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Alcoolismo e Cultura Brasileira

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ALCOOLISMO
ROMANTIZAÇÃO DO CONSUMO DE ÁLCOOL
O consumo de bebidas alcoólicas é estimulado e romantizado na nossa sociedade, a ponto do mesmo ser frequentemente associado na mídia à juventude, beleza, bemestar, sucesso pessoal e sexo.
Não é incomum assistir em pleno horário nobre televisivo a propagandas de cerveja recheadas de erotismo, com mulheres jovens, bonitas e com pouca roupa.
Não é à toa, portanto, que o álcool é a droga recreativa mais popular no Brasil.
CONTEXTO CULTURA
O consumo de cerveja, aguardente, vinho e uísque, fazem parte do contexto cultural do país, sendo frequentemente
incorporadas a eventos, reuniões sociais e festas
Na nossa sociedade, o consumo de bebida alcoólica não só é aceito, como também é frequentemente estimulado e glamourizado. O problema são as consequências desse costume.
O álcool é a droga mais produzida, consumida e que causa mais dependência em todo o mundo.
· ALCOOLISMO
O álcool é uma droga que, se consumida em excesso, pode provocar inúmeros problemas de saúde física e psicológica, e em vez de trazer o bem-estar e sucesso sugeridos pela publicidade, pode destruir famílias e vidas profissionais.
1 em cada 3 homens que consomem bebidas alcoólicas o fazem de modo excessivo
· O álcool é a substância que causa maior dano à sociedade na atualidade
· O álcool está relacionado a danos de saúde diretos aos usuários, como traumas, cânceres e cirrose; é o fator mais frequentemente associado a episódios de violência interpessoal, seja nas relações familiares ou comunitárias próximas. Da mesma forma, é o fator mais frequentemente associado a acidentes de trânsito envolvendo alcoolizados e não alcoolizados.
PREVALÊNCIA
No Brasil, pesquisas coordenadas pela Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas constataram que 11% dos homens e 2% das mulheres consomem álcool diariamente.
APS
Estudos demonstram que cerca de 20% das pessoas que buscam um serviço de saúde primário bebem em um nível considerado de alto risco, pelo menos em uso abusivo.
É o principal transtorno mental nos diversos níveis assistenciais, devendo estar em igual prioridade ao problema da hipertensão na APS.
UNIVERSIDADES
Está relacionado ao sexo masculino, em especial, a adultos jovens, porém, em crescente escala no sexo feminino.
Entre os jovens, o álcool está envolvido com absenteísmo escolar, vandalismo, problemas com a polícia, traumas e com atividade sexual de risco.
Estima-se que metade dos estudantes universitários faz uso excessivo de álcool
CONSUMO DIÁRIO MÁXIMO DE ÁLCOOL RECOMENDADO
Considera-se que o consumo aceitável de bebidas alcoólicas é aquele que não é diário e não ultrapassa a quantidade de 20 gramas de álcool em um único dia para mulheres e pessoas idosas ou 30 gramas de álcool por dia para os homens.
Consideramos 1 drink a medida de qualquer bebida que contenha cerca de 14 gramas de álcool: 
· uma taça de vinho (150 ml com teor alcoólico de 12%),
· uma lata de cerveja (350 ml com teor alcoólico de 5%) ou
· 45 ml de uísque (uma dose com teor alcoólico de 40%).
O consumo aceitável de álcool preenche os seguintes critérios:
· Não beber todos os dias, devendo haver pelo menos 2 dias da semana em que não haja consumo de álcool.
· Homens não devem beber mais do que 2 drinks em um único dia.
· Mulheres e pessoas acima de 65 anos (homens incluídos) não devem beber mais do que 1 drink por dia.
Com esse padrão de consumo de álcool há poucas chances de surgirem dependência, problemas pessoas ou danos para órgãos, como fígado, coração, pâncreas e cérebro.
 
PESSOAS QUE NÃO DEVEM CONSUMIR ÁLCOOL
· Grávidas
· Passado de alcoolismo
· Histórico familiar de alcoolismo.
· Antecedentes de AVC hemorrágico 
· Doenças hepáticas e pancreáticas
· Cardiopatas, principalmente paciente com IC
ANAMNESE NA APS
O consumo do álcool deve ser abordado na consulta de forma respeitosa, tentando estabelecer
vínculo e uma relação de confiança com o usuário.
O consumo do álcool é um hábito frequente em nossa população; diante desse fato, é importante abordar o uso do álcool como algo rotineiro nas consultas.
Podemos realizar uma pergunta simples e direta:
“Você bebe cerveja, vinho ou alguma outra bebida alcoólica?”. Identificado o uso do álcool, a investigação tem de ser aprofundada o suficiente para se determinar o padrão atual do consumo (quantidade, frequência e repercussões na vida da pessoa), além de investigar história pregressa e familiar.
QUESTIÓNÁRIOS
Questionários orientam as perguntas e são capazes de detectar o uso abusivo e estabelecer critérios para o padrão do consumo.
