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Química Farmacêutica

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DOCÊNCIA EM 
SAÚDE 
 
 
 
 
 
 
 
QUÍMICA FARMACÊUTICA 
 
 
 
1 
Copyright © Portal Educação 
2013 – Portal Educação 
Todos os direitos reservados 
 
R: Sete de Setembro, 1686 – Centro – CEP: 79002-130 
Telematrículas e Teleatendimento: 0800 707 4520 
Internacional: +55 (67) 3303-4520 
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 Dados Internacionais de Catalogação na Publicação - Brasil 
 Triagem Organização LTDA ME 
 Bibliotecário responsável: Rodrigo Pereira CRB 1/2167 
 Portal Educação 
P842q Química farmacêutica / Portal Educação. - Campo Grande: Portal 
Educação, 2013. 
 138p. : il. 
 
 Inclui bibliografia 
 ISBN 978-85-8241-947-2 
 1. Química farmacêutica. I. Portal Educação. II. Título. 
 CDD 615.19 
 
 
2 
SUMÁRIO 
 
 
1 INTRODUÇÃO À QUÍMICA FARMACÊUTICA .......................................................................... 5 
1.1 HISTÓRIA DA QUÍMICA FARMACÊUTICA ............................................................................... 5 
1.2 NOÇÕES BÁSICAS.................................................................................................................... 7 
1.3 CLASSIFICAÇÃO DOS FÁRMACOS ......................................................................................... 8 
1.3.1 Estrutura química ....................................................................................................................... 8 
1.3.2 Ação farmacológica .................................................................................................................... 9 
1.3.3 Classificação fisiológica .............................................................................................................. 9 
1.3.4 Pró-fármacos ............................................................................................................................. 10 
1.3.5 Tipo de ação dos fármacos e parâmetros físico-químicos ......................................................... 11 
2 INTERAÇÃO FÁRMACO-RECEPTOR ..................................................................................... 13 
3 MODELO CHAVE-FECHADURA .............................................................................................. 14 
4 MODELO DE ENCAIXE INDUZIDO .......................................................................................... 17 
5 TIPOS DE INTERAÇÕES INTERMOLECULARES .................................................................. 22 
5.1 FORÇAS ELETROSTÁTICAS ................................................................................................... 23 
5.2 FORÇAS DE DISPERSÃO ........................................................................................................ 26 
6 INTERAÇÕES HIDROFÓBICAS ............................................................................................... 28 
7 LIGAÇÃO DE HIDROGÊNIO .................................................................................................... 29 
8 LIGAÇÃO COVALENTE ........................................................................................................... 32 
9 GRUPO FARMACOFÓRICO .................................................................................................... 33 
 
 
3 
10 RECEPTORES E INTERAÇÃO FÁRMACO-RECEPTOR ........................................................ 35 
10.1 RECONHECIMENTO MOLECULAR DO RECEPTOR .............................................................. 41 
10.2 CARBONO ASSIMÉTRICO E QUIRALIDADE .......................................................................... 42 
10.3 COMPLEMENTARIDADE DOS ENANTIÔMEROS ................................................................... 47 
11 MISTURA RACÊMICA E COMPLEMENTARIDADE ................................................................ 49 
12 ISOMERIA GEOMÉTRICA E RECONHECIMENTO MOLECULAR ......................................... 52 
13 ATROPOISOMERISMO ............................................................................................................ 58 
14 FÁRMACOS ESTRUTURALMENTE INESPECÍFICOS ............................................................ 62 
15 PROPRIEDADES FÍSICO-QUÍMICAS E ATIVIDADE BIOLÓGICA ......................................... 63 
16 COEFICIENTE DE PARTIÇÃO E EQUAÇÃO DE HANSCH .................................................... 64 
17 COEFICIENTE DE IONIZAÇÃO E CÁLCULO DO COEFICIENTE DE IONIZAÇÃO (PKA) ..... 70 
18 COEFICIENTE DE PARTIÇÃO VS COEFICIENTE DE IONIZAÇÃO ....................................... 74 
19 METABOLISMO DE FÁRMACOS ............................................................................................ 76 
19.1 REAÇÕES MEDIADAS PELA FAMÍLIA P-450 .......................................................................... 80 
19.2 REAÇÕES DE FASE I ............................................................................................................... 83 
19.3 REAÇÕES DE FASE II .............................................................................................................. 87 
19.4 GRUPO AUXOFÓRICO E GRUPO TOXICOFÓRICO .............................................................. 91 
19.5 METABOLISMO E TOXICIDADE .............................................................................................. 93 
20 EFEITOS FARMACOLÓGICOS DE GRUPOS ESPECÍFICOS ................................................ 97 
21 MECANISMO DE AÇÃO DE FÁRMACOS .............................................................................. 107 
21.1 FÁRMACOS QUE INTERAGEM COM ENZIMAS .................................................................... 107 
21.2 FÁRMACOS QUE INTERAGEM COM PROTEÍNAS CARREGADORAS ................................ 108 
 
 
4 
21.3 FÁRMACOS QUE INTERFEREM COM OS ÁCIDOS NUCLEICOS ........................................ 108 
21.4 FÁRMACOS QUE INTERAGEM COM RECEPTORES ........................................................... 109 
22 MODIFICAÇÃO MOLECULAR ................................................................................................ 110 
23 LATENCIAÇÃO DE FÁRMACOS ............................................................................................ 117 
23.1 CLÁSSICOS ............................................................................................................................. 121 
23.2 BIOPRECURSORES ................................................................................................................ 122 
23.3 MISTOS .................................................................................................................................... 122 
23.4 FÁRMACOS DIRIGIDOS .......................................................................................................... 123 
24 HIBRIDIZAÇÃO MOLECULAR ................................................................................................ 125 
24.1 OBTENÇÃO DE COMPOSTO COM ÚNICA ATIVIDADE A PARTIR DE HIBRIDAÇÃO 
MOLECULAR...................................................................................................................................... 125 
24.2 OBTENÇÃO DE COMPOSTO COM ATIVIDADE DUAL A PARTIR DE HIBRIDAÇÃO 
MOLECULAR...................................................................................................................................... 126 
25 DESENVOLVIMENTO DE NOVOS FÁRMACOS E MODELAGEM MOLECULAR................. 129 
26 INOVAÇÃO DE FÁRMACOS NO BRASIL .............................................................................. 133 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..................................................................................................135 
 
 
 
 
 
5 
1 INTRODUÇÃO À QUÍMICA FARMACÊUTICA 
 
 
A Química Farmacêutica, segundo a International Union of Pure and Applied Chemistry 
(IUPAC) – em português, União Internacional da Química Pura e Aplicada –, é uma ciência 
baseada na química, envolvendo aspectos das Ciências Biológicas, Médica e Farmacêutica, 
cujas missões são: planejamento, descoberta, invenção, identificação e preparação de 
compostos biologicamente ativos (protótipos); o estudo do metabolismo; a interpretação do 
mecanismo de ação em nível molecular; e a construção das relações entre a estrutura química e 
a atividade farmacológica. 
Essas missões complexas envolvem uma multiplicidade de fatores responsáveis pela 
resposta terapêutica de uma substância exógena (p. ex., fármaco) que precisa apresentar 
elevada eficácia, reflexo das propriedades farmacodinâmicas (aquelas que regem as interações 
responsáveis pelo reconhecimento molecular do fármaco pelo biorreceptor e resultam na 
resposta terapêutica desejada) e as farmacocinéticas (aquelas que governam os fatores de 
absorção, distribuição, metabolismo e eliminação do fármaco na biofase, resultando no perfil de 
biodisponibilidade, além de possuir reduzida toxidez). 
 
 
1.1 HISTÓRIA DA QUÍMICA FARMACÊUTICA 
 
 
Povos antigos já possuíam uma ampla coleção de produtos naturais, de diversas 
fontes (vegetais, animais e minerais), usados com objetivos medicinais. Entretanto, muitos 
desses produtos apresentavam alto grau de toxicidade e esse conhecimento não era muito 
difundido, ficando retido a algumas aldeias ou a pequena parte da população de um lugarejo. 
Apenas com o advento da imprensa, no século XV, houve ampla circulação das informações 
 
 
6 
sobre os produtos naturais de uso medicinal, a partir de publicação de herbários e farmacopeias. 
A maior divulgação de informações sobre as drogas resultou em um rápido aumento do uso e do 
abuso desses produtos. O uso de tais drogas alcançou seu pico no século XVII e com isso 
também houve aumento da taxa de toxicidade desses produtos na população. Com o 
aperfeiçoamento da comunicação entre médicos e estudiosos nos séculos XVIII e XIX, houve 
uma remoção progressiva das preparações que eram ineficazes ou com alto grau de toxicidade 
dos herbários e das farmacopeias, o que impulsionou o uso racional dos produtos naturais de 
uso medicinal. 
Durante o século XIX, presenciou-se o isolamento de substâncias puras de plantas, o 
que contribuiu para o conhecimento mais aprofundado dos princípios ativos. Já no final do 
mesmo século, a busca por medicamentos menos tóxicos resultou na introdução de substâncias 
sintéticas com função terapêutica e seu uso foi amplamente disseminado no século XX. 
Inicialmente, o desenvolvimento dessas substâncias sintéticas estava relacionado aos produtos 
naturais, mas à medida que o conhecimento aumentou, uma ampla faixa de novos compostos 
sintéticos foi desenvolvida. Esse conhecimento que resultou na síntese dos mais diferentes 
fármacos deve-se ao desenvolvimento de ciências como química orgânica, bioquímica, físico-
química, química computacional, biofísica, biologia molecular, genômica e proteômica. 
Durante muitos anos a descoberta de fármacos foi baseada em grande parte por sorte, 
porém isso vem mudando. Antes o desenvolvimento de novos fármacos se devia a pesquisa de 
poucos indivíduos, mas hoje essa tarefa requer o trabalho de uma grande equipe composta de 
especialistas de diversas áreas de conhecimento como medicina, farmácia, farmacologia, 
microbiologia, fisiologia, patologia, toxicologia, química orgânica e química farmacêutica. 
Nos dias atuais, diversas estratégias modernas estão disponíveis para o desenho 
molecular de novos fármacos. Entre essas técnicas podemos ressaltar a abordagem fisiológica, 
que se baseia no mecanismo de ação farmacológico pretendido, o que depende da eleição de 
um alvo terapêutico. Essa abordagem de desenho ou planejamento molecular de novas 
moléculas candidatas a novos fármacos, baseada no mecanismo de ação, fundamenta-se no 
prévio conhecimento do processo fisiopatológico envolvido e na escolha correta do melhor alvo 
terapêutico (p. ex., receptor), que pode ter a estrutura conhecida ou não. 
 
