Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
4º ano, Turma A Patrícia Carneiro da Silva 1 AULAS PRÁTICAS DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO 27 DE SETEMBRO – AULA PRÁTICA Prof. Miguel da Câmara Machado mcamaramachado@fd.ul.pt 917666609 Bibliografia Manual do Prof. Lima Pinheiro – Volumes I e II Legislação: colectânea AAFDL VER ALTERAÇÃO AO CÓDIGO CIVIL Método de avaliação Papel no saco com nome, dia, subturma e caso 1 DE OUTUBRO – AULA PRÁTICA Diz-nos FERRER CORREIA que o Direito Internacional Privado é o ramo da ciência jurídica onde se definem os princípios, se formulam os critérios, se estabelecem as normas a que deve obedecer a pesquisa de soluções adequadas para os problemas emergentes das relações privadas de carácter internacional. São três os problemas nucleares a que o Direito Internacional Privado pretende dar resposta: • Determinação do direito aplicável – se estamos perante uma situação que entra em contacto com mais do que uma ordem jurídica, sabendo nós que entre estas existem, ou podem existir, divergências acentuadas, há que determinar qual a ordem jurídica em que devemos procurar a norma aplicável; • Competência internacional – se temos um litígio relativo a uma situação transnacional, torna-se necessário determinar quais os tribunais estaduais competentes para decidir do mérito da causa. Caso prático 1 - Métodos António pretende casar-se. É alemão e vive em Portugal, mas está a pensar emigrar para a França. A lei alemã (lei da nacionalidade) impede o casamento de António, ao contrário da lei francesa e da lei portuguesa (lei da residência habitual), que permitem o casamento. A) Supondo que em cada um dos três países em causa é sempre aplicado o direito material do foro a situações privadas internacionais, diga se António pode casar-se em cada um dos três países (Portugal, França e Alemanha). B) A sua resposta seria a mesma, sendo aplicadas às situações transnacionais as normas de conflitos vigentes em cada um dos países em apreço, isto é, empregando- se, nesses países, o método conflitual ou da conexão para a regulação de situações transnacionais e sabendo que a norma de conflitos alemã e a norma de conflitos francesa remetem para a lei da nacionalidade do nubente. mailto:mcamaramachado@fd.ul.pt 4º ano, Turma A Patrícia Carneiro da Silva 2 • Reconhecimento de decisões estrangeiras – decidida que seja determinada questão jurídica, por parte de um tribunal estrangeiro, pode ser necessário que essa decisão produza efeitos na ordem jurídica local. Desta feita, há que saber se a decisão estrangeira pode produzir efeitos na ordem jurídica local e, se sim, sob que condições. Em relação aos métodos de regulação das situações transnacionais, podemos desde logo distinguir entre o processo conflitual – ou de regulação indirecta – e os processos materiais ou directos. Através da regulação indirecta, recorre-se a uma norma de conflitos, através da qual se determina o Direito material aplicável. Em sentido oposto, surge a regulação directa destas situações, que pode fazer-se por uma de três vias: • Aplicação directa do direito material comum • Criação de um direito material especial de fonte interna • Unificação internacional do direito material aplicável A) Se em cada um dos três países em causa é sempre aplicado o direito material do foro a situações privadas internacionais, está em causa um método de regulação directa dessas situações. Este método reconduz-se à orientação jurisdicionalista, em que as situações internacionais são reguladas como se de situações meramente internas se tratassem – o órgão aplicador do Direito aplica o direito material da ordem jurídica a que pertence. Assim sendo, António poderá casar-se em Portugal e em França, mas não na Alemanha, pois que a lei alemã impede o casamento, ao contrário das leis portuguesa e francesa, que o permitem. Este método apresenta duas vantagens fundamentais: diminui a possibilidade de erros judiciais, por melhor conhecimento da lei do foro; e é menos dispendioso e mais eficiente, pois que o juiz não terá que procurar o conteúdo do direito material estrangeiro. No entanto, apresenta desvantagens inultrapassáveis: aplicar sempre o direito material do foro significa aplicá-lo mesmo a situações que não têm qualquer ligação com esse ordenamento jurídico, o que poderá vir a frustrar as espectativas jurídicas das partes; e torna possível o chamado forum shopping, na medida em que se torna possível procurar o direito material mais favorável. B) O método conflitual ou de conexão é aquele que procura qual das leis em presença apresenta a melhor ligação com o caso concreto. Essa escolha é feita através da definição de critérios, normalmente manifestação dos valores do DIP e da ordem jurídica a que pertence a regra de conflito. Este método apresenta, desde logo, uma vantagem fundamental – a preservação da identidade cultural dos vários direitos. No entanto, são também apontadas críticas, como a dificuldade em determinar qual a conexão mais estreita ou significativa da relação jurídica. Este é o método vigente na ordem jurídica portuguesa, na qual vigoram, essencialmente, normas de conflitos de base bilateral (normas que remetem tanto para o direito do foro como para o direito estrangeiro. Com base nisto, a resposta seria, de facto diferente. Se as normas de conflitos, quer na Alemanha quer em França, mandam aplicar a lei da nacionalidade do nubente (cidadão alemão), então António não se poderá casar nem em França, nem na Alemanha. Quanto ao casamento em Portugal, a norma de conflitos aplicável é a que decorre do art 49º CC, em conjugação com o art 31º, do que resulta que há lugar à aplicação, relativamente a cada nubente, da respectiva lei da nacionalidade. Desta feita, aplicar-se-á a lei da nacionalidade alemã, do que decorre que António também não se poderá casar em Portugal. 4º ano, Turma A Patrícia Carneiro da Silva 3 No método conflitual, como visto, procura-se qual das leis em presença apresenta a melhor ligação com o caso concreto. A determinação da norma aplicável é, então, feita por normas de conflitos, que têm em causa os melhores critérios a ter em conta (critérios esses que, geralmente, são manifestações dos valores de direito internacional privado e da ordem jurídica a que essas normas pertencem). a) O art 49º CC, norma de conflitos portuguesa em matéria de casamento, manda aplicar a lei pessoal. Desta feita, sendo Luisão um cidadão brasileiro, somos remetidos para esse ordenamento jurídico. Contudo, deste ordenamento decorre uma norma de conflitos incompatível, através da qual a questão é remetida para a lei do domicílio que, neste caso, é a lei portuguesa. Estamos, desta feita, perante um caso inserido no âmbito do art 18º CC. Do nº 1 decorre que, se o direito internacional privado da lei designada pela norma de conflitos devolver para o direito interno português, é este o direito aplicável. No entanto, há que atender ao nº 2: quando, porém, se trate de matéria compreendida no estatuto pessoal, a lei portuguesa só é aplicável se o interessado tiver em território português a sua residência habitual ou se a lei do país desta residência considerar igualmente competente o direito interno português. Se considerarmos a matéria do casamento como uma matéria inserida no estatuto pessoal, então exige-se o preenchimento de uma das condições do art 18º, nº 2: só se aplica a lei portuguesa se o interessado tiver residência habitual em Portugal OU se a lei dessa residência considerar de aplicar o direito interno português. Uma vez que Luisão reside habitualmente em Portugal, a legislação aplicável será sempre a legislação portuguesa, independentemente de considerações sobre se esta matéria integra ou não o estatuto pessoal. Não obstante, entendoque, de facto, esta matéria está compreendida nesse estatuto. Conclui-se, portanto, que Luisão se poderá casar em Portugal, por aplicação do direito nacional interno. b) A norma de conflitos do sistema jurídico brasileiro, manda aplicar a lei portuguesa (lei do domicílio de Luisão). Contudo, a lei portuguesa manda, no seu art 49º CC, aplicar a lei pessoal, que neste caso é a lei brasileira. A lei brasileira remete para a portuguesa, pelo que Luisão não se poderá casar – a lei nacional remete para a lei da nacionalidade. Segundo Lima Pinheiro: Regulação directa • Direito material comum • Direito material especial • Direito material unificado Caso prático 2 - Métodos Luisão é brasileiro, tem residência habitual em Portugal e quer-se casar. A lei brasileira impede o casamento; a lei portuguesa permite-o. No Brasil, a norma de conflitos pertinente manda aplicar a lei do domicílio (que, no caso concreto, é a lei portuguesa). Usando o método conflitual ou da conexão para a regulação de situações transnacionais: a) se Luisão se quiser casar em Portugal, pode fazê-lo? b) se Luisão se quiser casar no Brasil, pode fazê-lo? 4º ano, Turma A Patrícia Carneiro da Silva 4 Regulação indirecta Segundo Dário Moura Vicente: • Orientação jurisdicionalista – os tribunais aplicam o seu próprio Direito (o direito material do foro) • Orientação substancialista – há um direito especial; leis uniformes que são especialmente criadas para tratar os estrangeiros. • Conexão No seio da conexão, há duas grandes orientações: a que diz que o critério determinante deve ser o da nacionalidade; e a que diz que o critério determinante deve ser o da residência habitual. Em Portugal, adopta-se, como critério determinante, a nacionalidade (veja-se o art 31º CC). 