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Júlia Figueirêdo – APARECIMENTO E MANIFESTAÇÕES EXTERNAS DAS DOENÇAS E IATROGENIAS PÊNFIGOS: O termo “pênfigo” se refere a um grupo de doenças cutâneas (e, eventualmente, mucosas), que são unidas pela presença de bolhas em níveis distintos da pele, decorrentes da perda de adesão entre células epiteliais (acantólise). Essa disfunção ocorre devido à síntese de autoanticorpos contra as desmogleínas, proteínas que compõem as estruturas que mantém a coesão dos queratinócitos. Sítios preferenciais para a formação de bolhas (elipses) nos pênfigos e quadros penfigoides Outro aspecto comum a essas condições é a presença de sinal de Nikolsky positivo, com descolamento da pele sã após tração aplicada pelo examinador. Apesar de não ser exclusivo dos pênfigos, é um importante recurso diagnóstico. PÊNFIGO VULGAR: Descreve a forma mais grave das doenças penfigoides, surgindo com lesões ulceradas em mucosa oral, que podem perpetuar por meses até o desenvolvimento de lesões na pele. Pode afetar todas as faixas etárias, porém é mais prevalente entre os 40 e 60 anos, com certa predominância em judeus Ashkenazi. As úlceras orais, encontradas em até 90% dos pacientes, são mais frequentes no palato, gengivas e na parte interna das bochechas, de modo semelhante às aftas, dificultando a alimentação. Também pode haver acometimento de outras mucosas, como a conjuntival, genital e a das vias aéreas superiores. Lesão ulcerada na mucosa bucal por pênfigo vulgar O pênfigo vulgar pode também evoluir para acometimento cutâneo, caracterizado pelo desenvolvimento de bolhas flácidas sobre pele normal ou eritematosa. As áreas mais acometidas são couro cabeludo, face, axilas e virilha. A ruptura dessas lesões é quase inevitável, criando erosões úmidas, confluentes e dolorosas, em aspecto de ‘bife sangrante”. Neonatos nascidos de mães com pênfigo vulgar podem apresentar manifestações transitórias dessa condição, com resolução espontânea e alguns meses (evidencia passagem transplacentária de anticorpos) As feridas evoluem sem formar cicatrizes, porém há discromia (hipo ou hipercromia) nos sítios acometidos Júlia Figueirêdo – APARECIMENTO E MANIFESTAÇÕES EXTERNAS DAS DOENÇAS E IATROGENIAS Lesões ulceradas e sangrantes na apresentação cutânea do pênfigo vulgar O diagnóstico do pênfigo vulgar é confirmado por meio de exames citológico e histopatológico (acantólise baixa em área suprabasal), assim como pela imunofluorescência direta, para detectar depósitos de autoanticorpos. À avaliação imunológica, observam- se anticorpos contra desmogleínas 1 e 3, sendo a última responsável pelo comprometimento mucoso. Presença de acantólise e deposição de anticorpos na camada espinhosa da pele no pênfigo vulgar Esse é um quadro crônico, marcado por períodos de exacerbação e remissão, com possível evolução para óbito na ausência de tratamento. Dessa forma, recomenda-se o uso de prednisona (1-2 mg/kg/dia), cuja eficácia deve ser avaliada após 7 a 10 dias. Na ausência de resposta, é feita associação com azatioprina (2 mg/kg/dia), um imunossupressor. Nos pacientes que seguem refratários, pode ser feito esquema de pulsoterapia endovenosa com metilprednisolona (1 g/dia), por 3 dias, ou rituximabe (375 mg/m² semanais), ao longo de 1 mês. PÊNFIGO FOLIÁCEO: Essa doença apresenta duas subdivisões, clinicamente indistinguíveis, uma não endêmica (“de Cazenave”), de distribuição universal em indivíduos de 40-50 anos, e a outra, endêmica (fogo selvagem), incidindo predominantemente em crianças e jovens. No Brasil, o pênfigo foliáceo endêmico é observado em áreas rurais dos estados de Goiás, Minas Gerais, Paraná e São Paulo. O quadro clínico típico cursa com bolhas flácidas superficiais que se rompem com facilidade, levando ao desenvolvimento de erosões e áreas cobertas por crostas ou escamas (aspecto de “salpicos de lama”). Também há ocorrência de sensação de ardor e aumento da sensibilidade ao frio, com agravamento dos sintomas após a exposição solar. Crostas em paciente com pênfigo foliáceo (a observação de bolhas intacta é rara) A corticoterapia é mantida até a cicatrização das lesões, que ocorre em 3 a 4 semanas, período após o qual deve ser feito desmame lento Todos os pacientes em tratamento para o pênfigo vulgar devem receber profilaxia para estrongiloidíase Júlia Figueirêdo – APARECIMENTO E MANIFESTAÇÕES EXTERNAS DAS DOENÇAS E IATROGENIAS As lesões surgem primeiramente na face, pescoço e porção superior do tronco, podendo permanecer concentradas por meses ou anos (forma localizada) ou se disseminarem em sentido simétrico e craniocaudal. Após a suspeita clínica, o diagnóstico deve ser confirmado por meio de exames complementares, como provas imunológicas (imunofluorescência direta) e a biópsia das lesões. Os autoanticorpos encontrados se direcionam à desmogleína-1, presente nos desmossomos cutâneos, o que justifica a ausência de envolvimento das mucosas. Nos testes histopatológicos, há presença de clivagem intraepidérmica subcórnea ou granulosa, ou seja, a