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Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 Autor: Luana Signorelli 03 de Dezembro de 2021 03164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 1 Sumário Introdução ............................................................................................................................................... 3 1 – Realismo: A Nova Linguagem da Representação ............................................................................ 3 1.1 – Contexto Europeu ................................................................................................................. 7 1.2 – O Cientificismo ...................................................................................................................... 9 1.3 – Características Gerais do Realismo ..................................................................................... 11 1.4 – Realismo versus Naturalismo .............................................................................................. 13 1.5 – Quadro sinóptico de características ................................................................................... 17 2 – Realismo e Naturalismo em Portugal .............................................................................................. 17 2.1 – A Questão Coimbrã ............................................................................................................. 18 2.2 – Antero de Quental ............................................................................................................... 20 2.3 – Eça de Queirós ..................................................................................................................... 22 3 – Realismo e Naturalismo no Brasil ................................................................................................... 36 3.1 – Machado de Assis ................................................................................................................ 37 3.1.1 – Romances .................................................................................................................... 42 3.1.2 – Contos .......................................................................................................................... 54 3.2 – Aluísio Azevedo .................................................................................................................. 56 3.3 – Raul Pompéia ...................................................................................................................... 62 4 – A Arte do Final do Século XIX ........................................................................................................ 66 4.1 – Realismo .............................................................................................................................. 66 4.2 – Impressionismo ................................................................................................................... 67 4.3 – Rodin .................................................................................................................................... 68 4.4 – Realismo no Brasil ............................................................................................................... 69 4.5 – Intepretação de Obra Realista ............................................................................................ 69 Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 2 5 – Quadro Sinóptico ........................................................................................................................... 69 6 – Crítica Literária .............................................................................................................................. 72 7 – Lista de Questões ........................................................................................................................... 75 8 – Gabarito ........................................................................................................................................ 85 9 – Questões Comentadas .................................................................................................................... 85 10 – Referências Bibliográficas .......................................................................................................... 100 10.1 – Referências Bibliográficas das Imagens .......................................................................... 101 11 – Considerações FInais .................................................................................................................. 101 Professora Luana Signorelli Instagram: @profa.luana.signorelli Telegram: Luana Signorelli Facebook: /luana.signorelli YouTube: Professora Luana Signorelli Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 3 Carruagem de terceira classe (1864) de Honoré Daumier (1808-1879). INTRODUÇÃO Olá, prezados concurseiros. Hoje nós vamos dar continuidade ao nosso Curso de Literatura para Técnico Legislativo/Policial Legislativo – Senado Federal 2020 em teoria e questões. Lembrem-se sempre do nosso lema: O segredo do sucesso é a constância no objetivo. Segundo o nosso cronograma de aulas, hoje estudaremos o seguinte: AULA TÓPICOS ABORDADOS DATA Aula 04 Realismo e Naturalismo Características gerais. Tendências do século XIX. (cientificismo; evolucionismo; darwinismo; determinismo; positivismo). Diferenciação entre Realismo e Naturalismo. Contexto em Portugal: Eça de Queiroz e Antero de Quental. Contexto no Brasil: Machado de Assis, Aluísio de Azevedo e Raul Pompéia. 05/10/2020 Hoje abordaremos quadros sinópticos de obras mais importantes. O quadro sinóptico é um material de apoio que irá poder ajudá-los pouco antes da prova, por se tratar de conteúdos grandes com muita informação. Tanto é que se quiserem ler a obra inteira, cuidado com os spoilers. Hoje em particular, vamos fazer a interpretação de texto e a análise sintática ao longo da própria aula. Então, vamos lá, não percamos tempo! 1 – REALISMO: A NOVA LINGUAGEM DA REPRESENTAÇÃO Vamos começar essa aula de hoje observando a figura abaixo. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 4 Este quadro expressa com muita clareza a nova estética realista. Impressiona, à primeira vista, a escolha dos indivíduos representados. O foco não é a elite, muito menos homens ou mulheres idealizados. O pintor escolheu passageiros da terceira classe, ou seja, pessoas que viviam em condições miseráveis, fato que pode ser observado nas roupas simples, no amontoado das gentes e no cansaço evidente dos personagens da primeira fila. Essa imagem traduz visualmente aquilo que o Realismo literário também expressa. Assim como na pintura, o cotidiano passa a ser matéria da literatura. Observe, a título de comparação, os dois fragmentos descritivos, um do Romantismo, outro do Realismo. DESCRIÇÃO ROMÂNTICA “Afastemos indiscretamente uma dobra do reposteiro que recata a câmara nupcial. É uma sala em quadro, toda ela de uma alvura deslumbrante, que realça o azul celeste do tapete de riço recamado de estrelas e a bela cor de ouro das cortinas e do estofo dos móveis. A um lado, duas estatuetas de bronze dourado representando o amor e a castidade sustentam uma cúpula ovalde forma ligeira, donde se desdobram até o pavimento, bambolins de cassa finíssima. […] Correu-se uma cortina, e Aurélia entrou na câmara nupcial. Seu passo deslizou pela alcatifa de veludo azul marchetado de alcachofras de ouro, como o andar com que as deusas perlustravam no céu a galáxia quando subiam ao Olimpo.” (Senhora, José de Alencar) DESCRIÇÃO REALISTA “A carruagem parou ao pé de uma casa amarelada, com uma portinha pequena. Logo à entrada um cheiro mole e salobro enojou-a. A escada, de degraus gastos, subia ingrememente, apertada entre paredes onde a cal caía, e a umidade fizera nódoas. No patamar da sobreloja, uma janela com um gradeadozinho de arame, parda do pó acumulado, coberta de teias de aranha, coava a luz suja Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 5 do saguão. E por trás de uma portinha, ao lado, sentia-se o ranger de um berço, o chorar doloroso de uma criança.” (O primo Basílio, Eça de Queirós) ANÁLISE DAS DESCRIÇÕES Nos dois casos, temos a descrição de um ambiente que servirá de cenário para o encontro amoroso: o quarto no qual Aurélia receberá Fernando Seixas, seu marido (Senhora); e o corredor que dá a acesso ao quarto alugado, no qual Luísa encontrará seu amante, Basílio (O primo Basílio). A cena, portanto, é bastante banal, prosaica. No caso da descrição romântica, José de Alencar tenta dar especialidade que um quarto não possui, o ambiente está acima do ordinário. Tal fato pode ser notado pelo uso de adjetivos tais como “deslumbrante”, “bela”, “finíssima”, mas não apenas por esses recursos. As duas estátuas representam o amor e a castidade e o narrador compara Aurélia com as deusas do Olimpo. Os objetos ao redor expressam a própria pureza da personagem e lhe dão superioridade moral. Sugere-se que, para uma pessoa tão nobre, até mesmo o ambiente é superlativo, mesmo que isso custe a verossimilhança e o bom gosto. Verossimilhança: essa palavra é muito importante para a crítica literária. Um texto literário é ficcional, ou seja, ele não versa sobre o que aconteceu, mas sobre o que poderia ter ocorrido. Apesar de ser fruto da imaginação, o romance tenta recriar um ambiente ou uma história que não poderia contrariar o espaço real ou o tempo cronológico. Por exemplo, o uso de um narrador morto em Memórias Póstumas de Brás Cubas é uma licença da verossimilhança. A escolha dos objetos que serão descritos não tem compromisso com o real, mas com o que eles simbolizam. O tapete é azul-celeste, numa alusão à natureza tão cara aos românticos. Essa tonalidade se contrapõe ao dourado das cortinas e estofados, cor relacionada à nobreza dos metais. Isso sem falar no outro tapete de veludo azul com bordado de alcachofra dourada. O único compromisso do autor é com a simbologia dos elementos descritos. Na descrição de Eça de Queirós, os elementos não têm qualquer significado. Ao enumerar, o narrador se mantém fiel à verossimilhança. O leitor deve ser convencido de que essa escada poderia ter existido, dada a descrição exaustiva de pequenos detalhes. Observe que não há transposição entre objeto e valores morais ou espirituais (uma escada não representa algo como pureza, por exemplo). A materialidade dos objetos se impõe, portanto nada é idealizado. Pelo contrário. Vale, nesse ponto, uma observação sobre os tipos de adjetivos e os efeitos produzidos no texto. Há atributos mais “objetivos” e outros “subjetivos”. Um vocábulo como “bem” ou “mal” reflete um julgamento de quem emite a opinião (subjetivo). Já as palavras “branco”, “liso”, “rugoso” etc. são independentes da vontade de quem descreve. Eça abusa desse expediente de objetividade. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 6 Além disso, inclui adjetivos que revelam imperfeições em expressões como “casa amarelada”, “degraus gastos” e “luz suja”. Por fim, vale a pena destacar a escolha dos objetos a serem descritos. Ele faz questão de direcionar o olhar do leitor para detalhes que depõem contra o item descrito. Há nódoas na parede, pó acumulado, cal se despregando da parede etc. Deve ter ficado claro para você, corujinha esperta, que o Realismo parece ser o oposto do Romantismo. Vejamos o que escreveu sobre isso o maior nome do movimento em Portugal, Eça de Queirós. (LOPES; SARAIVA, 1985). "[O Realismo] É a negação da arte pela arte; é a proscrição do convencional, do enfático e do piegas. É a abolição da retórica considerada como arte de promover a comoção usando da inchação do período, da epilepsia da palavra, da congestão do tropos 'realismo'. É a análise com o fito na verdade absoluta. – Por outro lado, o Realismo é uma reacção contra o Romantismo: o Romantismo era a apoteose do sentimento; – O Realismo é a anatomia do carácter. É a crítica do homem. É a arte que nos pinta a nossos próprios olhos – para condenar o que houver de mau na nossa sociedade." ALMEIDA, Belmiro. Arrufos (1887). Disponível em: Ficheiro da Wikipedia. Disponível em: https://tinyurl.com/y65wgvdy. Acesso em: 24 set. 2020. Figura: Pixabay Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 7 Pertencente ao Realismo, a obra de Belmiro Almeida caracteriza-se como uma falência da instituição do casamento na classe burguesa. Percebe-se a indiferença do homem para com o sofrimento da mulher, representado não só pelo semblante choroso dela, como também pela rosa caída no chão. O adultério e o fatalismo eram temas comuns representados na arte realista do século XIX. 1.1 – Contexto Europeu Figura 1 – Referências da esquerda para a direita no sentido horário O século XIX foi abalado por uma série de revoltas e de ideias que mudariam a cara da Europa. Os conflitos refletiam a luta pela consolidação do poder da burguesia e a tensão entre proletários e proprietários. Em 1815, Napoleão é derrotado em Waterloo. No mesmo ano, os embaixadores de diversos países do continente se reúnem para redefinir as fronteiras entre as nações. Na prática, isso significou o retorno da monarquia ao poder. Em 1848, Paris assiste a uma nova revolta em moldes muito parecidos aos da Revolução Francesa. A burguesia, descontente com o governo monárquico, alia-se aos operários de Paris. Essa revolta foi vitoriosa para a rica classe social, mas não para o proletariado. Os operários organizam protestos que serão violentamente reprimidos em junho de 1848. 1840 Proudhon publica O que é a propriedade privada?..., marco do Socialismo. Utópico. 1848 Marx publica O Manifesto Comunista. 1857 Gustave Flaubert publica Madame Bovary, marco do Realismo francês Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 8 Novamente, em 1871, a luta entre burguesia nacional e operários se repete na França. Os proletários organizados tomam Paris e estabelecem um governo comunitário. A burguesia francesa, assustada e incapaz de fazer frente aos rebelados, alia-se a um inimigo histórico, a Alemanha, e consegue enfim vencer a guerra. Nesse percurso histórico, a divisão entre duas classes com interesses contraditórios se torna evidente. A “traição” da burguesia significa uma pá de cal nos anseios de uma sociedade mais justa, ideário promovido desde a Revolução Francesa. O impacto no pensamento político é grande com consequências nos movimentos sociais. Os dois grandes teóricosdo socialismo viveram no século XIX. Pierre-Joseph Proudhon (1809-1865), filósofo francês que, juntamente com outros escritores, lançou as bases do Anarquismo e do Socialismo Utópico (segundo Marx), escreveu O que é a propriedade? Pesquisa sobre o princípio do Direito e do governo. O pensador defendia a tese de que a propriedade é roubo. Imagine como a obra foi recebida pelas elites do mundo inteiro… O outro pensador, Karl Marx (1818-1883), filósofo, sociólogo, jornalista e revolucionário, escreveu O capital e O manifesto do Partido Comunista, um tratado analítico-panfletário que tinha o propósito de preparar as massas para a Revolução. Defendeu o “Socialismo Científico” para se opor às ideias de Proudhon que, para ele, eram ingênuas. Toda essa agitação social e política migra para a cultura. Escritores e artistas começam a representar a classe dos trabalhadores que se faz notar (como tema no quadro de Gustave Coubert, por exemplo). Além disso, esse gosto amargo de traição, resíduo de 1848 e 1871, tinge a forma como a burguesia se vê. O escritor, ele próprio filho dessa classe social, registra o cotidiano medíocre e hipócrita dessa nova ordem. Ao simplesmente registrar com senso crítico agudo, sem idealizar, como faziam os românticos, os escritores exibem a vergonha de uma nova era Então, o escritor era um burguês e falava mal da própria burguesia? Lembra-se da aula anterior que mencionou a grande ambiguidade da sociedade burguesa? Ela prometeu ideais libertários e precisa deles, mas não consegue cumpri-los. Dessa ambiguidade surgem os movimentos de ideias e movimentos literários. No Realismo essa crítica é mais cortante. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 9 Fo n te : P ix ab ay . E de onde vinham as ideias que levaram operários e artistas a se revoltarem? É isso o que iremos estudar agora. 