04 DE OUTUBRO – AULA PRÁTICA Estamos perante uma situação jurídica plurilocalizada, na medida em que em causa está um problema com pontos de contacto com ordens jurídicas várias: italiana (nacionalidade de Aníbal), portuguesa (residência habitual de Aníbal), espanhola (nacionalidade de Berta) e francesa (residência habitual de Berta). Desta feita, cumpre determinar qual a lei aplicável. Sendo a questão colocada junto dos tribunais portugueses, é desse ordenamento que partimos. Analisando o art 52º (com a redacção de 1977), conclui-se que a norma de conflitos portuguesa remete a questão para a “lei nacional comum”. Uma vez que esta não existe – Aníbal é italiano e Berta é francesa –, cabe aplicar o nº 2 do preceito: não havendo também lei da residência habitual comum, resta aplicar a “lei pessoal do marido”. Ora, para efeitos da lei portuguesa, a lei pessoal é a lei da nacionalidade (art 31º, nº 1 CC), pelo que o sistema português remete a questão para a lei italiana. Não obstante, a aplicação do art 52º CC levanta um grave problema, que se prende com o facto de o mesmo ser inconstitucional, por contrário ao disposto no art 36º, nº 3 CRP (princípio da igualdade entre cônjuges). Este caso levanta a questão da relação do Direito Internacional Privado com outras disciplinas jurídicas (aqui, em particular, com o Direito Caso prático 3 – DIP e outras disciplinas jurídicas Discute-se, em janeiro de 1977, perante tribunais portugueses qual a lei reguladora dos efeitos do casamento celebrado entre Aníbal, cidadão italiano, habitualmente residente em Portugal e Berta, cidadã espanhola, habitualmente residente em França. Diga, justificadamente, qual é a lei reguladora dos efeitos do casamento, sabendo que: a) Em janeiro de 1977, o artigo 52.º do Código Civil dispunha: “1. Salvo o disposto no artigo seguinte, as relações entre os cônjuges são reguladas pela lei nacional comum. 2. Não tendo os cônjuges a mesma nacionalidade, é aplicável a lei da sua residência habitual comum e, na falta desta, a lei pessoal do marido.”; b) Em janeiro de 1977, o artigo 31.º, n.º 1, do Código Civil tinha redação idêntica à atual; c) Os cônjuges residiam ambos em França entre 1960, data em que casaram, e 25 de abril de 1974, data em Aníbal abandonou o lar conjugal e se fixou em Portugal. 4º ano, Turma A Patrícia Carneiro da Silva 5 Constitucional). Poderá afirmar-se que as regras de conflitos se subordinam à Constituição? Perguntando de outra forma: as normas de conflitos portuguesas podem ser afastadas se contrárias à Constituição? A questão levanta uma divergência doutrinária: • JORGE MIRANDA entende que sim, defendendo por isso que a Constituição se sobrepõe sempre, daí resultando a possibilidade de afastar as regras de conflitos, se com ela contrárias. Este é o entendimento do Tribunal Constitucional; • FERRER CORREIA, em plano diferente, entende que o Direito Internacional Privado tem que dar segurança e certeza, pelo que se deve restringir essa possibilidade, ainda que a mesma possa eventualmente ser aceite; • RUI MOURA RAMOS, por sua vez, defende que a escolha não pode ser feita sem ter em conta a Constituição, e esta seria claramente uma norma inconstitucional. • DÁRIO MOURA VICENTE entende que as normas de conflitos se sujeitam à Constituição. Esta é vista como expressão imediata dos valores jurídicos base acolhidos ou dominantes na comunidade política, pelo que não se podem aceitar normas de conflitos contrárias à CRP. Perante esta divergência, parece ser de acolher a solução por via da qual as normas de conflito se submetem à Constituição, razão pela qual esta norma do art 52º não seria de aplicar, por contrária ao art 36º, nº 3 CRP. Estamos perante uma situação jurídica plurilocalizada, na medida em que temos um problema com pontos de contacto com várias ordens jurídicas: Paco tem dupla nacionalidade (mexicana e italiana), começando por residir habitualmente em Portugal e Caso prático 4 – A norma de conflitos Paco, cozinheiro nascido na Ciudad Juàrez, filho de mãe mexicana e pai italiano, reside habitualmente em Linda-a Velha. Paco voa todos os trimestres para Ciudad Juàrez, no México, para visitar os seus avós maternos, únicos parentes sobrevivos, e ainda para trazer iguarias e artesanato mexicanos que muito aprecia. Em abril de 2006, Paco, profissionalmente desiludido com Portugal que diz ser um país demasiado pequeno para o seu talento gastronómico, adquire um imóvel no Bairro de Salamanca, em Madrid, onde tenciona gerir um restaurante próprio. Os seus sonhos esbarram no entanto num agente de autoridade particularmente zeloso que o informa que, segundo a sua interpretação da lei espanhola, Paco não pode abrir o seu estabelecimento sob pena de graves multas e de deportação para o país donde é nacional, o México. Paco regressa a Lisboa para o consultar a si, eminente advogado, pedindo-lhe que o esclareça sobre a possibilidade de invocar a nacionalidade italiana para efeitos do exercício do direito de estabelecimento em Espanha, nos termos do artigo 49.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, apesar de nunca sequer ter visitado Itália. Considerando que: 1) A lei italiana da nacionalidade considera cidadão italiano os filhos de pai ou mãe italiana; 2) A lei mexicana da nacionalidade considera cidadão mexicano todas as pessoas que nasceram no território mexicano; 3) A lei espanhola da nacionalidade regula as situações de plurinacionalidade da mesma forma que a lei da nacionalidade portuguesa. Esclareça fundamentadamente se a pretensão de Paco tem sustentação jurídica. 4º ano, Turma A Patrícia Carneiro da Silva 6 mudando-se depois para Espanha. Ainda que apresente dupla nacionalidade, a sua ligação com o México é notoriamente mais forte que a ligação que (não) mantém com Itália. Segundo a nacionalidade portuguesa, prevalece a nacionalidade italiana: a lei da nacionalidadediz-nos que prevalecerá a nacionalidade do Estado onde Paco tem residência habitual (art 28º LN). Como este tem residência em ambos (Itália e México), deverá prevalecer a nacionalidade com a qual este tem uma relação mais estreita. Seguindo a regra geral, seria de olhar para a lei portuguesa e de aplicar o art 25º CC, que nos leva para o art 31º, nº 1 e, por aplicação do art 28º da Lei da Nacionalidade (aplicável a casos de conflitos de nacionalidades estrangeiras), a questão seria tratada pela lei mexicana (não sendo possível determinar efectivamente o local da sua residência habitual ao momento, aplica-se a lei do Estado com o qual se mantém uma conexão mais estreita, que tudo indica ser o do México). NO ENTANTO: quando está em causa um caso que envolve as quatro liberdades europeias, o Prof Dário Moura Vicente entende que deverá prevalecer a nacionalidade europeia, com base no desenvolvimento deste Direito por via jurisprudencial: • Acórdão Micheletti (7/7/1992) – quando está em causa uma situação de liberdades europeias, prevalece a nacionalidade europeia. Este factor foi relevante em Portugal na altura da privatização da TAP • Acórdão Gurkin Paul • Acórdão Garcia Avello – está em causa o acesso ao direito ao nome (sai, portanto, do âmbito das quatro liberdades). O Prof Dário Moura Vicente entende que só devemos preferir a nacionalidade europeia quando conseguimos identificar efectivamente uma das quatro liberdades. Caso contrário, continuamos a ter o art 28º LN. Seguindo a lógica jurisprudencial, prevalece a lei italiana, por ser a que corresponde à nacionalidade europeia de Paco e em causa estar um problema de liberdade de estabelecimento (art 49º TFUE). VER TEXTO DO PROFESSOR DÁRIO MOURA VICENTE SOBRE AS QUATRO LIBERDADES 8 DE OUTUBRO – AULA PRÁTICA Para aplicar uma norma de conflitos, o que é que tenho que fazer? Qualquer regra é composta por previsão e estatuição. O Prof Miguel Teixeira de Sousa entende ainda que todas as regras integram um operador deôntico1. No âmbito da previsão, as normas de conflitos envolvem os chamados conceitos-quadro. A primeira coisa a fazer é identificar o tipo de problema. Depois disso, por via do tal conceito-quadro, chegamos à conexão – para um determinado problema, chamamos um certo ordenamento jurídico. 