aplica-se iodo (PVPI) na base da lesão criada com a
curetagem, já que o iodo apresenta propriedades
antivirais. Outras medicações que podem ser utilizadas são o KOH 5% e o imiquimode, que
atua induzindo resposta imunológica celular via Th₁ (muito caro).
OBS₁: Com relação à presença de molusco em região genital, sua presença pode ocorrer
por autocontaminação da criança, que coça o local da ferida e depois coça as próprias
partes íntimas. Entretanto, uma presença importante de lesões nessa região cabe a dúvida
e acionar o conselho tutelar.
➨ Diagnósticos Diferenciais
São diagnósticos diferenciais do molusco
contagioso o líquen nítido (esquerda), a
criptococose em imunossuprimido (direita)
e as verrugas.
➽ Verruga
É caracterizada com uma pápula ou nódulo verrucoso e
hiperceratótico, conferindo aspereza à lesão. Além disso,
apresentam pequenos pontos pretos decorrentes da
trombose do sangue oriundo dos vasos que irrigam a
estrutura da verruga. Também podem apresentar outros
aspectos característicos a depender da região onde está
situada (verrugas filiformes, periungueais, plantares). É
causada pelo vírus HPV, sendo responsável por 21% dos encaminhamentos
dermatológicos. Ao lado, temos uma verruga vulgar. Abaixo, imagens de verruga plantar,
periungueal e verruga plana.
OBS₂: Verrugas plantares são de difícil tratamento pois, como há a pressão constante do
chão contra a planta do pé, as estruturas verrucosas crescem se interiorizando. Com isso,
não é possível saber ao certo o tamanho da lesão, além de serem dolorosas. Para não
confundir esse tipo de estrutura com as calosidades, é válido lembrar que nos calos a
impressão digital da planta é preservada, algo que não acontece na verruga plantar.
Pacientes com baixa imunidade celular estão propensos a maior disseminação e
malignização das lesões, principalmente no caso dos condilomas acuminados, que são as
verrugas presentes em região genital. Em cerca de 70% dos indivíduos imunocompetentes,
as lesões desaparecem em dois anos.
Ainda assim, é possível realizar a remoção das verrugas com o uso de ácidos
queratolíticos, eletrocoagulação e crioterapia. Não é recomendado utilizar produtos de
farmácia para a crioterapia, pois esses produtos
resfriam apenas até -20ºC e não são tão eficazes
quanto o nitrogênio líquido, que atinge -198ºC. A
crioterapia pode ser associada ao uso diário de
queratolíticos, acelerando o tratamento. A excisão
cirúrgica não está indicada, pois pode provocar o
surgimento de mais verrugas na cicatriz cirúrgica, ou a
implantação mais profunda do vírus.
No caso das verrugas planas, o tratamento é feito com
ácido retinoico e queratolíticos mais suaves, para evitar
lesões na pele ao redor. Em todos os tipos de verrugas, vale
a pena a administração da vacina de HPV, pela proteção
cruzada.
➨ Diagnósticos Diferenciais
As verrugas tem como diagnósticos diferenciais importantes
o condiloma acuminado, que também são lesões oriundas
do HPV (subtipos 6 e 11). Estão presentes em regiões genitais
tanto femininas, quanto masculinas, e ao perceber sua
existência, é válido realizar a sorologia para HIV. Outra lesão
provocada pelo HPV é a papulose bowenóide, que gera
lesões amarronzadas e acima do relevo da pele, também
comumente encontrado em pênis e vulva. É importante
lembrar que HPV em região genital torna o indivíduo mais
suscetível ao desenvolvimento de lesão neoplásica.
É importante não confundir verrugas com as pápulas
perláceas coronais que ficam ao redor da glande. Essas
pápulas são as glândulas de Tyson, produtoras de
lubrificantes que protegem o pênis. Outro diagnóstico
diferencial comum é o molusco contagioso, que quando
ocorre em paciente mais velho deve ser acendido um sinal
de alerta para a realização de sorologia para HIV.
Ao lado imagens dos diagnósticos diferenciais das verrugas.
De cima para baixo: condiloma acuminado, papulose bowenóide e glândulas de Tyson. O
molusco contagioso já foi mostrado anteriormente.
