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1 APS – DIREITO PROCESSUAL PENAL – 6º SEMESTRE 2020.1 PRINCÍPIOS QUE NORTEIAM O PROCESSO PENAL Nome: Davi Natã Wanzeler Cassolla RA: 1732931 Turma: 003206A02 APS – Processo Penal – Professor Eduardo Sorrentino. 1. Princípios: Ampla Defesa e Contraditório 2. Agravo Regimental no Recurso Ordinário em Habeas Corpus (RHC) nº 83.589 – RJ, Relator Ministro Rogério Schietti Cruz, Sexta Turma – STJ, Julgado em 20/08/2019. 3. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO. TRANCAMENTO DO PROCESSO. ACESSO À MÍDIA DAS INTERCEPTAÇÕES. AMPLA DEFESA E CONTRADITÓRIO. OBSERVÂNCIA. NÃO PROVIDO. 1. Não há previsão legal para suspensão da ação penal com o escopo de que a defesa tenha tempo hábil de examinar elementos probatórios produzidos na fase pré- processual. 2. No caso, verifica-se que "antes de ofertar as alegações finais, tanto defesa quanto acusação tiveram acesso às respectivas degravações, e inclusive, a pedido, foi prorrogado à defesa, por 10 dias, o prazo para que pudesse ofertar suas alegações finais". 3. Não se verifica a alegada violação aos princípios da ampla defesa e do contraditório se a parte teve acesso às provas para apresentação de alegações finais logo após a manifestação ministerial, mesmo que elas tenham sido juntadas aos autos tardiamente. 4. Por se tratar de procedimento afeto ao Tribunal do Júri, a defesa ainda tem a oportunidade de requerer novas diligências, ouvir testemunhas, ou mesmo, de contraditar a própria mídia, nos termos do que dispõe os arts. 422 e 423, ambos do CPP. 5. Agravo regimental não provido. 2 (grifo meu) (AgRg no RHC 83.589/RJ, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 20/08/2019, DJe 30/08/2019) 4. O referido julgado tratou do princípio constitucional da ampla defesa e do contraditório, corolários do Processo Penal. Ambos estão previstos na Constituição Federal em seu art. 5º, Inciso LV. O princípio da ampla defesa consiste na plena garantia do acusado de se defender por todos os meios legais possíveis, ou seja, que o sistema lhe faculta, da imputação de um crime, permitindo que o acusado constitua defensor em seu favor, e se tratando de direito fundamental, ele é irrenunciável, ou seja, mesmo se ao acusado não o quiser, a defesa técnica é imprescindível. Podemos trazer à baila os ensinamentos de Vicente Greco Filho e Edilson Mougenot Bonfim: “Consiste a ampla defesa na oportunidade de o réu contraditar a acusação, mediante a previsão legal de termos processuais que possibilitem a eficiência da defesa, como já se disse.”1 “O princípio da ampla defesa consubstancia-se no direito das partes de oferecer argumentos em seu favor e de demonstrá-los, nos limites em que isso seja possível. (…) Não supõe o princípio da ampla defesa uma infinitude de produção defensiva a qualquer tempo, mas, ao contrário, que esta se produza pelos meios e elementos totais de alegações e provas no tempo processual oportunizado por lei”2 Nesse sentido, tal princípio abrange a persecução penal como um todo, tanto em sua fase inquisitiva quando em sua fase acusatória. Sendo tão abrangente, ele acaba por originar princípios para garantir sua efetiva aplicação. O princípio do contraditório entra neste ponto, decorrente da ampla defesa, ele consiste na oportunidade das partes de participarem ativamente dos atos do processo, tendo ciência e se manifestando sobre cada ato. Na definição do Dr. Edilson Mougenot: “O princípio do contraditório significa que cada ato praticado durante o processo seja resultante da participação ativa das partes. Origina-se do brocardo audiatur et altera pars. (…) Relevante é que o juiz, antes de proferir cada decisão ouça as partes, 1 Greco, Vicente Filho, Manual de Processo Penal / Vicente Greco Filho – 11º ed. rev e atual. – São Paulo: Saraiva, 2015 (com a colaboração de João Daniel Rassi). Pg. 77 2 Mougenot, Edilson – Curso de processo penal / Edilson Mougenot. – 13ª ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2019. Pg. 99 3 dando-lhe igual oportunidade para que se manifestem, apresentando argumentos e contra-argumentos. Destarte, o juiz, ao proferir a decisão, deve oferecer às partes oportunidade para que busquem, pela via da argumentação, ou juntando elementos de prova, se for o caso, influenciar a formação de sua convicção (contraditório material).”3 No julgado ementado em epígrafe, o Agravo Regimental no Recurso Ordinário em Habeas Corpus interposto pela defesa do acusado em julgamento no rito do tribunal do júri por homicídio qualificado, objetivou o reconhecimento da violação dos princípios da ampla defesa e do contraditório na primeira fase do rito do júri (formação do juízo de prelibação). Requerendo em sede liminar a suspensão da ação penal e no mérito a nulidade da ação penal até o momento da resposta à acusação, pois as mídias de interceptações telefônicas que embasaram a pronúncia foram juntadas aos autos principais da ação penal em tese, tardiamente, após o encerramento da instrução criminal. Não obstante a isso, o Ilmo. Ministro Relator expõe claramente que a transcrição do conteúdo da mídia estava disponível às partes desde o encerramento da primeira fase da persecução penal em procedimento cautelar apensado aos autos, e não suficiente, assim como pugnou a defesa na audiência de instrução e julgamento, após a fase de instrução e antes do oferecimento das alegações finais, as mídias foram juntadas no processo crime, tanto que a defesa requereu e foi atendida com o prazo de 10 dias para análise da mídia juntada a fim de se manifestar sobre tal prova em sede de alegações finais, assim como o Órgão Acusatório que apenas se manifestou sobre tal prova em alegações finais. Diante destes fatos, a sexta turma negou provimento ao Recurso. A importância da ampla defesa e do decorrente contraditório dentro do processo crime representam os direitos fundamentais tanto da defesa quanto da acusação de: para a defesa, se defender das acusações imputadas, e para ambos, de se manifestarem sobre os atos praticados dentro do processo para influírem no livre convencimento do juiz, buscando a verdade real. Tais princípios garantem a democratização do procedimento de persecução penal e afastam a sana do Estado em punir a qualquer custo. 5. Da leitura do Acórdão, infere-se que realmente não houve a violação ao princípio da ampla defesa e tampouco ao do contraditório. Tendo em mente a definição dos princípios e quais são seus objetivos dentro do procedimento de persecução penal, a defesa alegou que houve a violação, pois, a juntada tardia da prova a que deveria se manifestar impediu o exercício 3 Mougenot, Edilson – Curso de processo penal / Edilson Mougenot. – 13ª ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2019. Pg. 97 4 da ampla defesa e do contraditório. Insano seria reconhecer tal violação visto que a juntada da mídia após a instrução foi pugnada pela própria defesa e que ainda nesse sentido, tanto a defesa quanto a acusação tinham acesso a transcrição da mídia desde o encerramento da investigação criminal, juntada em procedimento cautelar apenso, o que possibilitava a manifestação da defesa sobre a prova em qualquer momento do processo, podendo exercer assim o contraditório. Ainda mais que não lhe foi cerceado o direito a ampla defesa visto que a defesa técnica foi devidamente constituída e inclusive as alegações finais foram apresentadas e com prazo acrescido de 10 dias para evitar uma análise perfunctória da referida prova, que se mostrou tão importante. É claro que a ampla defesa e o contraditório garantem a manutenção de um processo penal mais democrático e conforme a legislação pátria. Se revelam tão caros ao direito penal e processual penal que o STF editou a Súmula Vinculante 14, que trata do direito que tem o defensor constituído para os interesses do representado, em ter acesso aos elementos de provadocumentados em procedimento investigatório, os quais dizem respeito ao exercício de seu direito de defesa. Diante disso, foram garantidos no referido procedimento de persecução penal o contraditório e a ampla defesa, tão importantes para a defesa do acusado. Acertada a decisão do STJ seguindo tanto os precedentes do pretório excelso quanto a jurisprudência da mesma corte. 1. Princípio: Presunção de Inocência 2. “Habeas Corpus Criminal nº 2060646-44.2020.8.26.0000, Relatora Gilda Alves Barbosa Diodatti, 15ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, julgado em 14/05/2018 e publicado em 25/04/2020. 3. HABEAS CORPUS. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES E CONDUÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR SEM HABILITAÇÃO. REVOGAÇÃO DA CUSTÓDIA CAUTELAR. IMPOSSIBILIDADE. 1. Presença dos requisitos e pressupostos da prisão processual. Cabimento da prisão preventiva. Fundamentação idônea na origem. Prisão flagrancial do paciente, que, em tese, trazia consigo, para fins de tráfico, 140 porções de maconha (287,2 gramas) e outros 16,3 gramas da mesma droga, na forma de "Skunk", 60 porções de cocaína (32,8 gramas) e 1.960 mililitros de 5 lança-perfume, sem autorização e em desacordo com determinação legal, enquanto dirigia uma motocicleta, sem habilitação para tanto. Gravidade concreta dos delitos imputados ao paciente e reincidência, a indicar o risco que a sua liberdade traz à persecução penal e ao meio social. Elementos concretos indicativos de que a soltura do paciente colocará em risco a ordem pública, a aplicação da lei penal e a instrução criminal. 2. Insuficiência, ao menos por ora, da imposição de medidas de contracautela diversas (artigo 319 do CPP). 3. Sendo a prisão preventiva decretada com estrita observância da sistemática processual vigente, não há que se falar em ofensa ao princípio constitucional da presunção de inocência. 