1 Elemento que mostra o que a regra pretende transmitir ao destinatário. P.e. “aquele que provocar um dano a outrem – previsão da regra – deve – operador deôntico – indemnizar o lesado – objecto da regra” 4º ano, Turma A Patrícia Carneiro da Silva 7 Estamos perante uma situação jurídica plurilocalizada, que apresenta pontos de contacto com várias ordens jurídicas: argelina (nacionalidade de António), portuguesa (residência habitual de António e local da celebração do contrato). Partimos da lei portuguesa, na qual está em causa uma situação que se subjaz ao art 28º CC – o negócio jurídico celebrado em Portugal por pessoa que seja incapaz segundo a lei pessoal competente (lei argelina: art 31º, nº 1 CC) não pode ser invalidado com fundamento na incapacidade no caso de a lei interna portuguesa, se aplicável, considerar essa pessoa como capaz (o que acontece, porque em Portugal a maioridade se adquire aos 18 anos). Desta feita, e por esta via, António não poderia anular o contrato. Não obstante, cumpre ver que em Portugal vigora, em matéria de obrigações contratuais, o Regulamento Roma I. Para saber da sua aplicabilidade, cabe analisar o seu âmbito de aplicação: • Âmbito de aplicação material – art 1º, nº 1, sem cair no âmbito do nº 2 • Âmbito de aplicação temporal – art 28º, está em vigor desde 2009 • Âmbito de aplicação territorial – sim, considerandos ou protocolos de adesão • Âmbito de aplicação espacial – art 1º, nº 1, in fine Preenchidos os âmbitos de aplicação do Regulamento, surge o art 13º em regulação desta matéria: António só pode invocar incapacidade se, no momento da celebração do contrato, o outro contraente tinha conhecimento dessa ou a desconhecia por negligência. Nenhuma das duas hipóteses parece acontecer, razão pela qual não há lugar à invocação desta incapacidade. Sub-hipótese: estamos perante uma lacuna, perante a qual o Professor Lima Pinheiro entender ter de se recorrer à analogia VER POSIÇÃO DO PROFESSOR LIMA PINHEIRO E RESOLVER A SUB-HIPÓTESE COM BASE NELA 11 DE OUTUBRO – AULA PRÁTICA A qualificação O objecto da qualificação são as normas materiais que tê que ser caracterizadas pelo seu conteúdo e função que têm na ordem jurídica em que se inserem. Podem existir situações da vida social cuja delimitação jurídica implique que várias ordens jurídicas em referência sejam chamadas para resolução de uma mesma questão. A qualificação divide-se em: Caso prático 5 – A norma de conflitos António, argelino, encontrando-se em Portugal a trabalhar, compra um computador topo de gama num estabelecimento comercial localizado em Portugal. Quando viu que fez um mau negócio, pediu a anulação do contrato com fundamento em que, de acordo com a lei argelina, a maioridade se adquire aos 23 anos e ele tem apenas 21. António tem razão? Sub-hipótese Suponha que não existem os artigos 25.º a 32.º do Código Civil e que, em vez deles, a nossa norma de conflitos era a seguinte: «as normas relativas ao estado e capacidade das pessoas aplicam-se aos portugueses, mesmo que residentes em país estrangeiro». António tinha razão? 4º ano, Turma A Patrícia Carneiro da Silva 8 • Conflitos positivos de qualificação: quando há concurso de normas (de conflito) chamadas a regular uma questão; • Conflitos negativos de qualificação: quando existe um vácuo, quando faltam normas para regular uma questão. A qualificação tem três momentos: 1º Momento: interpretação de conceitos • Teleológica: interpretação absoluta ou abrangente; • Lex fori: caracteriza-se o elemento de conexão e designa-se um ordenamento jurídico. 2º Momento: limitação do objecto da qualificação. 3º Momento: qualificação propriamente dita, art. 15º CC. Estamos perante uma situação jurídica plurilocalizada, com ponto de contacto com duas ordens jurídicas distintas: francesa (nacionalidade de ambos os nubentes) e portuguesa. A questão em causa é a da capacidade para casar, regulada na nossa lei pelo art 49º CC. O mesmo remete a questão para a lei da nacionalidade dos nubentes, que é a lei francesa (art 31º, nº 1 CC). Não obstante, por via do art 15º CC, concluímos que a remissão para o Direito estrangeiro (neste caso, para o Direito francês), apenas opera perante as normas que, pelo seu conteúdo e pela função que têm nessa lei, integram o regime do instituto visado na norma de conflitos. Desta feita, cumpre determinar qual o sentido do art 49º CC, concluindo o instituto que a mesma visa proteger. O conceito de casamento (conceito-quadro inscrito no art 49º) corresponde ao definido no art 1577º, como sendo o contrato mediante o qual duas pessoas assumem a vontade de viver em comunhão de vida. Ora, o conceito de casamento aqui presente não se trata de uma mera união entre duas pessoas: exige-se, entre outras coisas, que em causa estejam duas pessoas vivas. Assim sendo, não é de aceitar o casamento entre Angelique e Pierre. A interpretação da norma tem de atender às finalidades por ela visadas que, neste caso, passam por partilhar uma vida, o que não se identifica com a situação aqui em análise. O problema aqui solucionado é um problema de qualificação, sendo este o processo mediante o qual integramos um caso concreto na previsão de uma norma jurídica, ou o Caso prático 6 – A qualificação em DIP Angelique e Pierre são dois nacionais franceses enamorados e noivos um do outro, tendo combinado casarassim que Pierre terminasse o seu serviço militar no estrangeiro, tendo inclusive os noivos já enviado os convites. Enquanto Angelique passava férias em Portugal, recebeu notícia de que o seu noivo Pierre tinha falecido. Agora, Angelique apresenta-se perante o conservador do registo civil com cópia certificada do disposto no artigo 171.º do Código Civil Francês que dispõe "O Presidente da República pode, por motivos graves, autorizar a celebração do casamento no caso de falecimento de um dos futuros cônjuges, desde que existam factos suficientes que provem inequivocamente o consentimento do falecido" e com a correspondente autorização do Presidente da República Francesa, pedindo que o conservador a case com Pierre. O conservador, à luz do artigo 171.º do Código Civil Francês e da autorização do Presidente da República Francesa, casa Angelique com Pierre (já falecido). Concorda com a decisão do conservador do registo civil português? 4º ano, Turma A Patrícia Carneiro da Silva 9 subsumimos ao conceito que delimita essa norma. A qualificação opera por via de três momentos: • Interpretação do conceito-quadro da regra de conflitos; • Caracterização do objecto a qualificar; • Qualificação em sentido estrito No caso em apreço, levámos a cabo o primeiro dos três momentos, tendo esse sido suficiente para concluir que não era o caso em causa subsumível ao conceito integrado pela norma de conflitos do art 49º CC. Permitir este casamento, mais, violaria a reserva de ordem pública internacional (art 22º CC). 15 DE OUTUBRO – AULA PRÁTICA A qualificação faz-se à luz da lex fori, com autonomia e com finalidade. Note-se que isso não serve para a qualificação de regulamentos europeus. Estamos perante uma situação jurídica plurilocalizada, pois que a mesma detém pontos de contacto com várias ordens jurídicas: brasileira (nacionalidade de Ary e residência habitual de Celso e Dani), portuguesa (nacionalidade de Bia e residência habitual desta com Ary) e inglesa (nacionalidade de Bia). O problema em causa é o de saber se posso ver coisas a um filho, sem consentimento do cônjuge e do outro filho do casal. ARY, nacional do Brasil, em 1985, casou com BIA, nacionalidade portuguesa e do Reino Unido. Desde a data do casamento até 2007, o casal e seus filhos, CELSO e DANI, ambos nacionais brasileiros, viveram sempre no Rio de Janeiro. Em Janeiro de 2007, ARY e BIA, fixaram-se no Alentejo para gozar os seus anos de reforma, tendo os filhos do casal continuado a residir na casa do Rio de Janeiro. Em Janeiro de 2010, ARY vendeu a CELSO um terreno situado no Alentejo de que era proprietário, sem o consentimento de BIA ou DANI. O contrato foi celebrado em Portugal e as partes não escolheram a lei aplicável ao contrato. Presume-se, por via de contrato, que a lei aplicável é a lei inglesa. ARY morreu em Junho de 2010, tendo residência habitual em Lisboa. DANI pretende a anulação da venda por ARY a CELSO do terreno situado no Alentejo, por não ter dado o seu consentimento a tal venda. Tendo em conta que: a) Perante o Direito de Conflitos brasileiro, entende-se que as relações entre pais e filhos estão sujeitas à lei do domicílio comum dos pais e, na sua falta, à lei com a qual a vida familiar apresente uma conexão mais estreita – que, no caso, considera situar-se no Brasil. b) O artigo 496.º do C.C. brasileiro, inserido no capítulo relativo à compra e venda, estabelece a anulabilidade da venda de ascendente a descendente, salvo consentimento expresso dos outros descendentes e do cônjuge do alienante – à semelhança do artigo 877.º do C.C. português. c) O direito material inglês não contém qualquer regra jurídica com conteúdo semelhante ao artigo 877.º do C.C. Português, considerando válida a alienação de bens do pai a um dos filhos, sem consentimento dos outros. Diga, partindo do princípio que as questões são suscitadas em tribunal português se a venda de ARY a CELSO deve ser anulada. 4º ano, Turma A Patrícia Carneiro da Silva 10 São três as leis potencialmente aplicáveis: • Lei portuguesa – art 877º: insere a matéria no capítulo atinente à compra e venda, proibindo esta possibilidade sem consentimento expresso dos outros descendentes e do cônjuge • Lei brasileira – art 496º: insere a matéria no capítulo atinente à compra e venda, prevendo regime idêntico ao português • Lei inglesa – não prevê esta possibilidade na sua legislação Diz-nos o art 15º CC que a competência atribuída a lei estrangeira apenas abrange normas atinentes ao regime do instituto visado na lei de conflitos. Para saber qual a norma de conflitos aplicável, cabe saber qual o sentido do art 877º, pois que o facto de o mesmo estar inserido no capítulo obrigacional do Código Civil não implica que seja essa a sua ratio: • Art 877º é um artigo de âmbito sucessório (posição do Professor Câmara Machado): art 62º (por não preenchimento do âmbito temporal do Regulamento de Sucessões) • Art 877º é um artigo de âmbito obrigacional: art 4º, nº 1, al a) do Regulamento Roma I • Art 877º é um artigo de âmbito familiar (posição maioritária): art 57º CC (relações entre pais e filhos) • Art 877 é um artigo do âmbito de Direitos Reais Adoptando a ideia segundo a qual o art 877º é um artigo de âmbito familiar, por visar tutelar essas relações (protegendo, essencialmente, a posição dos filhos), a norma de conflitos aplicável é a do art 57º CC: rege-se esta situação pela lei da residência habitual comum dos pais, que é a lei portuguesa (por conexão subsidiária), estando assim proibida esta venda. 