1.2 – O Cientificismo No final do século XVIII, a Revolução Industrial muda as relações de trabalho. A introdução de máquinas como o tear mecânico, a fiandeira e a lançadeira móvel, entre outros equipamentos, aumenta a produtividade. Tais engenhocas, produtos de novas técnicas baseadas na racionalização dos processos de produção, aumentam a riqueza de forma exponencial. A ciência/tecnologia deixa de ser área de interesse de diletantes empenhados em discutir o funcionamento do mundo para fazer parte do cotidiano. O conhecimento científico avança e impacta a saúde, a indústria, a agricultura e as comunicações. Foi possível usar conceitos de física para o uso controlado dos raios X, para a produção de eletricidade e para a invenção do telefone, só para citar alguns exemplos. O método utilizado pela ciência mostra-se tão eficiente que surge como tábua de salvação para a resolução de qualquer problema enfrentado pelo ser humano. Até para problemas políticos? Problemas sociais? Problemas de relacionamento? Vários pensadores acreditavam que sim. Se fosse possível encontrar as causas da ação humana e criar leis e teorias sobre esse mundo à parte da realidade física, seria viável organizar a sociedade de uma maneira mais eficiente. Essa ideia levou os pensadores a tentar estender o método científico para áreas aparentemente resistentes a esse artifício. É no século XIX que são lançadas as sementes da nova historiografia e geografia, da psicologia e da sociologia. A esse otimismo exagerado com o método científico e à tentativa de submeter outras áreas da vida humana a essa mesma lógica denominaremos cientificismo. Por conta do cenário de pandemia global devido à Covid-19, é muito provável que este tema seja explorado de alguma forma. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 10 O primeiro ímpeto dessa tendência se traduz em várias teorias filosóficas: positivismo, darwinismo, evolucionismo, determinismo e o racismo científico. TEORIAS DO SÉCULO XIX Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 11 A literatura deve ser uma espécie de documento da sociedade, deve fazer refletir sobre a realidade social CIENTIFICISMO Incluir no texto literário a visão: Positivista, determinista, darwinista ESTILO /TEMAS Observação da realidade, descricionismo, análise psicológica Nesse contexto, os escritores tentam dar um outro status à Literatura. Não se trata de um texto ficcional para entreter leitoras, mas uma narrativa com forte carga de verossimilhança capaz de provar as ideias cientificistas da época. Torna-se comum, nesse período, o gênero romance de tese, no qual o autor cria uma história muito próxima da realidade para provar uma opinião. • Sistema criado por Auguste Comte (1798-1857). Considerada a ciência como modelo por excelência do conhecimento humano em detrimento das especulações metafísicas (místicas) ou teológicas. Tudo poderia e deveria ser explicado e organizado pelo conhecimento científico. POSITIVISMO • Conjunto de doutrinas que dão sustentação à tese positivias, pois considera a concepção filosófica evolucionista – o desenvolvimento inevitável do real em direção a estados mais aperfeiçoados – um modelo explicativo fundamental para o incessante fluxo de transformação do mundo natural, biológico e espiritual (Dicionário Houaiss Eletrônico/modificado). EVOLUCIONISMO • Aplicação não justificada cientificamente do conceito de seleção natural de Charles Robert Darwin (1809-1882) na compreensão das relações humanas. A análise social é feita pela ótica da luta e da lei do mais forte ou do mais apto. Percebe-se a solidariedade como um artifício social que mascara os conflitos. DARWINISMO • Princípio segundo o qual os fenômenos, inclusive sociais, estão ligados entre si por rígidas relações de causalidade e leis universais que excluem o acaso, a indeterminação e a liberdade. Segundo essa ideia, o homem é determinado pela raça, pela história e pelo ambiente. Como se o lema fosse: “Diga-me a que raça você pertence, onde você mora e sua época histórica e direi quem você é”. DETERMINISMO • É a crença pseudocientífica de que existem evidências que justificam a superioridade de uma raça sobre outra. Usando como critério o desenvolvimento da escrita e da ciência, ou europeus acreditavam que a raça branca era superior; a amarela, intermediária, e a negra e a indígena, inferiores, por não terem nem escrita nem técnicas sofisticadas. RACISMO CIENTÍFICO OU BIOLÓGICO Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 12 1.3 – Características Gerais do Realismo Vamos resumir o que já vimos? O QUE É OBJETIVIDADE E COMO IDENTIFICÁ-LA NO TEXTO? Objetividade se refere a um estilo pautado por recursos linguísticos cujos efeitos levam o leitor a acreditar que aquela opinião tem caráter geral, e não particular. Objetividade vem da palavra “objeto” e se refere à forma analítica e impessoal como tratamos determinado assunto. Se tivermos de fazer um texto sobre, por exemplo, uma cadeira, adotaremos uma linguagem com poucos adjetivos valorativos, poucos advérbios e faremos uma enumeração de traços que não despertaria qualquer emoção. Essa situação mudaria de figura se alguém pedisse que você descrevesse a cadeira onde seu avô, de quem você tem muitas saudades, se sentava regularmente. Um jornalista que cobre uma tragédia, por mais emocionado que esteja, deveadequar a linguagem para que ela seja informativa, não emotiva. Observe o exemplo abaixo. A linguagem científica com seus termos precisos, uso da terceira pessoa e referencialidade cria a ilusão de uma verdade inquestionável. A poesia vai em outra direção. O poeta se vale da primeira pessoa, utiliza figuras de linguagem, pontuação expressiva para criar a ilusão de que se expressa uma emoção, mesmo que o assunto seja astronomia. OBJETIVIDADE SUBJETIVIDADE Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 13 POR QUE AS ESTRELAS TÊM CORES DIFERENTES? PETRÔNIO DE TILIO NETO, 12 ANOS, JAÚ (SP). (...) RAMIRO DE LA REZA, DO OBSERVATÓRIO NACIONAL DO RIO DE JANEIRO (RJ), RESPONDE: AS ESTRELAS TÊM CORES DIFERENTES PORQUE TÊM TEMPERATURAS DIFERENTES. AS CORES SÃO DEFINIDAS APENAS PELAS EMISSÕES NA CHAMADA FAIXA ÓPTICA, A REGIÃO DO ESPECTRO QUE O OLHO HUMANO, NU OU COM LUNETA, É CAPAZ DE CAPTAR. O OLHO HUMANO NÃO VÊ, POR EXEMPLO, NEM NO INFRAVERMELHO NEM NO ULTRAVIOLETA. DA FAIXA VISÍVEL, SUA EFICIÊNCIA É MAIOR NO AMARELO. FOLHA DE SÃO PAULO – CADERNO MAIS! 01/08/93. “Ouvir Estrelas” “Ora (direis) ouvir estrelas! Certo, Perdeste o senso!” E eu vos direi, no entanto, Que, para ouvi-las, muitas vezes desperto E abro as janelas, pálido de espanto... E conversamos toda a noite, enquanto a Via-Láctea, como um pálio aberto, Cintila. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto, Inda as procuro pelo céu deserto. Direis agora: “Tresloucado amigo! Que conversas com elas? Que sentido Tem o que dizem, quando estão contigo?” E eu vos direi: “Amai para entendê-las! Pois só quem ama pode ter ouvido Capaz de ouvir e de entender estrelas”. O que você vai encontrar no movimento do Realismo? Crítica à burguesia, à família, ao casamento, à Igreja e ao clero Combate à idealização romântica Visão objetiva da realidade Descritivismo; verossimilhança Realce aos defeitos e imperfeições Personagens complexas (esféricas): profundidade psicológica. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 14 1.4 – Realismo versus Naturalismo Assim como no Romantismo ocorreu uma vertente exagerada em relação aos pressupostos do movimento, no Realismo acontece algo parecido a partir de dois autores que dão respostas diferentes aos desafios impostos pelo século XIX. Gustave Flaubert (1821-1880), escritor francês, dá início ao Realismo com a publicação de Madame Bovary (1857). O público, acostumado às histórias adocicadas de heroínas virgens que finalmente encontravam o amor verdadeiro, espantou-se com a narrativa de uma mulher já casada e fútil, que se entregava a um amante que passa pela cidade onde mora. A história parecia cotidiana demais e imoral demais para a sensibilidade da época. Além disso, os leitores se irritaram com a descrição quase fotográfica das cenas. O romance foi proibido e Flaubert foi acusado de “imoralidade”. Os críticos perceberam que se expunha a hipocrisia burguesa no coração da própria classe, a família, e acusavam o autor de investir contra sua própria classe social. Essa é a vertente que define o Realismo. Já o francês Émile Zola (1840-1902) tomou outro caminho. Ele não foi apenas um escritor, mas também jornalista e importante crítico político. Em 1866, publica Thérèse Raquin, obra em que mistura ficção com as ideias cientificistas, compondo aquilo que se convencionou chamar de “romance de tese”, um gênero ficcional cuja histórica tem a finalidade de revelar uma verdade social. Mas é com Germinal que o autor consolida essa nova vertente que ficará conhecida como Naturalismo. O protagonista do romance não é exatamente um herói solitário, mas um personagem coletivo, os trabalhadores de uma mina de carvão que, motivados pelas péssimas condições em que viviam e pelos ideais socialistas, revoltam-se e organizam uma greve geral. A manifestação é reprimida com violência. Para escrever a obra, Zola passou dois meses trabalhando em uma mina de carvão. O Naturalismo surge como uma grande novidade temática (inclusive no que diz respeito à aproximação com a ciência). Além disso, Zola se vale de uma linguagem sem rodeios, utiliza termos considerados “não literários” e inclui algumas palavras próprias das ciências naturais. Para se ter uma ideia, seguem dois fragmentos textuais do Naturalismo: um do próprio Zola (Germinal) e outro de Aluísio Azevedo (O homem). TEXTO I “o poço engolia magotes de vinte e de trinta homens, e com tal facilidade que nem parecia senti-los pela goela.” “[...] a corda, para dar o sinal embaixo, era puxada quatro vezes, convenção que queria dizer 'aí vai carne' e que avisava da descida desse carregamento de carne humana.” Émile Zola Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 15 TEXTO II “Pobre velha! Consumia-se numa infernal complicação de moléstias; eram intestinos, era cabeça, eram pernas, era o diabo! Parecia uma decomposição em vida: fedia como coisa podre! Já se não alimentava pela boca; os seus gemidos eram arrotos de ovo choco, e os humores que ela expelia por toda a parte do corpo empesteavam a casa inteira. […]” Perceberam como o personagem, nesses casos, não têm qualquer especialidade? A tese dos naturalistas é a de que o homem não se diferencia do animal. Como expressar isso? Pense rápido, qual a diferença entre homem e animal? A racionalidade. Tire a razão, resta o quê? O corpo. Eles irão focalizar o corpo usando os seguintes recursos: Comparações entre homens e animais (zoomorfismo). Exemplo: “daquele lameiro, e multiplicar-se como larvas no esterco” (O cortiço, Aluísio Azevedo). Destacar aspectos fisiológicos que nos igualam aos animais, o cheiro, o hálito, o suor etc. Exemplo: “os seus gemidos eram arrotos de ovo choco”. Focalizar comportamentos movidos pelo instinto. Exemplo: “Não era a inteligência nem a razão o que lhe apontava o perigo, mas o instinto, o faro sutil e desconfiado de toda a fêmea pelas outras, quando sente o seu ninho exposto.” REALISMO NATURALISMO Origem: França (1857) Gustave Flaubert – Madame Bovary Origem: França (1867) Émile Zola – Thérèse Raquin Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 16 Representava desvios morais. Representava desvios sociais e sexuais, mazelas. Romance documental, fotografa a realidade para dar impressão de vida real, psicologismo. Retrato da alta burguesia da segunda metade do século XIX. Romance experimental, que pretende apoiar-se na experimentação científica e numa tese, no determinismo, no evolucionismo, no homem é fruto do meio. Impassibilidade. Narrador em um ângulo neutro, não há interesse em agradar ao público, mas sim em retratar a realidade tal qual ela é. Arte engajada, preocupações políticas e sociais. Seleciona os temas, tem aspirações estéticas. Detém-se nos aspectos mais torpes e degradantes. Reproduz a realidade exterior bem como a interior, por meio da análise psicológica. Centra-se nos aspectos externos: atos, gestos, ambientes, personagens e seus instintos, animalização, zoomorfismo. Volta-se para a psicologia, para o indivíduo. Nomes: Dom Casmurro, Quincas Borba, Memórias póstumas de Brás Cubas. Volta-se para o coletivo, para a biologia, a patologia, centra-se mais no social. Retrata e critica as classes dominantes, a alta burguesia. Espelhacamadas inferiores: o proletariado, os marginais, o povão. É indireto na interpretação, o leitor tira as suas conclusões: sutil, sugere. É direto na interpretação, expõe conclusões, cabendo ao leitor aceitá-las ou discuti-las: grotesco, mostra. Grande preocupação com o estilo. O estilo é relegado ao segundo plano; no primeiro, há denúncia. Eis abaixo outros conceitos quanto à Literatura do período que podem lhes ajudar. LIBERDADE DETERMINISMO Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 17 OUTRORA UMA NOVELA ROMÂNTICA, EM LUGAR DE ESTUDAR O HOMEM, INVENTAVA-O. Hoje o romance estuda-o na sua realidade social. OUTRORA NO DRAMA, NO ROMANCE, CONCEBIA-SE O JOGO DAS PAIXÕES A PRIORI. Hoje, analisa-se a posteriori, por processos tão exatos como os da própria fisiologia. O Romantismo partia do princípio (a priori) de que o homem era livre e, nas narrativas, os protagonistas tinham a liberdade de inventar desejos que poderiam ser satisfeitos pela força de vontade; o Realismo partia da análise posterior (a posteriori), sob a perspectiva de que o homem não tinha liberdade e de que o personagem simplesmente seguia as determinações do seu instinto ou de seu meio social. Fatalismo. Doutrina segundo a qual os acontecimentos são fixados com antecedência pelo destino; atitude moral ou intelectual segundo a qual tudo acontece porque tem de acontecer, sem que nada possa modificar o rumo dos acontecimentos; atitude dos que acreditam nessas ideias; doutrina filosófica que propensa um rígido determino, equivalente à curva mítica ou religiosa na inexorabilidade do destino (dicionário Houaiss). Exemplo: no romance Anna Kariênina do realista russo Liév Tolstói, a protagonista presencia no início do livro uma pessoa que morreu sobre os trilhos do trem, sendo que ao fim do romance ela decide se suicidar da mesma maneira. 1.5 – Quadro sinóptico de características Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 18 2 – REALISMO E NATURALISMO EM PORTUGAL QUESTÕES RELEVANTES/CONSEQUÊNCIAS 1865: Questão Coimbrã. 1915: Publicação da Revista Orpheu → Modernismo. • Enfrentamento da realidade (Realismo) e não fuga da realidade (Romantismo) • Análise (Realismo) e não fantasia (Romantismo) • Racionalidade (Realismo) e não sentimentalismo (Romantismo) • Relações humanas baseadas no interesse financeiro (Realismo) e não relações humanas baseadas no idealismo (Romantismo) • Adultério (Realismo) e não amor eterno (Romantismo) REALISMO • Mistura entre ficção e cientificismo (Positivismo; Darwinismo; Determinismo) • Temas: agrupamentos sociais, comportamentos pautados pelos instintos (violência, adultério, homossexualidade). • Forma: linguagem simples, agressiva, às vezes chula; incorporação de termos cientificistas; zoomorfismo; destaque a aspectos fisiológicos. • Romance de tese. NATURALISMO Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 19 Se há duas palavras que podem definir a segunda metade do século XX para os portugueses, estas palavras são “crise” e “humilhação”. Depois da perda do Brasil como colônia, Portugal não conseguiu mais se estabilizar. A partir do momento em que a Monarquia Constitucional se consolida no país, uma questão parece assombrar os intelectuais lusitanos: como fazer para tirar o país do atraso em que ele se encontra? Essa questão se tornará ainda mais contundente pelo fato de que Portugal, finalmente, se ligará por via férrea a Paris. A circulação física de pessoas leva à circulação de ideias. Desembarcam, no solo de Camões, todas as vertentes do cientificismo que encontrarão nas mentes dos jovens de Coimbra uma boa acolhida. A pobreza grassa no país. A maior fonte de renda continua a ser o Brasil – imigrantes que partem para a ex-colônia fazem remessas generosas de dinheiro. A fundação do partido comunista demonstra a influência estrangeira e a existência de um movimento organizado em torno do operariado ou do campesinato. Em 1890, o Reino Unido exige a retirada imediata das forças militares portuguesas da região compreendida entre Angola e Moçambique, na África. Portugal, sem condições de resistir, cede aos caprichos ingleses sem sequer tentar uma negociação. A antiga potência marítima teve de renunciar às suas pretensões, de forma humilhante. Some-se a isso a bancarrota financeira de 1891 e você entenderá o pessimismo e o ponto de vista crítico que irão pairar sobre o país. 2.1 – A Questão Coimbrã A situação de Portugal era a seguinte: diante de um país que dormia em berço esplêndido, a Universidade de Coimbra se mantinha como polo de divulgação das ideias gestadas na longínqua “Europa”, que já estava na segunda Revolução Industrial. Os jovens que circulavam nesse ambiente acadêmico não se conformavam com a pasmaceira lusitana. 