4. Inexistência de contrariedade à Recomendação CNJ nº 62/2020, sobretudo porque não há comprovação de que fora do cárcere o paciente, acusado de crime grave, e não pertencente ao chamado grupo de risco, estaria em melhores condições de isolamento em relação à situação atual, ou que esteja privado do devido acompanhamento médico na prisão. 5. Demais questões (v. g. potencial turbidez da confissão e alegação de que o paciente não levava drogas) que se relacionam ao mérito, inviável o seu exame nos estreitos limites deste writ. 6. Impetração conhecida parcialmente e, na parte conhecida, denegada a ordem. (grifo meu) (TJSP; Habeas Corpus Criminal 2060646-44.2020.8.26.0000; Relator (a): Gilda Alves Barbosa Diodatti; Órgão Julgador: 15ª Câmara de Direito Criminal; Foro Central Criminal Barra Funda - 14ª Vara Criminal; Data do Julgamento: 14/05/2018; Data de Registro: 25/04/2020) 4. O julgado acima ementado tratou essencialmente do princípio da presunção de inocência. O referido princípio, positivado na carta maior em seu art. 5º, Inciso LVII, expõe o Direito fundamental e inerente a todos de que: ninguém será considerado culpado - comprovação da autoria de um fato delitivo com a aplicação de uma sanção penal - sem que reste comprovada a prática do crime pelo trânsito em julgado de uma sentença penal condenatória. Ou seja, não há que se falar no processo penal brasileiro em presunção de culpa, para ser considerado culpado o acusado deve ser devidamente submetido ao procedimento de persecução penal garantido pelos princípios do devido processo legal, do contraditório, ampla defesa e todos os princípios a ele inerentes que garantem um processo justo e conforme a constituição. Contudo, insta ressaltar o que o próprio texto constitucional implicitamente 6 denota: a presunção de inocência é Juris Tantum4, e ao passar pelo devido processo legal, o Estado Juiz entender pela condenação e essa condenação transitar em julgado, considerar-se-á o acusado culpado. Nesta esteira, sendo a inocência o “estado natural”, revela o caráter implícito actori incumbit probatio5, de que o ônus de provar a culpa do acusado é da acusação e não da defesa. No julgado analisado, foi impetrado no TJ/SP, Habeas Corpus pelo paciente que alega constrangimento ilegal por parte da Ilma. Juíza da 14ª Vara Criminal do Foro Central da Capital (SP) nos autos do processo crime em que está sendo denunciado por tráfico de drogas (art. 33, caput da Lei 11.343/06) e por dirigir sem habilitação (art. 309 CTB), que em decisão ao pedido de liberdade provisória do acusado, não concedeu a liberdade, tampouco as medidas cautelares previstas no art. 319 do CPP, da prisão efetuada em flagrante e convertida em preventiva na Audiência de Custódia. Na referida writ o paciente alega violação ao princípio da presunção de inocência fundamentando a impossibilidade de manutenção de uma prisão processual sendo que não há provas concretas do cometimento do delito e que a gravidade do delito pouco importa nesse sentido, invocando o princípio da presunção de inocência. Tal princípio é de suma importância para garantir os direitos fundamentais do acusado, visto que no Brasil é Estado Democrático de Direito e para evitar possíveis ilegalidades estatais, ante a hipossuficiência do cidadão/acusado nessa relação. Nas palavras de Guilherme de Souza Nucci: “Tem por objetivo garantir, primordialmente, que o ônus da prova cabe à acusação e não à defesa. As pessoas nascem inocentes, sendo esse o seu ‘estado natural’, razão pela qual, para quebrar tal regra, torna-se indispensável ao Estado-acusação evidenciar, com provas suficientes, ao Estado-juiz, a culpa do réu. (…) Por outro lado, confirma a excepcionalidade e a necessariedade das medidas cautelares de prisão, já que indivíduos inocentes somente podem ser levados ao cárcere quando realmente for útil a instrução e à ordem pública. A partir disso, deve- se evitar a vulgarização das prisões provisórias, pois muitas delas terminam por 4 Para Norberto Avena: “Classificam-se em absolutas (presunções jure et de jure) ou relativas (presunções juris tantum). As primeiras não aceitam prova em contrário, sendo exemplo a condição de inimputável do indivíduo menor de dezoito anos. Já as segundas admitem a produção de prova em sentido oposto, como a presunção de imputabilidade do maior de dezoito anos, que pode ser descaracterizada a partir de laudo de insanidade mental apontando que o indivíduo não possui discernimento.” – Avena, Norberto – Processo penal / Norberto Avena. – 11ª ed. – Rio de Janeiro: Forense, São Paulo: MÉTODO, 2019 (E-PUB) 5 Mougenot, Edilson – Curso de processo penal / Edilson Mougenot. – 13ª ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2019. Pg. 102 7 representar uma nítida – e indevida – antecipação de pena, lesando a presunção e inocência.”6 Com isso consignado, insta ressaltar que o princípio da presunção de inocência não inibe as prisões processuais. Tanto o legislador ao criar o art. 312 do Código de Processo Penal, quanto os Tribunais ao formarem sua jurisprudência, cuidaram de aclarar a situação expondo que presentes o fumus comissi delicti7 e o periculum libertatis8, é possível a decretação da prisão preventiva como forma de garantir a efetividade da persecução penal, assim como a ordem social. O Tribunal ao julgar a writ denegou a ordem expondo que estão presentes os pressupostos legais da prisão preventiva e que não há violação do referido princípio pois a apreensão do farto produto criminoso que o acusado portava e a reincidência são suficientes para embasar a medida, afastando a ilegalidade de tal. 5. Da análise do julgado é possível concluir a importância do princípio da presunção de inocência para o Direito Processual Penal, sendo ele, inerente ao estado democrático de direito. Tal princípio tem uma carga história muito grande, como expõe o Professor Edilson Mougenot: “o princípio se positiva pela primeira vez no art. 9º da Declaração dos Direitos do Homem edo Cidadão (Paris, 26.8.1789), inspirado na razão iluminista (Voltaire, Rousseau etc.). Posteriormente, foi reafirmado no art. 26 da Declaração Americana de Direitos e Deveres (22.5.1948) e no art. 11 da Declaração Universal dos Direitos Humanos, na Assembleia das Nações Unidas (Paris, 10.12.1948).”9 É inimaginável atualmente pensar na possibilidade de uma “presunção de culpa” ao vermos que existe toda uma evolução história para a conquista desse Direito Fundamental, sendo que se quisermos caminhar para uma democracia cada vez mais aperfeiçoada, devemos sempre assegurar a presunção da inocência, freando a sana do Estado. Perfazendo, o Acórdão proferido resolve muito bem as questões ventiladas pelo paciente. Ressalto aqui um ponto interessante consignado no voto da Relatora, que trouxe à baila o entendimento do STJ ao consignar na RT 686/388 - STJ - RHC 1.322 - 6.ª Turma - j. 12/8/1991 - julgado por Luiz Vicente Cernicchiaro - DJU 2/9/1991- “que o princípio em questão 6 Nucci, Guilherme de Souza – Manual de processo penal / Guilherme de Souza Nucci. – Rio de Janeiro: Forense, 2020. Não Paginado 7 “Fumaça da prática de um delito” – Denota a presença de autoria e materialidade 8 “Existência de perigo causado pela liberdade do sujeito passivo da persecução penal” 9 Mougenot, Edilson – Curso de processo penal / Edilson Mougenot. – 13ª ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2019. Pg. 100 8 não alcança os institutos do Direito Processual, como a prisão preventiva”. Não há realmente que se falar na violação do princípio da Presunção de Inocência visto que os elementos materiais coadunam com a decretação da prisão preventiva. Tanto a magistrada que determinou a manutenção da prisão quanto o Tribunal atuaram dentro dos limites legais respeitando os princípios que permeiam o processo penal. Notável mencionar aqui o julgamento das ADCS 43, 44 e 54 pelo STF que trataram precipuamente da prisão após a confirmação da condenação em 2ª Instância e o Princípio da Presunção de Inocência. Muito foi falado no “mundo jurídico” sobre esse julgamento. Dou aqui minha opinião pessoal que, muito acertada a decisão tomada pelo pretório excelso, manteve o respeito ao referido princípio assentando a constitucionalidade do art. 283 do Código de Processo Penal, reconhecendo a impossibilidade de decretar a prisão do acusado após a confirmação da condenação em 2ª Instância. 1. Princípio: Favor Rei ou “In Dubio Pro Reo” 2. Ação Penal nº 678 - Maranhão, Relator Ministro Dia Toffoli e Revisor Ministro Luiz Fux, Primeira Turma - STF, julgado em 18/11/2014. 3. Ação penal. Ex-secretário de estado. Deputado Federal. Peculato (art. 312 do CP). Desvio de colchões doados pelo governo federal para auxílio a vítimas de enchentes. Entrega e desvio dos bens para uso em evento da agremiação política a que o réu se encontra filiado. Alegada determinação do acusado para a cessão do material. Prova precária de envolvimento do réu no ilícito. Incidência do in dubio pro reo e do favor rei. Pedido julgado improcedente, com a absolvição do réu com fundamento no art. 386, VII, do Código de Processo Penal. 1. A conduta incriminada consiste no desvio, para fins diversos daqueles a que legalmente destinados (socorrer vítimas de enchentes), de colchões doados pelo Governo Federal à Defesa Civil do Estado do Maranhão, os quais, por ordem do ora réu, teriam sido entregues para uso de militantes da agremiação política a que o acusado se encontra filiado, em evento político realizado em São Luís/MA. Consta que, além de indevidamente utilizado, esse material, posteriormente, não foi restituído ao órgão consignatário, tendo parte dele sido apreendida em poder de terceiro, e parte dele desaparecido. 2. Diante da fragilidade da prova de efetivo 9 envolvimento do acusado no crime em questão, é o caso de incidência dos brocardos – in dubio pro reo e favor rei – somente restando proclamar a improcedência da pretensão ministerial. 