4º ano, Turma A Patrícia Carneiro da Silva 11 18 DE OUTUBRO – AULA PRÁTICA 1. A norma de conflitos, no ordenamento português, que trata da capacidade para contrair casamento está presente no art 49º CC. Este, por sua vez, entende que se deve aplicar, a cada caso, a lei pessoal que, pelo art 31º, nº 1 CC, é a lei da nacionalidade. No entanto, tanto António como Elaine apresentam dupla nacionalidade – António é simultaneamente Japonês e Marroquino; Elaine é simultaneamente Jamaicana e Brasileira. No fundo, estamos perante um elemento de conexão que tem uma pluralidade de conteúdos concretos, sendo necessário determinar, para o caso concreto, qual deles devemos considerar. Tendo em mãos um conflito entre nacionalidades estrangeiros, cabe analisar o art 28º da Lei da Nacionalidade. O mesmo prevê que, em caso de conflito positivo entre duas ou mais nacionalidades estrangeiras, deve prevalecer a nacionalidade do Estado em cujo território o plurinacional tenha a sua residência habitual. António reside habitualmente em Marrocos, tendo nacionalidade Marroquina. Desta feita, prevalece a nacionalidade Marroquina sobre a nacionalidade Japonesa – a capacidade de António para celebrar a convenção deve ser apreciada à luz da nacionalidade Marroquina. Já no caso de Elaine, esta vive em Portugal, pelo que não tem residência habitual em qualquer um dos Estados respectivos às suas nacionalidades. Desta feita, cumpre seguir o disposto na parte final do mesmo artigo, cabendo ao tribunal determinar qual o Estado “com o qual o cidadão mantém uma vinculação mais estreita”. O conceito de vinculação mais estreita é um conceito vago e indeterminado, pelo que a sua concretização é casuística. Neste caso, Elaine parece ter uma ligação mais estreita com a Jamaica, em comparação com aquela que mantém com o Brasil – os seus pais são Jamaicanos,a sua Caso prático 8 – Interpretação e concretização do elemento de conexão Em 1993, António, natural de Osaka (Japão), emigrou para Marrocos tendo aí fixado residência. Em 2004 António, que, entretanto, tinha encontrado emprego em Casablanca, conheceu Elaine, filha de pai e mãe jamaicanos, nascida no Brasil e reside habitualmente em Portugal. Apesar de ter nascido no Brasil, a família nuclear de Elaine reside habitualmente na Jamaica, país que ela visita com regularidade. Após alguns anos de namoro, António e Elaine estão preparados para dar o próximo passo, sendo que para o efeito pretendem celebrar, em Portugal, convenção antenupcial. Sabendo que: - António é considerado cidadão Japonês pelo direito da nacionalidade do Japão; - António é considerado cidadão Marroquino pelo direito da nacionalidade de Marrocos. - Elaine é considerada cidadã jamaicana pelo direito da nacionalidade da Jamaica; - Elaine é considerada cidadã brasileira pelo direito da nacionalidade do Brasil. 1. Determine qual a lei reguladora da capacidade para celebrar convenção antenupcial de António e Elaine. 2. A solução seria a mesma se António fosse considerado cidadão português pelo direito da nacionalidade português. 3. No 3.º ano de casamento, António e Elaine tiveram o seu primeiro filho Daniel. Nessa altura, Elaine decidiu mudar a sua residência habitual para Jamaica, pois aí viviam os seus pais que lhe poderiam dar um maior apoio na educação do seu filho. António continuou a residir, por razões profissionais, em Casablanca. Determine qual a lei reguladora das relações entre os cônjuges. 4º ano, Turma A Patrícia Carneiro da Silva 12 família nuclear reside lá e é um Estado que esta visita regularmente. Desta feita, conclui- se que a capacidade de Elaine para celebrar a convenção deve ser apreciada à luz da nacionalidade Jamaicana. 2. Se António fosse cidadão português, prevaleceria a nacionalidade portuguesa, por via da aplicação do art 27º da Lei da Nacionalidade – quando a nacionalidade portuguesa está em conflito com outra(s) nacionalidade(s), para efeitos da lei Portuguesa, vale essa nacionalidade em detrimento das demais. Neste âmbito, há uma discussão doutrinária que surge por via da seguinte questão: Marques dos Santos defende que a nacionalidade estrangeira deverá prevalecer caso se rebele que a ligação mais estreita é a sua nacionalidade estrangeira. O Professor Lima Pinheiro discorda, desde logo por esta ser uma solução contra legem. No entanto, mesmo que fosse alterada a lei, o Professor discordaria – a consideração da nacionalidade portuguesa é um verdadeiro imperativo constitucional. 3. A norma de conflitos que regula as relações entre os cônjuges está, no nosso ordenamento, presente no art 52º CC. A regra geral, presente no nº 1, determina que as relações entre os cônjuges são reguladas pela lei nacional comum. No entanto, os cônjuges não têm a mesma nacionalidade, situação na qual cabe aplicar o nº 2 do mesmo artigo – é aplicável a lei da sua residência habitual comum e, na falta desta (como é o caso), a lei do país com o qual a vida familiar se ache mais estreitamente conexa. Ora, neste caso, tudo parece apontar para que deva prevalecer a lei Jamaicana: é na Jamaica que a mãe e o filho residem, sendo por isso a ligação com este Estado mais forte que a ligação que a família mantém com Marrocos. Serve este caso para mostrar que o conceito de conexão mais estreita pode gerar divergências: é possível defender-se que a conexão mais estreita é mantida com Portugal, e não com a Jamaica. É, note-se, relevante o momento em que tudo isto é discutido. A posição que sustenta que a conexão mais estreita é com Portugal é frágil – pode desde logo adoptar-se o argumento de Pires de Lima e Antunes Varela, segundo o qual se um dos cônjuges vive com o(s) filho(s), então é aí que se estabelece a conexão mais estreita. 22 DE OUTUBRO – AULA PRÁTICA Matéria da devolução Está a perder relevância porque os Regulamentos europeus quase não consagram devolução, resolvendo as questões suscitadas por via de remissão simples. O que é que é importante perceber quando falamos de devolução? Existem, na prática, dois sistemas: • Sistema de referência material – indo à legislação estrangeira, apenas analiso as regras materiais, ignorando as regras de DIP que essa contém. Tem, como vantagem essencial, a de valorizar a conexão com o legislador (com a lei do foro). O seu grande problema, no entanto, é a falta de harmonia que se gera. • Sistema de referência global – indo à legislação estrangeira, olha-se para toda ela, incluindo, portanto, o Direito Internacional Privado. Traz a vantagem da harmonia, mas tem também algumas desvantagens (pode haver transmissão ad infinitum ou ping-pong perpétuo) o Devolução simples – faz uma referência global e uma referência material: primeiro olhamos para todo o CC; depois olhamos só para a referência material o Devolução dupla – “aplico o que eles aplicam” 4º ano, Turma A Patrícia Carneiro da Silva 13 Há quem diga que o sistema nacional é de referência material, por existência do art 16º. O Professor Baptista Machado entende que esta é uma norma programática, pelo que temos uma referência material muito ténue. SE HÁ AUTONOMIA, HÁ SEMPRE REFERÊNCIA MATERIAL – se as partes escolhem aplicar a lei inglesa, então não estão a escolher analisar a lei de conflitos inglesa, que possivelmente remete a questão para outro ordenamento. LEI 1 (lei portuguesa) → LEI 2 (lei brasileira) → LEI 1 L1 (PT) → L2 (BR) → L1 (PT) No ordenamento jurídico português, a norma de conflitos atinente à capacidade para contrair casamento é a norma inscrita no art 49º CC. Deste resulta que a capacidade para contrair casamento é regulada pela lei pessoal de cada um dos nubentes. Relativamente a Aníbal, portanto, valeria a lei brasileira (arts 49º e 31º, nº 1 CC). Esta, por sua vez, manda aplicar a lei da residência habitual – portanto, a lei portuguesa. Estamos perante um caso do art 18º CC. Para que se possa aplicar o art 18º é necessário que as normas de conflitos remetam para uma lei estrangeira que, por sua vez, conclua que não é competente. É esse o caso – a lei portuguesa remete para a lei brasileira, que por sua vez entende não ser competente por remeter a questão para “a lei do domicílio do nubente”. Mais, e neste caso em concreto, exige-se que: • L2 (lei brasileira) efectua uma referência material à lei portuguesa (L1), o que acontece (veja-se a alínea d. do enunciado)2 2 ISTO PORQUE: ❖ Se a L2 remeter para a lei portuguesa por via de referência global, então não poderá preencher-se o art 18º, nº 1; ❖ Se a L2 operar por via de uma devolução simples (referência global a uma lei estrangeira apenas admite a consulta das normas de conflitos da lei designada, com exclusão das suas normas sobre devolução – há favorecimento da aplicação da lei do foro), então acabará por considerar competente o seu próprio direito, em virtude da remissão para si operada pelas normas de conflitos da lei portuguesa; ❖ Se a L2 adoptar um sistema de dupla devolução (atende-se às normas de conflitos da lei designada, incluindo ao seu sistema de devolução – o país que a adopta coloca-se integralmente na posição da lei designada, dependendo totalmente do direito de conflitos dessa para resolução do caso), então ficará numa situação de dependência perante a lei portuguesa, mas não remeterá verdadeiramente para o direito português, como é exigência do art 18º (remeterá, antes, para o direito de conflitos português) Caso prático 9 – Devolução ou reenvio Aníbal, nacional brasileiro com residência habitual em Portugal, pretende contrair casamento em Portugal com Bela. Determine a capacidade para contraircasamento de Aníbal, considerando que: a) os órgãos aplicadores do Direito portugueses são internacionalmente competentes; b) a norma de conflitos brasileira dispõe que a capacidade para contrair casamento é regulada pela lei do domicílio do nubente; c) o Direito material brasileiro considera Aníbal domiciliado em Portugal; d) O artigo 16.