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TANATOLOGIA FORENSE 1 AULA 5 CASUÍSTICA DE ENTOMOLOGIA FORENSE Na aula passada aprendemos sobre os fatores de variabilidade na hora de apurar o intervalo após a morte. Na aula de hoje veremos a aplicabilidade prática da Entomologia Forense na perícia criminal. Esse caso se trata de um caso de homicídio que caminhava para arquivamento do Inquérito Policial como morte natural. Um cadáver em avançado estado de putrefação com presença de colonização de larvas foi atendido na cidade de Franca em São Paulo, onde uma mulher cardiopata e que residia sozinha foi encontrada nua ao lado de sua cama, em decúbito ventral, com estimativa de morte para 7 dias e sem vestígios de violência naquele ambiente, nem rompimento de obstáculos como portas e janelas. O Exame necroscópico foi efetuado e não foram encontrados traumas que sugerissem violência, mesmo porque o estágio putrefativo daquele cadáver impedia quaisquer considerações a respeito de eventuais lesões superficiais. O laudo médico- legal foi emitido como provável causa mortis decorrente de falência cardiovascular, como um infarto. Já o exame Peri necroscópico realizado pelo Perito Criminal de local constatou a presença de massa larval na nuca da vítima, na região occipital do crânio, o que chamou a atenção do perito criminal que fez constar o fenômeno em seu laudo pericial, alertando o delegado quanto à possibilidade de a vítima ter sofrido em vida alguma lesão na nuca que tenha causado o extravasamento sanguíneo. Um caso que já caminhava para arquivamento ganhou novas diligências, inclusive com exumação do cadáver, que confirmou o laudo médico-legal, comprovando que não haviam traumatismos no esqueleto da vítima. No curso das investigações os investigadores tiveram êxito em identificar um suspeito que teria invadido a residência da vítima no período estimado pelos peritos para a morte da vítima. Esse suspeito confessou a tentativa de estupro. TANATOLOGIA FORENSE 2 Ao tentar imobilizar a vítima no chão o agressor golpeou sua nuca contra o piso áspero, ocasião em que a vítima teria desfalecido e o autor do delito empreendido fuga. Mas antes o criminoso reorganizou o estado das coisas e trancafiou a porta com chave reserva, alterando a cena do crime. A grande contribuição que os conhecimentos entomológicos prestaram à Justiça nesse caso demonstra o potencial dessa ciência. Falaremos agora sobre os fenômenos cadavéricos transformativos conservadores, que são aqueles que agem transformando o cadáver, mas ao invés de reduzir e levar ao apodrecimento como a decomposição ou a maceração ele conservará o cadáver de alguma forma, preservando seu tecido e esqueleto. Mumificação A mumificação é um processo transformativo conservador do cadáver, podendo ser produzido por meio natural, artificial, natural e misto. Nas mumificações artificiais os corpos são submetidos a processos especiais de conservação que tem como objetivo preservar o corpo por conta de alguma crença ou ritual. Os primeiros registros desses acontecimentos são muito antigos. Eles eram feitos como embalsamamentos e eram praticados pelos povos egípcios, pelos nativos das Ilhas Canárias e pelos incas no Peru. TANATOLOGIA FORENSE 3 Atualmente existem relatos de cultura que realizam a preservação do corpo de seus familiares os mumificando, como os povos da Indonésia que enterram seus familiares e anualmente os desenterram para celebrar o dia dos mortos com seus familiares que já partiram. Diferente não é mesmo? Veja a seguir como é o Dia dos Mortos na Indonésia. A mumificação pode ocorrer também como um processo natural, mas é algo muito incomum e que dependerá de condições ambientais específicas que garantam a desidratação rápida, de modo a impedir a ação microbiana responsável pela putrefação. O cadáver, ficando exposto ao ar, em regiões de clima quente e seco, perde água rapidamente, sofrendo acentuado dessecamento. Podemos citar por exemplo as múmias do deserto, que são cadáveres de pessoas que morreram e tiveram seus corpos desidratados ficando com um aspecto de mumificação. Saponificação Também chamada de adipocera, a saponificação é um processo conservador que se caracteriza pela transformação do cadáver em substância de consistência untuosa, mole e quebradiça, de tonalidade amarelo-escura, dando uma aparência de cera ou sabão. Ela surge depois de um estágio mais ou menos avançado de putrefação quando certas enzimas bacterianas hidrolisam as gorduras neutras, dando origem aos ácidos graxos, os quais em contato com elementos minerais da argila se transformam em ésteres. TANATOLOGIA FORENSE 4 É raro encontrar um cadáver totalmente transformado por esse fenômeno especial. Mais comum é encontrar um cadáver com pequenas partes ou segmentos limitados, constituídos em adipocera. Inicia-se esse processo pelas partes do corpo que contêm mais gordura. Esse fenômeno pode surgir espontaneamente, em geral após a sexta semana depois da morte, sendo, porém, a água parada e o solo argiloso os responsáveis. O solo argiloso, úmido e de difícil acesso ao ar atmosférico facilita tal processo especial de transformação