3. Ação penal julgada improcedente. (grifo meu) (AP 678, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, julgado em 18/11/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-024 DIVULG 04-02-2015 PUBLIC 05-02-2015) 4. O deslinde da Ação Penal 678 - a qual iniciou seu trâmite na 6ª Vara Criminal da Comarca de São Luís/MA e em virtude do acusado Weverton Rocha Marques de Sousa ter sido diplomado Deputado Federal durante o processo, houve o deslocamento do feito para a Colenda Corte Constitucional - culminou na absolvição do acusado por fundada dúvida em relação ao conjunto fático probatório, sendo aplicado o brocardo “in dubio pro reo” também chamado de princípio favor rei. O Princípio Favor Rei, decorrente do princípio da presunção de inocência, é a significação de que se coligidas as provas apresentadas nos autos, as quais passaram pelo crivo do contraditório, ainda houver uma dúvida razoável do Estado-juiz em relação a culpa do acusado, deve-se absolver o acusado por não existir um juízo convicto em relação a sua culpa, portanto, “na dúvida, em favor do réu”. Nas lições de Guilherme de Souza Nucci: “O primeiro deles espelha que, na relação processual, em caso de conflito entre a inocência do réu – e sua liberdade – e o poder-dever do Estado de punir, havendo uma dúvida razoável, deve juiz decidir em favor do acusado. Exemplo disso está na previsão de absolvição quando não existir prova suficiente da imputação formulada (art. 386, VII, CPP) (…) O Estado é a parte mais forte na persecução penal, possuindo agentes e instrumentos aptos a buscar e descobrir provas contra o autor da infração penal, prescindindo, pois, de sua colaboração. Seria a admissão de falência de seu aparato e fraqueza de suas autoridades se dependesse do suspeito para colher elementos suficientes a sustentar a ação penal.”10 A importância desse princípio se revela na medida em que, como dito pelo Douto Professor Nucci, o Estado sendo a parte mais forte na persecução penal, tem todos as ferramentas necessárias para produzir provas contundentes contra o Réu em sede de persecução 10 Nucci, Guilherme de Souza – Manual de processo penal / Guilherme de Souza Nucci. – Rio de Janeiro: Forense, 2020. Não Paginado 10 penal, em vista disso, ao levar ao Estado-juiz as provas que embasam as denúncias apresentadas, se há dúvida razoável sobre a culpa mesmo depois de amealhadas as provas, por um silogismo e respeitando o Estado Democrático de Direito não há porque condenar, cercear a liberdade daquele que não é possível, com total convicção, reputar como culpado. No caso da ação penal em epígrafe, o ora acusado, na época dos fatos era Secretário do Esporte do Estado do Maranhão, tendo sido denunciado pelo Ministério Público Federal pela suposta prática do crime de peculato (art. 312 do Código Penal). Houve o devido prosseguimento do feito, tendo ocorrido na fase instrutória a oitiva de testemunhas que trouxeram informações contundentes. Logo, em sede de alegações finais o MPF pugnou pela condenação e a defesa do acusado pugnou pela absolvição em virtude da não comprovação da participação do acusado o cometimento do delito, nos termos do art. 386, VII do Código de Processo Penal. Assim, como já exposto, houve o deslocamento da persecução penal ao STF em virtude do cargo público ocupado pelo Réu. No julgamento, o eminente Relator Ministro Dias Toffoli elencou as provas contundentes, principalmente a oitiva das testemunhas e restou comprovado que apesar de dois dos corréus na fase inquisitória da persecução penal terem mencionado a participação do ora acusado, tanto estes dois quanto as outras testemunhas ao prestarem seus depoimentos em juízo, confirmaram que não houve a participação do acusado na prática do delito, restando assim, a fundada dúvida em relação a culpa deste, e nas palavras do ministro “diante da fragilidade da prova do efetivo envolvimento do acusado no crime em questão,penso seja o caso da incidência do brocardo in dubio pro reo, somente restando proclamar a improcedência da pretensão ministerial”. 5. Diante do exposto, é de se concluir que o princípio Favor Rei ou “In Dubio Pro Reo” é extremamente importante para garantir a “segurança” do acusado dentro do processo penal, afastando-o da sana do Estado em condenar os que passaram pelo devido processo legal, mas que o conjunto fático-probatório trazido pela acusação não se mostrou suficiente para sua condenação. Nota-se que ainda tal princípio se estende a outros campos, como nas prisões processuais, tendo o juízo dúvidas acerca dos requisitos que autorizam a preventiva por ex., não a decretará por ser favorável ao Réu. Interessante destacar que este princípio tem um oposto teórico, qual seja o “In Dubio Pro Societate”, nas palavras do Professor Mougenot Bonfim: “O princípio in dubio pro reo tem sua antítese teoria no princípio in dubio pro societate, que preceitua que, no caso de dúvida acerca da culpabilidade do acusado, decida-se em favor da sociedade; Em nosso sistema, no entanto, o princípio in dubio pro societate somente tem aplicação em específicas oportunidades: quando do 11 oferecimento da inicial acusatória (denúncia ou queixa), porquanto não se cobra certeza definitiva quanto à autoria criminosa, somente indícios de autoria; e nos processos do Júri, quando do encerramento da primeira fase (judicium accusationis), no momento da decisão de pronúncia pelo juiz (art. 413 do CPP).”11 Na Ação Penal 678, o princípio do in dubio pro reo foi corretamente aplicado pela 1ª Turma do STF. Sendo o processo um instrumento da verdade real, devemos reconhecer que ocorrem depoimentos conflitantes, provas escassas e todo tipo de circunstância, assim, apesar de no Inquérito Policial os ora corréus terem mencionado o nome do acusado, na fase instrutória foram produzidas provas que destoaram do que inicialmente foi apresentado na fase investigatória, assim, diante da dúvida razoável, não há que se falar na condenação do acusado. 1. Princípio: Non Reformatio In Pejus 2. Habeas Corpus nº 550.505 - SP, Relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma do STJ, julgado em 06/02/2020. 3. PENAL E PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. ROUBO MAJORADO. REFORMATIO IN PEJUS. ERRO MATERIAL EVIDENCIADO NA SENTENÇA SANADO PELO COLEGIADO DE ORIGEM EM SEDE DE APELO DEFENSIVO. FLAGRANTE ILEGALIDADE EVIDENCIADA. NECESSIDADE DE RESTABELECIMENTO DAS PENAS IMPOSTAS NO DECRETO CONDENATÓRIO. WRIT NÃO CONHECIDO E HABEAS CORPUS CONCEDIDO DE OFÍCIO. 1. Esta Corte e o Supremo Tribunal Federal pacificaram orientação no sentido de que não cabe habeas corpus substitutivo do recurso legalmente previsto para a hipótese, impondo-se o não conhecimento da impetração, salvo quando constatada a existência de flagrante ilegalidade no ato judicial impugnado. No caso, observa-se flagrante ilegalidade a justificar a concessão do habeas corpus, de ofício. 2. Nos termos do pacífico entendimento desta Corte Superior de Justiça, resta evidenciada a ocorrência de reformatio in pejus quando, em recurso exclusivo da defesa, 11 Mougenot, Edilson – Curso de processo penal / Edilson Mougenot. – 13ª ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2019. Pg. 103 12 a situação do réu é agravada pela correção de ofício de erro material existente na sentença. Precedentes. 3. Conquanto tenha sido verificado erro aritmético na individualização da pena, o Parquet não opôs embargos de declaração, tendo a sentença transitado em julgado para a acusação. Contudo, a Corte de origem, no julgamento do apelo defensivo, logrou sanar tal impropriedade, de ofício, exasperando a reprimenda a 6 anos e 5 meses de reclusão, mais 15 dias-multa, o que caracteriza reformatio in pejus sanável na via do writ. 4. Writ não conhecido e habeas corpus concedido, de ofício, a fim de restabelecer a sentença e fixar as penas de 5 anos, 9 meses e 10 dias de reclusão, mais 13 dias-multa. (HC 550.505/SP, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 06/02/2020, DJe 12/02/2020) 4. O desenlace da writ em epígrafe, impetrada pelo paciente no Tribunal da Cidadania versou principalmente sobre o Princípio da “Non Reformatio In Pejus”. Previsto expressamente no art. 617 do Código de Processo Penal e decorrente do sistema acusatório da persecução penal, preceitua que é vedado ao Tribunal, julgando apelo exclusivo do Réu, proferir acórdão que imponha situação mais gravosa do que na sentença proferida pelo magistrado singular. E ainda em casos mais específicos, mesmo a acusação recorrendo de matéria diversa e não recorrendo, por exemplo, do quantum de pena aplicado, o Tribunal não pode exasperar a pena, estando adstrito aos pedidos feitos pela acusação em seu apelo. No julgado analisado, o impetrante, representado pela Defensoria pública objetivou a concessão da ordem para reestabelecer a pena imposta na sentença proferida pelo magistrado singular em virtude da condenação pela sanção do art. 157, §2º, I e II (Roubo Majorado), visto que em sede de Recurso de Apelação exclusivo da defesa, o Tribunal exasperou a pena do acusado sob o fundamento de ter o magistrado sentenciante incorrido em erro material no cálculo da pena. Logo, a ordem foi concedida de ofício – “de ofício” pois conforme o entendimento dos Tribunais superiores, não cabe o HC substitutivo ao recurso legal previsto, se não na hipótese de flagrante ilegalidade do ato coator, a qual se verificou no presente caso, por isso o HC não foi conhecido, mas concedido de ofício pela Quinta Turma do STJ -, e em seu voto o Ministro Relator Ribeiro Dantas expõe que, apesar de ter sido verificado o erro aritmético no cálculo da pena, o Parquet não apresentou os aclaratórios para corrigir o erro no momento oportuno, tendo transitado em julgado a sentença para a acusação. Desse modo, violado o art. 617 do Código de Processo Penal, foi 13 proferido pelo Tribunal que reformou a sentença, acórdão que piorou a situação do paciente. Guilherme de Souza Nucci, preleciona que: “Não há possibilidade de a parte recorrer contra uma decisão e, em lugar de conseguir a modificação do julgado, segundo sua visão, terminar obtendo uma alteração ainda mais prejudicial do que se não tivesse recorrido. Veda o sistema recursal que a instância superior, não tendo a parte requerido, empreenda reformatio in pejus, ou seja, modifique o julgado piorando a situação de quem recorreu.”12 Cinge do referido princípio que é decorrente do sistema acusatório, a separação clara entre o Órgão Acusatório, a Defesa e o Estado-juiz. Permitir a reformatio in pejus seria atribuir ao judiciário o poder de atuar como órgão acusador, não só isso, de influir ativamente em decisão que a Acusação (essa que detém a legitimidade para buscar a condenação daquele que em tese ou efetivamente, praticou um delito) concordou, pois não recorreu. Portanto, o princípio é de suma importância para o Direito Penal, assegurando ao réu segurança para recorrer de uma decisão que o condenou, tornando o sistema lógico – persuasivo racional, e não uma ‘roleta”. 