º da Lei de introdução às normas do Direito brasileiro dispõe que “[q]uando, nos termos [das normas de conflitos] dos artigos precedentes, se houver de aplicar a lei estrangeira, ter-se-á em vista a disposição desta, sem considerar-se qualquer remissão por ela feita a outra lei”. 4º ano, Turma A Patrícia Carneiro da Silva 14 • Estando nós perante um caso de estatuto pessoal, mais precisamente do art 18º, nº 2, exige-se que o interessado tenha residência habitual em território português OU que a lei do país dessa residência considere competente o direito português. A primeira parte do artigo encontra-se preenchida Tendo tudo isto em consideração, conclui-se que a lei aplicável é a lei portuguesa. 25 DE OUTUBRO – AULA PRÁTICA L1 (PT) → L2 (A) → L3 (P) → L1 (PT) Temos um conflito que envolve 3 ordens jurídicas distintas. A capacidade para contrair casamento é regulada, na nossa lei, pelo art 49º CC. A mesma remete para a lei pessoal, que corresponde à lei da nacionalidade (art 31º, nº 1 CC) – neste caso, a lei argentina. No entanto, a lei argentina determina que a capacidade para contrair casamento é regulada pela lei do lugar da celebração do casamento – Paraguai. Por sua vez, este ordenamento aponta de novo para a lei portuguesa, quando adopta o critério do domicílio do nubente. Temos um caso de reenvio indirecto, em que a remissão para a lei portuguesa é feita através de uma terceira lei. Tanto a L2 (A) como a L3 (P) adoptam um sistema de devolução simples. Adoptando a L2 um sistema de devolução simples, a mesma fará uma referência global para L3, analisando as suas normas de conflitos. Dessa análise resulta que a L3 remete o caso para a L1, lei portuguesa. Este segundo momento é já de referência material, pelo que apenas será analisado o Direito material. Desta feita, a solução que melhor se coaduna com a harmonia jurídica no âmbito do Direito Internacional Privado é a de aceitar o retorno para a lei portuguesa. Vale, por isso, o disposto no art 18º, com referência ao art 18º, nº 2, uma vez que está em causa matéria integrante do estatuto pessoal do sujeito. Está, neste caso, preenchida a hipótese da residência habitual. Cumpre, por fim, e para garantir a aplicabilidade do art 18º, analisar o art 19º CC. Surge, neste âmbito uma divergência doutrinária: • Ferrer Correia e Baptista Machado – só contam negócios que foram já feitos, não sendo um incentivo aos negócios; Caso prático 10 – Devolução ou reenvio Discute-se perante tribunais portugueses a capacidade matrimonial de Alberto, cidadão argentino, com domicílio em Portugal. Alberto casou no Paraguai. Determine qual a lei reguladora da capacidade para contrair casamento, considerando que: a) a regra de conflitos argentina estabelece que a capacidade para contrair casamento é regulada pela lei do lugar da celebração do casamento; b) a regra de conflitos paraguaia regula a questão pela lei do domicílio do nubente e considera Alberto domiciliado em Portugal; c) os direitos de conflitos argentino e paraguaio praticam o sistema de devolução simples; d) segundo o direito material argentino, Alberto não teria capacidade para casar; e) segundo o direito material português, não existiriam quaisquer impedimentos ao casamento. 4º ano, Turma A Patrícia Carneiro da Silva 15 • Lima Pinheiro – não é isso que resulta dos trabalhos preparatórios, estando-se com essa solução a diminuir a letra da lei. O Prof Dário Moura Vicente concorda, acabando esta por ser a posição da Escola de Lisboa Não há lugar à aplicação do art 19º, pois que o próprio art 18º vem salvar o negócio em causa. SE A LEI PORTUGUESA ENTENDESSE QUE NÃO HAVIA CAPACIDADE PARA CASAR: aplicava-se o art 19º, parava-se a aplicação do art 18º e seguia-se a posição do art 16º - referência material: aplicação da lei argentina. L1 (PT – art 53º) → L2 (FR – Convenção de Haia: RF) → L3 (LUX: RF) No âmbito das normas de conflitos portuguesas vigora o art 53º CC, que regula a capacidade de celebração de convenções antenupciais e o regime de bens do casal (este segundo aqui em questão). De acordo com o art 53º, o regime de bens deve ser regulado pela lei nacional dos nubentes, ao tempo da celebração do casamento. Ora, ambos os nubentes eram, ao tempo da celebração do casamento, cidadãos franceses. Desta feita, a L2 é a lei francesa. Em França, no entanto, vigora nesta matéria a Convenção de Haia de 1978, que adopta um sistema de referência material, e segundo a qual a lei aplicável será a do país onde os imóveis do casal se encontrarem, desde que os cônjuges assim o acordem. Neste caso, estes acordaram que o problema em questão seria resolvido por via da lei luxemburguesa. O Luxemburgo está também presente na referida Convenção, convenção essa que adopta o sistema de referência material, pelo que a própria lei luxemburguesa se considera competente para analisar desta matéria. Estamos num caso do art 17º, nº 1, situação na qual a lei portuguesa reenvia o caso para a lei estrangeira. Está preenchido o art 17º, nº 2 – estamos no âmbito da lei pessoal (ainda que possa haver divergência, porque tratamos de uma “lei nacional”). Segue-se então o art 17º, nº 3, que está preenchido por estarmos perante um caso de relações patrimoniais entre os cônjuges, e a lei indicada pela norma de conflitos devolve para a lei da situação Caso prático 11 – Devolução ou reenvio Alain e Beatrice são cidadãos franceses, casaram em 2000 um com o outro sem convenção antenupcial, e residem habitualmente em Lisboa. Beatrice, antes do casamento, tinha adquirido uma casa no Luxemburgo e, depois do casamento, vendeu-a a Charles. Determine qual a lei reguladora do regime de bens deste casamento admitindo que: a) os órgãos aplicadores do Direito competentes são os portugueses; b) quer no ordenamento jurídico francês, quer no luxemburguês, vigora a Convenção da Haia de 1978 sobre a lei aplicável ao regime de bens do casal; c) de acordo com as normas de conflitos previstas nesta Convenção, e, por isso, em vigor quer em França, quer no Luxemburgo, a lei aplicável para regular o regime de bens do casal será a do país onde os imóveis do casal se encontrarem, desde que os cônjuges assim o acordem. Alain e Beatrice celebraram, aquando do casamento, um tal acordo, determinando que no que respeitava às questões suscitadas pelos imóveis próprios ou comuns sitos no Luxemburgo, seria aplicável ao regime de bens a lei luxemburguesa; d) No âmbito da referida Convenção da Haia de 1978 é excluído o reenvio, praticando- se, pois, referência material; 4º ano, Turma A Patrícia Carneiro da Silva 16 dos bens imóveis (LUX), que se considera competente. Não há lugar à aplicação do art 19º, uma vez que a Convenção de Haia não vigora em Portugal. PRÓXIMA AULA: casos 12 a 14 29 DE OUTUBRO – AULA PRÁTICA O sistema português é um sistema híbrido, mas acaba por ser o que mais vezes conduz a situações de harmonia dos julgados. Resta-nos a matéria do reenvio com utilização dos regulamentos. Estamos perante um conflito plurilocalizado, na medida em que Bernardo é cidadão português residente em Inglaterra, e falece deixando imóveis sitos em Portugal e no Canadá. Desta feita, são três os ordenamentos jurídicos em contacto com o caso: portuguesa, inglesa e canadiana. A questão é saber qual a lei queregula a sucessão, neste caso imobiliária. Sendo-nos dito que os tribunais portugueses são internacionalmente competentes, concluímos que a L1 é a lei portuguesa. Estando em causa matéria sucessória, cumpre analisar a aplicabilidade do Regulamento 650/2012, visto que por via do primado do Direito internacional, este prevalecerá, caso aplicável, sobre o direito nacional. Para tal, cabe estudar o seu âmbito de aplicação (não estando preenchido, vigora a regra de conflitos portuguesa na matéria em causa – art 62º): • Âmbito de aplicação material – art 1º, nº 1: o Regulamento aplica-se às sucessões por morte, não sendo aplicável em matérias fiscais, aduaneiras ou administrativas. Não cabe aqui qualquer uma das excepções previstas no nº 2. O conceito de sucessão, por sua vez, é definido no art 3º, nº 1, al a) • Âmbito de aplicação temporal – art 83º, nº 1: o Regulamento é aplicável às sucessões das pessoas falecidas em 17 de Agosto de 2015 ou em data posterior. Caso prático 12 – Devolução ou reenvio Bernardo, nacional português, residente Inglaterra (Reino Unido), faleceu em 10 de novembro de 2015, deixando como bens sucessórios, um imóvel sito em Portugal e um imóvel sito no Quebeque (Canadá). Discute-se hoje perante tribunais portugueses a sua sucessão imobiliária. Determine qual a lei reguladora da sucessão imobiliária de Bernardo, considerando que: a) os tribunais portugueses são internacionalmente competentes; b) no Reino Unido e no Canadá não existe direito interlocal ou direito internacional privado unificado; c) o direito de conflitos inglês pratica o sistema da foreign court theory e regula a sucessão imobiliária pela lex rei sitae e a sucessão mobiliária pelo domicílio do de cujus; d) o direito de conflitos do Quebeque pratica o sistema da referência material e regula a sucessão imobiliária pela lex rei sitae e a sucessão mobiliária pelo domicílio do de cujus; e) todos os ordenamentos jurídicos consideram Bernardo residente habitualmente e domiciliado em Inglaterra. 