 
 
7 
1.2 NOÇÕES BÁSICAS 
 
 
Para iniciarmos nosso estudo sobre a química farmacêutica vamos conceituar alguns 
termos necessários para o melhor entendimento dessa ciência: 
 droga – qualquer substância que interaja com o organismo produzindo algum 
efeito; 
 fármaco – uma substância definida, com propriedades ativas, produzindo efeito 
terapêutico; 
 medicamento – é uma droga utilizada com fins terapêuticos ou de diagnóstico. 
Muitas substâncias podem ser consideradas medicamentos ou não, depende da 
finalidade com que foram usadas; 
 remédio (re = novamente; medior = curar) – substância animal, vegetal, mineral 
ou sintética; procedimento (ginástica, massagem, acupuntura, banhos); fé ou crença; 
influência: usados com intenção benéfica; 
 protótipo – composto farmacologicamente ativo original, a partir do qual análogos 
são desenvolvidos; 
 screening farmacológico – seleção de fármacos mais ativos e seguros; 
 biofase ou biomacromolécula – alvo molecular das micromoléculas (p. ex., 
fármacos); 
 modelagem molecular – todo tipo de estudo que envolve a aplicação de modelos 
teóricos utilizando os conceitos de átomo e molécula na descrição de estrutura e 
propriedades de interesse em química. 
 
 
 
 
 
 
8 
1.3 CLASSIFICAÇÃO DOS FÁRMACOS 
 
 
Os fármacos podem ser classificados de diversas formas: de acordo com a estrutura 
química, de acordo com a ação farmacológica, de acordo com a ação sobre os sistemas 
fisiológicos e como fármacos ou pró-fármacos, entre outros. 
 
 
1.3.1 Estrutura química 
 
 
Os fármacos são agrupados em função da estrutura de seus esqueletos de carbono, 
ou das suas classificações químicas (p. ex., esteroides, penicilinas e peptídeos). Mas na química 
farmacêutica essa classificação apresenta desvantagens, pois frequentemente os membros de 
um mesmo grupo exibem tipos diferentes de atividade farmacológica. Por exemplo, os esteroides 
possuem atividades que são muito diferentes: a testosterona é um hormônio sexual, a 
espironolactona é um diurético e o ácido fusídico é um agente bactericida. 
 
 
FIGURA 1 - ESTRUTURA QUÍMICA DOS ESTEROIDES 
COM ATIVIDADES BIOLÓGICAS DISTINTAS 
 
FONTE: Thomas, 2003. 
 
 
9 
1.3.2 Ação farmacológica 
 
 
Os fármacos podem ser classificados de acordo com a natureza de seu 
comportamento farmacodinâmico, por exemplo: diuréticos, hipnóticos, anestésicos, 
vasodilatadores. Essa classificação é particularmente útil para os médicos e para fins didáticos 
nas universidades. 
 
 
1.3.3 Classificação fisiológica 
 
 
Há uma classificação baseada no sistema corporal sobre o qual os fármacos agem, 
elaborada pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Essa classificação especifica 17 sítios de 
ação dos fármacos. Entretanto, existe um sistema mais prático e menos detalhado que é 
frequentemente utilizado pelos químicos farmacêuticos. Ele é baseado em quatro classificações: 
 agentes que atuam no sistema nervoso central (SNC) – são os fármacos 
psicotrópicos, que afetam o humor, e os fármacos neurológicos, que são necessários 
nos distúrbios fisiológicos nervosos, como epilepsia e a dor; 
 agentes farmacodinâmicos – fármacos que agem funções corporais normais (p. ex. 
vasodilatadores); 
 agentes quimioterápicos – fármacos antibióticos, antifúngicos e antineoplásicos; 
 agentes mistos – fármacos que não se encaixam nas outras classificações (p. ex., 
hormônios). 
 
 
 
 
10 
1.3.4 Pró-Fármacos 
 
 
São compostos farmacologicamente inertes, mas que são convertidos na forma ativa no 
organismo, por ação enzimática ou química. Exemplo: a levodopa, utilizada para o tratamento da 
síndrome de Parkinson, é um pró-fármaco do neurotransmissordopamina. Como a dopamina é 
muito polar (hidrofílica) para atravessar a barreira hematoencefálica (BHE), mas como nessa 
barreira existe um sistema transportador de aminoácidos, esse transporta a levodopa. Quando a 
levodopa consegue entrar no cérebro, ele é descarboxilado, formando a dopamina, fármacos ativo 
(figura a seguir). 
 
 
FIGURA 2 - FORMAÇÃO DA DOPAMINA A PARTIR DA LEVODOPA, 
APÓS SUA PASSAGEM PELA BHE 
 
FONTE: Thomas, 2003. 
 
 
 
 
 
 
 
 
11 
1.3.5 Tipo de ação dos fármacos e parâmetros físico-químicos 
 
 
Outra forma de classificação dos fármacos utilizada por químicos farmacêuticos, para 
melhor compreensão dos modos de interação entre o fármaco e a biofase necessários para 
gerar uma resposta biológica, é relacionada ao seu tipo de ação – que pode ser estruturalmente 
inespecífica ou estruturalmente específica. 
 Fármacos estruturalmente inespecíficos 
São os que dependem exclusivamente de suas propriedades físico-químicas como o 
coeficiente de partição e o pKa para promover o efeito farmacológico observado. Os exemplos 
clássicos desses fármacos estruturalmente inespecíficos são os anestésicos gerais, que agem 
sobre o SNC bloqueando a condução de impulsos nos nervos sensitivos periféricos – e essa 
ação farmacológica está diretamente relacionada ao seu coeficiente de partição óleo:gás (como 
mostra a figura a seguir). 
 
 
FIGURA 3 - CORRELAÇÃO ENTRE AS PROPRIEDADES FÍSICO-QUÍMICAS E A ATIVIDADE 
BIOLÓGICA DOS FÁRMACOS ESTRUTURALMENTE INESPECÍFICOS 
 
O halotano (a) é mais potente que o isoflurano (b) por apresentar um coeficiente de partição maior. 
FONTE: Fraga, 2001. 
 
 
 
 
12 
As principais propriedades físico-químicas de uma micromolécula capazes de alterar 
seu perfil farmacoterapêutico são o coeficiente de partição, que expressa a lipofilicidade relativa 
da molécula (Log P), e o coeficiente de ionização (pKa), que expressa o grau de contribuição 
relativa das espécies neutras e ionizadas. 
Como a maioria dos fármacos é absorvida passivamente pela membrana plasmática, 
destaca-se a importância das propriedades físico-químicas (Log P e pKa) para que o fármaco 
atinja concentrações plasmáticas capazes de gerar o efeito biológico. Essas propriedades físico-
químicas serão discutidas mais profundamente em tópicos situados mais adiante neste curso. 
 Fármacos estruturalmente específicos 
São fármacos que exercem seu efeito biológico pela interação seletiva com uma 
determinada biomacromolécula (receptores metabotrópicos, receptores ionotrópicos, enzimas e 
ácidos nucleicos). O reconhecimento molecular do fármaco pela biomacromolécula depende do 
arranjo espacial dos grupamentos funcionais e das propriedades estruturais da molécula do 
fármaco, que devem ser complementares ao sítio de ligação da biomacromolécula, conhecido 
como sítio receptor. 
 
 
 
 
 
13 
2 INTERAÇÃO FÁRMACO-RECEPTOR 
 
 
A interação entre uma micromolécula com seu sítio de ação no sistema biológico 
(receptor) ocorre durante a fase farmacodinâmica e é determinada por forças intermoleculares, 
como interações hidrofóbicas, eletrostáticas, covalentes e estéricas. 
A partir dessas interações intermoleculares entre fármaco e receptor pode ocorrer tanto 
uma resposta biológica positiva como negativa. Por exemplo, respostas positivas podem produzir 
uma resposta fisiológica imediata, como a abertura de um canal iônico, ou levar a uma série de 
eventos bioquímicos que podem resultar na liberação dos chamados segundos mensageiros, 
tais como o monofosfato cíclico de adenosina (cAMP). Esses segundos mensageiros promovem 
uma sequência de eventos bioquímicos que resultam em uma determinada resposta fisiológica. 
Alternativamente, a ligação de uma micromolécula ao receptor pode impedir uma resposta 
fisiológica ao dar início à inibição de uma série de eventos biológicos associados, ou 
simplesmente impedir que o ligante endógeno normal ligue-se ao receptor. Por exemplo, os β-
bloqueadores (como o propranolol) agem bloqueando os β-receptores, impedindo a ação da 
adrenalina (ligante endógeno). Em todos os casos, o mecanismo pelo qual qualquer mensagem 
conduzida pela micromolécula é traduzida pelo sistema do receptor em uma resposta tecidual é 
conhecido como transdução do sinal. 
A ligação de um fármaco a um receptor pode inibir a ação do receptor, ou estimular o 
receptor produzindo as respostas fisiológicas que são características da ação do fármaco. Os 
fármacos que se ligam a um receptor e produzem respostas semelhantes àquelas do ligante 
endógeno são chamados de agonistas, ao passo que os fármacos que se ligam a um receptor, 
mas não causam uma resposta, são denominados antagonistas. No entanto, os fármacos não 
são os únicos xenobióticos1 que podem ligar-se a um receptor; os vírus, as bactérias e as 
toxinas podem ligar-se aos sítios receptores de tecidos específicos, o que pode causar a 
ocorrência de efeitos farmacológicos indesejáveis. 
 
1 Xenobióticos (do grego xenos = estranho): compostos químicos estranhos ao organismo (p. ex., fármacos). 
 
 
14 
3 MODELO CHAVE-FECHADURA 
 
 
A complementaridade molecular indispensável para a interação do fármaco 
(micromolécula) com seu receptor pode ser ilustrada pelo modelo chave-fechadura, de maneira 
simplificada. Nesse modelo, proposto pelo químico Emil Fischer para explicar as especificidades 
entre enzima e substrato, é possível comparar a biomacromolécula como a fechadura, o sítio 
receptor com o “buraco da fechadura” e as diversas chaves como ligantes do sítio receptor. 
Nesse caso, o ato de “abrir a porta” ou o “não abrir a porta” representariam as respostas 
biológicas dessa interação, isto é, gerar resposta biológica ou não gerar. Podemos evidenciar 
três principais tipos de chaves (mostradas na Figura 4): 
 chave original ou perfeita – que se encaixa de maneira perfeita à fechadura, 
permitindo a abertura da porta. Corresponderia ao agonista natural (endógeno), que 
interage com o sítio receptor da biomacromolécula, desencadeando uma resposta 
biológica; 
 chave modificada – com propriedades estruturais semelhantes à chave perfeita 
que permitem seu acesso à fechadura e a abertura da porta. Corresponderia a um 
agonista modificado da biomacromolécula, sintético ou de origem natural, capaz de 
reconhecer o sítio receptor e desencadear uma resposta biológica qualitativamente 
idêntica àquela do agonista natural; 
 chave falsa – que apresenta propriedades estruturais mínimas que permitem seu 
acesso à fechadura, sem ser capaz, entretanto, de permitir a abertura da porta. 
Corresponderia ao antagonista, sintético ou de origem natural, capaz de ligar-se ao 
sítio receptor, porém, sem promover uma resposta biológica e bloqueando a ação do 
agonista endógeno e/ou modificado (chave original ou modificada), ocasionando uma 
resposta qualitativamente inversa àquela do agonista. 
 