5. Tenho para mim que o STJ aplicou corretamente o princípio da Non Reformatio In Pejus, tendo em vista que o Tribunal, na análise de apelo exclusivamente defensivo exasperou de ofício a pena imposta pelo magistrado de primeiro grau, que incorreu em erro material na dosimetria da pena. Conforme o exposto, a acusação, que detém a legitimidade ativa, concordou com a pena imposta por não ter recorrido (preclusão lógica), o que desagua na segurança que o réu tem de recorrer da decisão buscando uma decisão mais benéfica para si. Se houvesse a permissão da reformatio in pejus, o sistema lógico-racional do processo e direito penal seria deturpado, virando um jogo de dados e ferindo a divisão de atores no sistema acusatório Insta ressaltarque por um silogismo, tal princípio se aplica ao recurso exclusivo da defesa, ou em casos específicos, como já exposto. No entanto, é necessário questionar se: é possível a reformatio in pejus nos casos de extremo apelo exclusivo da acusação? O que no caso melhoraria a situação do acusado/condenado, caracterizando a reformatio in mellius. Aqui avocamos então a esclarecedora lição do Ilustre Doutor Guilherme Nucci: “(…) há quem sustente, sob o prisma de que, no processo penal, enaltece-se o princípio da prevalência do interesse do réu. Parece-nos, no entanto, que a 12 Nucci, Guilherme de Souza – Manual de processo penal / Guilherme de Souza Nucci. – Rio de Janeiro: Forense, 2020. Não Paginado 14 prevalência desse interesse, deve contar no mínimo, com a provocação da defesa. Caso tenha havido conformismo com a decisão, não vemos razão para aplicar o princípio. Tem sido a posição dos Tribunais Superiores. (…)”13 Não obstante a esse entendimento, discordo do Ilustríssimo Guilherme Nucci e me firmo nas lições de Tourinho filho, que Nucci cita em seu livro: “Em contrário, afirma TOURINHO FILHO que ‘a maior e mais expressiva corrente doutrinaria brasileira admite poder o tribunal, ante apelo exclusivo do Ministério Público visando à exasperação da pena, agravá-la, abrandá-la, mantê-la ou, até mesmo, absolver o réu, em face do papel que o Ministério Público representa nas instituições políticas (…) Assim, por que motivo estaria impossibilitado, ante exclusiva apelação do Ministério Público, de abrandar mais ainda a situação processual do réu, e até mesmo absolve-lo? Se o Tribunal, em sede de revisão pode fazê-lo, que razão o impediria de agir da mesma maneira ao julgar uma apelação ministerial visando ao agravamento da pena?’ (Código de Processo Penal comentado, v.2, p. 364)”14 Neste sentido, seria reconhecido o princípio da plenitude de defesa, consagrado no Rito do Tribunal do Júri, podendo ser aplicado ao procedimento comum. O princípio em discussão é tão importante ao Direito Processual Penal, que o Pretório Excelso acabou por editar a súmula 160: “Súmula 160 STF: É nula a decisão do Tribunal que acolhe, contra o réu, nulidade não argüida no recurso da acusação, ressalvados os casos de recurso de ofício.” Assim, ainda que haja nulidade absoluta, tema tão caro ao Direito Processual, se a acusação não arguiu em sede recursal esse defeito, o Tribunal não pode reconhece-la de ofício, sob pena de incorrer na reformatio in pejus. Cito aqui nesse mesmo sentido (de importância do tema), a súmula 525 do STF. 13 Nucci, Guilherme de Souza – Manual de processo penal / Guilherme de Souza Nucci. – Rio de Janeiro: Forense, 2020. Não Paginado 14 Nucci, Guilherme de Souza – Manual de processo penal / Guilherme de Souza Nucci. – Rio de Janeiro: Forense, 2020. Não Paginado 15 Diante de todo o exposto, nota-se a importância do princípio da Non Reformatio In Pejus, e acredito que a decisão proferida pela Quinta Turma do STJ no julgado analisado foi extremamente acertada, aplicando corretamente o princípio estudado. 1. Princípio: Razoável Duração do Processo 2. Agravo Regimental no Recurso em Habeas Corpus (RHC) nº 105.508 - SE, Relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma do STJ, julgado em 05/03/2020. 3. PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EM HABEAS CORPUS. EXCESSO DE PRAZO. INOCORRÊNCIA. INSTRUÇÃO CRIMINAL ENCERRADA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO CARACTERIZADO. AGRAVO DESPROVIDO. 1. Apesar da garantia constitucional que assegura às partes a razoável duração do processo e a celeridade na tramitação do feito, esta Corte possui entendimento pacificado no sentido de que a demora para a conclusão dos atos processuais não pode ser verificada da simples análise dos prazos previstos em lei, devendo ser examinada de acordo com os princípios da razoabilidade e conforme as peculiaridades do caso concreto. 2. In casu, o processo, considerando sua complexidade, seguiu marcha regular. Eventual retardo no término da instrução processual se deveu à pluralidade de réus, patrocinados por diferentes advogados. Os atos processuais foram praticados em prazos razoáveis, não havendo falar em desídia por parte do Poder Judiciário. 3. Ademais, a instrução criminal foi encerrada e as partes já apresentaram as alegações finais, o que atrai a incidência da Súmula 52 do STJ. 4. Agravo regimental desprovido. (AgRg no RHC 105.508/SE, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 05/03/2020, DJe 13/03/2020) 16 4. Trata-se de Agravo Regimental no Recurso Ordinário em Habeas Corpus, o qual tratou principalmente do Princípio da duração razoável do processo. Positivado na Constituição Federal, no art. 5º, LXXVIII, preceitua que é assegurado a todos no âmbito judicial e administrativo, a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação, ou seja, é garantido as partes no processo, que o processo não se prolongue no tempo além do estritamente necessário e que os atos processuais sejam praticados com a maior celeridade possível. Insta ressaltar sendo “duração razoável” um termo aberto à interpretação, cabe ao Tribunal, ao analisar a arguição do prejudicado pelo tempo decorrido, amealhando as circunstâncias do caso, determinar se houve ou não a violação do princípio. Nesse sentido, diz Guilherme Nucci: “É incumbência do Estado procurar desenvolver todos os atos processuais no menor tempo possível, dando resposta imediata à ação criminosa e poupando tempo e recurso das partes.”15 Ainda neste diapasão, tendo em vista a figura das prisões processuais/cautelares presentes em nosso ordenamento jurídico, a doutrina e a jurisprudência passaram a entender a incorporação de tal princípio ao instituto da prisão cautelar. Nas palavras de Nucci: “Em decorrência de contemporâneas posições doutrinárias e jurisprudenciais, emerge outro princípio constitucional, embora implícito, dentre as garantias fundamentais: a duração razoável da prisão cautelar. Observa-se, como fruto natural dos princípios constitucionais explícitos da presunção de inocência, da economia processual e da estrita legalidade da prisão cautelar, ser necessário consagrar, com status constitucional, a meta de que ninguém poderá ficar preso, provisoriamente, por prazo mais extenso do que for absolutamente imprescindível para o escorreito desfecho do processo. Essa tem sido a tendência dos tribunais pátrios, em especial do Supremo Tribunal Federal.”16 Nesse contexto, no julgado ora analisado, o paciente interpôs agravo regimental contra a decisão que indeferiu o pleito de concessão da writ para relaxar sua prisão sob o argumento de que sofreu constrangimento ilegal visto que estava preso cautelarmente (sob os requisitos autorizadores do art. 312 do CPP) havia 08 meses e 14 dias, sem que a instrução processual tenha iniciado e ressaltou que a procrastinação do processo é culpa exclusiva do judiciário, que o magistrado de 1º Grau demorou dois meses para despachar o recebimento da denúncia. O 15 Nucci, Guilherme de Souza – Manual de processo penal / Guilherme de Souza Nucci. – Rio de Janeiro: Forense, 2020. Não Paginado 16 “ “ 17 Ministro Relator Ribeiro Dantas expõe em seu voto que não se afere a violação do referido princípio, ou seja, a demora nos atos processuais praticados não se verifica com simples análise dos prazos previstos em lei, devendo ser examinada de acordo com os princípios da razoabilidade e conforme as peculiaridades do processo. Assim, a Turma negou provimento ao agravo visto que da realidade fática, a complexidade do caso relativiza o que se entende por “duração razoável”, tendo seguido a marcha regular visto que a quantidade de réus veio a retardar a instrução se comparada a ações que há singularidade no polo passivo.Ainda assim, houve a incidência da súmula 52 do STJ, que analisando-a, infere a possibilidade do afastamento da alegação de constrangimento por excesso de prazo (violação à razoável duração