O CAGE é um questionário curto e pode ser utilizado como triagem. Sua sigla é composta por palavras-chave de cada pergunta do teste, e duas ou mais respostas positivas indicam uso abusivo do álcool 
AUDIT
O AUDIT (teste para identificação de problemas relacionados ao uso de álcool), criado pela OMS nos anos 1980, é um questionário longo e composto por 10 perguntas que avaliam o padrão de consumo nos últimos 12 meses
TESTE PARA AVALIAÇÃO DE CONSUMO DE BEBIDAS ALCOÓLICAS - AUDIT
0-7 pontos – baixo risco de haver problemas relacionados ao álcool.
8-15 pontos – risco moderado de haver problemas relacionados ao álcool, possibilidade de já haver dependência.
16-19 pontos – risco elevado de haver problemas relacionados ao álcool e dependência
20 pontos ou mais – Com certeza há problemas relacionados ao álcool e há elevado risco de haver dependência também.
Para a organização do atendimento, na perspectiva da intervenção breve, utilizar o CAGE para a detecção do uso abusivo e, em um segundo encontro, aplicar o AUDIT para definir o padrão do consumo recente e pactuar algumas intervenções, caso necessárias.
EXAME FÍSICO
O exame físico deve ser completo, assim como é realizado em pessoas que não fazem uso abusivo do álcool. A complexidade do cuidado da pessoa em uso nocivo do álcool também se reflete no exame físico, já que vários sistemas podem estar acometidos, como gastrintestinal, cardiovascular e neurológico.
É importante estar atento a alguns achados, como tremores, telangiectasias e elevação da pressão arterial, que reforçam a hipótese de uso excessivo crônico de álcool.
EXAMES COMPLEMENTARES
Importante papel para a vigilância de complicações orgânicas decorrentes do álcool e para o usuário se perceber em acompanhamento, o que lhe dá segurança e estímulo para as metas a serem alcançadas.
Assim como o exame físico, nenhuma alteração precisa estar presente para confirmar o diagnóstico.
As alterações comumente esperadas são a macrocitose, a elevação das transaminases e da gama-glutamiltransferase (GGT).
Cerca de 90% dos alcoolistas têm macrocitose (VCM entre 100 e 110 fL) antes mesmo de a anemia aparecer. Essa alteração pode ser induzida pela ingestão regular de 80 g/dia de álcool (p. ex., uma garrafa de vinho). Após abstinência, os valores voltam à normalidade com 2 a 4 meses
A elevação de GGT é um indicador precoce da disfunção hepática. Pode ser evidenciada mesmo antes das alterações clínicas. Também é usada como marcador de abstinência em pessoas em tratamento
A doença hepática alcoólica pode estar associada a uma série de alterações laboratoriais. O padrão mais comum de alterações hepáticas em pessoas com hepatite alcoólica é a elevação desproporcional de aspartato aminotransferase-transaminase glutâmico-oxalética (AST/ TGO) comparada com a alanina aminotransferase-transaminase glutâmico-pirúvica (ALT/TGP). Essa razão é geralmente superior a 2,0, valor raramente visto em outras formas de doença hepática
O uso do álcool pode estar associado a comportamentos sexuais de risco, o rastreamento para as infecções sexualmente transmissíveis (ISTs), como HIV, sífilis e hepatites B e C, deve ser oferecido ao indivíduo
CONDUTA PROPOSTA
O cuidado oferecido às pessoas que consomem álcool pode ser organizado em etapas. As ações preventivas sempre serão a primeira escolha de abordagem
Para os indivíduos que desenvolvem problemas de uso crônico, o tratamento deve ser ofertado em níveis crescentes de intensidade, restrições e custos.Caso essa abordagem inicial não seja suficiente e o problema persistir, é necessária uma nova pactuação entre o usuário, a equipe de APS e outros níveis assistenciais.
Para situações de urgência, como a intoxicação alcoólica aguda (IAA) e a síndrome de abstinência do álcool (SAA), a abordagem inicial pode ser realizada pela equipe de APS.
ABORDAGEM PSICOSSOCIAL
Existem diversas ferramentas à disposição dos profissionais de saúde da APS para o cuidado de usuários de álcool. Entre estas, a abordagem psicossocial tende a ser a mais acessível e de menor custo.
A Intervenção Breve é uma estratégia terapêutica estruturada, focal e objetiva que deve ser utilizada por profissionais da APS . É considerada como a primeira escolha para abordagem a pessoas que apresentam suspeita de problemas com uso do álcool.