 
 
 
 
15 
FIGURA 4 - MODELO CHAVE-FECHADURA DE EMIL FISCHER 
 
FONTE: Fraga, 2001. 
 
 
A partir dos três casos (chave original, chave modificada e chave falsa) podemos 
distinguir duas etapas relevantes na interação da micromolécula com a biomacromolécula que 
contém a subunidade receptora: 
 interação micromolécula-receptor – expressa pelo termo afinidade, que é a 
capacidade da micromolécula de se ligar ao sítio complementar de interação; 
 geração da resposta biológica – expressa pelo termo atividade intrínseca, que é 
a capacidade do sistema ligante-receptor, uma vez ligado, desencadear uma 
determinada resposta biológica. 
A Tabela 1 apresenta um exemplo para que possamos entender melhor esses dois 
termos (afinidade e atividade intrínseca). Temos três substâncias hipotéticas A, B e C, 
análogas do agonista AGO que atuam como ligantes de receptores X, em que o fármaco A 
atua com propriedades agonistas. Vale destacar que as substâncias A, B e C são ligantescom 
afinidades distintas, uma vez que são reconhecidas diferenciadamente pelos sítios localizados 
no receptor – o que podemos observar pelos resultados do ensaio de binding (Tabela 1). 
Nesse caso, o composto C é aquele que apresenta maior afinidade pelo receptor X, seguido 
 
 
16 
do derivado B e, por fim, o derivado A. O que é de extrema importância observar é que uma 
maior afinidade não traduz a capacidade de o ligante produzir uma determinada resposta 
biológica – como podemos evidenciar pela análise comparativa dos derivados B e A, em que B 
apesar de apresentar uma afinidade dez vezes maior que o análogo A, apresenta atividade 
intrínseca nula, isto é, não gerando resposta biológica (antagonista), diferentemente da 
substância A, que é agonista. Podemos concluir que o derivado A é, apesar de apresentar 
uma menor afinidade por esse receptor, um melhor candidato a fármaco que o derivado B. 
Porém, analisando os três análogos testados, o melhor candidato a fármaco é o derivado C, 
que além de apresentar maior afinidade (0,05 nM), apresenta atividade intrínseca igual a 1,0, 
isto é, age como agonista total do receptor X. 
 
 
TABELA 1 - AFINIDADE X ATIVIDADE INTRÍNSECA 
SUBSTÂNCIA AFINIDADE 
Ensaio de binding, IC50 (nM) 
ATIVIDADE INTRÍNSECA 
A 87,0 Agonista (α = 0,7) 
B 8,7 Antagonista (α = 0) 
C 0,05 Agonista (α = 1,0) 
IC50 = concentração de substância necessária para produzir interação com 50% dos receptores. 
Atividade intrínseca (α) – α=1,0 (agonista total = produz efeito máximo), α <1,0 e >zero (agonista parcial = não 
produz efeito máximo), α=zero (antagonista= não produz efeito). 
FONTE: Adaptado de Fraga, 2001. 
 
 
 
 
 
17 
4 MODELO DE ENCAIXE INDUZIDO 
 
 
A ideia tradicional de uma complementaridade rígida entre a “chave” e a “fechadura” 
(entre a micromolécula e o sítio receptor) ganhou força por meio dos estudos sobre complexos 
de enzimas proteolíticas com pequenos inibidores e pelo primeiro exemplo de complexo, 
cristalográfico proteína anticorpo. Contudo, essa ideia induz o estudante a imaginar tanto o 
ligante (chave) quanto o receptor (fechadura) como estruturas rígidas, o que não representa a 
realidade. 
A existência de uma flexibilidade, um dos fatores que permite que moléculas 
estruturalmente semelhantes apresentem “comportamentos diversos”, ou seja, conformações e 
orientações relativas distintas, no sítio de ligação do receptor e, consequentemente, afinidades e 
atividades intrínsecas diferentes. Podemos observar na Figura 5 um exemplo dessa ideia, onde 
os compostos 1 e 2 (Figura 5a) derivados do núcleo pirazolo[4,3-d]piridina, inibidores da enzima 
acetilcolinesterase (AChE) e planejados como análogos da tacrina (3)2. Estudos sobre dinâmica 
molecular indicaram que a orientação adotada por 1, 2 e 3 no sítio ativo da AChE são diferentes, 
mesmo sendo os três compostos estruturalmente similares (Figura 5b). 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
2 Tacrina: primeiro composto aprovado para o tratamento do mal de Alzheimer. 
 
 
18 
FIGURA 5 
 
a) Estrutura dos compostos 1, 2 e 3; b) visão frontal dos compostos 1 (amarelo), 2 (vermelho) e 3 (rosa) orientados 
no sítio ativo da AchE (omitida para fins de clareza). 
FONTE: Verli e Barreiro, 2005. 
 
 
A teoria do encaixe induzido, desenvolvida por Koshland e colaboradores, baseada em 
sistemas enzimáticos, sugere que, por meio da ligação, o substrato induz uma mudança 
conformacional na subunidade da enzima com a qual interage. Essa mudança pode ser 
transmitida às subunidades adjacentes, induzindo na enzima a conformação responsável pelo 
processo catalítico. Dessa mesma maneira ocorre a interação de inibidores com enzimas ou 
agonistas e/ou antagonistas com receptores. No caso dos ligantes serem agonistas, ao invés da 
mudança conformacional no receptor influenciar na catálise poderá, por exemplo, modificar a 
condutância de um canal iônico (p. ex., benzodiazepínicos frente ao receptor GABA). 
Portanto, a teoria do encaixe induzido considera a capacidade do ligante de induzir 
uma modificação na estrutura tridimensional do receptor, ao mesmo tempo em que esse tem a 
propriedade de reconhecer uma ou um conjunto de conformações do(s) ligante(s) (diversos 
análogos). 
 
 
19 
O ligante ao gerar uma mudança conformacional de seu receptor pode estar induzindo-o 
a adotar a conformação responsável por seu reconhecimento (Figura 6). As alterações 
conformacionais observadas como consequência da interação de um fármaco com seu receptor 
são de diferentes graus de amplitude e complexidade. Podem envolver uma reorientação da 
cadeia lateral de um resíduo de aminoácido de forma a maximizar interações com o ligante e, 
portanto, estabilizar o complexo. 
 
 
FIGURA 6 
 
Esquema do processo de indução e seleção de conformações por ligante e receptor, modificando-se mutuamente 
no processo de interação do qual poderá resultar uma resposta de interesse terapêutico. 
FONTE: Adaptado de Verli e Barreiro, 2005. 
 
 
 
 
20 
As proteínas podem assumir um grande número de conformações praticamente 
isoenergéticas e são capazes de sofrer mudanças conformacionais induzidas pela ligação a 
substratos ou inibidores. As biomacromoléculas apresentam um número diversificado de 
conformações ativas, algumas mais estáveis que outras, de modo que agonistas diferentes 
estabilizam populações diferentes de receptores. Desse modo, um agonista pode produzir um 
espectro de conformações ativas, enquanto que outro agonista pode estabilizar outro conjunto 
de conformações do biorreceptor; esse processo é conhecido como seleção conformacional. 
Adicionalmente, existe também o conceito de indução conformacional: quando um agonista 
induz uma conformação de seu receptor nunca apresentada na sua ausência. 
Para exemplificar essa ideia, podemos observar a Figura 7, que mostra a antitrombina 
(AT) – uma proteína plasmática relacionada com a inibição da cascata de coagulação, que 
quando encontrada livremente (Figura 7b) é inativa como inibidora, mas, ao se ligar à heparina 
ou a um pentassacarídeo sintético (Figura 7a) apresenta mudanças conformacionais bastante 
expressivas que a tornam uma inibidora do fator Xa da coagulação, 300 vezes mais eficiente 
(Figura 7c). Dentre as mudanças existentes nessa complexação, podemos observar: 
1) movimentos de cadeias por até 17 Å (formação de α-hélice, marcada por um 
círculo verde na Figura 6); 
2) movimentos de 30 Å do sítio de ligação (mudanças conformacionais de folhas-β e 
alças, marcadas por um círculo vermelho na Figura 6), sugerindo a existência de uma 
alteração alostérica. 
Esta figura exemplifica como a biomacromolécula sofre modificações em sua estrutura 
para o melhor encaixe de seu ligante. Este exemplo mostra que apesar do modelo chave-
fechadura ter sido bastante útil para o entendimento inicial da formação do complexo fármaco-
biomacromolécula e atualmente é de extrema valia para a compreensão inicial do processo por 
estudantes de diversas áreas, é o modelo de encaixe induzido o que mais se aproxima da 
realidade e atualmente é o mais aceito entre os químicos farmacêuticos. 
 
 
 
 
 
21 
FIGURA 7 
 
a) Estrutura do composto 6; b) forma livre da AT c) forma da AT ligada a 6, apresentando formação de α-hélice 
(círculo verde) e mudanças conformacionais de folhas-β e alças (círculo vermelho). 
FONTE: Verli e Barreiro, 2005. 
 
 
 
 
 
 
22 
5 TIPOS DE INTERAÇÕES INTERMOLECULARES 
 
 
O grau de afinidade e a especificidade da ligação micromolécula-sítio receptor são 
determinados por forças intermoleculares: 
 eletrostáticas; 
 de dispersão; 
 hidrofóbicas; 
 ligações de hidrogênio; 
 ligações covalentes. 
Em uma interação fármaco-receptor típica, normalmente ocorre uma combinação 
dessas forças e os somatórios delas são responsáveis por gerar uma resposta fisiológica 
específica. As interaçõesocorrem entre o fármaco e a biomacromolécula, como as 
biomacromoléculas são em sua maioria receptoras iônicas, metabotrópicos ou enzimas, isto é, 
estruturas proteicas, os fármacos (micromoléculas) interagem com aminoácidos (unidades 
básicas das proteínas) presentes nos sítios receptores dessas biomacromoléculas (Figura 8). 
Por serem, portanto, de grande importância, vamos discuti-las a seguir. 
 