acantólise ocorre em estratos mais altos. Comparação imunohitológica entre os pênfigos vulgar e foliáceo O tratamento com corticoides é a abordagem de escolha para o pênfigo foliáceo, empregando prednisona (1 mg/kd/dia) por 7 a 10 dias. Caso não ocorra resposta nesse prazo, recomenda-se a substituição por triamcinolona. O desmame só é iniciado após a resolução completa das lesões, reduzindo gradualmente a dose de acordo com a evolução clínica no período. Ainda que imunossupressores tenham pouca eficácia na abordagem contra esse tipo de dermatose, casos refratários à corticoterapia recebem micofenolato mofetil (35 a 45 mg/dia) em associação à medicação inicial. Sulfonas e cloroquina também podem ser incluídos ao manejo de formas leves e resistentes, ou frente à dificuldade de redução da dose dos esteroides. PENFIGOIDE BOLHOSO: O penfigoides bolhoso é uma doença autoimune subepidérmica, mais comum em idosos > 60 anos, marcada pela presença de anticorpos IgG contra proteínas da zona da membrana basal (ZMB). Como manifestações clínicas destacam-se as bolhas grandes e tensas, com conteúdo claro ou hemorrágico, que se fixam sobre pele normal ou eritematosa, com caráter altamente pruriginoso. Há predomínio das lesões na face interna das coxas, virilha axilas e parte inferior do abdome, apesar de poderem se disseminar por todo o corpo. O pênfigo vulgar é o principal diagnóstico diferencial a ser considerado, porém também é necessário considerar a dermatite seborreica e o lúpus eritematosos sistêmico Assim como no pênfigo vulgar, a profilaxia contra estrongiloidíase é obrigatória Júlia Figueirêdo – APARECIMENTO E MANIFESTAÇÕES EXTERNAS DAS DOENÇAS E IATROGENIAS As mucosas são afetadas em até 35% dos casos, normalmente limitadas à região oral (poupando lábios). O diagnóstico requer, assim como nos tipos supracitados de pênfigo, a confirmação por exames complementares. Na análise histopatológica, observa-se que não há acantólise (acometimento subepidérmico), mas sim a presença de infiltrado inflamatório. O sítio para realização da biópsia deve se situar na área perilesional, idealmente em áreas flexoras. A imunofluorescência direta irá detectar a presença de depósitos de autoanticorpos na ZMB, porém é necessário realizar também a imunofluorescência indireta para diferenciar o penfigoides de outras doenças, uma vez que anticorpos circulantes são comuns no quadro. Comparação entre as áreas lesadas no pênfigo vulgar (B) e no penfigoides bolhoso (C) O tratamento é realizado com ouso de prednisona sistêmica (1 mg/kg/dia), mantida até o controle das lesões, diminuindo gradualmente a dose a partir de então. Outras opções são a dapsona (100 mg/dia), o metotrexato (5 mg/semana), a azatioprina (2 mg/kg/dia), imunoglobulina endovenosa e a plasmaférese. DERMATITE HERPETIFORME: A dermatite herpetiforme é uma dermatose bolhosa crônica associada à doença celíaca na qual ocorre deposição granular de IgA na ZMB ou na derme papilar, visíveis na imunofluorescência direta. A incidência desse quadro é maior entre os 30 e 40 anos, e mais comum em caucasianos. As lesões características são pápulas/vesículas pruriginosas (escoriação é frequente) que evoluem para bolhas tensas simétricas, com tendência a formação de aglomerados semelhantes aos observados na infecção por herpes simples. Normalmente não há acometimento mucoso. As áreas predominantemente afetadas são a face externa dos cotovelos e joelhos, linha de implantação do cabelo, fronte, sacro, nádegas e região escapular. Como diagnósticos diferenciais destacam-se a epidermólise bolhosa adquirida, o lúpus eritematoso sistêmico bolhoso, a dermatite herpetiforme e a dermatose por IgA linear Formas localizadas da doença também podem ser abordadas com a administração de corticoides tópicos Mesmo com a correlação com a intolerância ao glúten, a maior parte dos doentes não possuem sintomas gastrintestinais, ainda que apresentem inflamação mucosa/submucosa ou atrofia do intestino, causando má absorção nutricional Júlia Figueirêdo – APARECIMENTO E MANIFESTAÇÕES EXTERNAS DAS DOENÇAS E IATROGENIAS O diagnóstico é feito por meio de correlações clínico-histológicas, que podem ser complementadas com investigação de lesões jejunais. A biópsia cutânea deve ser obtida de áreas próximas às bolhas, evidenciando achados subepidérmicos não acantolítico com inflamação na derme papilar. A imunofluorescência direta é responsável por fechar o diagnóstico, uma vez que demostra a presença de IgA nas camadas profundas da epiderme, sem se refletir na circulação (a avaliação indireta é negativa). O tratamento dessa condição é baseado na restrição rigorosa de glúten na dieta, complementada ao uso de sulfona (100 mg/dia). Essa estratégia é considerada como um fator protetor para as neoplasias comumente associadas à dermatite herpetiforme, como os linfomas. Os diagnósticos diferenciais a serem considerados são o eritema polimorfo, a escabiose, o penfigoides bolhoso, a dermatite por IgA linear e a herpes gestacional
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