do processo) nos atos processuais se já foi encerrada a instrução criminal. O Ilustre doutrinador Aury Lopes Júnior preleciona: “No que tange à duração razoável do processo, entendemos que a aceleração deve produzir-se não a partir da visão utilitarista, da ilusão de uma justiça imediata, destinada à imediata satisfação dos desejos de vingança. O processo deve durar um prazo razoável para a necessária maturação e cognição, mas sem excessos, pois o grande prejudicado é o réu, aquele submetido ao ritual degradante e à angústia prolongada da situação de pendência. O processo deve ser mais célere para evitar o sofrimento desnecessário de quem a ele está submetido. É uma inversão na ótica da aceleração: acelerar para abreviar o sofrimento do réu.”17 Portanto, de suma importância o princípio da razoável duração do processo. Mister apontar que se torna excruciante ao acusado, a persecução penal que se prolonga indevidamente no tempo. Sendo o processo penal um instrumento de busca da verdade real e por recair sobre o réu a presunção de inocência, este deve levar o tempo necessário e razoável para a prolação de sentença seja absolutória ou condenatória que reflita a verdade dos fatos. Não se podendo permitir que a persecução penal seja tão célere a ponto de que seja decidida de forma prematura, ou tão demorada que o réu se encontre dentro de acusações por tempo indeterminado. Por fim, expõe-se aqui o entendimento da aplicação do princípio na fase inquisitiva da persecução penal. O Professor Renato Brasileiro de Lima entende que: “(…) diante da inserção do direito à razoável duração do processo na Constituição Federal (art. 5º, LXXVIII), já não há mais dúvidas de que um inquérito policial não pode ter seu prazo de conclusão prorrogado indefinidamente. As diligências devem 17 Fundamentos do processo penal: introdução crítica / Aury Lopes Jr. – 3. Ed. – São Paulo: Saraiva, 2017. Não paginado. (E-PUB) 18 ser realizadas pela autoridade policial enquanto houver necessidade. Evidentemente, em situações mais complexas, envolvendo vários acusados, é lógico que o prazo para a conclusão das investigações deverá ser sucessivamente prorrogado. Porém, uma vez verificada a impossibilidade de colheita de elementos que autorizem o oferecimento de denúncia, deve o Promotor de Justiça requerer o arquivamento dos autos.”18 5. Ante a análise realizada, conclui-se que o Princípio da Razoável Duração do Processo é de extrema importância para o procedimento de persecução penal, inibindo ilegalidades relacionadas ao cumprimento de prazos pelo poder público, ditando que a marcha processual deve ser em tempo razoável ante as peculiaridades fáticas do processo: quantos acusados figuram no polo passivo, a quantidade de testemunhas e outras procedimentos inerentes ao processo. Do acórdão em epígrafe, concordo com o entendimento da quinta turma, ao passo em que não se verifica a violação ao princípio pois havia quatro acusados no polo passivo da ação penal, além do fato de o acusado estar legalmente preso ante a presença do periculum libertatis e fumus comissi delicti. Colaciono aqui uma decisão em que se mostra a nítida e até assustadora violação ao referido princípio, obtida do artigo19 escrito pelo Dr. Aury Lopes Júnior ao site “conjur.com.br”, em que houve o bloqueio das contas bancárias do réu em sede de persecução penal no ano de 1998, a denúncia foi apresentada apenas em 2001 e foi recebida apenas em 2011, tendo o bloqueio se perpetrado por TREZE anos. PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. BLOQUEIO DE CONTAS DETERMINADO HÁ 13 ANOS. PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE DO PROCESSO. ART. 5º, LXXVIII, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. 1. Bloqueio dos valores depositados, a qualquer título, nas contas bancárias de que é titular o paciente, determinado, em 1998. 2. Denúncia ofertada três anos depois, em 2001, sendo recebida neste mesmo ano. TREZE anos, o paciente tem os valores das suas contas bancárias bloqueadas! O processo ainda está fase das alegações finais. Não se sabe sequer qual o possível prejuízo causado pelo paciente. 3. O inciso LXXVIII do art. 5º, da Constituição Federal ("a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação"), princípio constitucional da razoabilidade do processo, impede que o acusado fique sob esta condição indefinidamente, aguardando que o feito tenha marcha processual normal. 4. O transcurso do tempo causado pela exagerada duração do processo contribui para disseminar um sentimento de injustiça e de incerteza na sociedade e gera para o acusado um grande transtorno, constituindo-se, 18 Lima, Renato Brasileiro de – Manual de processo penal: volume único / Renato Brasileiro de Lima – 7. Ed. ver., ampl. e atual. – Salvador Ed. JusPodvim, 2019. Pg. 131. 19 https://www.conjur.com.br/2014-jul-25/direito-duracao-razoavel-processo-sido-ignorado-pais https://www.conjur.com.br/2014-jul-25/direito-duracao-razoavel-processo-sido-ignorado-pais 19 por si só, punição. 5. O direito fundamental à razoável duração do processo é um direito constitucional e próprio do Estado Democrático de Direito. (TRF 1.ª R. – 3.ª T. – HC 0069549-49.2011.4.01.0000 – rel. Tourinho Neto – j. 13.12.2011 – public. 19.12.2011). Absurda tal situação, não é de se imaginar que em um estado democrático de direito tal prática se torne algo comum. Não obstante, é necessário usar o princípio da razoabilidade e também perceber que os Tribunais tem uma grande quantidade de trabalho, de modo que a lei afere a algumas situações prioridade na tramitação dos processos, e as que não recebem tal tratamento, seguem a marcha comum, não podendo se exigir, como já exposto um processo absurdamente célere a ponto de conter vícios e a que não reflita a verdade dos fatos não é útil a finalidade do processo penal, e no mesmo sentido, um que dure “uma eternidade” não se faz útil dentro da visão processualista moderna. 1. Princípio: Juiz Natural e Promotor Natural 2. Recurso Ordinário em Habeas Corpus nº 80.773/MS, Relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma - STJ, julgado em 26/03/2019. 3. “RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. PROCEDIMENTO DE INVESTIGAÇÃO CRIMINAL. LAVAGEM DE DINHEIRO. ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. INVESTIGAÇÃO CONDUZIDA PELO GRUPO DE ATUAÇÃO ESPECIAL DE COMBATE AO CRIME ORGANIZADO (GAECO). VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DO PROMOTOR NATURAL. NULIDADE. INOCORRÊNCIA. MEDIDAS CAUTELARES AUTORIZADAS PELO JUÍZO DA 1ª VARA DO TRIBUNAL DO JÚRI DE CAMPO GRANDE/MS. PROVIMENTO N. 162/2008 DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO MATO GROSSO DO SUL. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DO JUIZ NATURAL. NÃO VERIFICADA. PARTICIPAÇÃO DE POLICIAIS MILITARES NAS INVESTIGAÇÕES. PROCEDIMENTO LÍCITO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL INEXISTENTE. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS IMPROVIDO. 1. É consolidado nos Tribunais Superiores o entendimento de que a atuação de promotores auxiliares ou de grupos especializados, como o Grupo de Atuação Especial 20 de Combate ao Crime Organizado (GAECO) não ofende o princípio do promotor natural, uma vez que, nessa hipótese, amplia-se a capacidade de investigação, de modo a otimizar os procedimentos necessários à formação da opinio delicti do Parquet. 2. O art. 1º do Provimento n. 162/2008 (TJMS) especializou algumas varas da capital para o conhecimento de medidas cautelares formuladas pelo Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado - GAECO. Esse procedimento não se mostra contrário à garantia constitucional do juiz natural, consistindo em mera especialização, sem que se verifique a ocorrência de remanejamento, de forma excepcional e por razões personalíssimas, deum único processo. 3. A interpretação do art. 6.º da Lei n. 9.296/1996 não pode ser demasiadamente estrita, sob pena de degenerar em ineficácia. Assim, a condução dos trabalhos de interceptação telefônica por órgão da Secretaria de Segurança Pública, no qual se encontram alocados policiais, civis e militares, não implica ilegitimidade na execução da medida constritiva. (HC n. 57118/RJ, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, Sexta Turma, julgado em 1º/10/2009, DJe 19/10/2009). Veja-se ainda: RHC n. 53.432/RJ, Rel. Ministro JORGE MUSSI, Quinta Turma, julgado em 16/12/2014, DJe 3/2/2015. 