 
FIGURA 8 - ESQUEMA DA INTERAÇÃO FÁRMACO-SÍTIO RECEPTOR 
 
FONTE: Disponível em: <home.mira.net/~reynella/debate/spetner.htm>. Acesso em: 2 fev. 2012. 
aa 
aa 
aa 
aa 
aa 
aa 
aa 
 
 
23 
5.1 FORÇAS ELETROSTÁTICAS 
 
 
As forças eletrostáticas são resultantes da interação entre dipolos e/ou íons de cargas 
opostas, cuja magnitude é diretamente dependente da constante dielétrica do meio e da 
distância entre as cargas. A molécula de água apresenta elevada constante dielétrica, pois 
apresenta momento de dipolo permanente; e esse fato pode reduzir as forças de atração e 
repulsão entre dois grupos carregados e solvatados. 
Normalmente, a interação iônica é precedida de dessolvatação dos íons, processo que 
envolve perdas entálpicas, mas sendo favorecido pelo ganho entrópico resultante da geração de 
água livre (Figura 9). A força da ligação iônica é baixa, de aproximadamente 5 kcal.mol-1 (Figura 9). 
 
 
FIGURA 9 - DESSOLVATAÇÃO SEGUIDA DE INTERAÇÃO IÔNICA 
 
FONTE: Fraga, 2001. 
 
 
Alguns aminoácidos apresentam um terceiro grupo ionizável, além da carboxila e da 
amina. Esse grupo encontra-se ionizado em pH fisiológico (7,4) tornando o aminoácido básico 
– p. ex., arginina e lisina (com carga positiva) ou ácido, como glutamato e aspartato (com 
carga negativa). Fármacos que apresentem grupos ionizados (positiva ou negativamente) 
 
 
24 
podem interagir com aminoácidos presentes em proteínas de sítios receptores, que 
apresentam esse terceiro grupo ionizável. 
Para exemplificar como pode ocorrer uma ligação iônica na interação fármaco-
receptor, temos o flurbiprofeno, anti-inflamatório não esteroidal que atua inibindo a enzima 
prostaglandina endoperóxido sintase (PGHS)3, que provoca sua ação por ligações com resíduos 
de aminoácidos da enzima, como interação do grupamento carboxilato da forma ionizada com o 
resíduo de arginina na posição 120 da sequência primária dessa proteína (Figura 10). 
 
 
FIGURA 10 - RECONHECIMENTO MOLECULAR DO FLURBIPROFENO PELO RESÍDUO 
ARG120 DO SÍTIO ATIVO DA PGHS VIA INTERAÇÃO IÔNICA 
 
FONTE: Fraga, 2001. 
 
 
 
3 PGHS: prostaglandina endoperóxido sintase, conhecida popularmente como ciclo-oxigenase (COX). 
 
 
25 
As forças de atração eletrostáticas ainda podem incluir dois tipos de interações, que 
variam energeticamente entre 1 e 7 kcal.mol-1: 
 interações íon-dipolo – interação de um íon e uma espécie neutra polarizada 
com carga oposta àquela do íon; 
 interações dipolo-dipolo – interação entre dois grupamentos polarizados com 
cargas opostas (Figura 11). 
 
 
FIGURA 11 - INTERAÇÕES ÍON-DIPOLO E DIPOLO-DIPOLO 
E O RECONHECIMENTO FÁRMACO-RECEPTOR 
 
FONTE: Fraga, 2001. 
 
 
Essa polarização observada e de ocorrência natural é causada pela diferença de 
eletronegatividade entre um heteroátomo (p. ex., oxigênio ou nitrogênio) e um átomo de carbono, 
produzindo espécies que apresentam um aumento da densidade eletrônica do heteroátomo e 
uma redução da densidade eletrônica sobre o átomo de carbono. A ocorrência desse fato está, 
como ilustrada na Figura 12, para o grupamento carbonila, em que a interação do substrato 
natural endoperóxido cíclico de prostaglandina H2 com a enzima tromboxana sintase (TXS) (que 
contém ferro presente no grupo heme), envolve a formação de uma interação íon-dipolo entre o 
átomo de ferro do grupamento heme (íon) e o átomo de oxigênio (dipolo), que apresenta carga 
parcial negativa. 
 
 
26 
FIGURA 12 - RECONHECIMENTO MOLECULAR DA PGE2 PELO RESÍDUO FE-HEME DO 
SÍTIO ATIVO DA TROMBOXANA SINTASE, VIA INTERAÇÃO ÍON-DIPOLO 
 
FONTE: Fraga, 2001. 
 
 
5.2 FORÇAS DE DISPERSÃO 
 
 
Essas forças são conhecidas como forças de dispersão de London ou interações de 
van der Walls e caracterizam-se pela aproximação de moléculas apolares apresentando dipolos 
induzidos. Esses dipolos são resultado de uma flutuação local de densidade eletrônica entre 
grupos apolares adjacentes, que não apresentam momento de dipolo permanente. Essas 
interações são de fraca energia, variando de 0,5 a 1,0 kcal.mol-1 e ocorrem em função da 
polarização transiente de ligações carbono-hidrogênio (Figura 13) ou carbono-carbono. 
Apesar de serem interações de baixa energia, as forças de dispersão são de extrema 
importância para o processo de reconhecimento molecular do fármaco pelo sítio receptor, uma 
vez que normalmente ocorrem inúmeras interações desse tipo que, somadas, acarretam 
contribuições energéticas significativas. 
 
 
27 
FIGURA 13 - INTERAÇÕES DIPOLO-DIPOLO PELA POLARIZAÇÃO 
TRANSIENTE DE LIGAÇÕES CARBONO-HIDROGÊNIO 
 
FONTE: Barreiro e Fraga, 2008. 
 
 
 
 
 
28 
6 INTERAÇÕES HIDROFÓBICAS 
 
 
As interações hidrofóbicas são interações fracas, de aproximadamente 1 kcal.mol-1 e 
ocorrem em função da interação em cadeias ou subunidades apolares. Essas cadeias ou 
subunidades hidrofóbicas presentes tanto no receptor como no ligante encontram-se solvatadas 
por camadas de moléculas de água. A aproximação das superfícies hidrofóbicas promove o 
colapso da estrutura organizada de água, permitindo assim a interação ligante receptor por meio 
de ganho entrópico, associado à desorganização do sistema. 
Como há a ocorrência de um grande número de subunidades hidrofóbicas em 
peptídeos e fármacos, as interações hidrofóbicas são importantes para o reconhecimento do 
ligante pelo receptor. Podemos observar a ocorrência desse tipo de interação no sistema 
biológico a partir do exemplo contido na Figura 14, que mostra a interação do fator de ativação 
plaquetária (PAF) com o seu biorreceptor, pelo reconhecimento da cadeia alquílica C-16 por uma 
“bolsa” lipofílica presente na estrutura da proteína receptora e quando inativa se apresenta 
preenchida por moléculas de água. 
 
 
FIGURA 14 - RECONHECIMENTO MOLECULAR DO PAF VIA INTERAÇÕES HIDROFÓBICAS 
COM A BOLSA LIPOFÍLICA DE SEU BIORRECEPTOR 
 
FONTE: Fraga, 2001. 
 
 
29 
7 LIGAÇÃO DE HIDROGÊNIO 
 
 
As ligações de hidrogênio são as mais importantes, depois das ligações do tipo 
covalentes, existentes nos sistemas biológicos, sendo responsáveis pela manutenção das 
conformações bioativas de macromoléculas como interações purinas-pirimidinas dos ácidos 
nucleicos (Figura 15), por exemplo, que podem ser desfeitas facilmente para duplicação da dupla 
fita e logo em seguida refeitas. 
As ligações de hidrogênio são formadas entre heteroátomos eletronegativos como 
oxigênio, nitrogênio, enxofre e o átomo de hidrogênio de ligações O-H, N-H e CF2-H, como 
observado na Figura 16. 
Vários fármacos são reconhecidos por ligações de hidrogênio, dos quais podemos 
destacar o antiviral Saquinavir. O Saquinavir se complexa ao sítio ativo da protease do vírus 
HIV-1 (Figura 17). O reconhecimento do inibidor enzimático envolve fundamentalmente 
ligações de hidrogênio com resíduos de aminoácidos do sítio ativo, diretamente ou por 
intermédio de moléculas de água (Figura 17). 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
30 
FIGURA 15 - LIGAÇÕES DE HIDROGÊNIO E A MANUTENÇÃO 
DA ESTRUTURA DUPLA FITA DO DNA 
 
FONTE: Barreiro e Fraga, 2008. 
 
 
FIGURA 16 - PRINCIPAIS GRUPOS DOADORES 
E ACEPTORES DE LIGAÇÕES DE HIDROGÊNIO 
 
FONTE: Fraga, 2001. 
 
 
31 
FIGURA 17 - RECONHECIMENTO MOLECULAR DO ANTIVIRAL SAQUINAVIR PELO SÍTIO 
DA PROTEASE DO HIV-1 VIA INTERAÇÕES DE HIDROGÊNIO 
 
FONTE: Fraga, 2001. 
 
 
 
 
 
32 
8 LIGAÇÃO COVALENTE 
 
 
As ligações covalentes são de elevada energia, aproximadamente 77-88 kcal.mol-1,e 
por esse motivo são dificilmente clivadas em processos não enzimáticos. Portanto, complexos 
fármaco-receptor envolvendo ligações covalentes são raramente desfeitos, culminando em uma 
inibição enzimática irreversível ou inativação do sítio receptor. 
Essa interação, que envolve a formação de uma ligação sigma entre dois átomos que 
contribuem cada qual com um elétron, ocorre com fármacos que apresentam grupamentos com 
acentuado caráter eletrofílico e bionucleófilos orgânicos. 
O ácido acetilsalicílico (AAS) é um exemplo de fármaco que atua como inibidor 
enzimático irreversível da enzima PGHS, cujo reconhecimento molecular envolve a formação de 
ligações covalentes. O AAS apresenta propriedades anti-inflamatórias, analgésicas e 
antipiréticas decorrentes do bloqueio da biossíntese de prostaglandinas, devido à inibição da 
enzima PGHS. Essa complexação fármaco-receptor é irreversível, em função da formação de 
uma ligação covalente resultante do ataque nucleofílico da hidroxila do aminoácido serina530 ao 
grupamento eletrofílico acetila presente na enzima-alvo (Figura 18). 
 
 
FIGURA 18 - MECANISMO DE INIBIÇÃO IRREVERSÍVEL DA PGHS PELO ÁCIDO 
ACETILSALICÍLICO VIA FORMAÇÃO COVALENTE 
 
FONTE: Fraga, 2001. 
 