4º ano, Turma A Patrícia Carneiro da Silva 17 Bernardo falece em Novembro desse ano, pelo que está também este âmbito preenchido. • Âmbito de aplicação espacial – o Regulamento é aplicável em todos os Estados- membros, com excepção da Dinamarca e da Irlanda. • Âmbito de aplicação territorial – universal Preenchido o âmbito de aplicação, é possível aplicar a regra geral prevista no art 21º, nº 1 – salvo disposição em contrário, aplica-se a lei do Estado onde o falecido tinha residência habitual no momento do óbito. Neste caso, Inglaterra. A L2 é, portanto, a lei inglesa, onde vigora um sistema de dupla devolução – a L2 julga o caso da mesma forma que o caso seria julgado pela lei que essa L2 considera competente. O direito inglês regula o caso por via da aplicação da lex rei sitae, ou seja, pela aplicação da lei do Estado onde o imóvel se localiza. O Regulamento não é, aqui, aplicável, o que é afirmado no considerando (__) Assim: IMÓVEL SITO EM PORTUGAL L1 (PT – art 21º, nº 1 Reg.) → L2 (UK – lex rei sitae; DD) → L1 (PT) Estamos perante um caso de reenvio para a lei portuguesa, uma vez que o imóvel se encontra em Portugal e é para a lei do Estado do imóvel que o sistema inglês remete. Desta feita, e sendo o sistema inglês um sistema de dupla devolução, o mesmo coloca-se na posição do sistema português, julgando como este julgaria. Assim sendo, L2 remete para L1, mas L1 aplica L2. Não parece, por isso, estar preenchido o art 34º, nº 1, al a), uma vez que, em rigor, a lei inglesa não faz uma verdadeira remissão para a lei portuguesa: antes julga como ela julgaria, aplicando-se a si mesma. Pode então dizer-se que L1 aplica L2 e que L2 aplica L2 (por consulta da solução dada por L1). A situação é resolvida por via da lei inglesa. IMÓVEL SITO NO CANADÁ L1 (PT – art 21º, nº 1 Reg.) → L2 (UK – lex rei sitae; DD) → L3 (CAN: RF; remete para si mesma) Neste caso, L2 coloca-se na posição da L3 e julga como esta julgaria. A L3, por sua vez, considera-se competente para julgar do caso. Desta feita, a este imóvel, aplica-se a L3: a L1 aplica a L3 por via do art 34º, nº 1, al b) Reg; a L2 aplica a L3 e a L3 aplica-se a si mesma. Vigora, portanto, a legislação canadiana. 4º ano, Turma A Patrícia Carneiro da Silva 18 31 DE OUTUBRO – AULA PRÁTICA Estamos perante um problema plurilocalizado, na medida em que Mark é cidadão americano, residente em Portugal, e pretende casar em Lisboa com Teresa, cidadão portuguesa. A situação tem, então, ponto de contacto com duas ordens jurídicas distintas: a portuguesa e a americana. MARK A capacidade para casar é regulada, no nosso sistema de conflitos, pelo art 49º CC. O mesmo remete a questão para a lei pessoal, que por via do art 3º, nº 1 é correspondente à lei da nacionalidade. Sendo Mark cidadão americano, a questão é remetida para esse ordenamento. No entanto, os Estados Unidos da América representam um sistema plurilegislativo, na medida em que vigoram, simultaneamente, leis federais (aplicáveis por isso de igual forma a todos os Estados) e leis estaduais (sendo estas diferentes consoante o Estado em questão). Estamos, por isso, perante um dos casos do art 20º CC. O art 20º, nº 1 determina que, se em razão da nacionalidade, for competente a lei de um Estado em que existem diferentes sistemas legislativos locais (como aqui acontece, pois que a lei portuguesa remete a questão para a lei americana), então é o direito interno desse Estado que fixa, em cada caso, o sistema aplicável. No fundo, manda o art 20º, nº 1 que se determine se o Estado em questão apresenta, ou não, direito interlocal unificado. É-nos dito que não. Assim sendo, cumpre seguir para o art 20º, nº 2. Aqui, e por não haver normas de direito interlocal, recorre-se ao direito internacional privado do mesmo Estado. No entanto, também nos é dito que não há, neste caso, DIP unificado. Assim sendo, exige-se análise do art 20º, nº 2, 2ª parte: se este (DIP unificado) não bastar, considera-se como lei pessoal do interessado a lei da sua residência habitual. Esta parte final do art 20º, nº 2 tem levantado questões na Doutrina, havendo duas interpretações possíveis: • Deve entender-se que este artigo não sofre restrições, pelo que é aplicável a todas as situações em que não foi possível determinar a ordem jurídica local competente através do direito interlocal unificado ou do direito internacional privado unificado. Este é o entendimento mais literal, do qual resulta que a capacidade matrimonial de Mark seria aferida pela lei portuguesa, visto que este reside habitualmente em Lisboa. A favor desta perspectiva pode dizer-se que o objectivo Caso prático 13 – A remissão para os ordenamentos jurídicos complexos Mark, cidadão dos Estados Unidos da América, residente até 1999 em San Diego (Califórnia) e a partir dessa data em Lisboa, e Teresa de nacionalidade portuguesa, pretendem casar em Lisboa. Determine, sabendo que: i) nos E.U.A. não existe direito interlocal ou DIP unificado; ii) o direito de conflitos da Califórnia considera-se competente para regular a capacidade matrimonial de Mark. face a que lei ou leis, deve o Conservador do Registo Civil aferir a capacidade matrimonial dos nubentes. 4º ano, Turma A Patrícia Carneiro da Silva 19 do legislador é o de substituir a referência à lei da nacionalidade em favor da residência habitual, conexão subsidiária em matéria de lei pessoal (art 32º CC); • Deve entender-se que apenas se aplica este art 20º, nº 2 parte final quando a residência habitual possa funcionar como critério de selecção de uma ordem jurídica local, ou seja, quando o interessado reside no ordenamento jurídico complexo de que é nacional. A favor desta interpretação pode dizer-se que o art20º pretende determinar a ordem jurídica local competente, e que com base nisso a parte final do art 20º, nº 2 é só mais um desses critérios. Aplicar a lei da residência habitual quando a mesma se situa fora do ordenamento jurídico da nacionalidade originária seria uma discriminação pura entre os nacionais de ordenamentos plurilegislativos sem direito interlocal ou DIP unificados e os nacionais de outros Estados. No fundo, e neste caso concreto, Mark estaria a ser tratado como um apátrida (por utilização do elemento de conexão adoptado no art 32º CC, que é a solução subsidiária), quando tem uma nacionalidade, o que se mostra contrário ao espírito do nosso sistema. Com base em tudo isto, o Professor Dário Moura Vicente tem entendido que o art 20º, nº 2 tem de ser objecto de uma redução teleológica, no sentido de se restringir a remissão feita para a lei da residência habitual aos casos em que o interessado tem a sua residência habitual dentro do ordenamento complexo (ou seja, aqui, apenas se aplicaria o art 20º, nº 2 se Mark residisse nos Estados Unidos, o que não acontece). Não sendo aplicável o art 20º, nº2 – como acontece no caso em apreço – surge uma lacuna. Não podendo recorrer à analogia, cumpre seguir o disposto no art 10º, nº 3 e preencher a lacuna de acordo com a norma que o próprio intérprete criaria se houvesse de legislar dentro do espírito do sistema. Para tal, pode e deve seguir-se o critério da conexão mais estreita, submetendo o estatuto pessoal das pessoas singulares à lei que estiver mais próxima da situação privada internacional em causa. Neste caso, Mark, antes de viver em Lisboa, viveu em San Diego (Califórnia). Desta forma, parece lógico depreender que a sua conexão mais estreita é com o ordenamento jurídico da Califórnia. A sua capacidade matrimonial, então, deve ser analisada conforme a lei da Califórnia. L1 manda aplicar L2 e L2 considera-se competente. Note-se que, se não fosse possível determinar a conexão mais estreita, seguia-se para o art 23º, nº 3 que adopta a lei da residência habitual – ou seja, que nos levaria à mesma solução que o art 20º, nº 2 parte final se aplicado sem restrições. Desta feita, a interpretação restritiva feita a esse artigo funciona como uma tentativa de evitar a adopção desse critério, que é sempre a solução subsidiária para resolver estes conflitos. TERESA Teresa é cidadã portuguesa residente em Lisboa, pelo que a sua capacidade matrimonial é regulada pela lei portuguesa – art 49º e art 31º, nº 1. 4º ano, Turma A Patrícia Carneiro da Silva 20 Estamos perante um conflito plurilocalizado, na medida em que António é português e reside em Lisboa, mas tem um terreno sito no Texas e tem em aberto um litígio com Bob, cidadão americano residente no Texas. Desta feita, o problema apresenta pontos de contacto com Portugal e com os Estados Unidos da América. A servidão é um direito real de gozo. Enquanto direito real, e no que toca ao nosso sistema de conflitos, vigora o disposto no art 46º CC, mais concretamente no seu nº 1 – o regime é definido pela lei do Estado em cujo território as coisas se encontrem situadas. Ora, neste caso, o terreno está situado no Texas, EUA. Assim, há uma remissão feita pela L1 (lei portuguesa) para uma L2. Sendo os Estados Unidos um sistema jurídico complexo ou plurilegislativo, cumpre seguir o disposto no art 20º CC. O art 20º, nº 1 determina que, se em razão da nacionalidade, for competente a lei de um Estado em que existem diferentes sistemas legislativos locais (como aqui acontece, pois que a lei portuguesa remete a questão para a lei americana), então é o direito interno desse Estado que fixa, em cada caso, o sistema aplicável. No fundo, manda o art 20º, nº 1 que se determine se o Estado em questão apresenta, ou não, direito interlocal unificado. É-nos dito que não. Segue-se então a análise do art 20º, nº 2 – a primeira parte manda olhar para o direito internacional privado do mesmo Estado. É-nos também dito que o mesmo não existe, pelo que a questão é remetida para o art 20º, nº 2, 2ª parte. Aí, considera-se como lei pessoal do interessado a lei da sua referência habitual. Ora, neste caso, a questão é a de saber se há, ou não, uma servidão constituída sobre o terreno de António. Essa servidão, a existir, é um direito real de Bob. Bob é cidadão americano e reside no Texas. Desta feita, parece o art 20º determinar a aplicação, a esta questão, da lei em vigor no Texas. Caso prático 14 – A remissão para os ordenamentos jurídicos complexos António, português, residente habitualmente em Lisboa, é proprietário de um terreno situado no Estado do Texas, nos Estados Unidos da América. Atualmente surgiu um litígio com Bob, cidadão dos EUA, residente habitualmente no Texas, e proprietário de um terreno confinante com o de António. Bob alega que se constituiu uma servidão de passagem no terreno propriedade de António em favor do seu terreno. Determine, sabendo que nos E.U.A. não existe direito interlocal ou DIP unificado, qual a lei competente para determinar se o terreno de António está ou não onerado com uma servidão de passagem. 