➽ Herpes Simples
São caracterizados por vesículas confluentes sobre uma
base eritematosa, que provocam hiperestesia e
ardência (graças ao tropismo do vírus por nervo e pele).
Podem apresentar crostas melicéricas (tom parecido
com o mel) em caso de infecção secundária por
bactérias. As lesões são encontradas principalmente em
região perioral (tipo I) e genital (tipo II). Apesar de não
ser comum, é possível encontrar herpes tipo I em região
genital e herpes tipo II em região extragenital.
O primeiro contato do ser humano com o herpes
vírus costuma ocorrer ainda na infância, com o
surgimento das lesões entre 7-10 dias depois deste
contato. Cerca de 90% da população é
soropositiva para herpes, sendo que muitos
indivíduos não chegam a apresentar lesões. O
quadro é autolimitado e dura entre 10 - 15 dias. As
lesões costumam recidivar exatamente no mesmo
local, pois o vírus fica inativo naquela região.
O diagnóstico, além de clínico, pode ser feito através do citodiagnóstico de Tzanck, no
qual o material de uma das vesículas é coletado e corado, para observação do
microscópio. Na lâmina, são observados queratinócitos com vacúolos citoplasmáticos
aumentados. O tratamento é feito com aciclovir e deve ser instituído no início do quadro
(48-72h), reduzindo o tempo de duração das lesões.
➨ Outras dermatoses causadas pelo HSV
Outras lesões causadas por esse vírus são o panarício herpético e a erupção variceliforme
de Kaposi. A primeira lesão é mais comum em dentistas, que entram em contato com o
vírus ao manipular a boca de pacientes com lesões ativas, e acabam desenvolvendo as
vesículas nas regiões distais dos dedos. Já o segundo tipo de lesão ocorre por todo o
corpo, em áreas extensas com vesículas características da infecção viral, em pacientes
com a pele fragilizada por dermatite atópica. O tratamento também é feito com aciclovir,
em ambos os casos.
➨ Fatores desencadeantes do HSV
São fatores desencadeantes para a recidiva das lesões, circunstâncias como:
● Exposição solar prolongada
● Febre
● Estresse emocional
● Menstruação
● Trauma
➨ Tratamento
O tratamento, como já foi dito anteriormente, é realizado com aciclovir 200 mg, 4/4h, 5x
ao dia (sem dose noturna), por cerca de 5-7 dias. A dose em imunossuprimidos deve ser de
400 mg.
➽ Herpes Zoster
O herpes zoster (fogo selvagem), assim como o herpes simples, causa a formação de
vesículas confluentes sobre uma base eritematosa. Porém, quando se trata de herpes
zoster, as lesões acompanham a extensão de um
dermátomo. A doença é causada pelo vírus
varicela zoster (o mesmo agente causador da
catapora).
O indivíduo contrai o vírus e desenvolve a catapora.
Após a fase aguda da doença, o vírus entra em
uma fase quiescente, na qual fica adormecido nos
gânglios dorsais próximos à medula espinhal. Após um tempo, graças a algum fator
desencadeante (estresse, imunossupressão), a infecção é ativada novamente, seguindo odermátomo correspondente à raiz nervosa que abrigava o vírus. Trata-se de uma afecção
mais dolorosa do que a herpes simples.
São critérios de gravidade no herpes zoster:
● Atravessa a linha média
● Acomete mais de 3 dermátomos
● Acomete o ramo oftálmico
O acometimento do ramo oftálmico pode ser suspeitado pelo sinal de Hutchinson, que
consiste no acometimento da ponta do nariz com lesões vesiculares. A lesão pode resultar
em retinopatia e amaurose permanente. Na presença deste sinal, deve ser instituído
tratamento imediato com aciclovir e corticosteróide, assim como o encaminhamento
para o oftalmologista.
➨ Tratamento
O tratamento também é feito com aciclovir, porém em doses maiores, de 800 mg, a cada
4h, 5x ao dia (suspensão da dose noturna), por 7-10 dias. Quanto mais cedo instituído o
tratamento, melhor a resposta do paciente (idealmente nas primeiras 72h).