 
33 
9 GRUPO FARMACOFÓRICO 
 
 
Grupo farmacofórico é o conjunto de características eletrônicas e estéricas que 
caracterizam um ou mais grupos funcionais ou subunidades estruturais, necessários ao melhor 
reconhecimento molecular pelo receptor e, portanto, para o efeito farmacológico desejado. 
Farmacóforo não é uma molécula real, nem associações de grupos funcionais; ao contrário, é 
um conceito abstrato que representa as diferentes capacidades de interações moleculares de um 
grupo de compostos com o sítio receptor. O farmacóforo pode ser considerado como a “parte” 
molecular do fármaco essencial à atividade desejada, que se modificado pode reduzir ou eliminar 
a atividade farmacológica do fármaco. 
A inibição da anidrase carbônica (CA) pelas sulfas diuréticas evidenciou o padrão de 
similaridade molecular entre a função sulfonamida (SO2NH2) desses fármacos e o substrato 
natural da enzima, o ácido carbônico. A partir dessa constatação, pôde ser evidenciado que o 
reconhecimento molecular das sulfonamidas pela CA dependia dessa funcionalidade, 
comprovando sua natureza farmacofórica (Figura 19). 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
34 
FIGURA 19 
 
Esquema da interação do substrato natural e do farmacóforo 
das sulfas diuréticas –SO2NH2 com o sítio ativo da anidrase carbônica, 
ilustrando as ligações-H envolvidas no reconhecimento molecular. 
FONTE: Barreiro e Fraga, 2008. 
 
 
 
 
 
35 
10 RECEPTORES E INTERAÇÃO FÁRMACO-RECEPTOR 
 
 
A farmacologia entrou em uma nova fase em meados da década de 1970, quando os 
receptores, que até então eram apenas uma ideia teórica, começaram a surgir como realidade 
bioquímica. Após o desenvolvimento de técnicas de marcação de receptores houve a 
possibilidade da extração e purificação dos receptores marcados radioativamente. Essa nova 
fase da farmacologia, consequentemente, impulsionou a química farmacêutica ao conhecimento 
mais detalhado das interações fármaco-biomacromolécula que possuímos atualmente. 
Essa abordagem de extração e purificação dos receptores foi utilizada pela primeira 
vez com êxito no receptor nicotínico de acetilcolina. Tratando tecidos musculares com 
detergentes iônicos foi possível tornar solúvel a proteína receptora ligada à membrana. 
Posteriormente, essa proteína pôde ser purificada pela técnica de cromatografia por afinidade, 
em que um ligante do receptor, ligado de forma covalente à matriz de uma coluna de 
cromatografia, foi utilizado para adsorver o receptor e separá-lo de outras substâncias no extrato 
de tecido muscular. Em seguida, o receptor pôde ser eluído da coluna por lavagem com uma 
solução contendo um antagonista (p. ex., galamina). Atualmente, abordagens semelhantes vêm 
sendo utilizadas para purificar diferentes tipos de receptores. 
Com as proteínas receptoras uma vez isoladas e purificadas houve a possibilidade de 
analisar a sequência de aminoácidos de um fragmento curto dessas proteínas, permitindo 
deduzir a sequência correspondente de bases de RNA mensageiro (mRNA). Em seguida, foram 
sintetizadas sondas de oligonucleotídeos, utilizadas para extrair a sequência de DNA total por 
métodos convencionais de clonagem de DNA complementar (cDNA), começando a partir de uma 
biblioteca de cDNA obtido de uma fonte tecidual rica no receptor de interesse. A partir daí, foram 
obtidos os primeiros clones de receptores. Porém, atualmente dispõe-se de diversas estratégias 
para clonagem por expressão, que não exigem isolamento prévio e purificação da proteína 
receptora. 
Assim, muitas informações foram adquiridas ao introduzir o DNA clonado que codifica 
receptores individuais em linhagens celulares por transfecção, produzindo células capazes de 
 
 
36 
expressar os receptores estranhos a elas, numa forma funcional. Desenvolvidas por engenharia 
genética, essas células permitem um controle mais rigoroso dos receptores expressos do que o 
possível com células naturais ou tecidos intactos, auxiliando nos estudos referentes a esses 
receptores. 
A partir da clonagem os receptores começaram a ser mais bem compreendidos e 
consequentemente surgiram classificações em relação a sua forma de ação. Com base na 
estrutura molecular e de seu mecanismo de transdução de sinal, podemos distinguir quatro tipos 
ou superfamílias de receptores. 
 Tipo 1 – Canais iônicos regulados por ligantes 
Conhecidos como receptores ionotrópicos, esses receptores são proteínas da 
membrana com estrutura semelhante a outros canais iônicos, mas que incorporam um sítio de 
ligação (receptor) de ligante, geralmente no domínio extracelular. Tipicamente, são os receptores 
sobre os quais atuam os neurotransmissores rápidos. 
Exemplos: receptor nicotínico de acetilcolina (Figura 20), receptor GABAA. 
 Tipo 2 – Receptores acoplados à proteína G 
Esses receptores são conhecidos como receptores metabotrópicos, que consistem 
em uma cadeia de aminoácidos que atravessa sete vezes a membrana em formato de 
serpentina. Do lado extracelular da membrana podem existir resíduos de açúcar em diferentes 
locais N-glicosilados. A ligação do mediador ou de moléculas agonistas, estruturalmente 
relacionados, altera a conformação da proteína receptora, habilitando-a a interagir com a 
proteína G. As proteínas G estão na camada interna da membrana e consistem em três 
subunidades: α, β e ϒ. A associação do ligante ao receptor ativa a proteína G, levando, por 
sua vez, à ativação de outra proteína (enzima ou canal iônico) (Figura 21). 
Exemplos: receptor muscarínico de acetilcolina, receptores adrenérgicos, receptores 
de quimiocinas. 
 
 
 
 
 
37 
FIGURA 20 - RECEPTOR NICOTÍNICO ATIVADO POR ACETILCOLINA NA PLACA MOTORA 
 
A ligação simultânea de duas moléculas de Ach às duas subunidades α resulta na abertura do canal iônico com 
entrada de Na+ e saída de K+, despolarização da membrana e disparo do potencial de ação. 
FONTE: Lüllmann e colaboradores, 2008. 
 
 
FIGURA 21 - RECEPTOR METABOTRÓPICO COM SETE DOMÍNIOS 
TRANSMEMBRANA ATIVADO POR AGONISTA, COM ATIVAÇÃO DE PROTEÍNA G 
E POSTERIOR ATIVAÇÃO DE PROTEÍNA EFETORA 
 
FONTE: Lüllmann e colaboradores, 2008. 
 
 
38 
 Tipo 3 – Receptores ligados a quinases e receptores relacionados 
É um grupo heterogêneo de receptores de membrana que respondem a mediadores 
proteicos. Apresentam um domínio extracelular de ligação de ligante conectado a um domínio 
intracelular por uma única hélice transmembrana. Em muitos casos, o domínio intracelular é de 
natureza enzimática (com atividade de proteinoquinase ou de guanilato ciclase). 
Exemplo: receptores de insulina (Figura 22), de várias citocinas e fatores de 
crescimento (associado à quinase), receptor do fator natriurético atrial(associado à guanilato 
ciclase). 
 
 
FIGURA 22 
 
Receptor de insulina, ativado pela ligação do agonista (insulina), levando a ativação da tirosina quinase, que por sua 
vez fosforila resíduos de tirosina em proteínas, resultando em uma cascata de sinalização que culminará em 
alteração da função celular. 
FONTE: Lüllmann e colaboradores, 2008. 
 
 
39 
 Tipo 4 – Receptores nucleares 
Regulam a transcrição de genes. O termo usado, receptores nucleares, é um tanto 
incorreto, visto que alguns se localizam, na verdade, no citoplasma e migram para o 
compartimento nuclear na presença do ligante. 
Exemplos: receptores dos hormônios esteroides (Figura 23), do hormônio da tireoide, 
receptor do ácido retinoico, receptor da vitamina D. 
 
 
FIGURA 23 
Receptor dos hormônios esteroides (nucleares): o hormônio se liga ao receptor no citosol; esse complexo, por sua 
vez, atravessa a membrana nuclear e interage de forma pareada com o DNA regulando a sua transcrição. 
FONTE: Lüllmann e colaboradores, 2008. 
 
 
Dependendo da complexidade que envolve a transdução de sinal de cada tipo de 
receptor, teremos velocidades diferentes para cada resposta, como podemos observar na 
Figura 24. 
 
 
 
40 
FIGURA 24 - TIPOS DE RECEPTORES E SUAS ESCALAS DE TEMPO DE AÇÃO 
 
FONTE: Rang e Dale, 2008. 
 
 
A melhor compreensão da estrutura e do funcionamento dos receptores impulsionou a 
química farmacêutica e o desenvolvimento da modelagem molecular. O conhecimento da 
topografia molecular tridimensional (3D) do sítio receptor da biomacromolécula, principal 
responsável pelo reconhecimento molecular, permite o desenho de ativadores/inibidores 
enzimáticos ou agonistas/antagonista de receptores, por processos de complementaridade 
molecular planejada, que podem, por sua vez, discriminar entre interações reversíveis ou 
covalentes. 
 
 
 
 
 
 
41 
10.1 RECONHECIMENTO MOLECULAR DO RECEPTOR 
 
 
Sabemos agora que a interação entre a biomacromolécula e a micromolécula 
apresenta natureza tridimensional dinâmica, como descrito pelo modelo de encaixe induzido. O 
reconhecimento molecular entre fármaco e biomacromolécula depende da dimensão molecular 
do ligante, das distâncias interatômicas e do arranjo espacial entre os grupamentos 
farmacofóricos. A Figura 25 ilustra a natureza 3D do complexo biomacromolécula-micromolécula, 
com destaque para o arranjo espacial dos aminoácidos que constituem o sítio ativo. 
 
 
FIGURA 25 
 
Representação tridimensional do complexo da acetilcolinesterase com o inibidor tacrina (roxo), com destaque para 
os resíduos de aminoácidos que compõem o sítio receptor (vermelho). 
FONTE: Fraga, 2001. 
 
 
 
 
42 
Dessa forma, podemos considerar que a interação entre o fármaco e uma proteína 
deve ser imaginada como uma colisão entre dois componentes flexíveis. Nesse processo, o 
choque inicial do ligante com a superfície da proteína deve provocar o deslocamento de 
moléculas de água superficiais em garantir o acesso imediato ao sítio ativo, uma vez que o 
transporte do ligante sítio de reconhecimento molecular deve envolver múltiplas etapas de 
acomodamento conformacional que produzam um modo de interação mais favorável 
entalpicamente e entropicamente. 
 
 
10.2 CARBONO ASSIMÉTRICO E QUIRALIDADE 
 
 
Carbono assimétrico ou quiral é o átomo de carbono que se liga a quatro ligantes 
diferentes (Figura 26). Podem existir um ou mais carbonos quirais em uma mesma molécula, 
tornando-a uma molécula quiral. 
 