1836 1871 1814 1875 1891 Revolução de Setembro Ultimato Britânico/ Crise financeira Conferências do Casino Lisbonense Fundação do Partido Socialista Bancarrota do Estado português 1890 1850-1864 - Linhas Férreas/ Interligação com a Europa Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 20 A questão coimbrã representa, no plano cultural, esse grito de alerta. Em resumo, a questão opunha os poetas românticos com sua literatura conformista aos jovens coimbrãos que defendiam um caráter revolucionário na literatura. Fonte das imagens: Pixabay. Essa polêmica, apesar de ser restrita aos círculos intelectuais, levou à difusão dos ideais realistas. O movimento se consolidará em 1871, no que ficou conhecido como Conferências do Casino Lisbonense. Antero de Quental, influenciado por Proudhon, propôs a um grupo de intelectuais que discutissem as novas ideias científicas e a situação de Portugal. Entre as conferências, algumas chamavam atenção até pelo título, “Causas da decadência dos povos peninsulares”, “Os historiadores críticos de Jesus” e “O socialismo”. Somente cinco das dez Feliciano de Castilho (1800-1875), representante da 1ª geração romântica e defensor da arte espiritual do Romantismo, ao escrever o prefácio do livro de Pinheiro Chagas, critica os jovens de Coimbra. A Questão Coimbrã em 4 lances v Antero de Quental (1842-1891), jovem poeta, publica o livro Odes Modernas, no qual defende que a poesia deve ser revolucionária. Antero de Quental escreve uma carta aberta que circula em Coimbra e Lisboa. Sob o título “bom senso e bom gosto”, ele ataca diretamente Castilho: “A futilidade num velho desgosta-me tanto como a gravidade numa criança. V. ex.ª precisa menos cincoenta annos de edade, ou então mais cincoenta de reflexão.” Pinheiro Chagas (1842-1895), poeta romântico protegido de Feliciano de Castilho, responde acusando Antero de um materialismo ambíguo. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 21 programadas ocorreram, pois as últimas foram proibidas a pretexto de que as ideias ali discutidas atacavam a religião e as instituições do Estado. Em Portugal, consideram-se dois grandes nomes do movimento: Antero de Quental e Eça de Queirós. O primeiro é umgrande representante da poesia realista. O segundo é considerado um dos maiores romancistas em Língua Portuguesa. Os dois nos dão, em alguma medida, uma ideia das mudanças pelas quais passavam a cultura e a Literatura no final do século XIX. 2.2 – Antero de Quental Antero Tarquínio de Quental (1842-1891) teve uma trajetória intensa e trágica. Nascido de uma família abastada da região dos Açores, pôde, aos 16 anos, ingressar no curso de direito da Universidade de Coimbra. Na época, Coimbra fervia com as ideias cientificistas que circulavam nos grandes centros europeus e, ali, a tradição religiosa do jovem foi posta à prova. Logo, não somente cedeu às novas ideias do século como também tornou-se um dos líderes dos estudantes. Em 1865, Antero edita “Odes Modernas”, livro no qual ele rompe com o Romantismo e defende uma poesia libertária e combatente. Assim começou o episódio da Questão Coimbrã, como já mencionado anteriormente. Entra em contato com as ideias socialistas, aprende tipografia e torna-se operário. Entre 1866 e 1868 vivencia a experiência de ser operário em Paris. Volta a Lisboa e começa intensa atividade de militância. Inicialmente, participa do círculo intelectual que promoveu as conferências do Casino Lisbonense em 1871. Foi um dos fundadores do Partido Socialista Português. Colaborou com diversos periódicos, muitos deles de tendências socialistas. Em 1873, herda uma quantia que lhe permite viver de rendimentos. Contrai tuberculose. Em 1881, retira-se para Vila do Conde, onde vive um pouco mais sossegado. Ainda envolve-se com política, pois participa da Liga Patriótica do Norte, em resposta ao ultimato inglês em 1890. Em 1891, o poeta já dava sinais de depressão profunda e, no mesmo ano, comete suicídio. Essa trajetória bastante movimentada está expressa na sua poesia. Nunca abandonou de fato o ímpeto religioso por uma busca de algo que fosse além do trivial e do cotidiano. Percebem-se alguns temas que sucedem na poesia. Inicialmente, desenvolve uma poesia romântica de cunho religioso; na fase de Coimbra, torna-se combativo, defende a razão e parece vislumbrar uma época de mudanças; na fase final, o poeta assimila certo pessimismo influenciado pela filosofia do budismo. Além dessas fases, é possível fazer outra classificação a partir das poesias do poeta. Ele oscila entre o otimismo, que se reflete no uso de expressões que se referem à luz e à luminosidade, e o pessimismo, marcado pela escuridão. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 22 Essa força de dissolução que se percebe nos temas caros ao poeta encontra contraponto na forma: Antero de Quental foi um dos maiores sonetistas em Língua Portuguesa. A fragmentação interna do poeta parece necessitar de uma forma que dê alguma permanência fincada na tradição literária. Para se ter uma ideia da produção de Antero, seguem-se dois sonetos. No primeiro, pode-se perceber a fase combativa, luminosa, na qual o poeta defendia que as ideias poderiam ser guias para os homens. No segundo, predomina o pessimismo existencial. Força é pois ir buscar outro caminho! Lançar o arco de outra nova ponte Por onde a alma passe — e um alto monte Aonde se abre à luz o nosso ninho. Se nos negam aqui o pão e o vinho, Avante! é largo, imenso esse horizonte... Não, não se fecha o mundo! e além, defronte, E em toda a parte há luz, vida e carinho! Avante! os mortos ficarão sepultos... Mas os vivos que sigam, sacudindo Como o pó da estrada os velhos cultos! Doce e brando era o seio de Jesus... Que importa? havemos de passar, seguindo, Se além do seio D’Ele houver mais luz! Esse soneto já abre a primeira estrofe com a tese do poeta: “é preciso buscar outro caminho!”. Parece uma conclamação à coletividade que, aliás, aparece ao final da primeira estrofe, quando o poeta usa o pronome “nosso”, ou seja, na primeira pessoa do plural. Essa necessidade não é vista como impossível. O eu lírico incentiva seus leitores “avante” e, por fim, faz uma comparação com a perspectiva religiosa “doce e brando era o seio de Jesus...”. Na comparação, o além D’Ele promete ser melhor, pois haverá mais luz. Nesse poema, Antero parece comungar com as ideias filosóficas correntes de que a ciência e o conhecimento indicavam um avanço progressista das sociedades. A religião fora uma fase, para além da fé, haveria a ciência e um mundo melhor a ser buscado. Nesse texto não se observa traço de pessimismo. O tom é totalmente outro no poema que se segue: No Turbilhão (A Jaime Batalha Reis) No meu sonho desfilam as visões, Espectros dos meus próprios pensamentos, Como um bando levado pelos ventos, Arrebatado em vastos turbilhões... Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 23 Fonte: Pixabay. N'uma espiral, de estranhas contorsões, E d'onde saem gritos e lamentos, Vejo-os passar, em grupos nevoentos, Distingo-lhes, a espaços, as feições... — Fantasmas de mim mesmo e da minha alma, Que me fitais com formidável calma, Levados na onda turva do escarcéu, Quem sois vós, meus irmãos e meus algozes? Quem sois, visões misérrimas e atrozes? Ai de mim! ai de mim! e quem sou eu?!... Nesse poema, que manifesta quase uma análise da subjetividade, o eu lírico se vale do sonho para mostrar sua fragmentação. O eu dividido se reflete em espectros de seus próprios pensamentos. O resultado disso são lamentos e gritos. Essas imagens, fantasmas do próprio poeta, surgem com algozes. O poema é inconclusivo. O poeta não reconhece seus fantasmas e não reconhece a si mesmo. As duas obras mais famosas publicadas em vida são Odes Modernas e Sonetos Completos. 2.3 – Eça de Queirós Eça de Queirós (1845-1900) é considerado um dos grandes escritores em língua portuguesa. Mudou os rumos da Literatura e da própria língua portuguesa ao adotar um estilo mais enxuto e trazer para a prosa literária a linguagem próxima à do jornalismo. Com suas obras, conquistou fama internacional em vida. José Maria da Eça de Queirós nasceu em Póvoa do Varzim, em 1845, e morreu na França, em 1900. Chama a atenção em sua biografia o fato de seus pais só terem se casado quando ele tinha quase 4 anos. O fato em si aponta para uma família na qual as tradições não eram levadas tão a sério, o que, sem dúvida, deve ter colaborado para que ele se mostrasse sempre desconfiado diante das tradições. Na adolescência foi para um internato e, depois, para Coimbra, onde se formou em Direito. Na cidade universitária conheceu Antero de Quental, que o influenciou na sua verve crítica. Escreveu artigos que foram publicados depois com o título de Prosas Bárbaras. Em 1866, mudou-se para Lisboa, onde exerceu advocacia e jornalismo. Em 1871, participou das Conferências do Casino Lisbonense. Mais tarde, em 1870, começa sua carreira pública, sendo nomeado administrador do Concelho de Leiria. Três anos depois, ingressou na carreira diplomática. Casou-se aos 40 anos e teve 4 filhos. Morreu em Neuilly-Sur-Seine, cidade próxima de Paris. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 24 A imagem que ficou para a história é a de um escritor combativo, crítico cortante, irônico, acertando, com suas opiniões, “o homem de bem”, as instituições falidas e corrompidas. Através da Literatura, ele ambicionava traçar um retrato da sociedade portuguesa sem condescendência, deixando as ossadas à mostra para a repugnância de quem observava a cena. Há certo pessimismo e fastio com os homens da sua época, que será parcialmentereduzido com o passar dos anos, deixando despontar uma ponta de esperança somente nos seus romances finais. Vale destacar e relembrar que os críticos dividem sua produção literária em 3 fases: Na última fase, Eça de Queirós parece se reconciliar com os homens. Em A cidade e as serras, o personagem principal, Jacinto (o próprio Eça?), cansado da civilização e dos cientificismos, encontra paz para sua alma junto ao povo simples das serras portuguesas. Nessa obra, ele abandona a crítica mordaz e cria um enredo alegórico. Jacinto é o próprio Portugal e há nesse enredo uma lição para os “homens de bem” perdidos de sua época. Quase chega a ser uma fábula moderna. Algo semelhante ocorre em A ilustre casa de Ramires. • Prosas Bárbaras: textos influenciados pelos românticos da terceira fase (idealização social) • Traços românticos 1ª fase • O Crime do Padre Amaro (1874); Primo Basílio (1878) e Os Maias (1888), obras realistas naturalistas (crítica, patologia social, hipocrisia) • Crítica das instituições portuguesas: Igreja, pequena burguesia (classe média), elite, pessimismo; 2ª fase • A Ilustre Casa de Ramires (1900), A Cidade e as Serras (1901, obra póstuma), obras pós realistas (valorização de Portugal, caráter mais alegórico do que realista) • Romance de tese, exaltação da simplicidade portuguesa, esperança. 3ª fase Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 25 CARACTERÍSTICAS DO AUTOR Seguem algumas das obras mais importantes do autor. O primo Basílio Romance publicado em 1877, retrata com bastante fidelidade a sociedade portuguesa. O autor investe contra a classe média lusitana, correndo o risco de construir personagens estereotipados. Encontramos o “corno” típico, a mulher fútil, a amiga má companhia etc. Desponta como personagem complexa a empregada, Juliana, que desperta no leitor sentimentos de raiva, de pena e de compreensão. A obra foi inspirada em Madame Bovary, e alguns críticos insistem em ver nisso certa falta de criatividade. O romance lusitano, assim como o francês, se estrutura em torno da traição e do adultério. Eça, apesar da evidente imitação, transpõe o enredo para a realidade portuguesa com uma maestria ímpar, até porque se vale de uma linguagem sem adjetivação romântica, mudando a estilística da língua portuguesa na escrita. DESCRITIVISMO IRONIA LINGUAGEM OBJETIVA ANÁLISE DE CARÁTER • Narrador: terceira pessoa, onisciente e que se propõe a apresentar de forma fria e distante os fatos que serão narrados; uso de discurso indireto. • Tempo: não tem data definida, mas passa-se na segunda metade do século XIX; a narrativa é linear. • Espaço: o espaço predominante é Lisboa. Percebe-se a intenção de Eça em criticar a sociedade lisboeta. FICHA DE LEITURA Fi gu ra : P ix ab ay Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 26 Enredo O enredo tem como protagonista Luísa, esposa de Jorge, um engenheiro bem colocado em um ministério. O cotidiano do casal é extremamente banal. O momento mais excitante dessa vida a dois acontece quando Jorge recebe seus amigos. O grupo é composto por D. Felicidade, que sente atração pelo Conselheiro Acácio, outro ilustre integrante da turma, sujeito caricato e que vomita uma erudição vazia. Há ainda Ernestinho, um arremedo de escritor romântico; Julião, um estudante de Medicina, crítico oportunista da sociedade portuguesa; e Sebastião, único personagem que não é caricato e que se mantém leal ao drama humano seja de Luísa, seja de Jorge. Os amigos discutem sobre frivolidades como se fossem as coisas mais importantes do mundo. Essas “palestras” entediantes ocupam uma parte significativa dos primeiros capítulos e são extremamente irritantes para o leitor. É como se o leitor sentisse na pele o tédio desse estilo de vida. Por motivos profissionais, Jorge vai ficar algumas semanas longe de Luísa, vai para o Alentejo. No ínterim, Basílio, primo de Luísa, retorna de Paris para ficar algum tempo em Lisboa. Decide visitar a prima e, como lhe parecesse bem apessoada, resolve seduzi-la. A tarefa não foi difícil. Luísa era ávida leitora de romances românticos e sonhava com um amor mais ardente e aventuroso. Eles trocam várias cartas e se encontram algumas vezes num quarto denominado por Basílio de “Paraíso”. Juliana, a empregada ressentida, recolhe algumas dessas cartas comprometedoras à espera do momento certo para chantagear a patroa. Luísa não tem dinheiro nem ideia de como conseguir a quantia exigida pela empregada. Para piorar, Jorge retorna e a relação com Basílio esfria. Nesse contexto, ocorrem várias peripécias que têm como motivação a resolução do impasse. Luísa tenta ter relações com um homem rico, mas não consegue; faz concessões a Juliana, começa a trabalhar no lugar da empregada e, lógico, pede dinheiro a Basílio, que se retira de Portugal. Desesperada, confia seu problema a Sebastião, que se prontifica a ajudá-la. Acompanhado de um policial, o amigo de Jorge aborda a empregada com ameaças, momento em que ela, assustada, morre devido a um aneurisma. Tudo parece estar resolvido. Luísa, dada a situação estressante, adoece. Jorge fica ao lado dela, cuidando da saúde da amada. Nesse momento, o marido recebe uma carta de Paris. Basílio escrevera se justificando por não poder ajudá-la a esconder o adultério. Como ela está acamada, Jorge abre a correspondência e descobre tudo. Luísa, ao saber disso, entra em desespero e morre. Jorge se muda. Basílio volta a Lisboa e, ao saber da morte da amante, lamenta não ter mais diversão em Lisboa. Interpretação O romance pertence à segunda fase do autor. A configuração do círculo de amizades de Jorge é muito importante para Eça, pois através deles o autor dispara farpas críticas aos lisboetas, que se consideravam a camada pensante de Portugal. Em alguma medida, o leitor de Eça reconheceria algum vício exposto na obra de forma irônica e risível. Vamos aos tipos: Fi gu ra : P ix ab ay Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 27 Indivíduo moralista, arrogante e cheio de erudição fútil, mas que tinha uma amante bem mais jovem (Conselheiro Acácio). Senhora moralista, mas que tinha desejos sexuais e vontades imorais (D. Felicidade). Jovem ambicioso e inteligente capaz de tecer críticas próprias e contundentes, mas que as usa como forma de ascensão social (Julião). Escritor romântico que finge criticar a sociedade quando, na verdade, adapta o enredo para conseguir aplauso do público valendo- se de uma narrativa óbvia (Ernestinho). Mulher casada que poderia fingir-se de esposa ideal, contanto que pudesse manter seus relacionamentos adúlteros em segredo (Luísa). Ao lado, cartaz do filme “O primo Basílio” (2007). Fonte: Imdb. O primo Basílio (1878) CATEGORIA DEFINIÇÃO ESTRUTURA 26 (XVI) capítulos. PERSONAGENS Luísa, Jorge, D. Felicidade, Conselheiro Acácio, Ernestinho, Basílio, Sebastião. TEMPO Segunda metade do século XIX; a narrativa é linear. ESPAÇO Predominantemente Lisboa. ENREDO Luísa é esposa de Jorge, um engenheiro bem colocado em um ministério. O cotidiano do casal é extremamente banal. O momento mais excitante dessa vida a dois acontece quando Jorge recebe seus amigos. CONFLITO Por motivos profissionais, Jorge vai ficar algumas semanas longe de Luísa, vai para o Alentejo. No ínterim, Basílio, primo de Luísa, retorna de Paris para ficar algum tempo em Lisboa. Decide visitar a prima e, como lhe parecesse bem apessoada, resolve seduzi-la,o que não foi difícil – ela era uma ávida leitora romântica. CLÍMAX Juliana, a empregada ressentida, recolhe algumas dessas cartas comprometedoras à espera do momento certo para chantagear a patroa. Luísa não tem dinheiro nem ideia de como conseguir a quantia exigida pela empregada. Para piorar, Jorge retorna e a relação com Basílio esfria. Desesperada, Luísa confia seu problema a Sebastião. Acompanhado de um policial, ele aborda a empregada com ameaças, que , morre devido a um aneurisma. DESFECHO Luísa adoece. Nesse momento, Jorge recebe uma carta de Paris e descobre tudo. Luísa entra em desespero e morre. Jorge se muda. Basílio volta a Lisboa e, ao saber da morte da amante, lamenta não ter mais diversão em Lisboa. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 28 TRECHO DE O PRIMO BASÍLIO Sebastião fechou a porta da sala de jantar, pousou o candeeiro sobre a mesa, onde havia ainda um prato com côdeas de queijo e um fundo de vinho num copo, deu alguns passos fazendo estalar nervosamente os dedos, e parando bruscamente diante de Juliana: – Dê cá umas cartas que roubou à senhora... Juliana teve um movimento para correr à janela, gritar. Sebastião agarrou-lhe o braço, e fazendo-a sentar com força sobre a cadeira: – Escusa de ir à janela gritar, a polícia já está dentro de casa. Dê cá as cartas, ou para a enxovia! Juliana entreviu num relance um quarto tenebroso no Limoeiro, o caldo do rancho, a enxerga nas lajes frias... – Mas que fiz eu? — balbuciava. – Que fiz eu? – Roubou as cartas. Dê-as para cá, avie-se. Juliana, sentada à beira da cadeira, apertando desesperadamente as mãos, rosnava por entre os dentes cerrados: – A bêbeda! A bêbeda! Comentários A cena representa uma cena íntima desesperada entre Sebastião tentando preservar os segredos epistolares de Luísa e Juliana tentando revelá-los. Nesse sentido, o texto realista evidencia-se cheio de intrigas. Os Maias Esse é considerado o último livro da fase crítica de Eça de Queirós. Nele, o escritor tem como foco a classe mais alta de Portugal. O enredo, centrado em alguns personagens românticos, serve para que o autor se posicione contra o movimento anterior. Vale-se do tema de um amor proibido entre irmãos. Enredo A saga dos Maias começa com o casamento de Afonso, rico proprietário, com Maria Eduarda. Desse enlace, nasce Pedro Maia. O filho teve uma educação romântica e católica. A mãe, por quem o rapaz tinha verdadeira adoração, morre e Pedro se apaixona perdidamente por Maria Monforte, filha de um negociante de escravos. O pai de Pedro se opõe ao casamento e o filho se afasta do convívio paterno. O casal tem 2 filhos, Carlos Eduardo e Maria Eduarda. Maria Monforte se apaixona por um italiano e abandona o • Narrador: terceira pessoa, onisciente. • Tempo: segunda metade do século XIX, com flashbacks que permitem reconstituir a história familiar de 3 gerações. O momento em que avô e neto se instalam no casarão chamado “Ramalhete”, em 1875. • Espaço: o espaço predominante é Lisboa. FICHA DE LEITURA Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 29 marido e um dos filhos. Pedro retorna desolado apenas com o filho mais velho, Carlos. Pedro se suicida. Restam avô e neto. Carlos se forma em medicina. Monta um consultório e começa a clinicar. Conhece uma jovem encantadora, Maria Eduarda, que acredita ser esposa de Castro Gomes. O jovem amante compra uma quinta afastada para encontrá-la. Castro, enfim, revela a Carlos que Maria Eduarda não é sua mulher, mas sua amante. O jovem fica animado com a perspectiva de poder se casar com ela. Mas ocorre a reviravolta. Um tal Sr. Guimarães chega de Paris com uma revelação trágica: Maria Eduarda seria filha de Monforte, logo, irmã de Carlos. O avô, Afonso, morre. Maria Eduarda foge para a França e se casa. Carlos parte numa longa viagem. No final do romance, encontramos Carlos recordando o passado junto com seu amigo João da Erga. A conversa com o amigo transcorre com muita ironia e pessimismo. Interpretação O romance é perpassado pelo pessimismo e tragédia. Expressa o mal-estar que pairava sobre Portugal. Eça, aparentemente já desencantado com a política, investiga o próprio povo como causa da decadência do país. No texto, surgem alguns elementos dessa crítica. Há uma discussão sobre a educação de Carlos – se ele deveria frequentar uma escola católica, portuguesa ou protestante, ou seja, inglesa. A mãe determina que seja uma educação lusitana. Carlos refletirá esse espírito nada prático, romântico e indolente. Pensa em ajudar a nação, em fundar uma revista, mas, basicamente, frequenta as rodas sociais afrancesadas e se entrega a uma paixão que e se revelará trágica. Além desses elementos já interpretados, o narrador ou mesmo os personagens vão destilando críticas ao colonialismo, aos impostos e aos governantes. Os Maias (1888) CATEGORIA DEFINIÇÃO ESTRUTURA Livro Primeiro (X capítulos); Livro Segundo (VIII capítulos). PERSONAGENS Afonso, Pedro Maia, Maria Eduarda, Maria Monforte, Castro Alves, João da Ega. TEMPO Segunda metade do século XIX, com flashbacks que permitem reconstituir a história familiar de 3 gerações. O ano quando o avô e neto se instalam no casarão é 1875. ESPAÇO Predominantemente Lisboa. ENREDO A saga dos Maias começa com o casamento de Afonso, rico proprietário, com Maria Eduarda. Desse enlace, nasce Pedro Maia. O filho teve uma educação romântica e católica. A mãe morre e Pedro se apaixona por Maria Monforte, filha de um negociante de escravos. CONFLITO O pai de Pedro se opõe ao casamento e o filho se afasta do convívio paterno. O casal tem 2 filhos, Carlos Eduardo e Maria Eduarda. Maria Monforte se apaixona por um italiano e abandona o marido e um dos filhos. Pedro retorna desolado apenas com o filho mais velho, Carlos. Pedro se suicida. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 30 Ao lado, cartaz da minissérie “Os Maias” (2001), em 44 episódios. Fonte: Imdb. CLÍMAX Restam avô e neto. Carlos se forma em medicina. Conhece uma jovem encantadora, Maria Eduarda. O jovem amante compra uma quinta afastada para encontrá-la. Mas ocorre a reviravolta. Um tal Sr. Guimarães chega de Paris com uma revelação trágica: Maria Eduarda seria filha de Monforte, logo, irmã de Carlos. DESFECHO O avô, Afonso, morre. Maria Eduarda foge para a França e se casa. Carlos parte numa longa viagem. No final do romance, encontramos Carlos recordando o passado junto com seu amigo João da Ega. A conversa com o amigo transcorre com muita ironia e pessimismo. TRECHO DE OS MAIAS “Ega declarou muito decididamente ao sr. Sousa Neto que era pela escravatura. Os desconfortos da vida, segundo ele, tinham começado com a libertação dos negros. Só podia ser seriamente obedecido quem era seriamente temido... Por isso ninguém agora lograva ter seus sapatos bem envernizados, o seu arroz bem cozido, a sua escada bem lavada, desde que não tinha criados pretos em quem fosse lícito dar vergastadas... Só houvera duas civilizações em que o homem conseguira viver com razoável comodidade: a civilização romana e a civilização especial dos plantadores da Nova Orleães. Por quê? Porque numa e noutra existira a escravatura absoluta, a sério, com o direito de morte!... ” (QUEIRÓS, 2000, p. 271). Comentários Aqueles jovens veneravam Victor Hugo, dizendo que ele é o campeão heroico das verdades eternas, e que ele não era um homem, era um mundo. Eles ainda compactuavam o que chamavam de a Ideia Nova. Em particular,João da Ega é importante, porque ele é essa personagem dialeticamente contraditória, bancando o democrata, mas no fundo é um falso moralista e machista, dizendo que era dever da mulher primeiro ser bela, e depois ser estúpida, e que a mulher só devia ter duas prendas: saber cozinhar e amar bem. Enfim, Ega se passava por intelectual, mas não consegue se livrar da sua máscara e maneiras burguesas, e por isso comparado ao Mefistóteles, do Fausto de Goethe, tendo inclusive indo fantasiado assim para o baile dos judeus Cohen. Entre esses jovens também está o Alencar, escritor de Elvira e do poema A Democracia, versos históricos. Carlos quando se forma e arranja uma espécie de escritório junto com laboratório, onde vai para não fazer nada, não trabalhar, matando as suas horas de ócio escrevendo. A civilização lhe custava caro, esse tédio infindável. Nesse sentido, na Alemanha havia mais comércio, em Portugal era fastio total. Ega também escrevia para matar o tempo, e era morto pelo que escrevia, nunca tendo terminado um escrito. A sua grande obra prima chamar-se-ia Memórias dum átomo, e tinha uma forma autobiográfica. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 31 A cidade e as serras A cidade e as serras é uma obra da terceira fase de Eça de Queirós, momento em que seu criticismo se arrefece e ele faz uma revisão de suas convicções. Outrora um feroz crítico do atraso português, agora aos 50 e poucos anos, entende o atraso econômico como uma espécie de benção para o espírito humano. Ele escreveu um texto curto (novela) com características de romance de tese. Eça de Queirós cria uma narrativa para “provar” que o estilo de vida simples da serra supera o da cidade e suas comodidades tecnológicas. Enredo O protagonista, o rico Jacinto, nasce em Paris rodeado de todas as comodidades tecnológicas da época, tornando-se entusiasta da ciência e da modernidade. Acredita que a ciência (teórica) e a potência (tecnológica) serão capazes de trazer a felicidade perene ao ser humano. Nesse momento de otimismo, conhece José Fernandes, narrador da obra. O amigo serve como contraponto crítico, pois encara as crenças de Jacinto com ceticismo. Na segunda visita que José Fernandes faz ao amigo, percebe que a ilusão cientificista do protagonista vai se transformando em tédio e desilusão. A multidão de Paris lhe parece entediante, os aparelhos tecnológicos não lhe despertam mais a paixão e as relações pessoais e amorosas parecem ser circunstanciais e fúteis. É nesse ponto que o cosmopolita amigo de José Fernandes recebe uma carta avisando que houve uma tempestade na região de Tormes, onde fica a propriedade de Jacinto e os restos mortais de seus antepassados foram descobertos. Ele deveria ir para as serras para participar do sepultamento. Em verdade, Jacinto jamais saíra de Paris, e essa viagem, para ele, tem o gosto amargo da barbárie, pelo menos é como ele pensa inicialmente. A caminho, o trem para na Espanha, pois haverá uma baldeação. Todas as roupas e artigos de luxo ficam no vagão estacionado na plataforma, • Narrador: primeira pessoa, narrador-testemunha. Quem conta a história é José Fernandes, amigo do protagonista. Trata-se de um narrador muito limitado, ele só pode contar o que o protagonista disse para ele ou o que ele viu como testemunha. No caso dessa obra, isso se justifica. José Fernandes encarna a forma de viver do camponês lusitano e, na sua rusticidade, ele consegue ver o que há de ridículo no comportamento do sofisticado Jacinto. • Tempo: Final do século XX, época em que já era possível observar invenções como telefone, telégrafo e automóvel, que são mencionados no livro (Eça morreu em 1900 e o romance foi terminado a posteriori). • Espaço: como o nome já diz, o livro se divide em dois espaços: a cidade, que remete a Paris; e o campo, região de Tormes, onde Jacinto tem sua propriedade rural. FICHA DE LEITURA Fi gu ra : P ix ab ay Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 32 enquanto, em outro comboio, o protagonista e José Fernandes partem para Tormes sem nada, a não ser a roupa do corpo. Chegando na estação, há outro contratempo: ninguém do solar o espera. Ele consegue um cavalo para si e um burro para José Fernandes. Irritado, ele pretende ir para Lisboa no dia seguinte. Mas aos poucos vai sendo seduzido pelas serras, pela culinária do local, pelo colhimento caloroso que recebe e pela beleza da região. José Fernandes, quando o encontra, percebe que o amigo está mudado, está feliz, entusiasmado com o novo modo de vida. Mas, mesmo aí, Jacinto começa perceber que há problemas. Entra em contato com a pobreza extrema de alguns camponeses e vivencia a experiência de ser confundido com D. Sebastião, o rei renascentista que morreu no século XVI e que, segundo a lenda, voltaria para trazer glória a Portugal. O príncipe de grã-ventura, como era chamado, casa-se com uma mulher simples da região, Joaninha, e resolve trazer aparatos tecnológicos para melhorar a vida dos moradores da Serra. A novela (uma espécie de romance curto) termina com final feliz e uma nota de esperança de que seria possível conciliar esses dois mundos, cidade e serras. Interpretação Essa novela representa a “conversão” de Eça de Queirós. É interessante notar que o autor, em sua juventude, defendia o cientificismo e, agora, vê essa fé na ciência como algo exagerado. Jacinto desenvolvera uma teoria: a de que a Suma Ciência junto com a Suma Potência poderia levar o indivíduo à felicidade. Ora, guardadas as devidas diferenças, o próprio Eça pensava dessa forma, lá pelos idos de 1871. A cidade de Paris representava o que havia de mais moderno em 1900; as serras, o que havia de mais atrasado. A opção pelas serras mostra um certo desencanto do próprio Eça em relação à tecnologia. A indicação do livro para leitura no século XXI cai como uma luva para aqueles que precisam estar atentos à ilusão tecnológica. Há trechos bem escritos e muito expressivos de condenação do mundo tecnológico se considerado à luz do humanismo. Vale a pena destacar ainda a alegoria utilizada pelo autor. Jacinto é uma figura mitológica, seria um jovem muito bonito por quem Apolo se apaixona. O deus desce do Olimpo para se aproximar do jovem e brinca de arremessar o disco das olimpíadas com o rapaz. Zéfiro, enciumado, muda a trajetória do disco que atinge Jacinto e o mata. Desconsolado, Apolo transforma o amado em uma flor que nasce no campo. Na história de Eça, algo parecido acontece. Jacinto morre na tórrida civilização e renasce nas serras. A cidade e as serras (1901) CATEGORIA DEFINIÇÃO ESTRUTURA 26 (XVI) capítulos. PERSONAGENS Jacinto, José Fernandes, Joaninha. TEMPO Final do século XX (telégrafo e automóvel). ESPAÇO Paris e Tormes. ENREDO Jacinto nasce em Paris rodeado de todas as comodidades tecnológicas da época, tornando-se entusiasta da ciência e da modernidade. Acredita que a ciência (teórica) e a potência (tecnológica) serão capazes de trazer a felicidade perene ao ser humano. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 33 CONFLITO Nesse momento de otimismo, conhece José Fernandes, narrador da obra. O amigo serve como contraponto crítico, pois encara as crenças de Jacinto com ceticismo. Jacinto percebe que a ilusão cientificista do protagonista vai se transformando em tédio e desilusão. CLÍMAX Houve uma tempestade na região de Tormes, onde fica a propriedade de Jacinto e os restos mortais de seus antepassados foram descobertos.A caminho, no trem para na Espanha haverá uma baldeação. Todas as roupas e artigos de luxo ficam no vagão estacionado na plataforma e partem só com a roupa do corpo. DESFECHO José Fernandes, quando o encontra, percebe que o amigo está mudado, está feliz, entusiasmado com o novo modo de vida. O príncipe de grã-ventura, como era chamado, casa-se com uma mulher simples da região, Joaninha, e resolve trazer aparatos tecnológicos para melhorar a vida dos moradores da Serra. Termina com final feliz e uma nota de esperança de que seria possível conciliar esses dois mundos, cidade e serras. TRECHOS DE A CIDADE E AS SERRAS TRECHO I Ora nesse tempo Jacinto concebera uma ideia... Este Príncipe concebera a ideia de que o “homem só é superiormente feliz quando é superiormente civilizado”. E por homem civilizado o meu camarada entendia aquele que, robustecendo a sua força pensante com todas as noções adquiridas desde Aristóteles, e multiplicando a potência corporal dos seus órgãos com todos os mecanismos inventados desde Teramenes, criador da roda, se torna um magnífico Adão, quase onipotente, quase onisciente, e apto portanto a recolher [...] todos os gozos e todos os proveitos que resultam de Saber e Poder... [...] Este conceito de Jacinto impressionara os nossos camaradas de cenáculo, que [...] estavam largamente preparados a acreditar que a felicidade dos indivíduos, como a das nações, se realiza pelo ilimitado desenvolvimento da Mecânica e da erudição. Um desses moços [...] reduzira a teoria de Jacinto [...] a uma forma algébrica: Suma ciência Suma felicidade Suma potência = E durante dias, do Odeon à Sorbona, foi louvada pela mocidade positiva a Equação Metafísica de Jacinto. Eça de Queirós, A cidade e as serras. Comentários A equação elaborada por Jacinto, durante o período que vivia em Paris, para sintetizar a felicidade, torna-se ao fim do romance uma equação que resultava em servidão ou dependência, já que o protagonista percebe que era como um escravo da tecnologia, que deveria torná-lo feliz. TEXTO II Mas o meu novíssimo amigo, debruçado da janela, batia as palmas – como Catão para chamar os servos, na Roma simples. E gritava: – Ana Vaqueira! Um copo de água, bem lavado, da fonte velha! Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 34 Pulei, imensamente divertido: – Oh Jacinto! E as águas carbonatadas? E as fosfatadas? E as esterilizadas? E as sódicas?... O meu Príncipe atirou os ombros com um desdém soberbo. E aclamou a aparição de um grande copo, todo embaciado pela frescura nevada da água refulgente, que uma bela moça trazia num prato. Eu admirei sobretudo a moça... Que olhos, de um negro tão líquido e sério! No andar, no quebrar da cinta, que harmonia e que graça de ninfa latina! E apenas pela porta desaparecera a esplêndida aparição: – Oh Jacinto, eu daqui a um instante também quero água! E se compete a esta rapariga trazer as coisas, eu, de cinco em cinco minutos, quero uma coisa!... Que olhos, que corpo... Caramba, menino! Eis a poesia, toda viva, da serra... O meu Príncipe sorria, com sinceridade: – Não! Não nos iludamos, Zé Fernandes, nem façamos Arcádia. É uma bela moça, mas uma bruta... Não há ali mais poesia, nem mais sensibilidade, nem mesmo mais beleza do que numa linda vaca turina. Merece o seu nome de Ana Vaqueira. Trabalha bem, digere bem, concebe bem. Para isso a fez a Natureza, assim sã e rija (...). Eça de Queirós, A cidade e as serras. Comentários O fragmento reproduz uma cena passada na Quinta de Tormes, local em que Jacinto passa a morar depois de se ter mudado de Paris. O estranhamento de Zé Fernandes face ao pedido de Jacinto para que lhe tragam água da fonte, ao invés das águas sofisticadas que sempre preferira, a beleza natural de Ana Vaqueira, assim como a simplicidade do cenário remetem personagens e leitor às paisagens bucólicas descritas pelos autores clássicos que tematizavam o locus amoenus e o inutila truncat, como base essencial para se atingir o equilíbrio e a felicidade. A expressão “nem façamos Arcádia” alude ironicamente à visão idealizada de Zé Fernandes relativamente aos dotes físicos de Ana Vaqueira, dona de beleza invulgar, mas, como trabalhadora braçal e rude, seria insensível a apelos sentimentais. A ilustre casa de Ramires O romance foi publicado em 1900, portanto reflete a terceira fase do autor. A ironia cáustica dá lugar a uma narrativa mais equilibrada e sóbria. Nessa obra o autor deixa transparecer o otimismo e a esperança em relação a Portugal. Chama a atenção a estrutura narrativa em que o autor, à maneira de Almeida Garret, organiza duas histórias em tempos diferentes e depois as entrelaça. • Narrador: dois narradores em terceira pessoa. Há um narrador que conta a história de Gonçalo, e Gonçalo conta a história de seu antepassado. • Tempo: como é um romance que lida com o passado, há três marcações históricas. Gonçalo encontra um poema romântico sobre os heróis de sua família da década de 1840; agora, na década de 1890, ele resolve reescrever a história que se passa no século XII. • Espaço: há menção a vários locais, mas predomina a Torre da aldeia de Santa Irineia. FICHA DE LEITURA Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 35 Fo n te : F ic h ei ro d a W ik ip ed ia < h tt p s: // ti n yu rl .c o m /y 6 sj m n x6 >. Enredo Gonçalo é um português de ascendência nobre que na atualidade está falido e tem dívidas a pagar. O arrendamento de suas terras não cobre as despesas. Assim, a política lhe parece a maneira mais fácil de sair dessa situação. Contudo, quem ocupava o lugar de deputado da sua região era um inimigo seu que tinha mais influência no governo e entre os aldeões. Ele se resolve, então, pela fama. Haveria de, através da Literatura, fazer-se conhecido. Decide escrever a história de Tructesindo Ramires, um antepassado da época dos primeiros reis de Portugal. O narrador passa a contar o que aconteceu à linhagem de tal nobre protagonista. De forma até irônica, ele vai mostrando o declínio da família a partir de 1640, data da Restauração (época em que termina a união das duas coroas, a de Portugal com a da Espanha, e os lusitanos restauram sua Monarquia). A narrativa do declínio tem como contrapartida, no presente, a constante humilhação de Gonçalo. Um arrendatário seu, irritado e bêbado, lança pedras no solar e o nobre senhor da torre se esconde covardemente. Ele refaz o contrato com outro arrendatário, mas sem formalizar a ação comercial. Parte em seguida para Oliveira, onde encontra alguns desafetos. Sua vida medíocre vai sendo contraposta à dos aventureiros do passado. No romance histórico que ele está escrevendo, Tructesindo se indispõe com o novo rei, pois tinha prometido a D. Sancho que seria o protetor de D. Sancha. Vai à guerra contra D. Afonso II, mesmo sabendo que poderia perder a batalha. Essa demanda real é cumprida ao mesmo tempo que o cavaleiro vinga a morte de seu filho. O assassino de seu herdeiro é Lopo Baião, também fiel vassalo de D. Afonso. A vingança se concretiza. Quando volta ao solar, sofre nova humilhação. O atual arrendatário, irritado com a falta de palavra de Gonçalo, põe-no a correr e ele é socorrido pelos empregados. Seu inimigo político morre e abre-se uma possibilidade de ele entrar para a política. Para tanto, precisa se aproximar de André Cavaleiro, mesmo sabendo que tal senhor usaria esse pretexto para seduzir a irmã de Gonçalo. O protagonista fica entre a política e a honra familiar. De fato, embora as coisasse encaminhem na política, André começa a visitar sua irmã em momentos que seu cunhado não está. Sua redenção começa com um objeto. Ele descobre um antigo chicote de prata perdido no sótão. Após sonhar com os antepassados, ele se torna menos tolerante. Vai andar a cavalo e reage a um valentão que sempre o molestava. A notícia de sua valentia se espalhou. Tornou-se deputado e teve êxito literário. Instala-se em Lisboa. Contudo, quatro meses depois consegue uma concessão na África. Hipoteca suas terras e parte para a colônia, abandonando a política. Quatro anos depois retorna a seu país, abastado, com saúde redobrada e orgulhoso de si. Interpretação Esse romance é o mais significativo da terceira fase do autor. Gonçalo é uma alegoria do próprio Portugal. Descendente de ilustres guerreiros medievais, a nação se encontra degradada e Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 36 humilhada. O jovem nobre que se esconde e foge de um arrendatário figurativiza o Ultimato Britânico, quando a Inglaterra humilhou o país. Se até a metade do romance Eça faz uma alegoria da condição de Portugal, na metade seguinte ele expressa, através do desenlace da sua narrativa, certo otimismo e uma prescrição de como deveria ser a pátria que ele ama. A certeza que anima o autor é a de que a Lusitânia será grande novamente. A saída para isso, expressa na trajetória de Gonçalo, passa pela revalorização do colonialismo e pelo desprezo à política. É fácil perceber nesse enredo traços culturais que servirão de base para a era de Salazar, ou seja, da ditadura que se estabeleceu em Portugal e que perdurou de 1926 até 1975. Afinal, durante o salazarismo, a política se restringia a decretos de gabinete e à economia colonial. Tirando esse lado sinistro, a estrutura do texto e a linguagem bem cuidada fazem do romance uma obra de notáveis qualidades. A ilustre casa de Ramires (1900) CATEGORIA DEFINIÇÃO ESTRUTURA 12 (XII) capítulos. PERSONAGENS Gonçalo Ramires, Titó, Castanheiro, Videirinha, André Cavaleiro, Gracinha. TEMPO Como é um romance que lida com o passado, há três marcações históricas. Gonçalo encontra um poema romântico sobre os heróis de sua família da década de 1840; agora, na década de 1890, ele resolve reescrever a história que se passa no século XII. ESPAÇO Predominantemente Torre da Aldeia de Santa Irineia. ENREDO Gonçalo é um português de ascendência nobre que na atualidade está falido e tem dívidas a pagar. O arrendamento de suas terras não cobre as despesas. quem ocupava o lugar de deputado da sua região era um inimigo seu. Para sair dessa, tenta a fama na Literatura. CONFLITO Decide escrever a história de Tructesindo Ramires, um antepassado da época dos primeiros reis de Portugal. O narrador passa a contar o que aconteceu à linhagem de tal nobre protagonista. De forma até irônica, ele vai mostrando o declínio da família a partir de 1640, data da Restauração. CLÍMAX A narrativa do declínio tem como contrapartida, no presente, a constante humilhação de Gonçalo. Um arrendatário seu, irritado e bêbado, lança pedras no solar e o nobre senhor da torre se esconde covardemente. Sua vida medíocre é contraposta à dos aventureiros do passado. DESFECHO O inimigo político morre e abre-se uma possibilidade de ele entrar para a política. Tornou-se deputado e teve êxito literário. Instala-se em Lisboa. TRECHO DE A ILUSTRE CASA DE RAMIRES Mas Gonçalo, que abominava aquela lenda, a silenciosa figura degolada, errando por noites de inverno entre as ameias da Torre com a cabeça nas mãos – despegou da varanda, deteve a Crônica imensa: (...) Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 37 Abolição Início da crise mundial que vai até 1890 1881 1870 30 Governo Floriano Peixoto 1891 Realismo Proclamação da República 1888-1889 1873 30 1871 30 1894 1893 1880 Despido, soprada a vela, depois de um rápido sinal-da-cruz, o Fidalgo da Torre adormeceu. Mas no quarto, que se povoou de sombras, começou para ele uma noite revolta e pavorosa. André Cavaleiro e João Gouveia romperam pela parede, revestidos de cotas de malha, montados em horrendas tainhas assadas! E lentamente, piscando o olho mau, arremessavam contra o seu pobre estômago pontoadas de lança, que o faziam gemer e estorcer sobre o leito de pau-preto. Depois era, na Calçadinha de Vila-Clara, o medonho Ramires morto, com a ossada a ranger dentro da armadura, e El-Rei D. Afonso II, arreganhando afiados dentes de lobo, que o arrastavam furiosamente para a batalha das Navas. Ele resistia, fincado nas lajes, gritando pela Rosa, por Gracinha, pelo Titó! Mas D. Afonso tão rijo murro lhe despedia aos rins, com o guante de ferro, que o arremessava desde a Hospedaria do Gago até a Serra Morena, ao campo da lide, luzente e fremente de pendões e de armas. E imediatamente seu primo de Espanha, Gomes Ramires, Mestre de Calatrava, debruçado do negro ginete, lhe arrancava os derradeiros cabelos, entre a retumbante galhofa de toda a hoste sarracena e os prantos da tia Louredo trazida como um andor aos ombros de quatro Reis!... (...) Comentários Como romance histórico, a História é recontada por meio de artifícios literários, como o excesso de descrição. A atuação política de Gonçalo tem por cenário o período que a história política de Portugal denomina Regeneração. Facções da burguesia emergente das revoluções liberais alternavam-se no poder e transitavam do Partido “Histórico” para o “Regenerador” e vice-versa, sem qualquer constrangimento, ao sabor de conveniências eleitorais. É o que fez Gonçalo para lançar-se candidato. Representante da aristocracia decadente, desenvolve uma política caracteristicamente paternalista. Nessa direção, ampara a mulher e os filhos pequenos do agricultor José Casco de Bravaes, que primeiro mandou prender e depois soltar, quando percebeu nele um eleitor potencial. Distribui favores, aproxima-se dos pobres, acerca-se dos correligionários com práticas eleitorais clientelistas. 3 – REALISMO E NATURALISMO NO BRASIL Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 38 O Realismo ocorre num momento muito particular da história do Brasil. A corte se consolida como o grande espaço urbano do país, com seus bailes e vida cultural significativa para uma ex-colônia. Um estilo refinado pautado pela imitação dos franceses se impõe nos gestos, na erudição na formação do carioca. Pode-se observar esse ambiente até um pouco artificial e afetado nas obras de José de Alencar e Machado de Assis. Ao mesmo tempo, o Império está no meio de uma crise que vai desembocar na República. Desde o fim da Guerra do Paraguai, o Brasil enfrenta uma crise financeira – o custo da guerra foi alto – e social. Os escravos participaram no conflito impondo ao status quo o reconhecimento de pertencimento à nação brasileira. A Lei do Ventre Livre e a fundação do Partido Republicano evidenciam uma realidade social muito mais complexa. Os negros e os párias sociais que só tinham aparecido nos romances românticos de forma cômica ou na posição de vilões, ocuparão um espaço significativo, quando não o lugar de protagonista (no romance O bom-crioulo, de Adolfo Caminha – 1867-1897 –, autor naturalista). Em vários contos e em alguns romances de Machado de Assis, os negros aparecem não mais submetidos a estereótipos, mas em cenas que começam a dar uma noção da complexidade social da nação. O Realismo/Naturalismo, no Brasil, seguiu trajetóriasvariadas. Aluísio Azevedo e Adolfo Caminha adotam a linguagem mais grosseira e se valem das ideias cientificistas. Machado de Assis, em alguns momentos, ironiza a moda filosófica, criticando-a sob a perspectiva de pensadores clássicos, além de manter fiel a uma linguagem elegante como se fosse um lorde inglês nos trópicos. Raul Pompeia parece indiferente a essas escolas, realizando um Realismo próprio que se aproxima do que depois virá a ser chamado de Expressionismo. 3.1 – Machado de Assis Vamos começar com o mais importante autor do Realismo e da Literatura brasileira. As histórias de Machado de Assis são mais simples, nada rocambolescas, até porque, vamos combinar, ninguém, na vida real, viveria tantas peripécias quanto as que eram experimentadas pelos heróis românticos. Apesar disso, a narrativa, dada a ambiguidade e a ironia, traduz uma complexidade própria do ser humano. As intervenções do escritor e a análise dos personagens tomam o espaço destinado à ação. Filho de gente humilde, aos 15 anos publica os primeiros versos e é aprendiz de tipógrafo (executor de serviços tipográficos de composição, paginação ou Fo n te P ix a b a y Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 39 impressão). Posteriormente, irá ganhar a vida sendo jornalista, profissão a qual lhe rendeu grandes contatos políticos e literários. Porém, não estava totalmente satisfeito com tal ofício. Aos 27 anos, ingressa no serviço público, em que ficaria até o fim da vida. Foi o fundador e presidente da Academia Brasileira de Letras (ABL), criada em 1897 e baseada no modelo da Academia Francesa de Letras (Académie Française). Segundo o crítico literário brasileiro Roberto Schwarz, na caricatura, “foi possivelmente o maior escritor brasileiro”. Morreu em 1908 no Rio de Janeiro. O estilo machadiano é tão particular que, abaixo do quadro biográfico, você encontrará algumas das características do texto do autor. Joaquim Maria Machado de Assis (1839-1908) nasceu no bairro do Livramento, região modesta do Rio de Janeiro. Seus pais eram humildes, o mulato Francisco José de Assis, pintor de paredes, e Maria Leopoldina. Contudo logo ficou órfão de pai e mãe e foi criado pela madrasta, a lavadeira Maria Inês. Na adolescência trabalhou vendendo balas e doces. Com 15 anos, conseguiu trabalhar como tipógrafo na Imprensa Nacional, dirigida, na época, por Manuel Antônio de Almeida, que o encorajou a se tornar escritor. Entre 1855 e 1869, trabalha em jornais, inicialmente como revisor e, posteriormente, como jornalista. Publica, em 1864, uma coletânea de poemas, “Crisálidas”. Com 30 anos casa-se com Carolina Xavier de Novais, uma portuguesa culta que o influenciará, revelando ao escritor os clássicos da Literatura Universal. A partir de 1872, o escritor publica seus romances. Os quatro primeiros (Ressurreição, A mão e a luva, Helena e Iaiá Garcia) são românticos. Como Memórias Póstumas de Brás Cubas (1881), o escritor enverada pelo Realismo. Não se entrega totalmente à moda literária. Construiu um estilo próprio que destoa em vários pontos do Realismo tradicional. Quanto ao Naturalismo, praticamente o ignorou, em alguns pontos percebe-se, inclusive, sua verve crítica em relação aos “ismos” que serviram de base para o Naturalismo. O Realismo de Machado tenta o impossível. Retratar as bases “reais” do comportamento humano. Ele deixa o fenômeno, aquilo que geralmente é o foco do Realismo, para submergir nas motivações psicológicas de seus personagens. Teve contato com vários dos principais escritores do século XIX, foi amigo de José de Alencar e recepcionou Castro Alves quando o poeta passou pela corte. Participou da fundação da Academia Brasileira de Letras em 1897. Sua esposa morreu em 1904, e Machado entrou em depressão. Mesmo assim, algumas obras ainda foram lançadas depois dessa data: Esaú e Jacó (1904), Memorial de Aires (1908) e Relíquias da casa velha (1906). Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 40 PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS DO AUTOR • Os fatos aparecem conforme são lembrados pelo narrador ou pelas personagens. Corresponde à digressão: ação ou resultado de se desviar do assunto tratado; desvio, afastamento de um objetivo; evasiva, pretexto, subterfúgio; recurso literário us. para esclarecer, detalhar, ilustrar ou criticar um assunto (dicionário Aulete). • O objetivo principal é o retardamento do texto, brincando com as instâncias de essência e aparência, pois o que parece mais importante (o enredo) de repente passa a não ser mais, deixando-se entrever outros detalhes. NARRATIVA NÃO LINEAR • A obra de Machado de Assis flerta com o niilismo (não acreditar em nada; o Nada Absoluto), com uma visão negativa do mundo e do homem. Muitos de seus personagens são cínicos ou hipócritas. • É uma vertente que influenciou Machado de Assis por ser contemporâneo do decadentismo francês, com Charles Baudelauire, por exemplo, e dos movimentos pessimistas de transição do século XIX para o XX. Verifica-se pessimismo especialmente no “Capítulo das Negativas” de Memórias póstumas de Brás Cubas. PESSIMISMO • As tendências filosóficas (positivismo, darwinismo, determinismo) são muitas vezes questionadas pelo autor. • Esse aspecto está presente no emplasto de Brás Cubas, um remédio mágico que curaria toda a humanidade, quando no fundo Brás Cubas só queria descobri-lo por fama própria. Também está em Quincas Borba, quando Machado de Assis critica o surgimento de tantas tendências no século XIX, muitas vezes até mesmo sem embasamento ou com fundamentos cruéis. DESCRENÇA NO CIENTIFICISMO • E humor negro, advinda da tradição inglesa do humour, bem como o riso são muitas vezes o modo de lidar com o mundo que o autor encara negativamente. Ficou conhecido pelo humor machadiano. IRONIA • A metalinguagem é tanto uma função de linguagem quanto um efeito de texto em que se verifica a linguagem se remetendo a ela mesma. Porém, pode ser um filme se remetendo a ele mesmo; ou uma fotografia se remetendo a ela mesma → trata-se de algo se remetendo a si mesmo. • O comentário do escritor sobre a própria escrita, os próprios capítulos, a própria obra etc. é um traço evidente de suas obras. Frequentemente, as obras contêm informações sobre os capítulos, sobre a relação com o leitor, sobre o estilo de escrita entre outros. METALINGUAGEM Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 41 PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS DO AUTOR DISCURSO INDIRETO LIVRE “Além da variedade de discursos diretos e indiretos, a narrativa de ficção, a partir das últimas décadas do século XIX, utiliza um tipo de discurso que consiste na combinação dos já existentes, misturando valores estilísticos de um e de outro: é o discurso indireto livre, que recebeu denominações diversas dos autores que o estudaram (discurso velado, direto impropriamente dito, discurso vivido). (...) O discurso indireto livre, em muitos casos, não deixa claro quem está com a palavra, se o narrador ou a personagem. O que permite distinguir é estar sendo relatado o pensamento da personagem, o qual é dela e não do narrador; por mais que este com ela se identifique. Este tipo de discurso tem, portanto, um cunho acentuadamente psicológico, daí a sua voga no romance realista que pretendia apresentar com maior profundidade o mundo interior das suas criaturas: seus estados emotivos, devaneios, reflexões, perturbações alucinatórias, autoanálise etc. O narrador podia ficar por trás delas, em atitude neutra ou irônica”. (MARTINS,2011, p. 251, grifos meus). • O uso de imperativos, vocativos ou de perguntas direcionadas ao leitor muitas vezes de forma jocosa representa o jogo de aproximação/afastamento do narrador; ora ele quer conquistar e convencer o leitor, ora quer se mostrar superior. Em todo caso, para o bem ou para o mal, parte do pressuposto de que vai ser lido. Na teoria literária, esse leitor ideal é denominado de narratário. • Exemplo: “E Sofia? interroga impaciente a leitora, tal qual Orgon: Et Tartufe? Ai, amiga minha, a resposta é naturalmente a mesma, – também ela comia bem, dormia largo e fofo, – coisas que, aliás, não impedem que uma pessoa ame, quando quer amar. Se esta última reflexão é o motivo secreto da vossa pergunta, deixai que vos diga que sois muito indiscreta, e que eu não me quero senão com dissimulados.” (Machado de Assis – Quincas Borba, grifos meus). DIÁLOGO COM O LEITOR • Recursos tais como análise dos pensamentos, das sensações e do abismo entre desejo e convenções sociais fazem parte importante do enredo. • Opera o trânsito entre a crítica e a denúncia dos costumes sociais (externo) com as opiniões íntimas (interno). Muitas vezes é empregada a técnica literária do discurso indireto livre. PSICOLOGISMO • Trata-se da menção a outros autores e obras, internacionais e nacionais, inclusive do próprio autor. O ideal é não procurar todos os autores, pois isso pode atrapalhá-los e distraí-los. De qualquer forma, os mais importantes serão analisados mais à frente. • No caso de Machado de Assis, há muita intertextualidade com a Bíblia e outros autores do cânone, com quem não só quer dialogar, como também rivalizar. • A intertextualidade também pode ser interna, como é o caso do personagem Conselheiro Aires, que está presente tanto no romance Esaú e Jacó quanto no Memorial de Aires. INTERTEXTUALIDADE Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 42 (VUNESP – Universidade Estadual Paulista – 2019 – adaptada) Leia o trecho do conto “Pai contra mãe”, de Machado de Assis (1839-1908), e julgue o item a seguir. A escravidão levou consigo ofícios e aparelhos, como terá sucedido a outras instituições sociais. Não cito alguns aparelhos senão por se ligarem a certo ofício. Um deles era o ferro ao pescoço, outro o ferro ao pé; havia também a máscara de folha de flandres. A máscara fazia perder o vício da embriaguez aos escravos, por lhes tapar a boca. Tinha só três buracos, dois para ver, um para respirar, e era fechada atrás da cabeça por um cadeado. Com o vício de beber, perdiam a tentação de furtar, porque geralmente era dos vinténs do senhor que eles tiravam com que matar a sede, e aí ficavam dois pecados extintos, e a sobriedade e a honestidade certas. Era grotesca tal máscara, mas a ordem social e humana nem sempre se alcança sem o grotesco, e alguma vez o cruel. Os funileiros as tinham penduradas, à venda, na porta das lojas. Mas não cuidemos de máscaras. O ferro ao pescoço era aplicado aos escravos fujões. Imaginai uma coleira grossa, com a haste grossa também, à direita ou à esquerda, até ao alto da cabeça e fechada atrás com chave. Pesava, naturalmente, mas era menos castigo que sinal. Escravo que fugia assim, onde quer que andasse, mostrava um reincidente, e com pouco era pegado. Há meio século, os escravos fugiam com frequência. Eram muitos, e nem todos gostavam da escravidão. Sucedia ocasionalmente apanharem pancada, e nem todos gostavam de apanhar pancada. Grande parte era apenas repreendida; havia alguém de casa que servia de padrinho, e o mesmo dono não era mau; além disso, o sentimento da propriedade moderava a ação, porque dinheiro também dói. A fuga repetia-se, entretanto. Casos houve, ainda que raros, em que o escravo de contrabando, apenas comprado no Valongo, deitava a correr, sem conhecer as ruas da cidade. Dos que seguiam para casa, não raro, apenas ladinos, pediam ao senhor que lhes marcasse aluguel, e iam ganhá-lo fora, quitandando. Quem perdia um escravo por fuga dava algum dinheiro a quem lho levasse. Punha anúncios nas folhas públicas, com os sinais do fugido, o nome, a roupa, o defeito físico, se o tinha, o bairro por onde andava e a quantia de gratificação. Quando não vinha a quantia, vinha promessa: “gratificar- se-á generosamente” – ou “receberá uma boa gratificação”. Muita vez o anúncio trazia em cima ou ao lado uma vinheta, figura de preto, descalço, correndo, vara ao ombro, e na ponta uma trouxa. Protestava-se com todo o rigor da lei contra quem o acoitasse. Ora, pegar escravos fugidios era um ofício do tempo. Não seria nobre, mas por ser instrumento da força com que se mantêm a lei e a propriedade, trazia esta outra nobreza implícita das ações reivindicadoras. Ninguém se metia em tal ofício por desfastio ou estudo; a pobreza, a necessidade de uma achega, a inaptidão para outros trabalhos, o acaso, e alguma vez o gosto de servir também, ainda que por outra via, davam o impulso ao homem que se sentia bastante rijo para pôr ordem à desordem. (Contos: uma antologia, 1998.) Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 43 A perspectiva do narrador diante das situações e dos fatos relacionados à escravidão é marcada, sobretudo, pela ironia. Comentários Questão sobre conhecimento do estilo do autor/interpretação de texto literário. No conto “Pai contra mãe”, o narrador relata práticas que remontam ao período da escravidão aplicando muitas vezes o recurso da ironia, figura caracterizada pelo emprego inteligente de contrastes, usado literariamente para criar ou ressaltar certos efeitos humorísticos. Há grande ironia, por exemplo, em “Eram muitos, e nem todos gostavam da escravidão”, como se algum escravo gostasse, de fato, de apanhar. Nos escritos literários de Machado de Assis como um todo o que há é a crítica e a problematização da escravidão, mais do que uma defesa ou condenação abertas propriamente ditas. Nisso, torna-se bastante clara a ironia, pois há também duplo sentido: será que são máscaras de ferro ou as máscaras que o próprio narrador utiliza!? Isso não fica claro, não é de todo respondido. Mais uma vez, consiste na sutileza do estilo de Machado de Assis. Grau de dificuldade da questão: médio. Gabarito: C. 3.1.1 – Romances Memórias póstumas de Brás Cubas Publicado em 1881, inaugura, ao lado de O cortiço, o Realismo no Brasil. Sua forma e estilo são experimentais: o autor mistura influências de Laurence Sterne (1713-1768), na caricatura, e de Almeida Garret. Sterne é um escritor irlandês cuja obra-prima é A vida e as opiniões de Tristram Shandy (1759), com quem Machado de Assis aprendeu muito de sua ironia. A narrativa bêbada, com idas e vindas, com digressões e comentários metalinguísticos, traduz o sarcasmo próprio do narrador protagonista. Nas obras posteriores, o autor utilizará as técnicas desenvolvidas nesse romance de forma mais equilibrada. • Narrador: primeira pessoa, um defunto autor que, por estar morto, pode revelar os podres dos homens sem que sofra qualquer retaliação. Trata-se de um narrador sarcástico, cínico e ressentido que se compraz em humilhar o leitor. • Tempo: abrange o tempo de vida do narrador, 1805-1869; narrativa não linear, cortada por digressões, flashbacks e diálogo com o leitor. • Espaço: Rio de Janeiro. FICHA DE LEITURA Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 44 Enredo Brás Cubas escreve suas memórias. Começa pela infância, quando descreve sua formação de caráter sob a égide da permissividade paterna. Quando adolescente, envolve-secom Marcela, uma cortesã interessada nas condições financeiras do protagonista. O pai, por esse motivo, envia o filho para Coimbra, onde deverá se tornar bacharel. A mãe morre, ele volta de Portugal e encontra algum apoio em Eugênia, uma moça muito bonita, coxa e filha bastarda. As condições sociais da moça levam o narrador a desprezá-la, apesar do evidente interesse. Finalmente, interessa-se por uma mulher de sua classe, Virgília. Contudo, ela fica entre dois pretendentes: o pavoneado Brás Cubas e o ambicioso Lobo Neves. Escolhe o último. O pai morre, ele briga com a irmã por causa da herança. Nessa época solitária, já maduro, ele se encontra com a antiga pretendente. Ela continua casada, mas, como o narrador não é ciumento, eles se tornam amantes. Começam as peripécias para esconder da sociedade e do marido corno a traição. O casal aluga uma casa na Gamboa que servirá de refúgio amoroso. D. Plácida, uma agregada conhecida de Virgília, finge ser a dona do local. Ela é costureira e serve de álibi perfeito para uma mulher que deve fazer diversas provas na costureira. Virgília fica grávida, o que faz o narrador pensar romanticamente em fugir com ela, mas em seguida perde a criança. Brás Cubas fica sem qualquer herdeiro. Lobo Neves é nomeado para ocupar um cargo em outra província e o casal vai embora do Rio. Começa uma fase entediante para o personagem principal. Ele reencontra um amigo louco, Quincas Borba, com quem discute teorias filosóficas esdrúxulas. Reconcilia-se com a irmã, que consegue arranjar uma pretendente para se casar com Brás, Nhá Loló. O casamento não se realiza, pois a moça morre antes. Ele morre de pneumonia no momento quando tentava criar um emplasto para curar todas as moléstias. Ele faz essa afirmação, mas insinua que não era o interesse pelo bem da humanidade que o motivava, mas a possibilidade de ver seu nome no jornal como sendo o de um grande benfeitor. Interpretação A interpretação pode ser feita a partir de dois polos: o da análise psicológica e o da crítica à elite escravocrata brasileira. Em relação à crítica social, Machado de Assis cria um personagem da elite que contará sua história em primeira pessoa. Se estivesse vivo, não poderia ser sincero, esconderia suas intenções sob um discurso moralista. Como está morto, ele vai revelando sua futilidade e falha ética. Brás Cubas nasceu em uma família abastada, mas sem muito escrúpulo, a não ser o da conquista da consideração pública. Como personagem típico de uma sociedade escravocrata, Brás Cubas poderia dispor dos negros a sua volta e das pessoas miseráveis, sempre com alguma fineza e elegância. É o que ele faz durante sua vida. Ele respeita somente aqueles que pertencem a sua classe social. Essa forma de dispor das pessoas migra para a própria estrutura do texto. O narrador, caprichoso, comanda a narrativa fazendo interrupções, digressões despropositadas, intervenções Cartaz do filme “Memórias póstumas de Brás Cubas” (2001). Fonte: Imdb. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 45 irônicas, desafiando a inteligência do leitor, quando não, insinuando incapacidade intelectual de quem o lê. A estrutura social hipócrita do Império permitiu que Machado de Assis visse com mais nitidez a diferença entre intenções subjetivas e julgamento social. Entre esses dois extremos, há espaço para ressentimentos, moralismos, remorsos e justificativas que ele capta ao deixar expostos os pensamentos do protagonista. Há vários momentos em que Brás Cubas revela que seu ato humanitário tem como origem a vontade de ser aplaudido publicamente. Memórias póstumas de Brás Cubas (1881) CATEGORIA DEFINIÇÃO ESTRUTURA 160 (CLX) curtos capítulos. PERSONAGENS Brás Cubas; Prudêncio; Marcela; Eugênia; Virgília; Dona Plácida; cunhado Cotrim; Lobo Neves; Quincas Borba → intertextualidade interna. TEMPO Abrange o tempo de vida do narrador, 1805-1869; narrativa não linear, cortada por digressões, flashbacks e diálogo com o leitor. ESPAÇO Rio de Janeiro ENREDO Brás Cubas escreve suas memórias. Começa pela infância, quando descreve sua formação de caráter sob a égide da permissividade paterna. Quando adolescente, envolve-se com Marcela, uma cortesã interessada nas condições financeiras do protagonista. Ambos os pais morrem. Brás Cubas encontra algum apoio em Eugênia, uma moça muito bonita, coxa e filha bastarda. As condições sociais da moça levam o narrador a desprezá-la. CONFLITO Finalmente, interessa-se por uma mulher de sua classe, Virgília. Contudo, ela fica entre dois pretendentes: o pavoneado Brás Cubas e o ambicioso Lobo Neves. Escolhe o último. CLÍMAX Virgília fica grávida, o que faz o narrador pensar romanticamente em fugir com ela, mas em seguida perde a criança. Começa uma fase entediante para o personagem principal. Ele reencontra um amigo louco, Quincas Borba, com quem discute teorias filosóficas esdrúxulas. DESFECHO Ele morre de pneumonia no momento quando tentava criar um emplasto para curar todas as moléstias. Seu legado é um grande nada. (Cebraspe – Secretaria de Estado da Educação de Alagoas – Professor de Português – 2018) Cresci; e nisso é que a família não interveio; cresci naturalmente, como crescem as magnólias e os gatos. Talvez os gatos são menos matreiros, e, com certeza, as magnólias são menos inquietas do que eu era na minha infância. Um poeta dizia que o menino é pai do homem. Se isto é verdade, vejamos alguns lineamentos do menino. Desde os cinco anos merecera eu a alcunha de “menino diabo”; e verdadeiramente não era outra coisa; fui dos mais malignos do meu tempo, arguto, indiscreto, traquinas e voluntarioso. Por exemplo, um dia quebrei a cabeça de uma escrava, porque me negara uma colher do doce de coco que estava fazendo, e, não contente com o malefício, deitei um punhado de cinza ao tacho, e, não satisfeito da travessura, fui dizer à minha mãe que a escrava é que estragara o doce “por pirraça”; e eu tinha apenas seis anos. Prudêncio, um moleque de casa, era o meu cavalo de todos os dias; punha Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 46 as mãos no chão, recebia um cordel nos queixos, à guisa de freio, eu trepava-lhe ao dorso, com uma varinha na mão, fustigava-o, dava mil voltas a um e outro lado, e ele obedecia, — algumas vezes gemendo — mas obedecia sem dizer palavra, ou, quando muito, um — “ai, nhonhô!” — ao que eu retorquia: — “Cala a boca, besta!” — Esconder os chapéus das visitas, deitar rabos de papel a pessoas graves, puxar pelo rabicho das cabeleiras, dar beliscões nos braços das matronas, e outras muitas façanhas deste jaez, eram mostras de um gênio indócil, mas devo crer que eram também expressões de um espírito robusto, porque meu pai tinha-me em grande admiração; e se às vezes me repreendia, à vista de gente, fazia-o por simples formalidade: em particular dava-me beijos. Não se conclua daqui que eu levasse todo o resto da minha vida a quebrar a cabeça dos outros nem a esconder-lhes os chapéus; mas opiniático, egoísta e algo contemptor dos homens, isso fui; se não passei o tempo a esconder-lhes os chapéus, alguma vez lhes puxei pelo rabicho das cabeleiras. Outrossim, afeiçoei-me à contemplação da injustiça humana, inclinei-me a atenuá-la, a explicá-la, a classificá-la por partes, a entendê-la, não segundo um padrão rígido, mas ao sabor das circunstâncias e lugares. Minha mãe doutrinava-me a seu modo, fazia-me decorar alguns preceitos e orações; mas eu sentia que, mais do que as orações, me governavam os nervos e o sangue, e a boa regra perdia o espírito, que a faz viver, para se tomar uma vã fórmula. De manhã, antes do mingau, e de noite, antes da cama,pedia a Deus que me perdoasse, assim como eu perdoava aos meus devedores; mas entre a manhã e a noite fazia uma grande maldade, e meu pai, passado o alvoroço, dava-me pancadinhas na cara, e exclamava a rir: Ah! brejeiro! ah! brejeiro! Machado de Assis. Memórias póstumas de Brás Cubas. Internet: <www.dominiopublico.gov.br>. Julgue os próximos itens, com relação ao fragmento de texto apresentado, ao contexto histórico- literário em que foi produzido e à produção literária machadiana. 