Para tratar a neuropatia aguda associada ao acometimento do dermátomo, pode ser
utilizado paracetamol + codeína (popularmente conhecido como PACO) e prednisona
40-60 mg/dia por 20 dias, reduzindo 10 mg a cada 10 dias. É válido ressaltar que o uso de
prednisona é controverso.
Para os casos em que o paciente desenvolve neuralgia pós herpética (cerca de 2 a 3
meses após o quadro agudo), o controle da dor pode ser feito com medicações como a
amitriptilina, carbamazepina e a fenitoína. Para idosos, essas medicações podem ser
perigosas por aumentar o intervalo QT e causar bradicardia, sendo preferível o uso da
pregabalina nesse grupo de pacientes.
Com relação às medicações de uso tópico, assim como na herpes simples, na herpes
zoster o uso tópico do aciclovir não se mostra eficaz. Para uso tópico seria mais
interessante lançar mão de antibióticos associados ou não a corticosteróides, a fim de
evitar infecções secundárias e reduzir a inflamação (betametasona + gentamicina).
➽ Varicela
A varicela, ou catapora, é causada pelo vírus varicela zoster. As lesões têm padrão
craniocaudal, com o surgimento de vesículas espaçadas (não são confluentes como na
herpes simples, nem associadas a dermátomos como na herpes zóster). Essa doença
apresenta diversos picos de viremia e, por isso, em um
mesmo paciente é possível ver pápulas, vesículas, pústulas
e crostas, que são o padrão natural de evolução das lesões.
A principal faixa etária acometida está entre 2-8 anos,
sendo rara em crianças com menos de 3 meses
(provavelmente graças à proteção materna). Possui
período de incubação de 2-3 semanas e apresenta maior
incidência na primavera e no inverno (mas no Brasil isso não
se aplica muito). Lembrar que pessoas com herpes zoster
também transmitem o vírus e podem causar varicela.
O paciente geralmente apresenta uma fase prodrômica
com febre, cefaléia e mialgia, que inicia 1-2 dias antes da
apresentação clínica. Dá-se então início à fase
exantemática, que dura cerca de 8-10 dias. É nessa fase
que vemos as pápulas, vesículas, pústulas e crostas (que
não apresentam vírus viável) e o prurido característico da
catapora. a transmissão pode ocorrer desde 1-2 dias antes
do surgimento dos exantemas, até a formação da última
crosta. É válido lembrar que a transmissão também é feita
por via respiratória.
➨ Complicações Associadas
As lesões da varicela podem sofrer infecção bacteriana secundária (principalmente S.
aureus), e são estas as responsáveis pelo surgimento de cicatriz após o quadro viral. Outras
complicações são o desenvolvimento de pneumonia hemorrágica e encefalite, que pode
cursar com ataxia cerebelar.
Pacientes com deficiências imunológicas tendem a apresentar curso prolongado, com
erupções hemorrágicas muito extensas, sendo comum a complicação com pneumonia
nestes casos. Neste grupo de pacientes, a mortalidade é alta.
➨ Tratamento
Na maioria dos casos o tratamento é sintomático, com uso de anti-histamínicos VO para o
prurido. Além disso, é preciso fazer o isolamento respiratório desses pacientes para evitar a
transmissão da doença.
É preciso tratar com medicamento antiviral os pacientes imunossuprimidos, adolescentes
com mais de 13 anos, adultos, neonatos e pessoas que contraíram a varicela do paciente
zero (sendo este, grave). O medicamento de escolha é o aciclovir, na mesma dose de
tratamento do herpes zoster. O uso de permanganato de potássio é útil para evitar o
acometimento das lesões por infecção secundária.
➽ Eritema Infeccioso
É causado por um parvovírus e caracteriza-se pela presença de eritema malar, que evolui
com exantema maculopapular. Acomete comumente indivíduos entre 5-12 anos, com
período de incubação de 6-14 dias. O paciente apresenta pródromos leves, que cursam
com cefaleia, febre e calafrios. Não se compreende muito bem o período de contágio,
mas é sabido que o paciente não transmite mais a infecção na fase exantemática, e que
o contágio costuma ocorrer no ambiente escolar e
intradomiciliar.