 
FIGURA 26 - REPRESENTAÇÃO DO CARBONO ASSIMÉTRICO OU QUIRAL 
 
FONTE: Disponível em: <http://www.infoescola.com/quimica-organica/carbono-assimetrico/>. 
Acesso em: 15 fev. 2012. 
 
 
43 
Quiralidade é um atributo geométrico, um objeto que não pode ser sobreposto à sua 
imagem especular é dito quiral, enquanto que um objeto no qual a sua imagem especular pode 
ser sobreposta ao objeto original, é dito aquiral. Exemplos de quirais são as mãos (Figura 27) e 
as conchas marinhas. Essa propriedade de não sobreposição também é exibida por moléculas 
orgânicas, que contêm um carbono quiral (Figura 28). 
 
 
FIGURA 27 - IMAGEM ESPECULAR DA MÃO HUMANA 
 
FONTE: Coelho, 2001. 
 
 
 
 
 
 
44 
FIGURA 28 - REPRESENTAÇÃO DE UMA MOLÉCULA QUIRAL E DE OUTRA AQUIRAL 
 
FONTE: Coelho, 2001. 
 
 
Quando duas moléculas não podem ser sobrepostas (quirais), elas são tipos de 
estereoisômeros, também conhecidos como enantiômeros (do grego enantio = opostos). A única 
diferença existente entre esses enantiômeros é a propriedade de desviar o plano da luz 
polarizada quando uma solução de cada um deles é submetida a um equipamento chamado 
polarímetro. 
 
 
 
45 
Sabe-se que uma onda de luz viaja no espaço vibrando em vários planos; mas quando 
um feixe de luz é submetido a um cristal, contido no polarímetro, essa luz passa a vibrar em um 
único plano. Portanto, quando uma solução contendo um enantiômero é submetida a um 
polarímetro, ela pode desviar o plano para a direita ou para a esquerda (Figura 29). Se o plano 
for desviado para a direita, a substância é conhecida como dextrorrotatória (do latim dextro = 
direita). Se o plano é desviado para a esquerda, a substância é conhecida como levorrotatória 
(do latim laevu = esquerda). Essa propriedade é conhecida como rotação óptica. Como 
convencionado, coloca-se um sinal de menos entre parênteses (-) para nomear uma substância 
levorrotatória e um sinal de mais (+) para designar uma substância dextrorrotatória. 
Cahn, Ingold e Prelog propuseram uma notação para facilitar o desenho e o 
reconhecimento da forma correta em que os substituintes de um carbono assimétrico 
orientam-se no espaço, conhecida como notação R e S. Esses pesquisadores estabeleceram 
uma regra de prioridade entre os substituintes ligados ao carbono assimétrico. Essa regra 
baseia-se no peso molecular dos átomos ligados ao carbono quiral, da seguinte maneira: 
 um heteroátomo ( I > Br > Cl > S > O > N) tem maior prioridade do que o carbono; 
 uma ligação dupla (-CH=CH2) tem uma prioridade maior do que uma ligação 
simples (-CH2-CH2-). 
Podemos observar a aplicação dessa regra na Figura 30, que exemplifica utilizando a 
molécula do aminoácido fenilglicina. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
46 
FIGURA 29 
 
a) polarização da onda de luz em um polarímetro. b) desvio do plano de luz ocasionado por um polarímetro. 
FONTE: Coelho, 2001. 
 
 
 
 
47 
FIGURA 30 - APLICAÇÃO DA REGRA R E S
 
FONTE: Coelho, 2001. 
 
 
10.3 COMPLEMENTARIDADE DOS ENANTIÔMEROS 
 
 
Um dos primeiros relatos da literatura que indicava a relevância da estereoquímica, 
mais particularmente da configuração absoluta na atividade biológica, foi feito por Piutti (1886), 
descrevendo o isolamento e as diferentes propriedades gustativas dos enantiômeros do 
aminoácido asparagina (Figura 31). Essas diferenças de propriedades organolépticas 
expressavam diferentes modos de reconhecimento molecular do ligante pelo sítio receptor 
localizado nas papilas gustativas, traduzindo sensações distintas [(S)- doce e (R)- amargo]. 
 
 
48 
FIGURA 31 - ESTERIOISÔMEROS DA ASPARAGINA 
 
FONTE: Fraga, 2001. 
 
 
 
 
 
49 
11 MISTURA RACÊMICA E COMPLEMENTARIDADE 
 
 
Até a década de 1960, quando ocorreu a tragédia decorrente do uso indiscriminado da 
forma racêmica (mistura em quantidades iguais de dois enantiômeros de uma molécula quiral, 
cuja atividade óptica não desvia o plano da luz polarizada, nem para a esquerda, nem para a 
direita) da talidomida por gestantes (utilizada como sedativo leve), resultando no nascimento de 
crianças com deformações nos membros superiores e inferiores (Figura 32), a importância da 
configuração absoluta na atividade biológica das moléculas se manteve adormecida. 
Após a tragédia ocorrida, um estudo do metabolismo da talidomida permitiu evidenciar 
que o enantiômero (S) era oxidado levando à formação de espécies eletrofílicasreativas do tipo 
areno-óxido, que reagem com nucleófilos bio-orgânicos, induzindo teratogenicidade, enquanto o 
ananiômero (R) era responsável pelas propriedades sedativas e analgésicas e não sofria esse 
processo de oxidação (Figura 33). 
Esse episódio é conhecido como o início de uma nova era no desenvolvimento de 
fármacos, onde a quiralidade passou a ter grande destaque. E, portanto, uma investigação 
cuidadosa do comportamento de fármacos quirais, frente aos processos que influenciam tanto a 
fase farmacocinética, quanto a fase farmacodinâmica, passou a ser indispensável antes da 
liberação para uso terapêutico. 
 
 
FIGURA 32 - DEFORMAÇÕES OCASIONADAS PELO USO DA TALIDOMIDA NOS ANOS DE 1960 
 
FONTE: Coelho, 2001. 
http://pt.wikipedia.org/wiki/Enanti%C3%B3mero
http://pt.wikipedia.org/wiki/Mol%C3%A9cula_quiral
http://pt.wikipedia.org/wiki/Luz
http://pt.wikipedia.org/wiki/Polariza%C3%A7%C3%A3o
 
 
50 
FIGURA 33 - ESTERIOISOMEROS DA TALIDOMIDA (S-TERATOGÊNICO E R-SEDATIVO) 
 
FONTE: Fraga, 2001. 
 
 
A atividade biológica diferente de substâncias quirais foi pioneiramente proposta por 
Easson e Stedman (1933). Esses pesquisadores propuseram que o reconhecimento molecular 
de um fármaco, que apresente apenas um carbono assimétrico, deveria envolver a participação 
de pelo menos três pontos de reconhecimento pelo biorreceptor. Dessa maneira, o 
reconhecimento do antípoda correspondente ao fármaco pelo mesmo sítio receptor não seria tão 
eficaz devido à perda de um ou mais pontos de interação complementar. 
Um exemplo dessa interação chamada como modelo de três pontos de Easson-Stedman 
está ilustrado na Figura 34. Nesse exemplo é considerado o mecanismo de reconhecimento 
estereoespecífico do propranolol pelos receptores β-adrenérgicos. O enantiômero (S) é 
reconhecido por esses receptores por meio de três principais pontos de interação: a) sítio de 
interação hidrofóbica, que reconhece o grupamento lipofílico naftila do propranolol; b) sítio de 
doador de ligação de hidrogênio, que reconhece o átomo de oxigênio da hidroxila da cadeia 
lateral do propranolol; c) sítio de alta densidade eletrônica, que reconhece o grupamento amina 
da cadeia lateral (interações do tipo íon-dipolo). Já o enantiômero (R)-propranolol apresenta-se 
praticamente destituído das propriedades β-bloqueadoras para o tratamento da angina de peito, 
devido à menor afinidade fármaco-receptor decorrente da perda do ponto de interação (b) (ligação 
de hidrogênio), e apresentando por sua vez propriedades indesejadas relacionadas à inibição da 
conversão do hormônio da tireoide tiroxina à tri-iodotironina. 
 
 
51 
FIGURA 34 - RECONHECIMENTO MOLECULAR DOS GRUPOS 
FARMACOFÓRICOS DOS ENANTIÔMEROS DO PROPRANOLOL 
 
FONTE: Barreiro e Fraga, 2008. 
 
 
 
 
 
52 
12 ISOMERIA GEOMÉTRICA E RECONHECIMENTO MOLECULAR 
 
 
Isômeros espaciais são os que só podem ser diferenciados por sua fórmula espacial. 
Esse tipo de isomeria pode ser dividido em isomeria óptica (que destacamos anteriormente) e 
isomeria geométrica. A isomeria geométrica só ocorre em moléculas que apresentam ligação 
dupla ou um ciclo. 
Átomos de carbono unidos por ligação simples têm possibilidade de rotação livre, por 
isso uma das estruturas pode ser convertida na outra pela rotação de um dos carbonos ao 
redor do eixo que une os carbonos 2 e 3 da estrutura (Figura 35). Já se os carbonos 2 e 3 
estivessem unidos por uma ligação dupla, a situação seria diferente. A dupla ligação impede a 
rotação dos carbonos dela participantes. Os carbonos 2 e 3 são trigonais e se dividirmos o 
plano a que pertencem todos os carbonos através do eixo da dupla ligação, observaríamos, 
claramente, a existência de dois compostos diferentes. Em um exemplo, os grupos metil (CH3) 
se encontram de um mesmo lado (cis-2-buteno) e no outro, estarão de lados diferentes (trans-
2 buteno) (Figura 36). 
 
 
FIGURA 35 
 
FONTE: Disponível em: <http://luizclaudionovaes.sites.uol.com.br/isomeriageometrica.htm>. Acesso: 15 fev. 2012. 
 
http://luizclaudionovaes.sites.uol.com.br/isomeriageometrica.htm
 
 
53 
FIGURA 36 - EXEMPLO DE ISÔMEROS GEOMÉTRICOS 
(A) CIS-2 BUTENO (B) TRANS-2 BUTENO 
 
FONTE: Disponível em: <http://luizclaudionovaes.sites.uol.com.br/isomeriageometrica.htm>. Acesso: 15 fev. 2012. 
 
 
Os átomos de carbono participantes de um ciclo ou anel também são impedidos de 
girar em torno do eixo da ligação, com isso a isomeria geométrica também pode ocorrer em 
compostos cíclicos. Para isso, basta que, pelo menos, dois átomos de carbono participantes do 
ciclo possuam ligantes diferentes. Os átomos de carbono que apresentam os ligantes diferentes 
não precisam ser vizinhos (Figura 37). 
 
 
FIGURA 37- EXEMPLO DE ISÔMEROS GEOMÉTRICOS DE UM CICLO 
 
FONTE: Disponível em: <http://www.quiprocura.net/isomeria/espacial.htm>. Acesso: 15 fev. 2012. 
 
