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1 Khilver Doanne Sousa Soares Gastrite Estômago O estômago tem quatro regiões principais: a cárdia, o fundo gástrico, o corpo gástrico e a parte pilórica. A cárdia circunda a abertura do esôfago ao estômago. A porção arredondada superior e à esquerda da cárdia é o fundo gástrico. Inferior ao fundo gástrico está a grande parte central do estômago, o corpo gástrico. A parte pilórica pode ser dividida em três regiões. A primeira região, o antro pilórico, liga o corpo ao estômago. A segunda região, o canal pilórico, leva à terceira região, o piloro, que por sua vez se conecta ao duodeno. Quando o estômago está vazio, a túnica mucosa forma grandes rugas, as pregas gástricas, que podem ser vistas a olho nu. O piloro se comunica com o duodeno do intestino delgado por meio de um esfíncter de músculo liso chamado músculo esfíncter do piloro. A margem medial côncava do estômago é chamada curvatura menor; a margem lateral convexa é chamada curvatura maior. Fonte: TORTORA, Gerard J.; DERRICKSON, Bryan. Vista anterior das regiões do estômago. Princípios de Anatomia e Fisiologia. 14. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2016. A superfície da túnica mucosa é uma camada de células epiteliais colunares simples, chamada células mucosas da superfície. A túnica mucosa contém a lâmina própria (tecido conjuntivo areolar) e a lâmina muscular da mucosa (músculo liso). As células epiteliais se estendem até a lâmina própria, onde formam colunas de células secretoras chamadas glândulas gástricas. Várias glândulas gástricas se abrem na base de canais estreitos chamadas criptas gástricas. Secreções de várias glândulas gástricas fluem para cada cripta gástrica e, em seguida, para dentro do lúmen do estômago. Funções do Estômago Mistura a saliva, os alimentos e o suco gástrico para formar o quimo. Serve como reservatório para o alimento antes da liberação para o intestino delgado. Secreta suco gástrico, que contém HCl (mata bactérias e desnatura proteínas), pepsina 2 Khilver Doanne Sousa Soares (começa a digestão de proteínas), fator intrínseco (auxilia na absorção de vitamina B12) e lipase gástrica (auxilia na digestão de triglicerídeos). Secreta gastrina no sangue. Fonte: TORTORA, Gerard J.; DERRICKSON, Bryan. Vista tridimensional das camadas do estômago. Princípios de Anatomia e Fisiologia. 14. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2016. 3 Khilver Doanne Sousa Soares Vista em corte da túnica mucosa do estomago mostrando as glândulas gástricas e os tipos de células. Fonte: TORTORA, Gerard J.; DERRICKSON, Bryan. Túnica mucosa do fundo gástrico. Princípios de Anatomia e Fisiologia. 14. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2016. Fisiologia do Muco Estomacal/Suco Gástrico As glândulas gástricas contêm três tipos de células glandulares exócrinas que secretam seus produtos para o lúmen do estômago: as células mucosas do colo, as células principais gástricas e as células parietais. Tanto as células mucosas superficiais quanto as células mucosas do colo secretam muco. As células parietais produzem fator intrínseco (necessário para a absorção de vitamina B12) e ácido clorídrico. As células principais gástricas secretam pepsinogênio e lipase gástrica. As secreções das células mucosa, parietal e principal gástrica formam o suco gástrico, que totaliza 2.000 a 3.000 m ℓ /dia. Além disso, as glândulas gástricas incluem um tipo de célula enteroendócrina, a célula secretora de gastrina, que está localizada principalmente no antro pilórico e secreta o hormônio gastrina na circulação sanguínea. Como veremos em breve, esse hormônio estimula vários aspectos da atividade gástrica. DIGESTÃO MECÂNICA Alguns minutos depois de o alimento entrar no estômago, ondas de peristaltismo passam pelo estômago a cada 15 a 25 s. Poucas ondas peristálticas são observadas na região do fundo gástrico, que tem principalmente uma função de armazenamento. Em vez disso, a maior parte das ondas começa no corpo gástrico e se intensifica à medida que alcança o antro pilórico. Cada onda peristáltica move o conteúdo gástrico do corpo gástrico para baixo para dentro do antro pilórico, em um processo conhecido como propulsão. O óstio pilórico normalmente permanece quase, mas não completamente, fechado. Como a maior parte das partículas de alimento no