PASSO A PASSO DA INTERVENÇÃO BREVE 
FAMÍLIA, AMIGOS E REDES SOCIAIS
Existem diversas abordagens que incluem a família como coautora do surgimento do abuso e como instituição protetora para apoiar o cuidado: evidências crescentes demonstram a equivalência ou a superação de intervenções familiares e de redes sociais sobre abordagens individuais
ESPIRITUALIDADE, RELIGIOSIDADE E RELIGIÃO
Os aspectos-chave relacionados a esse tipo de cuidado são: apoio social, tratamento igualitário e aceitação livre de julgamentos: o envolvimento espiritual de uma pessoa não é um fator capaz de prever abstinência, porém, é capaz de prever afiliação e participação em grupos de AAs, que, por sua vez, é um fator capaz de prever abstinência
PROGRAMAS DE RECUPERAÇÃO EM 12 PASSOS
Entre os diversos programas, evidencia-se o AA: as evidências acerca do AA são controversas: para as pessoas que freqüentam o grupo, as taxas de abstinência são o dobro em relação a não participantes; maiores níveis de assiduidade estão relacionados a maiores taxas de abstinência e a participação prévia é um fator preditivo de abstinência
PLANTAS ANSIOLÍTICAS E SEDATIVAS
Chás de camomila e de folha do maracujá, entre outros, podem aliviar sintomas de ansiedade relacionados à abstinência
TRATAMENTO FARMACOLÓGICO
O tratamento farmacológico apresenta papel coadjuvante na abordagem terapêutica do uso abusivo do álcool. O seu principal efeito não é alcançar a abstinência, mas ajudar na sua manutenção e na prevenção de recaídas. A pessoa deve ser orientada sobre o uso devido das medicações e seus efeitos e receber apoio da família e da equipe de saúde para a adesão ao tratamento.
Naltrexona, dissulfiram e acamprosato são as principais medicações para o tratamento farmacológico do uso abusivo do álcool
O Dissulfiram é indicado para os usuários que necessitam alcançar a abstinência, porém, não é recomendado para aqueles que desejam o consumo moderado na estratégia de redução de danos.
É o primeiro medicamento aprovado pela Food and Drug Administration para tratamento do alcoolismo.
O dissulfiram inibe o aldeído-desidrogenase e, quando usado associado ao álcool, aumenta os níveis de acetaldeído, provocando reações desagradáveis, como palpitações, rubor, náuseas e vômitos (efeito antabuse). A dose habitual é de 250 mg/dia.
Naltrexona é indicada quando se deseja alcançar o consumo moderado, e a abstinência não é necessária.
A naltrexona é um antagonista opioide utilizado na dose habitual de 50-100 mg/dia, com duração de 3 a 4 meses, e pode estender-se de acordo com cada caso. É necessário o acompanhamento da função hepática.
Acamprosato é indicado para reduzir os sintomas da abstinência.
O acamprosato é um coagonista de receptores de glutamato, e não apresenta efeitos no humor, na concentração, na atenção e no desempenho psicomotor.
A dose habitual varia entre 1.300-2.000 mg/dia, divididos em 3 tomadas, por um período de 3 a 12 meses.
Deve-se analisar a necessidade do uso de antidepressivos e ansiolíticos para a redução de sintomas psíquicos, pois podem contribuir para a diminuição do desejo de consumo. Isso reforça a estratégia de redução de danos, que considera o uso do álcool dentro do contexto maior dos problemas da vida.
Atualmente, há novos fármacos em estudo que se mostram promissores no tratamento do uso abusivo do álcool. Anticonvulsivantes, como o topiramato e a gabapentina, podem reduzir o consumo de álcool em pessoas dependentes, inclusive na fase de síndrome de abstinência (com vantagem sobre os benzodiazepínicos, por interagirem menos com o álcool).
O baclofeno pode ser eficaz para manutenção da abstinência em pessoas com cirrose alcoólica . A ondasetrona parece ser eficaz na redução do uso no estágio inicial do alcoolismo.
QUANDO REFERENCIAR
Quando não há recursos suficientes para oferecer o cuidado necessário à pessoa com transtorno de uso de álcool, é necessário referenciar para um serviço especializado. Após o referenciamento, a equipe de APS permanece responsável pelo acompanhamento do tratamento do usuário.
A expansão e a organização da rede de saúde mental seguem as orientações e os desígnios da reforma psiquiátrica. Como referência, há os Centros de Atenção Psicossocial – Álcool e Drogas (CAPS-AD), serviço que trabalha com uma equipe multiprofissional (médico clínico, psiquiatra,
terapeuta ocupacional, psicólogo e assistente social) e atende pessoas com transtornos decorrentes do uso e da dependência de álcool e de outras drogas.
Sintomas moderados a graves devem ser acompanhados em centros de desintoxicação. Além disso, são indicações de tratamento hospitalar: depressão com ideação suicida, comorbidades clínicas ou psiquiátricas não controladas, situação do lar extremamente instável, falta de resposta ao tratamento ambulatorial.
Pessoas que durante o tratamento apresentam sintomas leves a moderados de abstinência podem ser acompanhadas de forma segura e eficaz na APS. Porém, se for desejo do usuário, pode ser referenciado a algum centro de referência para estar em ambiente livre de estímulos e evitar a recaída.
ESTÁGIOS DE MUDANÇA

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