 
54 
Alterações da configuração relativa dos grupamentos farmacofóricos de um ligante 
alicíclico também podem repercutir diretamente no seu reconhecimento pela biomacromolécula, 
uma vez que as diferenças de arranjo espacial dos grupos envolvidos nas interações com o sítio 
receptor implicam em perda de complementaridade e, consequentemente, em perda de 
afinidade e atividade intrínseca, como ilustra a Figura 38. 
 
 
FIGURA 38 - RECONHECIMENTO MOLECULAR LIGANTE-FÁRMACO 
 
FONTE: Fraga, 2001. 
 
 
55 
Analisando o desenvolvimento de novos estrogênios sintéticos podemos exemplificar a 
importância da isomeria geométrica para a atividade biológica. Podemos observar que o trans-
dietilestilbestrol, cuja configuração relativa dos grupamentos para-hidroxifenila mimetiza o arranjo 
espacial das hidroxilas do hormônio estradiol, que representam o grupo farmacofórico para o 
reconhecimento desse ligante natural (Figura 39). O cis-dietilestilbestrol apresenta distância 
entre os grupamentos farmacofóricos (hidroxilas) inferior à necessária para o reconhecimento 
adequado pela biomacromolécula e, consequentemente, apresenta atividade estrogênica muito 
menos potente que aquela do derivado trans-dietilestibestrol (Figura 39). 
 
 
FIGURA 39 - RECONHECIMENTO MOLECULAR DOS GRUPOS FARMACOFÓRICOS 
DOS ESTEOISÔMEROS CIS E TRANS-DIETIESTIBESTROL 
FONTE: Fraga, 2001. 
 
 
A tragédia da talidomida promoveu um grande desenvolvimento nos estudos 
relacionando a quiralidade com propriedades farmacocinéticas, farmacodinâmicas e tóxicas, e 
consequentemente um grande conjunto de informações nessa área está disponível, embora para 
muitos medicamentos de uso corrente em clínica nenhum estudo com os enantiômeros isolados 
tenha sido relatado. Na atualidade, dentre os 100 medicamentos mais vendidos, 20 são quirais 
 
 
56 
(porém, comercializados em suas formas enantiomericamente puras), enquanto que outros 17 
de estrutura quiral (são comercializados como mistura racêmica). 
A “Food and Drug Administration” (FDA), dos Estrados Unidos, e outros órgãos 
semelhantes existentes em países desenvolvidos estabeleceram protocolos que devem ser 
seguidos para a liberação de um novo medicamento, especialmente se a estrutura do princípio 
ativo for quiral. Para a liberação comercial de uma mistura racêmica é necessária a execução 
de todos os ensaios clínicos e toxicológicos com cada enantiômero isoladamente e 
comparados com aqueles envolvendo a mistura racêmica. Esses protocolos tiveram um efeito 
imediato sobre o tempo e o custo para a liberação de uma nova substância, que totalizava no 
passado US$ 20 milhões, atingindo hoje a faixa dos US$ 150 milhões a US$ 250 milhões. 
 
 
FIGURA 40 - EXEMPLOS DE IMPORTANTES MEDICAMENTOS 
QUIRAIS DISPONÍVEIS NO MERCADO 
 
FONTE: Barreiro e colaboradores, 1997. 
 
 
57 
Para maior segurança e eficácia terapêutica no emprego de fármacos 
enantiomericamente puros é desejável a eliminação do isômero inativo (distômero) da 
formulação farmacêutica. Mas, devido à complexidade de fatores que regulama atividade 
farmacoterapêutica de um medicamento, além da necessidade de serem considerados, 
simultaneamente, fatores econômicos que viabilizem a produção de fármacos com perfil de baixo 
custo, baixa toxicidade, produção em larga escala e alta lucratividade, fórmula ideal da indústria 
farmacêutica moderna, outros fatores pontuais devem ser analisados individualmente, que 
podemos analisar, observando a Tabela 2. Nessa tabela, estão contidos os principais fatores 
relacionados à decisão de se produzir o racemato ou a substância enantiomericamente pura. 
 
 
TABELA 2 - CONSIDERAÇÕES ENTRE A PRODUÇÃO DO EUTÔMERO 
(ATIVO OU MAIS ATIVO) OU DA MISTURA RACÊMICA 
MOTIVOS QUE DETERMINAM A 
PRODUÇÃO DO EUTÔMERO 
MOTIVOS PARA O DESENVOLVIMENTO 
DO RACEMATO 
Ser enantiômero o único isômero 
ativo 
Ação sinérgica dos isômeros 
Baixo índice terapêutico da mistura Alto índice terapêutico da mistura 
Maior toxicidade do distômero Pouca ou nula toxicidade do distômero 
Não haver bioversão de quiralidade Ocorrência de bioinversão de 
quiralidade 
Acessibilidade econômica Inovação terapêutica 
 Uso em quadros crônicos 
 Baixo custo de produção em relação ao 
eutômero 
FONTE: Adaptado de Barreiro e colaboradores, 1997. 
 
 
58 
13 ATROPOISOMERISMO 
 
 
Atropoisomerismo (do grego atropos = sem rotação) é um fenômeno atribuído a um 
tipo de estereoisomerismo onde a rotação livre em torno de uma ligação simples é impedida, 
produzindo uma barreira energética bastante elevada, de modo a permitir o isolamento ou 
simplesmente a detecção dos diferentes rotâmeros, nesse caso, chamados atropoisômeros. 
Essa isomeria axial é caracterizada pela atividade ótica promovida por um eixo de ligação, e não 
da presença de um carbono assimétrico, como elemento de quiralidade. O fenômeno foi 
observado pela primeira vez pelos pesquisadores Christie e Kenner (Figura 41), após a 
identificação dos atropoisômeros do ácido 6,6’-dinitro-2,2’-difênico, que não se mostraram 
interconversíveis à temperatura ambiente. 
 
 
FIGURA 41 - EQUILÍBRIO ATROPOISOMÉRICO DO ÁCIDO 6,6’-DINITRO-2,2’-DIFÊNICO 
 
FONTE: Santos, 1996. 
 
 
A nomenclatura dos atropoisômeros pela aplicação das regras de prioridade de Cahn-
Ingold-Prelog pode ser atribuída como R ou S, como exemplificado na Figura 42. Partindo da 
projeção da estrutura vista na direção do eixo de ligação do sistema bifenílico, define-se a ordem 
 
 
59 
de prioridade dos grupos funcionais, iniciando-se por aqueles mais próximos ao observador e, 
em seguida, atribuindo-se a configuração absoluta R ou S com base no sentido da rotação 
produzida quando se caminha do substituinte de maior prioridade para o de menor prioridade. 
A inscrição da configuração absoluta de atropoisômeros deve ser acompanhada pela 
introdução do prefixo aR ou do aS (apesar de ser opcional, é bastante utilizado), visando 
distingui-los de outros tipos de compostos oticamente ativos. As substâncias atropoisoméricas 
também podem ser vistos como hélices e suas configurações descritas como P (“Plus”), 
referente à rotação no sentido horário, ou M (“Minus”), referente à rotação no sentido anti-
horário. Dessa maneira, as inscrições aR e M são correspondentes, assim como aS e P. 
 
 
FIGURA 42 - NOMENCLATURA DOS ATROPOISÔMEROS 
 
FONTE: Santos e colaboradores, 1996. 
 
 
O atropoisomerismo é observado em muitas substâncias de origens natural e sintética, 
que apresentam atividade farmacológica, e dessa maneira se tornando essencial seu 
conhecimento para diversos campos da Química Medicinal. 
 
 
60 
São exemplos de substâncias atropoisoméricas de uso medicinal: 
 Vimblastina – anticancerígeno de origem natural, inibidor da polimerização de 
microtúbulos (Figura 43); 
 Vancomicina – antibiótico de origem natural, obtido a partir da fermentação de 
cepas da bactéria Streptomyces orientalis; 
 Colchicina – inibidor da polimerização de microtúbulos; 
 Gossipol – produto natural obtido de sementes, troncos e raízes do algodão 
(Gossypium sp.), apresentando atividades contraceptivas, antivirais e antiparasitárias 
(Figura 44). 
 
 
FIGURA 43 - ESTRUTURA DA VIMBLASTINA (A) E SEU ATROPOISÔMERO (B) 
 
FONTE: Santos, 1996. 
 
 
 
 
 
(b) (a) 
 
 
61 
FIGURA 44 - ESTRUTURA QUÍMICA DOS ATROPOISÔMEROS DO GOSSIPOL 
 
FONTE: Santos, 1996. 
 
 
O atropoisomerismo está presente em diversas substâncias terapêuticas, e esse 
fenômeno é capaz de influenciar no perfil de reconhecimento molecular de um determinado 
ligante pelo seu receptor, produzindo como consequência importantes diferenças no perfil de 
bioatividade de um protótipo. 
A estereosseletividade, observada para substâncias apresentando essa propriedade 
estrutural, evidencia a importância de se caracterizar o atropoisomerismo em substâncias 
bioativas no que se refere a parâmetros como segurança, eficácia, absorção, distribuição, 
metabolismo e excreção, a qual tem sido fortemente recomendada em estudos clínicos com 
racematos de um candidato a fármaco. 
Uma poderosa ferramenta na preparação de novos ligantes quirais eficazes e 
seletivos, empregando metodologias de menor custo e complexidade é a possibilidade de 
manipulação da estabilidade dos atropoisômeros. 
 
 
 
 
 
62 
14 FÁRMACOS ESTRUTURALMENTE INESPECÍFICOS 
 
 
Como já citado neste curso, os fármacos estruturalmente inespecíficos são fármacos 
que dependem exclusivamente de suas propriedades físico-químicas como o coeficiente de 
partição e o coeficiente de ionização para promoverem o efeito farmacológico. Vimos um 
exemplo clássico desses fármacos, os anestésicos gerais, em que a potência dessa classe de 
fármacos está diretamente relacionada com a sua lipossolubilidade. 
Há casos em que a alteração das propriedades físico-químicas decorrentes de 
modificações estruturais de uma molécula pode alterar seu modo de interação com a 
biomacromolécula. Podemos exemplificar esse fato, destacando a classe dos anticonvulsivantes, 
onde pentobarbital (a) é estruturalmente específico sobre o receptor ionotrópico GABA. Porém, 
uma simples substituição de um átomo de oxigênio por um átomo de enxofre produz o tiopental 
(b), cuja lipossolubilidade é maior e tem ação anestésica inespecífica (Figura 45). 
 
 
FIGURA 45 - ESTRUTURA QUÍMICA DO PENTOBARBITAL (A) E DO TIOPENTAL (B), 
MOSTRANDO A INFLUÊNCIA DA MODIFICAÇÃO ESTRUTURAL NA AÇÃO DOS FÁRMACOS 
 
FONTE: Barreiro e Fraga, 2008. 
 