4. Recurso ordinário em habeas corpus improvido.” (RHC 80.773/MS, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 26/03/2019, DJe 16/04/2019) 4. O Acórdão objeto de análise aqui, tratou dos princípios do “juiz natural” e do “promotor natural”. No caso, a defesa do investigado por lavagem de dinheiro, organização criminisa e delitos contra a administração pública e ordem tributária, impetrou Habeas Corpus ao Tribunal de Justiça do Mato Grosso, objetivando a concessão de ordem da liberdade do réu sob o argumento de que a investigação feita pelo Ministério Público, assim como o Juízo que decretou a prisão preventiva, violam o princípio do Promotor Natural e do Juiz Natural. O Tribunal Sul Mato Grossense denegou a ordem do HC, o que levou o réu a interpor o Recurso Ordinário contra a decisão, ao Tribunal da Cidadania. Alega o recorrente que a designação do GAECO (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado) e o pedido de prisão cautelar formulado por este e deferido pelo juízo, é ilegal, visto que o GAECO não detém atribuição para tanto, uma vez que não há organização criminosa sendo investigada, o que fere diretamente o princípio do Promotor Natural. Neste mesmo passo, afirma que o Juízo que deferiu a medida 21 de prisão cautelar requisitada, qual seja o da 1ª Vara do Tribunal do Júri de Campo Grande/MS, não tem competência para o processamento e julgamento da ação penal, estando fora de sua competência, ferindo o princípio do Juiz Natural, desaguando diretamente em nulidade. Tanto o princípio o Juiz Natural quanto o do Promotor Natural estão positivados no art. 5º, LII da Constituição Federal, que por consequência garantem a efetividade do art. 5º, XXXVII da Carta Maior. O Princípio do Juiz Natural, consiste em assegurar ao processo um julgador equidistante das partes e livre de julgamentos feitos de forma parcial que possam beneficiar um dos litigantes, sendo atribuído de modo prévio e não em virtude de casuística ou levando em conta a subjetividade do réu. Nas palavras do Professor Aury Lopes Júnior: “O princípio do juiz natural não é mero atributo do juiz, senão um verdadeiro pressuposto para a sua própria existência. Como explicamos anteriormente, na esteira de MARCON, o Princípio do Juiz Natural é um princípio universal, fundante do Estado Democrático de Direito. Consiste no direito que cada cidadão tem de saber, de antemão, a autoridade que irá processá-lo e qual o juiz ou tribunal que irá julgá-lo, caso pratique uma conduta definida como crime no ordenamento jurídico- penal. O nascimento da garantia do juiz natural dá-se no momento da prática do delito, e não no início do processo. Não se podem manipular os critérios de competência e tampouco definir posteriormente ao fato qual será o juiz da causa. Elementar que essa definição posterior afetaria, também, a garantia da imparcialidade do julgador, como visto anteriormente.”20 No que se refere ao Princípio do “Promotor Natural”, este segue na mesma linha de conceituação do explicitado anteriormente, com nuances únicas, por óbvio. Desse modo, consiste na garantia de que a pessoa ao ser acusada (segundo o sistema acusatório ou misto do processo), o órgão do Estado determinado para prática de tal ato (centralizada na figura do promotor, que acusa!) deve ser previamente definida por critérios legais e constitucionais a fim de evitar um órgão de acusação ad hoc, ou um que leve em conta a subjetividade do acusado para firmar seu entendimento sobre a situação e sua consequente formação de opinio delicti. Na definição do Professor Edilson Mougenot: “Discute a doutrina acerca da existência do princípio do promotor natural. O conteúdo desse princípio consistiria em uma garantia do imputado de ser acusado 20 Lopes Junior, Aury -Direito processual penal / Aury Lopes Júnior. – 17. Ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2020. Não paginado (E-PUB) 22 por órgão do Estado previamente escolhido por critérios legais, afastando a possibilidade de designações arbitrárias do Procurador-Geral. Estabelece-se, dessa maneira, a vedação ao acusador de exceção. O fundamento a tal vedação é o disposto no art. 5º, LIII, da Constituição Federal, que estabelece que ninguém será processado senão pela autoridade competente. Veda-se, também, a atuação de acusador ad hoc. As atribuições do Ministério Público somente poderão ser exercidas por integrantes da carreira (art. 129, §2º), não mais se permitindo o chamado procedimento penal de ofício, ou a designação de promotor ad hoc para determinado ato, feita pelo juiz, nas hipóteses de falta ou impedimento do representante do Parquet.”21 Tais garantias asseguram a vedação da criação de juízo ou tribunal de exceção (art. 5º, XXXVII), que nas palavras de Nucci “seria a escolha do magistrado encarregado de analisar determinado caso, após a ocorrência do crime e conforme as características de quem será julgado, afastando-se dos critérios legais anteriormente estabelecidos.”22. Posto isto, podemos inferir que do julgado analisado, o GAECO, que atuou como Órgão Acusatório havia sido constituído previamente e instituído para atuar nos casos em que existem indícios de atuação de organização criminosa, conforme exposto pelo Ministro Relator em seu voto. Inclusive, o referido grupo especializado foi criado pela Resolução nº 12/2008, e o art. 2º da Resolução nº 019/2011-PGJ, de 22 de agosto de 2011, do MPMS, explicitou as funções do GAECO determinando e delimitando sua área de atuação. Ainda neste diapasão, o paciente alega que, “o Juízo da 1ª Vara do Tribunal do Júri, que deferiu os pedidos formulados pela acusação, não é competente para a ação principal”. Ocorre que também não condiz com a realidade fática o alegado pelo paciente pois o art. 1º do Provimento nº 162/2008 do Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul, há muito tempo, instituiu a competência deste juízo, assim como da 2ª Vara do Tribunal do Júri, da 1ª e 2ª Vara de Execuções Penais, entre algumas outras, para apreciar os pedidos cautelares em matéria criminal formulados pela GAECO. Colacionados pelo relator diversos precedentes, de uma coletânea é possível sintetizar que não há ofensa ao Princípio do Promotor Natural se houve a prévia designação do órgão acusador de forma objetiva, em momento anterior aos fatos, apenas ocorrendo violação se houver 21 Mougenot, Edilson – Curso de processo penal / Edilson Mougenot. – 13ª ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2019. Pg. 527 22 Nucci, Guilherme de Souza – Manual de processo penal / Guilherme de Souza Nucci. – Rio de Janeiro: Forense, 2020. Não Paginado 23 “designação de promotor ad hoc ou de exceção com a finalidade de processar uma pessoa ou caso específico, o que não ocorreu na espécie.”23. Ainda neste sentido, a jurisprudência do Tribunal da Cidadania já reconheceu que a atuação de grupo especializado não fere o referido princípio pois apenas visa dar maior efetividade ao procedimento de investigação e otimizar os atos praticados para obter informações para formação da opinio delicti do Ministério Público.24 Quanto a suposta violação do princípio do Juiz Natural, conforme o Ministro Relator, não há motivo para conceder a ordem pleiteada pelo paciente pois não houve violação alguma ao princípio.Em virtude do provimento que determinou a especialização de determinadas varas para apurar os pedidos cautelares em matéria criminal formuladas pelo GAECO, a designação foi anterior ao fato e não feita unicamente para julgar tampouco “caçar” o acusado, sendo mera especialização, não sendo contra o Princípio ora estudado do Juiz Natural, não podendo ser causa de nulidade “sem que se verifique a ocorrência de remanejamento, de forma excepcional e por razões personalíssimas, de um único processo.”25 A importância dos princípios então se revela na medida que percebemos a necessidade de tais garantias para o acusado dentro do Estado Democrático de Direito, nas palavras de Aury Lopes Júnior: “o juiz é o guardião da eficácia do sistema de garantias da constituição e que lá está para limitar poder e garantir o débil submetido ao processo.”26 E conforme preleciona o Ministro Celso de Mello, atualmente Decano do Pretório Excelso, nos autos do HC 81.963 de sua relatoria, julgado em 06/04/2001: “O postulado do juiz natural representa garantia constitucional indisponível, assegurada a qualquer réu, em sede de persecução penal, mesmo quando instaurada perante a Justiça Militar da União. (…). O postulado do juiz natural, em sua projeção político-jurídica, reveste-se de dupla função instrumental, pois, enquanto garantia indisponível, tem, por titular, qualquer pessoa exposta, em juízo criminal, à ação persecutória do Estado, e, enquanto limitação insuperável, representa fator de restrição que incide sobre os órgãos do poder estatal incumbidos de promover, judicialmente, a repressão criminal.” (grifo meu) (HC 81.963, Rel. Min. Celso de Mello, DJ 28/10/2004). 23 (HC 95447, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Primeira Turma, julgado em 19/10/2010) 24 (RHC n. 27.780/SP, Quinta Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, DJe de 24/9/2012). 25 Fls. 11 do julgado em análise (RECURSO EM HABEAS CORPUS Nº 80.773 – MS) 26 Fundamentos do processo penal: introdução crítica / Aury Lopes Jr. – 3. Ed. – São Paulo: Saraiva, 2017. Não paginado. (E-PUB) 24 E no mesmo sentido: HC 79.865, DJ 06/04/2001. Nessa lógica, o Princípio do Promotor Natural, sendo figura que busca a aplicação do Ius Puniendi, deve ser livre e imparcial, sempre se pautando pela aplicação da lei e a busca da verdade real, conforme as lições do Professor Renato Brasileiro: “Cuida-se de verdadeira garantia do devido processo legal, destinada a proteger tanto o membro do Ministério Público, na medida em que lhe assegura o exercício pleno e independente do seu ofício, quanto a tutelar a própria coletividade, a quem se reconhece o direito de ver atuando, em quaisquer causas, apenas o Promotor cuja intervenção se justifique a partir de critérios abstratos e pré-determinados estabelecidos em lei. Funcionando como verdadeira garantia constitucional da isenção na escolha dos representantes ministeriais para atuarem na persecução penal, este princípio visa assegurar o pleno e independente exercício das atribuições ministeriais, repelindo do nosso ordenamento jurídico a figura do acusador de exceção designado com a finalidade de processar uma pessoa ou um caso específico.”27 Assim, é de se ressaltar que tais princípios são fundamentais na persecução penal, a fim de se garantir o Estado Democrático de Direito e a segurança do acusado ante as figuras do Estado-juiz e do órgão de acusação. 