4º ano, Turma A Patrícia Carneiro da Silva 21 Para que haja fraude à lei, exige-se a verificação de dois pressupostos: • Intenção fraudatória • Fraude propriamente dita 1. Está em causa uma situação jurídica plurilocalizada, por ter pontos de contacto com mais que uma ordem jurídica (aqui, portuguesa e inglesa). A questão que se levanta é a de saber qual a lei que regula a capacidade de disposição dos bens. Não preenchendo o âmbito temporal do âmbito de aplicação do Regulamento de Sucessões, o mesmo não se aplica. Desta feita, resta-nos a regra interna do art 63º CC: o problema é regulado pela lei pessoal de António (portuguesa – art 31º, nº 1 CC, que remete para a lei da nacionalidade. Tendo António dupla nacionalidade, prevalece a portuguesa por via do art 27º LN). Não estamos perante um caso de fraude à lei, pois que não é contornada a solução legal avançada para o problema. 2. Aqui a solução é distinta: a regra de conflitos é a do art 63º CC, que remete a questão para a lei pessoal de António – art 31º, nº 1 CC. Ora, se António renuncia à nacionalidade portuguesa, resta-lhe a nacionalidade inglesa, pelo que se aplicaria a lei inglesa. Aqui, estão já preenchidos os dois pressupostos da fraude à lei: há uma intenção fraudatória e essa materializa-se numa manipulação com êxito da solução do caso (aqui, aplicação da lei inglesa, mais favorável que a portuguesa). Com base nisto, manda o art 21º que se desconsidere a renúncia à nacionalidade portuguesa, mantendo-se essa a lei aplicável. A fraude à lei afasta o acto físico ou jurídico que foi levado a cabo com o intuito de afastar a lei primeiramente aplicável. Caso prático 15 – Fraude à lei António, português, quer privar da legítima, Bruno, seu filho, para deixar todos os seus bens a Carla, sua segunda mulher. Com vista a obter este resultado, António obtém a nacionalidade do Reino Unido e dispõe, ao abrigo do Direito inglês, dos bens imóveis que se situam em Portugal e que integram toda a sua herança a favor de Carla. Todavia, António continuou a viver em Portugal e a comportar-se como português. Atendendo a que: a) Os tribunais portugueses são internacionalmente competentes; b) O Reino Unido não contém normas de Direito Internacional Privado ou de Direito Interlocal unificadas; c) A lei inglesa remete para a lex rei sitae; d) Os tribunais ingleses praticam a dupla devolução. Admitindo que António faleceu em 30 de maio de 2015: 1. Determine qual a lei aplicável à situação em análise. 2. Quid juris se o António tivesse, nos termos da Lei da Nacionalidade,renunciado à nacionalidade portuguesa? 3. Igual à questão 2, mas António, a partir do momento em que renunciou à nacionalidade portuguesa, passou a fazer a sua vida em Londres? 4. A sua resposta seria a questão 1 seria a mesma se António tivesse falecido em 27 de agosto de 2018 e o testamento tivesse sido redigido em dezembro de 2016, contendo uma disposição expressa de escolha da lei inglesa? 4º ano, Turma A Patrícia Carneiro da Silva 22 3. Ainda que haja intenção fraudatória, não há fraude à lei. Entendem os Professores LIMA PINHEIRO e FERRER CORREIA que não haverá fraude à lei no caso em que a conduta fraudulenta consiste na mudança de nacionalidade e o naturalizado se integra seriamente na sua nova comunidade. Assim sendo, poderíamos inicialmente considerar que há fraude, mas a mesma é sanada pela integração efectiva na sua nova comunidade nacional. 4. Mudando a data de falecimento, cumpre analisar novamente a aplicabilidade do Regulamento de Sucessões: • Âmbito de aplicação material – art 1º, nº 1: o Regulamento aplica-se às sucessões por morte, não sendo aplicável em matérias fiscais, aduaneiras ou administrativas. Não cabe aqui qualquer uma das excepções previstas no nº 2. O conceito de sucessão, por sua vez, é definido no art 3º, nº 1, al a) • Âmbito de aplicação temporal – art 83º, nº 1: o Regulamento é aplicável às sucessões das pessoas falecidas em 17 de Agosto de 2015 ou em data posterior. Bernardo falece em Novembro desse ano, pelo que está também este âmbito preenchido. • Âmbito de aplicação territorial – o Regulamento é aplicável em todos os Estados- membros, com excepção da Dinamarca e da Irlanda. • Âmbito de aplicação espacial – art 1º, nº 1 Aqui, dado que estão preenchidos os âmbitos de aplicação, há já lugar à aplicação do Regulamento. Desta feita, cabe analisar o art 22º, relativo à escolha de lei: António podia escolher aplicar à sua sucessão a lei inglesa. Note-se que o art 34º do Regulamento exclui a possibilidade de reenvio neste caso, por ter existido essa escolha. SOBRE A FRAUDE À LEI ESTRANGEIRA: só é preocupante a fraude à lei estrangeira se esse Estado estrangeiro tiver também essa preocupação. • Isabel de Magalhães Colaço – a fraude à lei do foro é sempre sancionada, mas a fraude à lei estrangeira só o será em dois casos: o Se a lei estrangeira defraudada também sanciona a fraude; o Se, embora isso não aconteça, na perspectiva do DIP do foro, esse sancionamento seja decorrente de um princípio mínimo ético nas relações internacionais • Lima Pinheiro – se a lei estrangeira não reage à fraude à lei, excepcionalmente, a nossa não o deverá fazer. O afastamento de uma norma imperativa estrangeira através de uma manipulação do elemento de conexão pode ser inaceitável à luz de valores éticos que integram a justiça da conexão. Nesse caso, note-se, falamos em justiça da conexão e não em justiça material, mantendo-se assim clara a distinção entre fraude à lei e reserva da ordem pública internacional. 4º ano, Turma A Patrícia Carneiro da Silva 23 05 DE NOVEMBRO – AULA PRÁTICA Normas de aplicação imediata (NAIs) Prof Lima Pinheiro • Normas autolimitadas • Normas de aplicação necessária Prof Marques dos Santos • Normas de aplicação imediata Prof Ferrer Correia • Normas de aplicação imediata e necessária Prof Dário Moura Vicente • Normas internacionais imperativas Joaquim é português, residindo em França e sendo possuidor de dois imóveis (um em Portugal e outro em Espanha). Esta é, por isso, uma situação privada internacional, que tem pontos de contacto com quatro ordens jurídicas. Este contrata uma sociedade P, com sede na Alemanha, para pintar as suas duas casas. O problema surge quando a pintura feita na casa do Algarve é defeituosa. A grande questão é saber se se aplica, a este problema, o contrato ou a lei francesa, escolhida pelas partes. Este é um problema de contratos, mais especificamente de cláusulas contratuais gerais. Por preenchimento de todos os âmbitos de aplicação, é aplicável o Regulamento Roma I (âmbito temporal – art 28º; âmbito material – art 1º; âmbito territorial – considerandos e protocolos; âmbito espacial – art 1º, nº 1 in fine), no qual o art 3º permite às partes escolher Caso prático 16 – As normas de aplicação imediata Em 20 de novembro de 2010, Joaquim, português com residência habitual em frança, após ter visto um anúncio da Sociedade Painters'R'Us, com sede na Alemanha, no jornal Le Monde, contactou-a com vista a celebrar um contrato de prestação de serviços de pintura das suas casas de férias situadas no Algarve e na Espanha. O contrato foi celebrado mediante recurso a cláusulas contratuais gerais fixadas pela Sociedade Painters'R'Us. Nas cláusulas contratuais gerais dispunha-se que: - "A lei reguladora deste contrato é a lei francesa."; - "São competentes para dirimir litígios decorrentes deste contrato os tribunais portugueses."; e - "As partes desde já excluem toda e qualquer responsabilidade que pudesse ser assacada à Sociedade Painter'R'us, nomeadamente, mas sem limitar, a que, nos termos da lei, pudesse resultar de vícios no cumprimento da prestação a que se obrigou a Sociedade neste contrato". Jacques verificou que, por causa da pintura defeituosa efetuada pela Sociedade Painters'R'Us, a sua casa de férias no Algarve tinha agora problemas graves de infiltrações. Em ação intentada perante um tribunal português contra a sociedade Painters'R'Us, Joaquim requer uma indemnização pelos danos sofridos e alega que, ao abrigo do Direito Português, a cláusula de exclusão de responsabilidade constante do contrato não é válida. Na contestação, a sociedade alega que nada deve e que a cláusula de exclusão de responsabilidade é válida à luz da lei escolhida pelas partes. Quid juris, admitindo que a lei francesa considera a cláusula de exclusão de responsabilidade válida? 