O exantema apresenta três fases, que duram cerca de
7-21 dias. Na primeira fase, o paciente apresenta um
exantema facial na forma de borboleta, que costuma
ficar concentrado na região malar e poupar o nariz
(face esbofeteada). A segunda fase é marcada pela
presença de exantema macular rendilhado, que
percorre as extremidades e o tronco, com um
clareamento central, e dura cerca de 2-3 semanas.
Após a melhora deste quadro, o paciente pode
apresentar a terceira fase, que consiste na recidiva dos
sintomas da primeira e segunda fase após a exposição
do paciente ao calor, luz solar e atividade física. Essa
última fase pode durar entre 1-3 semanas ou se
prolongar até três meses.
➨ Complicações
Pacientes que apresentam doenças hematológicas podem experimentar aplasia grave,
em função da destruição de suas hemácias durante a infecção pelo parvovírus. Podem
ocorrer quadros de artrite, especialmente em pacientes adultos que apresentam esta
infecção. Tal condição, assim como a síndrome purpúrica em luvas e meias, são quadros
incomuns.
➽ Exantema Súbito ou Roséola Infantum
É um quadro viral causado pelos herpes vírus 6
e 7, que comumente acomete crianças entre 6
meses e 3 anos de idade. Passa por um período
de incubação de 10-14 dias, que é sucedido
por um período prodrômico de 3-4 dias, no qual
a criança apresenta um quadro de febre alta e
irritabilidade.
Após o fim da fase febril, surge um exantema
maculopapular não descamativo, fugaz, que
tem origem no tronco do paciente. O quadro pode durar apenas algumas horas ou 1-3
dias, com evolução autolimitada.
➽ Síndrome Mão-Pé-Boca
Caracterizada pela presença de vesículas isoladas em mãos, pés e boca (que apresenta
lesões com aspecto aftóide), com exantema maculopapular discreto, que por vezes é
urticariforme ou petequial.
É causada pelos vírus da família
Coxsackie e costuma acometer
crianças entre 1 e 4 anos. O
período de incubação é de 3-7
dias. O paciente não costuma ter
pródromos e apresenta um quadro
leve e autolimitado, que cursa com
febre, anorexia, mal estar e
odinofagia.
➽ Mononucleose
Popularmente conhecida como “Doença do
Beijo”, fã dos amantes do carnaval, a
mononucleose é uma doença causada pelo
Epstein-Barr vírus. A faixa etária mais comumente
acometida está entre os maiores de 2 anos e
adolescentes. Possui um período de incubação
que pode durar de 30 a 50 dias.
O paciente apresenta pródromos por 1-2
semanas, com mal estar, fadiga, cefaleia e dor
abdominal (esplenomegalia), além de febre alta (40ºC). O quadro clínico apresenta uma
tríade clássica: faringite exsudativa, adenomegalia e febre prolongada, além de atipia
linfocitária. O paciente apresenta exantema maculopapular difuso por reação de
hipersensibilidade a penicilinas, muitas vezes prescritas na tentativa de tratar a
faringoamigdalite. O diagnóstico diferencial para a infecção por EBV é o linfoma, que
inclusive pode ser uma consequência da infecção por EBV.
➽ Dengue, Chikungunya e Zika
Formam exantema maculopapular inespecífico. São quadros clínicos muito parecidos
entre si, com diferenças muito sutis. O zika é a afecção mais associada ao surgimento de
exantemas e hiperemia conjuntival, por exemplo. Outradiferença é que a dengue cursa
com plaquetopenia, e por isso seu exantema pode não se mostrar eritematoso como nas
outras doenças, e sim purpúrico. Além disso, a chikungunya pode causar hipermelanose
facial persistente. Algumas delas podem ser vistas na tabela abaixo.
➽ Covid-19
O SARS-Cov-2 pode causar exantema
maculopapular antes, durante ou após os sintomas
da infecção por coronavírus. Pacientes também
podem abrir quadro de erupção urticariforme
durante ou após a infecção. Outros tipos de lesões
associadas são as erupções vesico-bolhosas e
variceliformes.

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