estômago inicialmente são demasiadamente grandes para passar através do estreito óstio pilórico, elas são forçadas para trás para o corpo gástrico, em um processo conhecido como retropulsão. Ocorre então outra rodada de propulsão, movendo as partículas de alimentos de volta para o antro pilórico. Se as partículas de alimento continuam sendo demasiadamente grandes para passar através do óstio pilórico, a retropulsão ocorre novamente e as partículas são comprimidas de volta para o corpo gástrico. Em seguida, ocorre ainda outra rodada adicional de propulsão, e o ciclo continua se repetindo. O resultado líquido destes movimentos é que o conteúdo gástrico é misturado ao suco gástrico, por fim sendo reduzido a um líquido com consistência de sopa chamado quimo. Uma vez que as partículas de alimento no quimo são suficientemente pequenas, elas podem passar através do óstio pilórico, em um fenômeno conhecido como esvaziamento gástrico. O esvaziamento gástrico é um processo lento: apenas aproximadamente 3 mℓ de quimo se movem através do óstio pilórico de cada vez. Os alimentos podem permanecer no fundo gástrico durante aproximadamente 1 h sem serem misturados ao suco gástrico. Durante este tempo, a digestão pela amilase salivar das glândulas salivares continua. Logo, no entanto, a ação de agitação mistura o quimo com o suco gástrico ácido, inativando a amilase salivar e ativando a lipase lingual produzida pela língua, que começa a digerir os triglicerídeos em ácidos graxos e diglicerídios. Embora as células parietais secretem os íons hidrogênio (H+) e íons cloreto (Cl–) separadamente no lúmen do estômago, o efeito líquido é a secreção de ácido clorídrico (HCl). As bombas de prótons alimentadas pela H+K+ ATPase transportam ativamente o H+ para o lúmen enquanto trazem os íons potássio (K+) para 4 Khilver Doanne Sousa Soares dentro da célula. Ao mesmo tempo, o Cl– e o K+ se difundem para fora para o lúmen através dos canais de Cl– e K+ da membrana apical. A enzima anidrase carbônica, que é especialmente abundante nas células parietais, catalisa a formação de ácido carbônico (H2CO3) a partir da água (H2O) e dióxido de carbono (CO2). Quando o ácido carbônico se dissocia, ele fornece uma fonte pronta de H+ para as bombas de prótons, mas também produz íons bicarbonato (HCO3–). Conforme o HCO3– se acumula no citosol, ele sai da célula parietal na troca por Cl– via antiportadores Cl–HCO3– na membrana basolateral (próxima da lâmina própria). O HCO3- se difunde nos capilares sanguíneos próximos. Esta “maré alcalina” de íons bicarbonato entrando na corrente sanguínea após uma refeição pode ser grande o suficiente para elevar ligeiramente o pH do sangue e deixar a urina mais alcalina. Fonte: TORTORA, Gerard J.; DERRICKSON, Bryan. Secreção de HCl (ácido clorídrico) pelas células parietais do estômago; as bombas de próton, alimentadas pelo ATP, secretam H+; O Cl– se difunde para o lúmen do estômago através dos canais de Cl–. Princípios de Anatomia e Fisiologia. 14. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2016. A secreção de HCl pelas células parietais pode ser estimulada por várias fontes: a acetilcolina (ACh) liberada pelos neurônios parassimpáticos, a gastrina secretada pelas células secretoras de gastrina e a histamina, que é uma substância parácrina liberada pelos mastócitos na lâmina própria das proximidades. A acetilcolina e a gastrina estimulam as células parietais a secretar mais HCl na presença de histamina. Em outras palavras, a histamina atua sinergicamente, melhorando os efeitos da acetilcolina e da gastrina. Osreceptores das três substâncias estão presentes na membrana plasmática das células parietais. Os receptores de histamina nas células parietais são chamados receptores H2; eles medeiam respostas diferentes do que os receptores H1 envolvidos nas respostas alérgicas. Fonte: TORTORA, Gerard J.; DERRICKSON, Bryan. Regulação da secreção de HCl; a secreção de HCl pelas células parietais pode ser estimulada por diversas fontes: acetilcolina (ACh), gastrina e histamina. Princípios de Anatomia e Fisiologia. 14. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2016. O líquido fortemente ácido do estômago mata muitos microrganismos dos alimentos. O HCl desnatura parcialmente as proteínas dos alimentos e estimula a secreção de hormônios que promovem o fluxo da bile e do suco pancreático. A digestão enzimática das proteínas também começa no estômago. A única enzima proteolítica (que digere proteína) no estômago é a 5 Khilver Doanne Sousa Soares pepsina, que é secretada pelas células principais gástricas. A pepsina rompe certas ligações peptídicas entre os aminoácidos, fragmentando uma cadeia proteica de muitos aminoácidos em fragmentos peptídicos menores. A pepsina é mais efetiva no ambiente ácido do estômago (pH 2); torna-se inativa em um pH mais alto. O que impede que a pepsina digira as proteínas das células do estômago junto com os alimentos? Em primeiro lugar, a pepsina é secretada em uma forma inativa chamada pepsinogênio; nesta forma, ela não é capaz de digerir proteínas nas células principais gástricas que a produzem. O pepsinogênio não é convertido em pepsina ativa até que tenha entrado em contato com o ácido clorídrico secretado pelas células parietais ou moléculas de pepsina ativa. Em segundo lugar, as células epiteliais do estômago são protegidas do suco gástrico por uma camada de 1 a 3 mm de espessura de muco alcalino secretado pelas células mucosas da superfície e células mucosas do colo. Outra enzima do estômago é a lipase gástrica, que cliva os triglicerídeos (gorduras e óleos) das moléculas de gordura (como as encontradas no leite) em ácidos graxos e monoglicerídeos. Um monoglicerídeo é composto por uma molécula de glicerol ligada a uma molécula de ácido graxo. Esta enzima, que tem um papel limitado no estômago adulto, opera melhor a um pH entre 5 e 6. Mais importante do que qualquer lipase lingual ou lipase gástrica é a lipase pancreática, uma enzima secretada pelo pâncreas para o intestino delgado. Apenas uma pequena quantidade de nutrientes é absorvida no estômago, porque suas células epiteliais são impermeáveis à maior parte dos materiais. No entanto, as células mucosas do estômago absorvem um pouco de água, íons e ácidos graxos de cadeia curta, bem como determinados fármacos (especialmente o ácido acetilsalicílico) e álcool. Do estômago, o quimo passa para o intestino delgado, onde a digestão química dependerá da atividade do pâncreas, do fígado e da vesícula biliar. Gastrite/Doença Ácido Péptica A gastrite é um processo inflamatório da mucosa. Quando há a presença de neutrófilos, a lesão é conhecida como gastrite aguda. Quando células inflamatórias são raras ou estão ausentes, o termo gastropatia é aplicado; ele inclui um conjunto diverso de distúrbios, marcado por lesão ou disfunção gástrica. Agentes que causam a gastropatia incluem AINEs, álcool, bile e lesões por estresse. Erosão ou hemorragia mucosa aguda, como úlceras de Curling, ou lesões após o interrompimento do fluxo sanguíneo gástrico, por exemplo, na hipertensão portal, também causam a gastropatia que tipicamente progride para a gastrite. A luz gástrica possui um pH próximo de 1, mais do que um milhão de vezes mais ácido do que o sangue. Esse ambiente hostil contribui para a digestão, mas também tem o potencial de danificar a mucosa gástrica. Múltiplos mecanismos têm evoluído para proteger a mucosa gástrica. A mucina, secretada pelas células foveolares da superfície, forma uma camada fina de muco e fosfolipídios que evita que partículas grandes de alimento toquem diretamente o epitélio. A camada de muco também promove a formação de uma camada “inerte” de fluido sobre o epitélio que protege a mucosa e tem pH neutro, como resultado da secreção do íon bicarbonato pelas células epiteliais da superfície. Sob o muco, uma camada contínua de células epiteliais gástricas forma uma barreira física que limita a retrodifusão de ácido e o vazamento de outros materiais luminais, incluindo a pepsina, na lâmina própria. A substituição completa das células foveolares da superfície, a cada 3 a 7 dias, é essencial para a manutenção da camada epitelial e para a secreção do muco e bicarbonato dessas células. 6 Khilver Doanne Sousa Soares Fonte: KUMAR, V.; ABBAS, A.K.; FAUSTO, N.; ASTER, J.C. Mecanismos de lesão e proteção gástricas. Este diagrama ilustra a progressão das formas mais leves de lesão até ulcerações, que podem ocorrer com gastrite aguda ou crônica. As úlceras incluem camadas de necrose (N), inflamação (I) e tecido de granulação (G), mas cicatrizes fibrosas (C), as quais levam certo tempo para se desenvolver, ocorrem apenas em lesões crônicas. Bases Patológicas das Doenças. 9. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2016. Nas áreas do estômago em que há secreção de ácido, uma “onda alcalina” capilar é gerada conforme as células parietais secretam o ácido clorídrico na luz gástrica e bicarbonato nos vasos sanguíneos. Além de fornecer bicarbonato, o rico suprimento vascular da mucosa libera oxigênio e nutrientes enquanto remove o ácido que foi retrodifundido na lâmina própria. Mecanismos Protetores da Mucosa Afetados A. Anti-inflamatórios não esteroidais (AINEs) inibem a síntese de prostaglandinas E2 e I2 dependente da cicloxigenase (COX), as quais estimulam quase todos os mecanismos de defesa relatados, incluindo o muco, o bicarbonato e a secreção de fosfolipídios, fluxo sanguíneo da mucosa e restituição epitelial, enquanto reduz a secreção de ácido. Apesar de a COX-1 ter um papel mais importante do que a COX-2, ambas as isoenzimas contribuem para a proteção da mucosa. Portanto, enquanto o risco de lesão gástrica induzida por AINE é maior com inibidores não seletivos, como por exemplo a aspirina, ibuprofeno e naproxeno, a inibição de COX-2 seletiva, como no caso do celecoxibe, também pode resultar em gastropatia ou gastrite; B. A lesão gástrica que ocorre nos pacientes urêmicos e naqueles infectados com H. pylori secretor de urease pode ser decorrente da inibição dos transportadores gástricos de bicarbonato pelos íons amônio; C. A redução da secreção de mucina e de bicarbonato tem sido sugerida como um fator que explica o aumento da suscetibilidade de adultos mais velhos em relação à gastrite; D. A queda na liberação de oxigênio pode concorrer para uma incidência aumentada de gastrite aguda em altas atitudes. A ingestão de químicos agressivos, particularmente ácidos ou bases, tanto acidentalmente quanto por uma tentativa de suicídio, também resulta em lesão gástrica grave, predominantemente como resultado da lesão direta da mucosa epitelial e das células 7 Khilver Doanne Sousa Soares estromais. Danos celulares diretos também contribuem para a gastrite induzida pelo consumo excessivo de álcool, AINEs, terapia radioativa e quimioterapia. Gastrite Crônica A causa mais comum de gastrite crônica é a infecção com o bacilo H. pylori. A gastrite autoimune, a causa mais comum de gastrite atrófica difusa, representa menos de 10% dos casos de gastrite crônica, mas é a forma mais comum de gastrite crônica em pacientes sem infecção por H. pylori. No entanto, é importante reconhecer que infecções duradouras por H. pylori também podem resultar em gastrite atrófica, geralmente em um padrão multifocal em vez de um padrão difuso. Causas menos comuns de gastrite crônica incluem lesão por radiação, refluxo biliar crônico, lesão mecânica (p. ex., um tubo nasogástrico)e envolvimento por doenças sistêmicas, tais como a doença de Crohn, amiloidose (grupo de doenças raras, causadas pelo depósito de proteínas insolúveis no corpo) ou doença do enxerto-versus-hospedeiro. Gastrite por Helicobacter pylori H. pylori são bacilos em forma de espiral ou curva presentes em amostras de biópsia gástrica de quase todos os pacientes com úlceras duodenais, bem como na maioria dos indivíduos com úlceras gástricas ou gastrite crônica. A infecção por H. pylori não produz sintomas suficientes para que haja um alerta para cuidados médicos, na maioria dos casos; é a gastrite crônica que, por fim, faz com que o indivíduo busque tratamento. Organismos H. pylori estão presentes em 90% dos indivíduos com gastrite crônica que afeta o antro. A infecção por H. pylori apresenta-se, mais frequentemente, como uma gastrite predominantemente antral, com produção de ácido normal ou elevada. A produção de gastrina local pode ser aumentada, mas a hipergastrinemia (aumento do nível sérico da gastrina) é rara. Em outros pacientes, a gastrite progride para envolver o corpo gástrico e o fundo. Essa gastrite atrófica multifocal está associada a placas de atrofia da mucosa, redução da massa de células parietais e da secreção de ácido, metaplasia intestinal e risco aumentado de adenocarcinoma gástrico. Dessa forma, há um relacionamento inverso entre a úlcera duodenal e o adenocarcinoma gástrico, o qual se correlaciona com o padrão da gastrite. Os organismos H. pylori se adaptaram ao nicho ecológico fornecido pelo muco gástrico. Sua virulência está relacionada aos seguintes fatores: a. Flagelos, os quais permitem que a bactéria seja móvel no muco viscoso; b. Urease, que gera amônia da ureia endógena e assim eleva o pH gástrico local e aumenta a taxa de sobrevivência bacteriana; c. Adesinas, que acentuam a aderência bacteriana à superfície das células foveolares; d. Toxinas, como o gene A associado à citotoxina (CagA), que pode estar envolvido na progressão da doença. Fatores do hospedeiro também têm um papel importante na infecção por H. pylori. Polimorfismos genéticos, que resultam no aumento da expressão do fator de necrose tumoral (TNF), de citocinas pró-inflamatórias e interleucina-1β (IL-1β), ou a queda de expressão da citocina anti-inflamatória interleucina-10 (IL- 10), estão associados ao desenvolvimento de pangastrite, atrofia e câncer gástrico. A deficiência de ferro também pode ser um fator de risco para o câncer gástrico associado ao H. pylori. A rota da gastrite por H. pylori é, dessa forma, o resultado da interação entre as defesas das mucosas gastroduodenais, respostas inflamatórias e fatores de virulência bacteriana. Gastrite Autoimune A gastrite autoimune é responsável por menos de 10% dos casos de gastrite crônica. Ao contrário da gastrite associada ao H. pylori, a 8 Khilver Doanne Sousa Soares gastrite autoimune tipicamente poupa o antro e está associada à hipergastrinemia. A gastrite autoimune é caracterizada por: Anticorpos para células parietais e fatores intrínsecos que podem ser detectados no soro e nas secreções gástricas; Concentração sérica de pepsinogênio I reduzida; Hiperplasia de células endócrinas; Deficiência de vitamina B12; Secreção alterada de ácido gástrico (acloridria). A gastrite autoimune está associada à perda de células parietais, as quais são responsáveis pela secreção de ácido gástrico e fator intrínseco. A ausência da produção de ácido estimula a liberação de gastrina, resultando na hipergastrinemia e hiperplasia das células G antrais, produtoras de gastrina. A falta do fator intrínseco impede a absorção ileal de vitamina B12, levando, por fim, à deficiência de vitamina B12 e à anemia megaloblástica de início lento (anemia perniciosa). A reduzida concentração sérica de pepsinogênio I resulta da destruição de células principais. Apesar de a infecção por H. pylori poder causar atrofia gástrica e hipocloridria, ela não está associada à acloridria ou anemia perniciosa. Isto ocorre porque, diferentemente da atrofia difusa da gastrite autoimune, os danos da gastrite por H. pylori são multifocais e deixam áreas de células principais e parietais residuais. As células T CD4+ direcionadas contra os componentes da célula parietal, incluindo a H+, K+ -ATPase, são consideradas as principais agentes de lesões na gastrite autoimune. Isso é fundamental pela observação de que a transferência das células T CD4+ reativas para H+, K+ -ATPase, para camundongos normais resulta em gastrite e produção de anticorpos contra H+, K+ -ATPase. Não há evidência de uma reação autoimune às células principais, sugerindo que estas podem ter sido perdidas em virtude da destruição das glândulas gástricas durante o ataque autoimune às células parietais. Se a destruição autoimune for controlada pela imunossupressão, as glândulas podem repovoar- se, demonstrando que as células-tronco gástricas sobrevivem e são capazes de se diferenciar em células parietais e principais. Os anticorpos aos componentes das células parietais, mais proeminentemente a H+, K+ - ATPase ou a bomba de próton, além do fator intrínseco, estão presentes em até 80% dos pacientes com gastrite autoimune. No entanto, acredita-se que estes anticorpos não sejam patogênicos, porque nem o fator intrínseco secretado nem a bomba de prótons orientada para a luz estão acessíveis aos anticorpos circulantes, e a transferência passiva desses anticorpos não produz gastrite em animais experimentais. Todavia, a presença destes anticorpos é uma ferramenta útil para o diagnóstico. Aspectos clínicos. Anticorpos para células parietais e fator intrínseco estão presentes no início do curso da doença. A progressão para atrofia gástrica provavelmente ocorre ao longo de 2 a 3 décadas, e a anemia é vista somente em alguns poucos pacientes. Graças ao início lento e à progressão variável, os pacientes são geralmente diagnosticados somente após terem sido afetados por muitos anos. A idade média no diagnóstico é