4º ano, Turma A Patrícia Carneiro da Silva 24 a lei aplicável – aqui, a lei francesa. Desta feita, todo o contrato seria regulado pela lei francesa. Não obstante, estão em causa normas de aplicação imediata, o que limita essa aplicação da lei escolhida. O art 9, nº 1 define as normas de aplicação imediata, e o nº2 permite que os Estados-membros as tenham. Em conflito com essa aplicação estão os arts 21º, d) + 23º LCCG (lei das cláusulas contratuais gerais). Aplicando as regras da LCCG, a cláusula em apreço é nula, por absolutamente proibida. Em conclusão, a empresa alemã teria que pagar pelo sucedido em casa do Sr Joaquim. VER TESE DO PROFESSOR MARQUES DOS SANTOS SOBRE NORMAS DE APLICAÇÃO IMEDIATA; VER ARTIGO DA PROFESSORA JOANA GALVÃO TELLES 08 DE NOVEMBRO – AULA PRÁTICA As normas de aplicação imediata fazem, na prática, uma alteração do âmbito de aplicação. Deixa de ser aplicada a lei definida pela regra de conflitos, por estarmos perante matérias tratadas por normas de aplicação imediata. Pode haver vários tipos de normas de aplicação imediata (aquilo a que o Professor Lima Pinheiro chama de normas tipo I, II, III e IV). Pode ainda falar-se em normas de aplicação imediatas implícitas. A Doutrina, seja o Professor Marques dos Santos, seja o Professor Lima Pinheiro, aceita que o intérprete descubra normas de aplicação imediata perante a análise de uma norma. Estas normas implícitas podem, desde logo, ser de fonte consuetudinário – habituamo-nos a aplicar o Direito português a certas situações, por costume. Caso 17 Mantém-se a aplicabilidade do Regulamento Roma I. As partes escolhem a lei aplicável, o que é permitido por via do art 3º RR I. nestes termos, dir-se-ia que os arts 21º, 22º e 23º LCCG seriam aplicáveis, pois que estes integram a ordem jurídica portuguesa. Não obstante,MARQUES DOS SANTOS sustenta que uma norma de aplicação imediata [como o art 21º, nº 1, al d) LCCG] só pode ser aplicada quando a norma de conflitos (aqui, art 23º) o permitir. Nada sendo dito, ou não permitindo a norma em causa essa aplicação (o que aqui acontece), o Direito português é ainda aplicável, mas a LCCG não tem aplicação. Recorremos, assim, às regras gerais de cumprimento defeituoso. Note-se que este não é o entendimento maioritário, pois que esse segue a ideia de que o art 21º LCCG teria aqui aplicabilidade. Caso prático 17 – As normas de aplicação imediata Igual ao anterior, mas: a) as casas de férias situam-se em Marrocos e na Espanha; b) a lei escolhida pelas partes é a lei portuguesa; c) a lei marroquina sobre cláusulas contratuais gerais, tal como a francesa, não tem normas equivalentes aos artigos 21.º, 22.º e 23.º do Decreto-Lei que institui o Regime das Cláusulas Contratuais Gerais. Quid juris? 4º ano, Turma A Patrícia Carneiro da Silva 25 CÂMARA MACHADO: É como o art 21º tivesse dois amores: aplica-se de forma necessária quando a norma de conflitos o ditar, nos termos do art. 23.º, e aplica-se de forma não necessária, quando as partes mandam aplicar a lei portuguesa, sendo certo que o art. 21/1/d) é uma norma material do ordenamento jurídico português. Portanto: • Prof. Lima Pinheiro: chegamos à conclusão que aplicávamos o art, 21/1.º/d) LCCG, sem que o art 23.º estivesse preenchido (e neste caso não estava mesmo); • Prof. Marques dos Santos: não poderíamos aplicar o art. 21/1/d), mas rendo que recorrer às regras do Direito das Obrigações Geral. Em França, há um Conselho Constitucional, que faz uma fiscalidade preventiva. Sabemos que: não há nenhuma declaração com força obrigatória geral; não há fiscalização concentrada ou difusa. O Tribunal português está a aplicar o CC e a CR franceses, e está a fazê-lo como se faria lá. A questão prende-se com a segurança jurídica e com a harmonia jurídica internacional. VER TESES DE RUI MOURA RAMOS E DE JORGE MIRANDA A Doutrina entende que, se nunca houve uma decisão de inconstitucionalidade, não pode o Tribunal português entender que a norma é contrária à Constituição americana. Exige- se uma posição forte na jurisprudência a desaplicar esta norma. Mais, o Professor Jorge Miranda ainda avança que a inconstitucionalidade em causa tem que ser muito evidente. Quando aplicamos o Direito estrangeiro, nós somos meros observadores, por não conhecermos o ordenamento jurídico competente. Sobre o caso 19 (CÂMARA MACHADO): relações entre Constituição e o Direito material estrangeiro. Havia quem dissesse que o juiz português não deveria aplicar o Direito estrangeiro se inconstitucional. Essa é hoje residual. A reserva de ordem pública preocupa-se com resultados. Há quem ache que tudo o que está na CRP é reserva de ordem pública internacional, mas isto apenas faz sentido quando as Constituições são pequenas. Obviamente, na CRP, há coisas que não são reserva de ordem pública internacional. Quando os nossos juízes aplicam o Direito estrangeiro, aplicam-no efectivamente. Se não há fiscalização difusa da constitucionalidade nesse Estado, então nós não a vamos fazer. Se essa existir: • Podemos fiscalizar e determinar a sua inconstitucionalidade – posição arriscada porque não conhecemos o suficiente desse Direito para avaliar dessa constitucionalidade. É estranho que seja um português a determinar a inconstitucionalidade de uma norma internacional Caso prático 19 – Interpretação e aplicação do Direito estrangeiro Admita que, ao dirimir um litígio referente a uma situação privada internacional, o tribunal português de 1.ª instância determinou que o Direito material competente era o Direito francês e que a concreta norma de Direito material aplicável ao caso concreto era, no seu entender, inconstitucional à face do disposto na Constituição da República Francesa. Como deve o tribunal português de 1.ª instância atuar nesta situação? Subhipótese: a resposta alterava-se se o Direito material estrangeiro competente fosse o do Estado de Nova Iorque (EUA) e a concreta norma aplicável fosse, no entender do tribunal português, inconstitucional face à Constituição dos EUA? 4º ano, Turma A Patrícia Carneiro da Silva 26 • Jorge Miranda – exige que esteja em causa uma inconstitucionalidade grave, pois que se houver dúvidas há uma presunção de constitucionalidade • Dário Moura Vicente + Lima Pinheiro – corrente maioritária. Se maioritariamente os tribunais e a Doutrina desaplicam determinada norma com base em inconstitucionalidade, então devemos também desaplicar. Segunda questão: como faço se as partes, no meu tribunal, não apresentam o Direito estrangeiro. P.e. a lei aplicável é a japonesa, mas as partes não as trazem ao processo. O art 348º, nº 1 fala do princípio da colaboração – as partes são obrigadas a levar o direito estrangeiro ao tribunal. No entanto, tendo em conta o princípio do dispositivo, há certas coisas que as partes poderiam não apresentar. Pode o juiz conhecer desses aspectos sozinho? Sim – art 348º, nº 2. O art 348º, nº 3 levanta algumas questões, ainda que tenha cada vez menos relevância. Estes casos relacionam-se com a matéria da aplicação e interpretação de normas de Direito estrangeiro. A principal questão neste âmbito é a de saber se tratamos este Direito estrangeiro como se de Direito nacional se tratasse. 14 DE NOVEMBRO – AULA PRÁTICA O caso em apreço descreve uma situação jurídica plurilocalizada, com pontos de contacto com os sistemas português e argentino. A questão central prende-se com saber se um negócio, validamente celebrado em certo país, mas inválido aos olhos da lei aplicável, deve ou não ter-se como válido. Em causa está, mais concretamente, a capacidade de Juan para celebrar este negócio, pois que ele é maior aos olhos da lei portuguesa (lei do domicílio e lei da celebração do negócio), mas menor aos olhos da lei argentina (lei da nacionalidade). 1. Os tribunais portugueses são internacionalmente competentes, razão pela qual L1 é a lei portuguesa. Em Portugal, à data, está em vigor o Regulamento Roma I, atinente às obrigações contratuais. • Âmbito de aplicação material – art 1º • Âmbito de aplicação temporal – art 28º, está em vigor desde 2009 • Âmbito de aplicação territorial – sim, considerandos ou protocolos de adesão Caso prático 21 – Lei pessoal das pessoas singulares Em julho de 2014, Juan, cidadão argentino com 18 anos que se encontrava de férias em Portugal, comprou, em Lisboa, por 4500 Euros e em segunda mão, a Miguel, cidadão português com residência habitual em Portugal, um computador portátil macbook pro c/ ecrã de retina. Dias depois, Juan, que considera ter feito mau negócio, pretende que o negócio seja declarado inválido uma vez que, segundo o direito material argentino a maioridade só se atinge aos 21 anos. Considerando que a ação era intentada em tribunais portugueses e que o DIP argentino submete as questões relativas à capacidade dos indivíduos à lei da nacionalidade destes: 1. Diga se o juiz português deve ou não invalidar o negócio. 2. Imagine que Miguel tinha nacionalidade argentina e que Juan lhe tinha dito que adquiria o computador por ocasião do seu 18.º aniversário e que o contrato foi celebrado em julho de 1994. Quid juris? 4º ano, Turma A Patrícia Carneiro da Silva 27 • Âmbito de aplicação espacial – art 1º, nº 1 in fine O mesmo determina, no seu art 1º, nº 2, al a) que está excluída da sua aplicação a regulação da capacidade das pessoas singulares. Não obstante, ressalva o disposto no art 13º. Esse, precisamente, da incapacidade, estatuindo que a incapacidade só é arguível se, no momento da celebração, o outro contraente tiver conhecimento dessa incapacidade
Compartilhar