5. Diante de todo exposto, há de se concluir que dentro de uma visão democrática do Direito Penal e do Processo penal em que devem se assegurar a imparcialidade daquele que vai à juízo e por meio da persecução penal busca uma condenação para que o estado exerça o Ius Puniendi, ou seja, o Órgão Acusatório, assim como a imparcialidade do Estado-juiz, que por outorga do Estado tem o poder de dizer o direito e decretar tanto a condenação do réu quanto a absolvição deste, é mister que não haja um direcionamento dessas figuras em virtude de um fato determinado e exclusivo, tornando-os despidos pré-julgamentos e garantindo a imparcialidade. Nesse mesmo sentido, olhando para a função da persecução penal que se traduz na busca da verdade real, por um silogismo, deve-se garantir a imparcialidade e abstenção de julgamentos subjetivos pessoais do Órgão que acusa e da figura do Julgador. Tão caro ao Direito Processual Penal e suas nuances, que o STF editou a súmula 704, que traz à baila a hipótese de violação do princípio do juiz natural nos casos de conexão ou 27 Lima, Renato Brasileiro de – Manual de processo penal: volume único / Renato Brasileiro de Lima – 7. Ed. ver., ampl. e atual. – Salvador Ed. JusPodvim, 2019. Pg. 1261 25 continência do processo nos casos de corréu com foro por prerrogativa de função de um dos denunciados: “Súmula 704 - Não viola as garantias do juiz natural, da ampla defesa e do devido processo legal a atração por continência ou conexão do processo do corréu ao foro por prerrogativa de função de um dos denunciados.” Quanto ao Recurso Ordinário em Habeas Corpus analisado, a Quinta-Turma do STJ ao julgar foi correta ao não conceder a ordem da writ. Da leitura dos autos fica nítido que não há violação do princípio do juiz natural tampouco do promotor natural pois ambos foram escolhidos e designados anteriormente ao fato, tendo suas competências delimitadas por atos formais aptos a produzirem os efeitos jurídicos pertinentes. Também restou nítido que a Jurisprudência da Corte, assim como a da Corte Constitucional já enfrentou tal tema e assentou o entendimento que grupos especializados para combate ao crime organizado não ferem o Princípio do Promotor Natural. Não ferindo também o Princípio do Juiz Natural a designação de juízos determinados para apreciar os pedidos cautelares em matéria criminal formulados pelos referidos grupos especializados, tendo em vista que essa especialização foi determinada visando tão somente efetividade na apreciação de medidas judiciais no combate ao crime organizado, não caracterizando “ocorrência de remanejamento, de forma excepcional e por razões personalíssimas, de um único processo”, não há que se falar na violação do princípio pois os juízos designados apreciam TODOS os pedidos cautelares formulados pelo GAECO e não somente do processo em que se arguiu a violação e foi analisado aqui. Desse modo, concordo com o julgado e consigno que a meu ver a jurisprudência segue dentro de um entendimento legal, a definição dos princípios, delimitando bem a área de incidência destes, enfrentando matérias que podem acarretar nulidade. 1. Princípio: Sigilo das votações do Tribunal do Júri. 2. Agravo Regimental no Recurso Especial nº 1.604.256 – MG, Relator Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma do STJ, julgado em 07/02/2019. 3. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL DECIDIDO MONOCRATICAMENTE. ART. 255, § 4º, II, DO RISTJ. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 568/STJ. 26 CERCEAMENTO DE DEFESA E OFENSA AO PRINCÍPIO DA COLEGIALIDADE. INOCORRÊNCIA. HOMICÍDIO QUALIFICADO. NULIDADE. SIGILO DAS VOTAÇÕES. IMPARCIALIDADE DOS JURADOS. NÃO OCORRÊNCIA. PLEITO ABSOLUTÓRIO. REEXAME FÁTICO-PROBATÓRIO. INVIABILIDADE. DOSIMETRIA. REGULARIDADE. CONTINUIDADE DELITIVA. UNIDADE DE DESÍGNIOS E MESMO CONTEXTO FÁTICO. RECONHECIMENTO. POSSIBILIDADE. AGRAVO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. A teor do disposto no art. 255, § 4º, inciso II, do Regimento Interno deste Sodalício, com a redação dada pela Emenda Regimental n. 22/2016, o relator pode negar provimento ao recurso especial se as suas razões forem contrárias à jurisprudência dominante sobre o tema, justamente o que se verificou no presente caso. Incidência da Súmula n. 568/STJ. 2. O cabimento de agravo regimental contra o julgamento singular afasta a alegação de violação aos princípios da ampla defesa e da colegialidade, já que a matéria pode, desde que suscitada, ser remetida à apreciação da Turma. 3. No âmbitodo Tribunal do Júri, o cômputo da totalidade dos votos não se caracteriza como irregularidade insanável, sendo inviável o reconhecimento de nulidade processual na hipótese em que não se demonstrar concretamente o prejuízo à parte. 4. O recurso especial não se mostra instrumento apto para desconstituir o julgado e operar a absolvição dos delitos imputados, diante da necessidade de revolvimento do material fático-probatório dos autos, procedimento de análise exclusiva das instâncias ordinárias e vedado ao Superior Tribunal de Justiça, a teor do óbice constante do Enunciado n. 7 da Súmula desta Corte. 5. Esta Corte Superior de Justiça orienta-se no sentido de que se afigura possível, na hipótese em que reconhecida mais de uma qualificadora, a utilização de uma delas com o fim de reconhecer a forma qualificada do delito, e das outras para justificar a exasperação da pena na primeira etapa da dosimetria, sem que com isso se configure bis in idem. 27 6. O artigo 71, parágrafo único, do CP admite o reconhecimento da continuidade delitiva, ainda que se trate de crimes cometidos com violência ou grave ameaça, em desfavor de vítimas diferentes e bens personalíssimos. 7. Na espécie, não há controvérsia em relação às circunstâncias em que praticados os crimes, pois ocorridos dentro do mesmo contexto fático e derivados de desígnios absolutamente idênticos - recuperação forçada da posse de terras invadidas por trabalhadores rurais, após tentativa frustrada de reavê-las por intermédio da Justiça -, tudo a indicar que os atos criminosos realizados pelos agravantes encontram-se entrelaçados, ou seja, têm vinculação fático-temporal, devendo ser reconhecida e aplicada a regra do art.71, parágrafo único, do CP, sob pena de excessivo e desproporcional apenamento. 8. Diante da desfavorabilidade de parte das circunstâncias judiciais, especialmente as circunstâncias dos crimes, bem como a extrema gravidade dos fatos praticados e o excessivo número de vítimas dos homicídios qualificados (cinco consumados e oito tentados), impõe-se a elevação da maior sanção ao triplo, consoante limite estabelecido no parágrafo único do art. 71, do Código Penal, quantum este que se entende suficiente para a prevenção e repressão das condutas incriminadas. 9. Agravo regimental parcialmente provido, para reconhecer-se a continuidade delitiva entre os delitos de homicídio (consumados e tentados), com o consequente redimensionando das penas dos agravantes, nos termos do voto. (grifo meu) (AgRg no REsp 1604256/MG, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 07/02/2019, DJe 07/03/2019) 4. No julgado acima foi tratado o princípio do sigilo das votações do tribunal do júri. Inicialmente faz-se mister conceituarmos o referido princípio, partindo do rito especial do Tribunal do Júri. O Professor Renato Brasileiro conceitua o Tribunal do Júri como: “ (…) um órgão especial do Poder Judiciário de primeira instância, pertencente à Justiça Comum Estadual ou Federal, colegiado e heterogêneo, formado por um juiz togado, que é seu presidente, e por 25 (vinte e cinco) jurados, 7 (sete) dos quais compõem o Conselho de Sentença, que tem competência mínima para o processo e julgamento dos crimes dolosos contra a vida, temporário, porquanto constituído para sessões periódicas, sendo depois dissolvido, dotado de soberania quanto às decisões, 28 tomadas de maneira sigilosa e com base no sistema da íntima convicção, sem fundamentação, de seus integrantes leigos.”28 (grifo meu) Sendo o Júri um instituto tão importante ao Direito Processual Penal, ele goza de garantias constitucionais, positivadas na constituição federal no art. 5º, XXXVIII, alíneas a, b, “c” e “d”, e neste ponto, entramos no princípio ora estudado. O princípio do sigilo das votações do Tribunal do Júri, descrito na referida alínea “b”, consiste na garantia de que as votações do conselho de sentença, ou seja, dos 7 jurados que o compõem (esses, pessoas físicas e do povo), são sigilosas, assim, ninguém deve ou pode saber o teor que motivou votação de cada jurado. Tanto é que, a votação dos quesitos é feita em sala especial com a presença do juiz-presidente, os jurados, o ministério público, o assistente, o querelante, o defensor do acusado, o escrivão e o oficial de justiça. Cada jurado recebe uma cédula contendo a palavra “sim” e a palavra “não”, onde, indagado sobre o quesito (art. 483 CPP), serão disponibilizadas duas urnas, uma para colocar a resposta em relação ao quesito e outra para depositar a cédula não usada (art. 486, 487 e 488 do CPP), tal procedimento assegura o sigilo total das votações. Cinge ainda deste princípio que para assegurar o sigilo, nos quesitos formulados em relação a materialidade do fato e a autoria do crime, se no cômputo dos votos houver a negativa de mais de 3 votos, o cômputo deve ser imediatamente interrompido e o acusado absolvido, inteligência do art. 483, §1º do CPP. Ainda, se os quesitos acima tiverem 3 respostas afirmativas, o cômputo dos votos é interrompido e os jurados são indagados do quesito: “O jurado absolve o acusado?” (art. 483. §2º CPP). O objetivo é resguardar a segurança dos jurados evitando ao máximo qualquer possível represália que possa sofrer de terceiros, assim como preservar a independência de cada jurado para decidir sobre com sua mais íntima e livre convicção. Nesse sentido, o Professor Paulo Rangel: “O sigilo visa evitar que se exerça pressão sobre a votação dos jurados, seja com perseguições, ameaças, chantagens, vantagens ou qualquer outro expediente que possa perturbar a livre manifestação do conselho de sentença.”29 Sendo os votos de cada jurado motivados por sua íntima convicção acerca dos autos, temos que a votação no tribunal do júri constitui verdadeira e única exceção ao princípio da fundamentação das decisões judiciais, de modo que os votos sendo sigilosos e gozando dessa proteção, jamais podem ser exteriorizados no decurso do processo enquanto estiver ocorrendo 28 Lima, Renato Brasileiro de – Manual de processo penal: volume único / Renato Brasileiro de Lima – 7. Ed. ver., ampl. e atual. – Salvador Ed. JusPodvim, 2019. Pg. 1372 29 Rangel, Paulo – Tribunal do Júri: visão linguística, histórica, social e jurídica / Paulo Rangel. – 6ª ed., atual. e ampl. – São Paulo: Atlas, 2018. Não Paginado (E-PUB). 