de 60 anos. As mulheres são levemente mais afetadas do que os homens. A anemia perniciosa e a gastrite autoimune estão geralmente associadas a outras doenças autoimunes, incluindo a tireoidite de Hashimoto, diabetes melito dependente de insulina (tipo I), doença de Addison, insuficiência ovariana primária, hipoparatireoidismo primário, doença de Graves, vitiligo, miastenia gravis e síndrome de Lambert-Eaton. Essas associações, juntamente com a concordância em alguns gêmeos monozigóticos e o agrupamento de doenças em famílias, dão respaldo à predisposição genética. Geralmente, cerca de 20% dos parentes de indivíduos com anemia perniciosa também têm gastrite autoimune, embora eles possam ser assintomáticos. 9 Khilver Doanne Sousa Soares A apresentação clínica pode estar ligada aos sintomas da anemia. A deficiência de vitamina B12 também pode causar glossite atrófica, na qual a língua fica lisa, robusta e vermelha, megaloblastose epitelial, diarreia por má absorção, neuropatia periférica, lesões da coluna vertebral e disfunção cerebral. Alterações neuropáticas incluem desmielinização, degeneração axonal e morte neuronal. As manifestações mais frequentes de neuropatia periférica são as parestesias e o entorpecimento. Complicações da Gastrite Doença Ulcerosa Péptica A doença ulcerosa péptica (DUP) refere-se à ulceração crônica da mucosa, que afeta o duodeno ou o estômago. Quase todas as úlceras pépticas estão associadas à infecção por H. pylori, AINEs ou ao consumo de cigarros. A forma mais comum da DUP ocorre dentro do antro gástrico ou duodeno, como resultado de uma gastrite antral induzida por H. pylori, a qual é associada com o aumento da secreção ácida gástrica, e com a queda da secreção de bicarbonato duodenal. Em contrapartida, a DUP dentro do fundo ou corpo gástrico geralmente vem acompanhada por menos secreção ácida, resultanteda atrofia da mucosa (associada, em alguns casos, com a gastrite crônica autoimune ou induzida por H. pylori). Apesar de esses pacientes ainda secretarem mais ácido do que indivíduos normais, eles são incapazes de secretar as grandes quantidades necessárias para vencer os mecanismos de defesa que “protegem” a mucosa duodenal e do antro. Dessa forma, indivíduos com atrofia da mucosa gástrica são geralmente protegidos contra úlceras antrais e duodenais. A DUP também pode ser causada pela secreção ácida da mucosa gástrica ectópica dentro do duodeno ou por um divertículo de Meckel ileal. A DUP pode ocorrer também no esôfago como resultado da DRGE ou da secreção de ácido pela mucosa gástrica ectópica esofágica A DUP resulta de desiquilíbrios entre os mecanismos de defesa da mucosa e fatores lesivos que causam a gastrite crônica. Logo, a DUP geralmente se desenvolve em um ambiente de gastrite crônica. As razões pelas quais algumas pessoas desenvolvem somente a gastrite crônica enquanto outras desenvolvem a DUP, são pouco entendidas. No entanto, assim como ocorre com a gastrite por H. pylori, é provável que fatores de hospedeiros, bem como a variação entre cepas bacterianas, estejam envolvidos. As úlceras pépticas podem ser lesões crônicas, recorrentes, com morbidade significativa. A maioria das úlceras pépticas chama a atenção clínica por causa da queimação epigástrica ou dor forte, embora uma fração significativa apresente complicações como anemia por deficiência de ferro, hemorragia ou perfuração. A dor tende a ocorrer de 1 a 3 horas após as refeições durante o dia, sendo pior à noite (geralmente entre às 11 da noite até as 2 da manhã) e é aliviada por álcalis ou alimentos. Náusea, vômito, distensão, arrotos e perda de peso significativa são manifestação adicionais. Com úlceras penetrantes, a dor é ocasionalmente referida às costas, o quadrante esquerdo superior, ou ao tórax, onde pode ser interpretada erroneamente como de origem cardíaca. _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ 10 Khilver Doanne Sousa Soares _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ REFERÊNCIAS MARTINS, Mílton de Arruda. et. al. Clínica Médica, 1. ed. São Paulo: Manole, 2009. FILHO, Geraldo Brasileiro. Bogliolo Patologia. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2016. Guyton, Arthur C.; Hall, John E. Tratado de Fisiologia Médica. 13. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2017
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