 
 
63 
15 PROPRIEDADES FÍSICO-QUÍMICAS E ATIVIDADE BIOLÓGICA 
 
 
As propriedades físico-químicas de determinados grupamentos funcionais são 
fundamentais na fase farmacodinâmica da ação dos fármacos; etapa essa de reconhecimento 
molecular, uma vez que a afinidade de um fármaco por seu receptor depende do somatório das 
forças de interação dos grupamentos farmacofóricos com sítios complementares do sítio 
receptor. 
A fase farmacocinética – de absorção, distribuição, metabolização e excreção – 
apresenta resultados diretos sobre a biodisponibilidade e no tempo de meia-vida (t1/2) do fármaco 
na biofase. Também pode ser afetada de forma drástica pela variação das propriedades físico-
químicas de um fármaco. 
As principais propriedades físico-químicas de uma micromolécula capazes de alterar o 
perfil farmacoterapêutico são: 
 coeficiente de partição – expressa a lipofilicidade relativa das moléculas; 
 coeficiente de ionização – expresso pelo valor de pKa, que traduz o grau de 
contribuição relativa de espécies ionizada e não ionizada. 
 
 
 
 
 
64 
16 COEFICIENTE DE PARTIÇÃO E EQUAÇÃO DE HANSCH 
 
 
Lipossolubilidade (Log P) é conceituada como o coeficiente de partição de uma 
substância entre uma fase orgânica e uma fase aquosa, isto é, a razão entre a concentração de 
fármaco que tende a ficar na fase orgânica e a concentração de fármaco que tende a 
permanecer na fase aquosa em um modelo de dois compartimentos (Figura 46). Esse modelo 
mimetiza o que ocorreno organismo, dando a informação sobre o perfil de afinidade do fármaco 
ao óleo (octanol) ou a água. 
 
 
FIGURA 46 
 
Modelo de dois compartimentos, com ênfase para a estrutura do octanol, 
constituinte da fase orgânica (com estrutura semelhante a um fosfolipídeo). 
FONTE: Adaptado de Barreiro e Fraga, 2008. 
Octan
ol 
 
 
65 
Lipossolubilidade é a razão entre a concentração de fármaco na fase orgânica e 
concentração de fármaco na fase aquosa (lipossolubilidade = Corg/Caqua) (Figura 46), portanto 
quanto maior a lipossolubilidade maior a afinidade do fármaco pela fase orgânica (oleosa), ou 
seja, maior a facilidade de esse fármaco atravessar as membranas plasmáticas constituídas de 
uma bicamada lipídica (fosfolipídios) (Figura 47). 
 
 
FIGURA 47 - ESTRUTURA DE UM FOSFOLIPÍDIO (UNIDADE QUE FORMA 
A BICAMADA LIPÍDICA DA MEMBRANA PLASMÁTICA) 
 
FONTE: Lüllmann e colaboradores, 2008. 
 
 
Hansch e colaboradores demonstraram as correlações existentes entre atividade 
biológica e parâmetros físico-químicos (p. ex., lipofilicidade) e também demonstraram que Log P 
é uma propriedade aditiva e possui um considerável caráter constitutivo. Por analogia à equação 
de Hammett utilizando derivados benzênicos substituídos, eles definiram a constante hidrofóbica 
do substituinte, x: 
x = Log (Px/PH) 
 
 
66 
E, portanto, o coeficiente de partição (Log Px) de um derivado funcionalizado com um 
substituinte X, pode ser calculado empregando-se a equação a seguir, acrescentando o valor de 
contribuição da constante hidrofóbica do substituinte X tabelada ao logaritmo do coeficiente de 
partição do derivado não substituído (Log PH). 
 
Log Px = Log PH + x 
 
Podemos exemplificar o emprego dessa equação calculando o coeficiente de partição 
do paracetamol a partir do benzeno (Figura 48): 
 
 
FIGURA 48 - USO DA EQUAÇÃO DE HANSCH 
NA PREDIÇÃO DO LOG P DO PARACETAMOL 
 
FONTE: Adaptado de Barreiro e Fraga, 2008. 
 
 
Nesse exemplo, com a utilização da equação de Hansch, podemos calcular o 
coeficiente de partição do paracetamol, conhecendo o coeficiente de partição do benzeno e 
utilizando constante hidrofóbica dos substituintes (OH e NHCOCH3), já conhecidos e tabelados: 
 
Benzeno 
Log PH = 2,13 
Paracetamol 
Log Px = 0,49 (calculado) 
Log Px = 0,46 (experimental) 
 OH = -1,67 
 NHCOCH3 = -0,97 
 
 
67 
 
Log P paracetamol = Log P benzeno + (OH + NHCOCH3) 
Log P paracetamol = 2,13 + (-1,67 + (-0,97)) 
Log P paracetamol = 0,46 
 
Podemos observar, então, que o valor de Log P do paracetamol calculado (0,49) é 
bastante aproximado do valor obtido experimentalmente (0,46) (utilizando o modelo de dois 
compartimentos octanol-água). 
A seleção de substâncias com propriedades lipofílicas, desde a Antiguidade é de 
grande importância, pois como já vimos facilita a absorção dessa pelas membranas biológicas 
até seu sítio de ação. O uso de produtos de fonte natural como remédio foi muito comum na 
Antiguidade, período geralmente chamado de pré‐científico, quando já se verificava a 
importância da utilização de substâncias botânicas na forma de óleos, tais como os óleos de 
oliva, gergelim, rícino, entre outros, graças a sua facilidade de passagens pelas membranas. 
Na Índia da Antiguidade, pode-se encontrar escritos de 3000 anos a.C. que indicavam 
a utilização de óleos viscosos para o tratamento de diversas doenças. A maior utilização desses 
óleos foi observada principalmente no século V a.C. 
Claudius Galeno, médico e filósofo grego (129‐216 d.C.), conhecido como o Pai da 
Farmácia, foi um importante observador científico dos fenômenos biológicos. Dos mais de 300 
tratados escritos por Galeno, cerca de 150 são aceitos atualmente, inclusive suas famosas 
prescrições, conhecidas como preparações galênicas, que foram reestudadas em 1963 e tiveram 
a composição dos seus inúmeros óleos determinados. 
Outro fato notório da história é o trabalho de farmacologia de Pedanius Dioscórides, 
médico grego militar nascido na Cicília (40‐90 d.C.), que já descrevia em sua obra “De Materia 
Medica”, mais de mil remédios entre óleos, beberagens e unguentos. Dentre seus relatos 
destaca‐se que Dioscórides já descrevia o uso de ópio como medicamento e como veneno. Mas, 
somente no século XX é que se descobririam os componentes farmacologicamente ativos no 
 
 
68 
ópio (Figura 49), compostos da classe dos alcaloides, como a morfina (de origem natural do 
ópio), que por sua vez pode gerar a heroína – derivado sintético obtido por acetilação da morfina 
(Figura 50). E podemos destacar que a heroína apresenta atividade psicotrópica mais elevada 
pelo maior transporte e maior absorção cerebral, por apresentar a maior solubilidade em óleo 
(lipossolubilidade) devido à ocorrência de grupos hidroxílicos (da morfina) se apresentarem 
acetilados (Figura 50). 
 
 
FIGURA 49 - ESQUEMA DA OBTENÇÃO DA TINTURA DE ÓPIO A PARTIR DA PAPOULA 
 
FONTE: Lüllmann e colaboradores., 2008. 
 
 
69 
FIGURA 50 
 
Estrutura química da morfina e da heroína, com destaque para os grupos hidroxílicos encontrados na morfina se 
apresentarem acetilados na heroína, tornando-a assim mais lipofílica. 
FONTE: (NOGUEIRA, 2009). 
 
 
 
 
 
70 
17 COEFICIENTE DE IONIZAÇÃO E CÁLCULO DO COEFICIENTE DE IONIZAÇÃO (PKA) 
 
 
A maioria dos fármacos é de ácido ou de base fraca (Figura 51). Fármacos de natureza 
básica (BH+) podem ser protonados, levando à formação de espécies catiônicas; enquanto 
fármacos de natureza ácida (HA) podem ser desprotonados, levando à formação de espécies 
aniônicas (A-), como pode ser observado na Figura 52. 
 
 
FIGURA 51 - VALORES DE PKA DE ALGUNS FÁRMACOS ÁCIDOS E BÁSICOS 
 
FONTE: Rang e colaboradores, 2004. 
 
 
71 
 
FIGURA 52 - GRAU DE IONIZAÇÃO E ABSORÇÃO PASSIVA DE BASE E ÁCIDOS FRACOS 
 
FONTE: Adaptado de Goodmann e Gilman, 2011. 
 
 
A constante de ionização de um fármaco é capaz de expressar a contribuição 
percentual relativa das espécies ionizadas (BH+ ou A-) e não ionizadas (B ou AH), dependendo 
de sua natureza química e do pH do meio. Essa propriedade é fundamental na fase 
farmacocinética, pois as espécies não ionizadas, mais lipofílicas, conseguem atravessar a 
membrana plasmática por transporte passivo (sem gasto de energia e sem a necessidade de 
transportador); já as espécies carregadas são polares e normalmente se encontram solvatadas 
por moléculas de água, dificultando o processo de absorção passiva (Figura 50). 
Essa propriedade físico-química também se faz importante na fase farmacodinâmica, 
devido à formação de espécies ionizadas que podem interagir complementarmente com resíduos 
de aminoácidos do sítio receptor da biomacromolécula por ligação iônica ou interações do tipo 
íon-dipolo (já discutidas em tópicos anteriores neste curso). 
A partir da equação de Henderson-Hasselbach para ionização de ácidos fracos: 
pKa = -pH – Log [espécie ionizada] 
 [espécie não ionizada] 
 
HA H
+
 + A
-
 
H
+
 + A
- 
HA
H
+
+B 
 
+
BH
+ 
H
+
 + 
B 
MEIO 
EXTRACELULAR
MEIO INTRACELULAR 
 
 
72 
À fração ionizada atribui-se o termo α, de forma que em termos percentuais a fração 
não ionizada corresponderia a 100 – α, chegando então à equação para cálculo do percentual de 
ácidos, descrita a seguir: 
 
% de ionização (α) = 100 - 100 
 1 + antilog (pH – pKa) 
 
De maneira similar, a equação de Henderson Hasselbach para cálculo do grau de 
ionização de bases pode ser desenvolvida produzindo a equação a seguir: 
 
% de ionização (α) = 100 - 100 
 1 + antilog (pKa – pH) 
 
Essas equações podem ser utilizadas para dar uma previsão de como será o 
comportamento farmacocinético (absorção, distribuição e excreção) de fármacos, conhecendo-se 
previamente o pH dos principais

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