29 o julgamento pelo conselho de sentença. Neste diapasão, faz-se necessário trazer à baila “um dos braços” do princípio do Sigilo das votações do júri, qual seja o sistema da “Incomunicabilidade dos jurados”. Esse significa que os jurados não devem se comunicar entre si ou com outra pessoa alheia ao procedimento do júri, não podendo manifestar sua opinião sobre o processo tampouco seu entendimento acerca do caso (art. 466, §1º CPP), sendo que a quebra dessa incomunicabilidade torna possível influenciar outro jurado ou ainda receber influência de 3º, e acaba por macular o rito e causar nulidade absoluta do procedimento. Segundo Renato Brasileiro: “A fim de se evitar que os jurados possam conversar livremente, inclusive informando qual seria o sentido do seu voto, é comum que o Oficial de Justiça fique próximo a eles. Enquanto a sessão de julgamento não terminar, ficam os jurados incomunicáveis, significando que não podem voltar para casa, nem falar ao telefone ou mesmo ler mensagens em celulares ou aparelhos semelhantes. Qualquer contato com o mundo exterior, estranho às partes, aos funcionários da Vara e aos outros jurados, serve para quebrar a incomunicabilidade, uma vez que ninguém poderá garantir não ter havido qualquer tipo de pressão ou sugestão para o voto. Logo, uma vez suspenso o julgamento (por exemplo, em virtude do adiantado da hora), não poderá o jurado retomar a sua casa. Na verdade, em homenagem à incomunicabilidade, deve permanecer no prédio do Fórum, dormindo em local apropriado, fazendo suasrefeições e atendendo suas necessidades ali mesmo, em situações que, não raras vezes, acarretam enorme transtorno e desconforto (v. art. 497, VIII).”30 Neste contexto, faz-se necessário ressaltar o entendimento acerca do atinente a incomunicabilidade, aonde devemos usar a proporcionalidade ante as diversas circunstâncias que podem acontecer no dia-a-dia forense. Colaciono então o ditame pelo Desembargador Hoeppner Dutra na RJTJSP 41/349: "o que a lei proíbe é a comunicabilidade dos jurados no que diz respeito ao mérito do julgamento, visando que qualquer deles exteriorize sua decisão e, dessa forma, influa no julgamento dos demais, favorecendo ou prejudicando qualquer das partes. No caso, a ter-se em conta a invocação feita, o jurado apenas teria perguntado a forma de votar, ou seja, procurando saber a maneira de proceder quanto às respostas dos quesitos, nada mais, fato que em si não viola o princípio da incomunicabilidade, porque nada exteriorizou o propósito de seu julgamento sobre o mérito. Portanto, 30 Lima, Renato Brasileiro de – Manual de processo penal: volume único / Renato Brasileiro de Lima – 7. Ed. ver., ampl. e atual. – Salvador Ed. JusPodvim, 2019. Pg. 1375. 30 desde que o diálogo se restringiu à forma de votar, não há como falar-se em nulidade"31 (grifo meu) Do julgado em análise aqui, a defesa dos acusados por múltiplos homicídios qualificados, objetou a decisão que condenou os réus, por meio do recurso interposto, arguindo a nulidade do julgamento pelo Tribunal do Júri por violação à garantia do sigilo das votações. Alega, sumariamente, que não foi respeitado o procedimento previsto no art. 483 do Código de Processo Penal, de modo que já atingida a maioria de votos para o quesito, foram computados a totalidade dos votos, sendo que deveria ter sido interrompida quando se verificou a maioria. A importância do sigilo das votações, e nesse caso, materializada no respeito ao procedimento determinado pelo Código de Processo Penal garante que os jurados não sofram represálias ou opressões de terceiros estranhos ou partes do processo, também assegurando que a motivação do voto de cada jurado seja de sua íntima e própria convicção acerca dos autos, não recebendo influências e opiniões de terceiros ou de outro jurado. No julgado, o Ministro Relator na fundamentação de seu voto adotou as razões do Acórdão proferido em 2ª Instância que expôs a distinção entre o sigilo das votações (garantia constitucional) e a apuração dos votos (que deve ser pública). Ainda nesse sentido, trouxe à baila precedentes tanto do Tribunal da Cidadania quanto do Pretório Excelso para corroborar seu entendimento de que no processo penal, no tocante as nulidades, vigora o Princípio da pas de nullité sans grief (art. 563 CPP), e tanto as nulidades relativas quanto as absolutas dependem da prova de prejuízo para a parte, ensejando na anulação de atos processuais, e não sendo provado o efetivo prejuízo, subsistem os atos e seus efeitos. Inclusive, a jurisprudência assentada preleciona que “a não interrupção no cômputo dos votos, mesmo após a definição do veredicto, configura mera irregularidade, não sendo causa de nulidade do Júri.”32 Assim, o Tribunal não reconheceu a violação do Princípio do sigilo das votações do Tribunal do Júri, não anulando a sessão que condenou os réus, mas acabou por dar parcial provimento ao Recurso para tão somente reconhecer a continuidade delitiva entre os delitos de homicídio (consumados e tentados), conforme requerido pela Defesa. 5. É possível concluir diante do exposto que o procedimento do Júri como instituto do Direito Processual Penal que lida diretamente com os crimes dolosos contra a vida é de extrema 31 (TJSP ~ Rei. Hoeppner Dutra - RJTJSP 41/349) 32 (AgRg no REsp 1451792/PB, Rel. Ministro LEOPOLDO DE ARRUDA RAPOSO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/PE), QUINTA TURMA - STJ, julgado em 18/08/2015, DJe 01/09/2015) 31 importância para manutenção da ordem constitucional e jurídica. O garantia do sigilo das votações do Tribunal do Júri é mister para o procedimento, visto que os jurados decidem por sua intima convicção acerca dos autos. Se eventualmente receberem ameaças ou influência de terceiros, afetando sua convicção e influenciando na sua decisão acerca do juízo de formação de culpa que recairá sobre o acusado, maculará totalmente o procedimento, deturpando o objetivo do Tribunal do Júri. O princípio também garante a segurança dos jurados. Importante ressaltar também que a decisão exarada pelo conselho de sentença quanto aos quesitos a eles formulados não se coaduna com o Princípio da fundamentação das decisões judiciais, sendo a única decisão dentro do processo que prescinde de fundamentação. Visto que emana da intima convicção dos jurados, a fundamentação de tal decisão afrontaria os princípios do sigilo das votações do tribunal do júri: “os quesitos são perguntas formuladas aos jurados para que se pronunciem quanto ao mérito da acusação. Como os jurados não fundamentam seu voto, porquanto vigora o sigilo das votações há necessidade de elaboração de quesitos para que se possa colher, por maioria dos votos, o veredito do Conselho de Sentença.”33 Não obstante a análise feita do julgado, não concordo com o posicionamento do Tribunal em relação a nulidade do procedimento em razão da violação do princípio do sigilo das votações do júri. Cinge da própria teoria do processo que “o procedimento são os atos ordenados/organizados praticados dentro do processo, para chegar a sua finalidade, o Ius Puniendi”34. No livro “Nulidades no processo Penal”, o Dr. Ricardo Jacobsen preleciona que: “No processo penal, o procedimento, nas palavras de Carrara, serve como um freio para o juiz. Existe, portanto, nessa dimensão, um fim político das formas processuais: a forma não é tão somente uma garantia de justiça, mas uma garantia de confiança dos cidadãos no direito. Assim é que a legitimidade de um processo encontra na forma sua matriz. Como se vê, a cláusula due process of law poderia ser arguida para justificar a importância da forma.35 Diante disso, tenho que o respeito as formas determinadas pelo procedimento adotado dentro do processo devem ser levadas à risca. Apesar do princípio pas de nullité sans grief, me 33 Lima, Renato Brasileiro de – Manual de processo penal: volume único / Renato Brasileiro de Lima – 7. Ed. ver., ampl. e atual. – Salvador Ed. JusPodvim, 2019. Pg. 1661 34 Definição dada pelo professor Eduardo Sorrentino na aula de 27/04/2020 35 Gloeckner, Ricardo Jacobsen – Nulidades no processo Penal / Ricardo Jacobsen Gloeckner. – 3ª ed. – São Paulo: Saraiva, 2017. Pg. 34 32 parece que mitigar as consequências da não adoção dos procedimentos dentro do processo é desrespeitar o que foi posto pelo legislador. Entendo que, do ponto de vista da economia processual é extremamente custoso anular todo o procedimento do Júri, mas subverter a ordem legal posta, é para mim extremamente contra o que tanto pregamos dentro do Estado Democrático de Direito. Assim, apesar da jurisprudência assentada nos Tribunais Superiores, não concordo com o Acórdão proferido pela Quinta-Turma do STJ. Isso em momento algum significa que apoio os crimes cometidos ou que acho que o julgamento deveria ser diferente, mas não é aceitável que os fins justifiquem os meios. 1. Princípio: Vedação das Provas Ilícitas 2. Habeas Corpus nº 505.705/RJ, Relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma - STJ, julgado em 17/12/2019. 3. PROCESSO PENAL. TRÁFICO DE DROGAS E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. NULIDADE. PROVA ILÍCITA. BUSCA DOMICILIAR AUTORIZADA POR TERCEIRO. AUSÊNCIA DE FUNDADAS RAZÕES PARA O INGRESSO FORÇADO DOS POLICIAIS. ABSOLVIÇÃO. WRIT NÃO CONHECIDO. MANIFESTA ILEGALIDADE VERIFICADA. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO. 1. Esta Corte e o Supremo Tribunal Federal pacificaram orientação de que não cabe
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