cadavérica. Este processo é mais comum em cadáveres com mais tecido adiposo, normalmente observado em obesos. Calcificação A calcificação é um fenômeno transformativo conservador que se caracteriza pela petrificação ou calcificação do corpo. Ocorre mais frequentemente nos fetos mortos e retidos na cavidade uterina, constituindo-se nos chamados litopédios, que significa criança de pedra. TANATOLOGIA FORENSE 5 Corificação A corificação é um fenômeno transformativo conservador muito raro, descrito por Della Volta em 1985, sendo encontrado em cadáveres que foram armazenados em urnas metálicas fechadas hermeticamente, principalmente em urnas de zinco. O cadáver submetido ao fenômeno da corificação apresenta a pele de cor e aspecto do couro curtido recentemente. TANATOLOGIA FORENSE 6 O cadáver normalmente fica com o abdome achatado e deprimido, a musculatura e a tela subcutânea preservadas e os órgãos em geral amolecidos e conservados. No interior da urna, pode-se encontrar relativa quantidade de um líquido viscoso, turvo e de tonalidade castanho-amarelada. Acredita-se que nesse fenômeno o cadáver passa por um processo inicial de putrefação, mas que por motivos ainda não bem explicados seria interrompido, dando origem em seguida a um processo de mumificação natural, sendo responsável por isso certos ácidos graxos oriundos da decomposição da gordura e o ambiente fechado onde o cadáver se encontra. Congelação Um cadáver submetido à baixíssima temperatura e por tempo prolongado vai se conservar integralmente por muito tempo. Há relatos de que foram encontrados corpos de animais pré-históricos com milhões de anos e que tiveram a aparência e a conservação preservadas. TANATOLOGIA FORENSE 7 Certos autores consideram que em temperaturas de menos 40 graus podem-se obter “uma preservação quase indefinida”, inclusive permitindo a conservação em condições vitais de alguns materiais orgânicos como ossos, tecidos e espermatozoides. Como exemplo temos as múmias do gelo, que ficam preservadas por conta da baixa temperatura que anula a ação bacteriana e preserva a matéria. A mais famosa dessas múmias é Ôtzzi, você já ouviu falar dele? E por fim, iremos aprender sobre um fenômeno de conservação realizado por tribos indígenas da região da Amazônia. O fenômeno das cabeças reduzidas, chamado de TsanTsan constituía-se em uma forma especial de conservação cadavérica utilizada por aborígines do Equador, Colômbia e Peru, com a finalidade de manter as cabeças de seus inimigos comotroféu de guerra ou talismã. Essas cabeças, além de conservadas, apresentavam-se com acentuada diminuição do seu volume. Muitos pensavam que esse processo era devido a uma prática capaz de reduzir o tamanho da cabeça. Na verdade tal redução se devia à retirada de todos os ossos do crânio e da face, com o cuidado de manter a pele íntegra. TANATOLOGIA FORENSE 8 Através de um corte na parte posterior do pescoço retiravam esses ossos e a bolsa de pele da cabeça era colocada em água fervente com ervas por 15 a 20 minutos, o que diminuía em cerca da metade o seu volume. Em seguida, por meio da ação do calor conseguiam encolher e endurecer a pele da face e da cabeça, colocando nessa espécie de saco de pele humana uma pedra quente e recheio de areia que lhe servia de molde, o que diminuía pouco a pouco seu tamanho. A isso, juntavam-se ainda certas ervas aromáticas e ricas em tanino, o que evitava o mau cheiro e a putrefação. Depois, quando a areia e a pedra começavam a esfriar, reiniciava-se o mesmo processo e com isso a cabeça ia encolhendo ainda mais. Durante esse procedimento, a cabeça ia sofrendo a ação da fumaça de carvão vegetal ou negro de fumo e por isso tinha sempre a tonalidade enegrecida. TANATOLOGIA FORENSE 9 Assim, a cabeça sem os ossos do crânio e da face ia encolhendo até adquirir o tamanho de um punho. Enquanto durava essa operação, o corte da nuca continuava aberto, e quando a bolsa de pele chegava a uma forma e tamanho desejados faziam a sutura da incisão da nuca, costuravam os olhos, passavam azeite nos cabelos e faziam um orifício na parte superior da cabeça por onde colocavam um cordão para suspendê-la ou pendurá-la. Muito curioso os fenômenos transformativos conservadores, não é mesmo?! Isso acontece porque a relação da vida após a morte é algo que sofre muita influência da cultura e da crença local e regional. Nossa cultura está sujeita a mudar e com isso mudam os costumes também, mas a história ficará preservada, assim como as múmias e os fenômenos transformativos conservadores! ATIVIDADE COMPLEMENTAR Faremos na aula de hoje o primeiro trabalho da disciplina de entomologia forense, que será realizado através de pesquisa na internet e nas aulas anteriores. O aluno deverá responder qual a aplicação e a importância da Entomologia Forense nos seguintes âmbitos da investigação pericial: • Local da morte • Modo da morte • Tempo da morte O aluno deverá discorrer sobre cada tópico, com um mínimo de 5 linhas para cada tema, falando sobre como a biologia dos insetos é importante para a perícia criminal e como ela pode ser utilizada para resolver crimes.
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