1) A obra da qual esse fragmento de texto foi extraído pertence à segunda fase da produção machadiana e inaugura a estética realista no Brasil. Comentários Questão de conhecimento de cânone; estilo do autor e movimento literário. O romance Memórias póstumas de Brás Cubas (1881) faz parte da segunda fase de Machado de Assis, considerada realista, e também inaugura o movimento realista na Literatura Nacional. O grau da dificuldade da questão é: fácil. Gabarito: C. 2) A crueldade e a rebeldia que caracterizam o menino Brás Cubas se contrapõem à imagem idealizada de infância, própria de autores românticos. Comentários Questão de interpretação de texto literário. Brás Cubas mostra-se uma criança perversa já desde a infância, como se esse fato fosse justificar sua personalidade na fase adulta. Segundo ele, quando criança quebrou a cabeça de escrava e montava em Prudêncio, além de outras travessuras, como esconder chapéus. O grau da dificuldade da questão é: fácil. Gabarito: C. 3) A afirmação “o menino é pai do homem” é corroborada pelo narrador, que se mostra consciente dos fatos que marcaram sua trajetória existencial. Comentários Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 47 Questão de interpretação de texto literário. Essa frase quer dizer que o menino tem tanta autoridade que é capaz até mesmo de mandar no pai. Assim, cresce sem ser repreendido pelos pais, pois o pai gosta de tudo que faz e a mãe é pacífica e benevolente, ensinando-lhe a rezar. O grau da dificuldade da questão é: médio. Gabarito: C. 4) No fragmento apresentado, assim como em toda a obra Memórias Póstumas de Brás Cubas, predomina a linguagem denotativa, em consonância com os princípios de racionalismo e objetividade característicos do Realismo. Comentários Conhecimento da obra do cânone/características do movimento literário. Percebam que é o tipo de questão que vai abordar o enredo e o estilo de todo o livro; logo, sua visão global. Mesmo que o Realismo seja um movimento literário no qual predominou a verossimilhança, muitas vezes para estabelecer suas críticas sociais Machado de Assis utilizava recursos estilísticos subjetivos, como a ironia. Portanto, linguagem conotativa e não denotativa. O grau da dificuldade da questão é: médio. Gabarito: E. 5) O fragmento apresentado é predominantemente descritivo, dada a preocupação do narrador em detalhar suas próprias características. Comentários Questão sobre organização textual. O trecho mistura narração com descrição. O grau da dificuldade da questão é: fácil. Gabarito: E. 6) Depreende-se do último parágrafo do texto que Brás Cubas foi criado em contexto familiar que reprovava comportamentos prepotentes. Comentários Questão de interpretação de texto literário. Pelo contrário: mesmo admitindo ter feito maldades, Brás Cubas diz que a reação do pai quanto a isso era relevar, bater em seus ombros e dizer: “Ah! brejeiro! ah! brejeiro!”, como quem se orgulha do filho em vez de repreendê-lo adequadamente por suas torturas. O grau da dificuldade da questão é: médio. Gabarito: E. 7) Para compor um panorama da sociedade carioca do século XIX, Machado de Assis elege, principalmente nos romances da segunda fase de sua produção, protagonistas pertencentes às classes populares, como é o caso de Bento Santiago, narrador de Dom Casmurro. Comentários Questão de conhecimento do cânone. Machado de Assis elege para suas personagens as classes sociais das mais variadas. Porém, predominantemente, a crítica gira em torno da burguesia, classe da qual Bento A=Santiago faz parte. O grau da dificuldade da questão é: médio. Gabarito: E. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 48 Quincas Borba Dez anos depois de Memórias póstumas de Brás Cubas, surge este interessante romance que, embora leve um nome próprio no título, apresenta como protagonista Rubião. Amigo do filósofo Quincas Borba, aproxima-se deste no fim da vida e por sorte do destino acaba sendo herdeiro universal de toda sua herança quando o amigo morre, inclusive, com o cachorro com o mesmo nome: Quincas Borba. Porém, uma série de oportunistas se acercam de Rubião que, ingênuo e depois enlouquecendo, não consegue manter seu patrimônio. Entre os aproveitadores está o casal Palha. Rubião acaba por se apaixonar por Sofia, mas nunca conquista nada com ela. Quincas Borba (1891) CATEGORIA DEFINIÇÃO ESTRUTURA CCI (201) capítulos. São na maioria das vezes capítulos curtos, alguns de um parágrafo só. Os capítulos não são nomeados (em contraposição a Memórias póstuma de Brás Cubas, cujos capítulos eram nomeados). PERSONAGENS Quincas Borba (filósofo); Quincas Borba (cachorro); Rubião; Sofia. Cristiano Palha; Camacho; Carlos Maria; Maria Benedita. Tipos previsíveis. Outras personagens: Major Siqueira; Dona Tonica; Tia Augusta. TEMPO Entre 1867 e 1871. Logo, o enredo ocorre no Brasil – Segundo Império. ESPAÇO Rio de Janeiro (Botafogo) e Barbacena (Minas Gerais). ENREDO Rubião era amigo do filósofo Quincas Borba, que viera a falecer sem deixar herdeiros. Inesperadamente, Rubião torna-se o seu herdeiro universal, ganhando não só o dinheiro, mas também o cachorro que levara o mesmo nome do dono. Indo ao Rio de Janeiro para resolver questões do testamento, acaba por conhecer Cristiano Palha, que se aproveita da sua nova condição financeira, e sua esposa Sofia, por quem se apaixona. CONFLITO Impasse de Rubião. Sofia é capaz de trair o marido Palha, mas não com ele. Rubião se torna enciumado e obcecado, adentrando em um ciclo obsessivo. CLÍMAX Rubião enlouquece. Sofia tem medo dele e depois um sentimento médio: nem remorso, mas certamente não amor. DESFECHO Rubião é internado numa casa de saúde; mas foge de lá e volta para a sua cidade natal – Barbacena – com o cachorro, Quincas Borba. O primeiro morre, seguido do segundo depois de 3 dias. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 49 Dom Casmurro O romance foi publicado 18 anos após Memórias póstumas. A crítica considera a obra mais bem-acabada do escritor. No texto, os recursos literários utilizados de forma exagerada no primeiro romance realista são manejados com mais cuidado, sem que se perca a essência de Machado: a análise psicológica e a ambiguidade. Enredo No primeiro capítulo somos apresentados a Bentinho, um senhor que pretende “atar as duas pontas da vida” e fazer um balanço para entender o que aconteceu em seu casamento. De forma retrospectiva, lembra-se da adolescência e de seu encantamento por Capitu, filha de vizinhos próximos que tinham a proteção de sua mãe. O narrador sugere que Capitu o teria seduzido: por atração amorosa ou por interesse financeiro? O narrador tem dúvidas quanto a isso. Sua empolgação com a moça encontra um obstáculo: como D. Glória tinha perdido um filho, prometera que o próximo, Bentinho, seria padre. Bentinho segue para o seminário. Lá, ele conhece Ezequiel Escobar, seu grande amigo. Ao mesmo tempo,o jovem se aproxima de José Dias, um agregado e conselheiro de D. Glória, para que ele interceda a seu favor. José Dias não gosta de Capitu, mas imagina que poderia viajar para a Europa ao lado de Bentinho se o garoto não se tornasse padre. Capitu conquista D. Glória, que agora vê com pesar a ausência do filho. Bentinho revela para a mãe que não tem vocação religiosa, e é Escobar quem encontra uma solução: ela prometera para Deus formar um padre, não era imprescindível que fosse Bentinho. D. Glória, então, envia ao seminário um escravo que se tornará padre. Bentinho e Capitu se casam. Depois de alguns anos nasce o filho Ezequiel. Escobar também se casa e os amigos se frequentam. Com o passar do tempo, o protagonista vai se tornando desconfiado. Ezequiel morre e, no velório, o narrador observa que Capitu teria demonstrado um sentimento além do normal para alguém que seria simplesmente amigo do casal. Nesse ponto, ele descreve o olhar enigmático de Capitu com a seguinte expressão: “olhos de ressaca”. • Narrador: primeira pessoa, um senhor casmurro, ou seja, ensimesmado, resolve contar sua história para provar que não teria sido injusto com sua esposa. • Tempo: segunda metade do século XIX; a narrativa começa em 1857 quando o protagonista tem 14 anos. • Espaço: Rio de Janeiro. FICHA DE LEITURA Cartaz da série “Capitu” (2008). Fonte: Imdb. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 50 Bentinho fica atormentado. Começa a ver nas feições de Ezequiel traços de Escobar. Torna- se insuportável. Capitu parte para o exterior com o Filho e morre na Europa. Ezequiel retorna ao Brasil, mas tem uma recepção fria e distante por parte do pai. Morre de febre tifoide durante uma viagem para Jerusalém. Ao final do livro, ele conclui que Capitu o traiu, mesmo sem ter conseguido dar uma prova substancial durante toda a narrativa. Dom Casmurro (1899) CATEGORIA DEFINIÇÃO ESTRUTURA 148 (CXLVIII) capítulos curtos. PERSONAGENS Bento; Capitu; Dona Glória; Escobar; Ezequiel; José Dias. TEMPO Segunda metade do século XIX; a narrativa começa em 1857, o protagonista tem 14 anos. ESPAÇO Rio de Janeiro ENREDO De forma retrospectiva, Bentinho lembra-se da adolescência e de seu encantamento por Capitu, filha de vizinhos próximos que tinham a proteção de sua mãe. Sua empolgação com a moça encontra um obstáculo: como D. Glória tinha perdido um filho, prometera que o próximo, Bentinho, seria padre. CONFLITO Bentinho segue para o seminário. Lá, ele conhece Ezequiel Escobar, seu grande amigo. Ao mesmo tempo, o jovem se aproxima de José Dias, um agregado e conselheiro de D. Glória, para que ele interceda a seu favor. José Dias não gosta de Capitu, mas imagina que poderia viajar para a Europa ao lado de Bentinho se o garoto não se tornasse padre. É Escobar quem encontra uma solução: ela prometera para Deus formar um padre, não era imprescindível que fosse Bentinho. D. Glória, então, envia ao seminário um escravo que se tornará padre. CLÍMAX Bentinho e Capitu se casam. Depois de alguns anos nasce o filho Ezequiel. Escobar também se casa e os amigos se frequentam. Com o passar do tempo, o protagonista vai se tornando desconfiado. Ezequiel morre e, no velório, o narrador observa que Capitu teria demonstrado um sentimento além do normal para alguém que seria simplesmente amigo do casal. Nesse ponto, ele descreve o olhar enigmático de Capitu com a seguinte expressão: “olhos de ressaca”. DESFECHO Bentinho fica atormentado. Começa a ver nas feições de Ezequiel traços de Escobar. Torna-se insuportável. Capitu parte para o exterior com o Filho e morre na Europa. Ezequiel retorna ao Brasil, mas tem uma recepção fria e distante por parte do pai. Morre de febre tifoide durante uma viagem para Jerusalém. Ao final do livro, ele conclui que Capitu o traiu, mesmo sem ter conseguido dar uma prova substancial durante toda a narrativa. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 51 TRECHO DE DOM CASMURRO Não houve lepra, mas há febres por todas essas terras humanas, sejam velhas ou novas. Onze meses depois, Ezequiel morreu de uma febre tifóide, e foi enterrado nas imediações de Jerusalém, onde os dous amigos da universidade lhe levantaram um túmulo com esta inscrição, tirada do profeta Ezequiel, em grego: "Tu eras perfeito nos teus caminhos." Mandaram-me ambos os textos, grego e latino, o desenho da sepultura, a conta das despesas e o resto do dinheiro que ele levava; pagaria o triplo para não tornar a vê-lo. Como quisesse verificar o texto, consultei a minha Vulgata, achei que era exato, mas tinha ainda um complemento: "Tu eras perfeito nos teus caminhos, desde o dia da tua criação." Parei e perguntei calado: "Quando seria o dia da criação de Ezequiel?" Ninguém me respondeu. Eis aí mais um mistério para ajuntar aos tantos deste mundo. Apesar de tudo, jantei bem e fui ao teatro. Machado de Assis – Dom Casmurro. Fonte: Domínio Público. Disponível em: https://tinyurl.com/6wfv6yy. Acesso em: 11 de abril de 2020. Comentários No fragmento, observa-se o processo de uma construção e uma convicção tão acirrada que os ânimos se exaltam e a razão se oblitera. O ciúme é tão doentio e xucro, isto é, casmurro mesmo, que chega a desejar o mal de Ezequiel, pois via nele Escobar, que tinha como certo que era amante. Independentemente de Ezequiel ser mesmo filho ou não de Bentinho, este mostra para com aquele uma frieza chocante. A relação entre ambos é baseada na distância, até no elemento pecuniário. Esaú e Jacó O livro foi publicado em 1904, depois da proclamação da República. O título é extraído da Bíblia e faz referência à disputa entre irmãos. Nesse romance, Machado envereda por um enredo mais simples e se vale do narrador em terceira pessoa, fato que torna a narrativa “mais comportada”. A crítica costuma destacar o fato de que, nitidamente, o autor faz uma alegoria da passagem da Monarquia à República. Trata-se do romance em que o autor expôs sua opinião sobre o contexto político em que vivia. • Narrador: o texto teria sido encontrado nos cadernos do Conselheiro Aires, mas ele não é o narrador. O narrador de fato é onisciente em terceira pessoa. • Tempo: inicia-se com a previsão da vidente sobre os gêmeos em 1871 indo até os primeiros anos da República. • Espaço: Rio de Janeiro. FICHA DE LEITURA Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 52 Enredo Natividade, grávida de gêmeos, consulta uma cabocla para saber do destino das crianças. Seriam grandes, mas rivais na vida. Os dois crescem idênticos na aparência, mas opostos no caráter. Paulo se torna republicano e ingressa na Faculdade de Direto; Pedro, monarquista e cursa Medicina. Forma-se um triângulo amoroso, quando os dois se apaixonam por Flora, filha de um político oportunista chamado Batista. O pai é nomeado para presidente de uma província ao norte, portanto a moça deverá abandonar o Rio. Mas, então, é proclamada a República. As circunstâncias mudam e, para felicidade dos irmãos, ela deve ficar na capital. Indecisa, vai para a casa da irmã do Conselheiro Aires, contudo adoece e morre. Não resta aos irmãos outra coisa senão dar atenção às respectivas carreiras. Os dois são eleitos deputados, mas atuam em lados opostos. Natividade, em seu leito de morte, pede aos dois que se reconciliem. Os irmãos abalados atendem ao desejo materno, mas por pouco tempo. Logo recomeçam as brigas e eles terminam separados. Interpretação Do ponto de vista da análisepsicológica, o enredo envolvendo gêmeos permite ao autor explorar a ambiguidade e dualidade do ser humano. Um representa o espírito, outro, o coração. A paixão por uma única mulher permite explorar a indecisão que ronda o indivíduo. Contudo a história pode ser lida como alegoria da transição entre os regimes políticos. Os gêmeos são idênticos e opostos. No Brasil, republicanos e monarquistas retoricamente se contrapõem sem que isso os distinga na prática. Esaú e Jacó (1904) CATEGORIA DEFINIÇÃO ESTRUTURA 121 (CXXI) capítulos. PERSONAGENS Natividade; Paulo; Pedro; Flora; Aires → intertextualidade interna. TEMPO Inicia-se com a previsão da vidente sobre os gêmeos em 1871 indo até os primeiros anos da República. ESPAÇO Rio de Janeiro. ENREDO Natividade, grávida de gêmeos, consulta uma cabocla para saber do destino das crianças. Seriam grandes, mas rivais na vida. Os dois crescem idênticos na aparência, mas opostos no caráter. Paulo se torna republicano e ingressa na Faculdade de Direto; Pedro, monarquista e cursa Medicina. Forma-se um triângulo amoroso, quando os dois se apaixonam por Flora, filha de um político oportunista chamado Batista. Fo n te : P ix ab ay . Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 53 CONFLITO O pai é nomeado para presidente de uma província ao norte, portanto a moça deverá abandonar o Rio. Mas, então, é proclamada a República. As circunstâncias mudam e, para felicidade dos irmãos, ela deve ficar na capital. CLÍMAX Indecisa, vai para a casa da irmã do Conselheiro Aires, contudo adoece e morre. Não resta aos irmãos outra coisa senão dar atenção às respectivas carreiras. Os dois são eleitos deputados, mas atuam em lados opostos. DESFECHO Natividade, em seu leito de morte, pede aos dois que se reconciliem. Os irmãos abalados atendem ao desejo materno, mas por pouco tempo. Logo recomeçam as brigas e eles terminam separados. Memorial de Aires Último romance do autor, publicado em 1908. Narrativa não linear à moda de Memórias póstumas. O título já diz ao que se presta: um memorial, ou seja, um conjunto de folhas esparsas com eventos interessantes dignos de serem lembrados pelo Conselheiro Aires e que foram anotados na forma de diário. Enredo Marcondes Aires, diplomata aposentado, viúvo e solitário, acompanha com interesse a história do casal Aguiar. Aguiar e D. Carmo estão casados há mais de 20 anos, mas não têm filhos. A mulher dirige todo seu carinho de mãe para o afilhado, Tristão, e para uma viúva, Fidélia, chegando a chamá-la de “minha filha”. Tristão viaja para a Europa, onde se forma em Medicina. D. Carmo sente saudades “do filho”, que vai deixando de enviar cartas. Contudo a notícia de que o jovem retornará da Europa reanima o casal Aguiar. Ao chegar ao Brasil, D. Carmo apresenta ao afilhado Fidélia. Eles se apaixonam, se casam e vão para a Europa, deixando os Aguiar sozinhos novamente. Essa história é entrecortada pela própria história do Conselheiro. Ele conhece Fidélia, fala de seu interesse por ela a sua irmã, que o desafia a conquistá-la. Aires faz uma aposta, ele tinha certeza de que a viúva jamais se casaria novamente. Ele, que já não tinha muita esperança de ser correspondido, desiste de seu projeto de se casar novamente, quando percebe que Tristão e Fidélia estão apaixonados. Aires parece querer se juntar à solidão do casal Aguiar. • Narrador: em primeira pessoa, quando o Conselheiro fala de si; em terceira pessoa, quando ele conta circunstâncias envolvendo outros personagens. • Tempo: inicia-se com a previsão da vidente sobre os gêmeos em 1871 indo até os primeiros anos da República. • Espaço: Rio de Janeiro. FICHA DE LEITURA Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 54 Interpretação Trata-se de um belo tratado da condição humana, principalmente no momento quando o indivíduo pode fazer um balanço de sua vida na velhice. Apesar de triste, a história não envereda para o sentimentalismo barato, seja por conta da forma lacunar própria de um diário, seja pela sabedoria e equilíbrio, traços distintivos do Conselheiro. O Conselheiro parece construir uma narrativa como jogo de espelhos. Ao observar a vida dos personagens ao seu redor, ele vai reconstruindo a própria biografia. No desejo de se casar com Fidélia, ele espelha a tentativa de fuga do tédio e da solidão que também assombram o casal Aguiar. Mas, se para o casal não há saída, para o arguto observador dos homens, resta a própria atividade de escrita. Memorial de Aires (1908) CATEGORIA DEFINIÇÃO ESTRUTURA Diário. Última entrada: 30 de agosto / sem data. PERSONAGENS Aires, casal Aguiar, Tristão, Fidélia. TEMPO Começo das anotações: 1888, ano da abolição; fim das anotações: 1889. ESPAÇO Rio de Janeiro. ENREDO Marcondes Aires, diplomata aposentado, viúvo e solitário, acompanha com interesse a história do casal Aguiar. Aguiar e D. Carmo estão casados há mais de 20 anos, mas não têm filhos. A mulher dirige todo seu carinho de mãe para o afilhado, Tristão, e para uma viúva, Fidélia, chegando a chamá-la de “minha filha”. CONFLITO Tristão viaja para a Europa, onde se forma em Medicina. D. Carmo sente saudades “do filho”, que vai deixando de enviar cartas. Contudo a notícia de que o jovem retornará da Europa reanima o casal Aguiar. CLÍMAX Ao chegar ao Brasil, D. Carmo apresenta ao afilhado Fidélia. Eles se apaixonam, se casam e vão para a Europa, deixando os Aguiar sozinhos novamente. Essa história é entrecortada pela própria história do Conselheiro. Ele conhece Fidélia, fala de seu interesse por ela a sua irmã, que o desafia a conquistá-la. Aires faz uma aposta, ele tinha certeza de que a viúva jamais se casaria novamente. DESFECHO Ele, que já não tinha muita esperança de ser correspondido, desiste de seu projeto de se casar novamente, quando percebe que Tristão e Fidélia estão apaixonados. Aires parece querer se juntar à solidão do casal Aguiar. 13 de maio Enfim, lei. Nunca fui, nem o cargo me consentia ser propagandista da abolição, mas confesso que senti grande prazer quando soube da votação final do Senado e da sanção da Regente. Estava na Rua do Ouvidor, onde a agitação era grande e a alegria geral. [...] Ainda bem que acabamos com isto. Era tempo. Embora queimemos todas as leis, decretos e avisos, não poderemos acabar com os atos particulares, escrituras e inventários, nem apagar a instituição da História, ou até da Poesia. ASSIS, Machado de. Memorial de Aires. São Paulo: Ática, 2007. p. 38-39. (Série Bom livro). Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 55 3.1.2 – Contos Papéis avulsos Publicado em 1882, é o terceiro livro de Machado na sua fase realista. O autor adverte que, apesar do título, “papeis avulsos”, há uma analogia no que se refere aos temas abordados. Vários contos giram em torno da diferença entre o desejo individual e a apreciação pública, numa sociedade em que o jogo social tinha muito valor. Além disso, como não podia deixar de ser, a ironia e o pessimismo já estão marcando presença. Para se ter uma ideia da qualidade dos contos, destacarei três: “O espelho”, “Teoria do medalhão” e o incrível “O alienista”. Teoria do Medalhão. Um pai resolve aconselhar seu filho sobre como obter sucesso na vida. O filho deveria se submeter à opinião das pessoas mais influentes, raramente manifestar suas próprias ideias, possuir um vocabulário limitado e preferir o humor simples à ironia. O espelho. Aos 25 anos, Jacobina se torna Alferesda Guarda Nacional. Isso muda seu status e todos ao seu redor o chamam de Sr. Alferes. Vai passar uns dias na casa de Tia Marcolina que, para fazer um agrado ao Sr. Alferes, coloca no quarto dele um grande espelho. Contudo, por motivos de força maior, ele acaba ficando sozinho no sítio. Sem a consideração dos outros, a imagem dele desaparece, não consegue mais se ver no espelho. O protagonista resolve colocar a farda e, para sua surpresa, sua imagem volta a aparecer com nitidez. Somente com a farda sua “alma exterior” preenchia “a alma interior”. O alienista. Dr. Bacamarte retorna ao Brasil e à Itaguaí com fama de médico psiquiatra reconhecido em Portugal, Espanha e Brasil. Na cidade, ele funda, com o apoio das autoridades, a Casa Verde, um hospício. Ele vai observando o comportamento das pessoas e interna aquelas que têm padrão desviante de comportamento. Ele acaba por encarcerar boa parte dos habitantes da cidade. Se todos têm comportamento de desvio, menos ele, então ele é o louco! Ao chegar a essa conclusão, ele solta a todos e se tranca na Casa Verde. Histórias sem data Publicado em 1884, esse livro reúne 18 contos publicados em periódicos cariocas. Nessa data Machado já tinha se consolidado como autor realista com Memórias póstumas e preparava Quincas Borba. Dois contos se destacam: “Noite de almirante” e “A igreja do Diabo”. Noite de almirante. Deolindo, marinheiro, sai do navio para encontrar sua amada. Os colegas, cheios de inveja, dizem que ele terá uma noite de almirante. Quando chega em terra, descobre que sua namorada fora morar com um mascate. Pensa me matá-la. Quando a encontra, Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 56 jura que vai se matar se ela não voltar com ele. Não se matou e, no dia seguinte, voltou para o navio sem desmentir os amigos que cumprimentavam o “almirante”. A igreja do Diabo. Essa história teria sido narrada num velho manuscrito beneditino. Há muito tempo, o Diabo resolveu criar uma igreja que invertia os conceitos de virtude e vício. Ninguém poderia praticar o bem, o roubo era bem-visto, todos deveriam mentir etc. Contudo, logo que tal Igreja se institucionalizou, os fiéis faziam às escondidas o que era proibido: davam esmolas, restituíam o objeto roubado, falavam a verdade etc. Várias histórias Coletânea de contos lançada em 1896, reúne 16 contos publicados na Gazeta de Notícias. Observam-se, nos livros, as características já consagradas do autor: o pessimismo, a ironia, análise psicológica e descrença no conhecimento. Alguns contos se destacam: “A causa secreta”, “O enfermeiro” e “A cartomante”. A Causa Secreta. Fortunato, casado com Maria Luiza, torna-se grande amigo de Garcia, com quem abre uma casa de saúde em sociedade. O amigo fica surpreso ao ver Fortunato torturando um rato: percebe a índole sádica do amigo. No final da trama, Maria Luiza morre e, de novo, há certo prazer para Fortunato em observar seu sofrimento e do seu amigo que chora pela mulher que amou em segredo. O enfermeiro. Esse conto narra a história de um enfermeiro que, num acesso de raiva, esgana o rico Felisberto, ação que precipita a morte do velho. O rapaz consegue se desvencilhar das provas. Ele herda os bens do Sr. Felisberto. Devido ao remorso e ao peso na consciência, pensa em doar todo o dinheiro, mas, como as pessoas da cidade o elogiam pela paciência com o ricaço morto, fica com o dinheiro e, com o tempo, esquece-se da culpa interna. A cartomante. Rita é casada com Vilela, mas mantém relações com Camilo, com quem se encontra frequentemente. Certa feita, ela diz ao amante que foi à cartomante. Camilo desdenha da crendice da amada. Camilo recebe cartas de alguém que diz saber da relação entre ele e Rita. Ele se afasta da amada. Um dia recebe uma carta de Vilela, que desejava conversar com o amigo. Camilo, apavorado, resolve ir à Cartomante que lhe assegura que nenhum mal lhe acometerá. Tranquilo, ele entra na casa de Vilela. Depara com Rita morta e, em seguida, é morto pelo marido traído. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 57 3.2 – Aluísio Azevedo Aluísio Tancredo Gonçalves de Azevedo (1857-1913) é natural de São Luís do Maranhão e era irmão do teatrólogo e jornalista Artur Azevedo. Aos 19 anos foi para o Rio de Janeiro na companhia do irmão. Em 1879, com a morte do pai, volta para o Maranhão, onde lança seu primeiro romance, ainda romântico. Em 1881, dá início ao “Movimento Naturalista no Brasil” com a publicação do romance O mulato. A obra indignou a sociedade de São Luís, que chegou a chamá-lo de “Satanás da cidade”. Em virtude disso, Aluísio Azevedo voltou para o Rio de Janeiro decidido a ser escritor. Oscilou entre livros românticos, mais vendáveis, e outros mais realistas. Da fase naturalista, destacam-se O cortiço, Casa de pensão e O mulato. Em 1895, Aluísio Azevedo ingressa na carreira diplomática. Vamos às obras. O mulato Enredo José, um abastado fazendeiro de São Luís, tem um filho com a escrava, Domingas. O proprietário tem afeição especial pelo menino bastardo, mas o rapaz fica órfão cedo. A mãe enlouquecera e o pai fora morto pelo Pe. Diogo, ex-amante da mulher de José. Na verdade, esse trio amoroso foi bastante trágico. José matara sua mulher na frente do amante. Os dois fizeram um pacto de silêncio, mas o padre resolvera se vingar do marido. Raimundo, o protagonista de fato, recebeu a herança e foi enviado a Portugal para completar seus estudos. De volta ao Brasil, ele se apaixona pela prima. O pai da moça não aprova tal relacionamento por preconceito. O rapaz engravida a prima e está disposto a se casar com ela, quando é assassinado por Luís Dantas (empregado do tio), a quem a moça tinha sido prometida em casamento. O assassino fora influenciado pelo padre, pois temia ser descoberto por Raimundo. • Narrador: em terceira pessoa. • Tempo: a história se desdobra em dois tempos: no presente, em que o personagem principal, Raimundo, se movimenta, e outro no passado, que envolve a descoberta de seu passado familiar. • Espaço: São Luís do Maranhão. FICHA DE LEITURA Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 58 Interpretação A obra tematiza, sobretudo, o racismo presente na sociedade brasileira. Contudo outros temas polêmicos também podem ser observados na obra: crítica social (há um desfile de personagens grotescos representantes da elite maranhense); anticlericalismo e o predomínio da falta de caráter. O mulato (1881) CATEGORIA DEFINIÇÃO ESTRUTURA 19 capítulos. PERSONAGENS José, Domingas, Raimundo, Dantas. TEMPO A história se desdobra em dois tempos: no presente, em que o personagem principal, Raimundo, se movimenta, e outro no passado, que envolve a descoberta de seu passado familiar. ESPAÇO São Luís do Maranhão. ENREDO José, um abastado fazendeiro de São Luís, tem um filho com a escrava, Domingas. O proprietário tem afeição especial pelo menino bastardo, mas o rapaz fica órfão cedo. A mãe enlouquecera e o pai fora morto pelo Pe. Diogo, ex-amante da mulher de José. CONFLITO Na verdade, esse trio amoroso foi bastante trágico. José matara sua mulher na frente do amante. Os dois fizeram um pacto de silêncio, mas o padre resolvera se vingar do marido. CLÍMAX Raimundo, o protagonista de fato, recebeu a herança e foi enviado a Portugal para completar seus estudos. De volta ao Brasil, ele se apaixona pela prima. O pai da moça não aprova tal relacionamento por preconceito.DESFECHO O rapaz engravida a prima e está disposto a se casar com ela, quando é assassinado por Luís Dantas (empregado do tio), a quem a moça tinha sido prometida em casamento. O assassino fora influenciado pelo padre, pois temia ser descoberto por Raimundo. Representa anticlericalismo e o predomínio da falta de caráter. O cortiço • Narrador: em terceira pessoa. • Tempo: a narrativa se passa em algum momento entre 1880 e 1890; em relação ao tempo da contação da história, a narrativa é linear e os fatos são contados em ordem cronológica. • Espaço: Rio de Janeiro – sobrado e cortiço. FICHA DE LEITURA Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 59 Enredo Nesse romance, o autor consegue a façanha de contar uma narrativa de uma coletividade. Ele se vale de uma narrativa central, a ascensão de João Romão, o proprietário do cortiço, entremeada pelas histórias particulares dos habitantes da estalagem. Inicialmente, o narrador apresenta a história do protagonista que dá alma ao cortiço, o português João Romão. Tendo trabalhado miseravelmente para um outro conterrâneo, fica com uma soma em dinheiro e o armazém onde trabalhava quando seu patrão retorna para Portugal. Ele se junta com uma escrava, Bertoleza, e apropria- se do dinheiro que ela está guardando para comprar a alforria. Consegue fazer isso forjando uma carta de alforria. Compra o terreno adjacente ao armazém e começa a construir casinhas. Ele e Bertoleza trabalham dia e noite sem descanso para ampliar o negócio. Consegue comprar mais umas braças do terreno, o que inclui a pedreira que logo ele começa a explorar. Ele é descrito como alguém que tem febre em acumular, não gasta seu dinheiro com nada e, quando pode, apropria- se do que é dos outros. No sobrado ao lado, vem morar um rico comerciante: Miranda. Mudou-se para o bairro, com a finalidade de afastar a mulher adúltera, Dona Estela, dos fregueses e dos caixeiros que trabalhavam para ele. A relação entre eles era de ódio. Parte da fortuna do comerciante vinha do dote da mulher, ele tinha então que suportar a relação. Tinham uma filha Zulmira, uma menina obediente e enjeitada. No sobrado, viviam o Botelho, um velho agregado, e Henrique, filho de um rico cliente que mandara o filho para a capital para que ele se preparasse para o curso de medicina. Esses dois polos, inicialmente, opõem-se. João Romão e Miranda se indispõem por conta do terreno adjacente ao sobrado. Miranda quer comprá-lo para ampliar seu quintal, João Romão não quer vendê-lo. Feita a apresentação do conflito inicial, o narrador passa a focar nos habitantes do cortiço e apresenta seus moradores. Ele começa pelas lavadeiras: Machona (uma mulher autoritária), Augusta Carne Mole (honesta), Albino (lavadeiro), Marciana e sua filha Florinda, Leocádia (mulher infiel), Paula ou Bruxa (feiticeira) e Dona Isabel e sua filha Pombinha. Chega um outro personagem que terá muita importância para a trama: Jerônimo, um português, honesto, trabalhador e bom pai de família que chega ao cortiço para trabalhar como cavouqueiro para João Romão. Conhece Rita Baiana, por quem é seduzido. A mulata representa a sensualidade tanto da raça (segundo o narrador) quanto do próprio país tropical. Indispõe-se com o amante dela, Firmo, brigam e Jerônimo, ferido, acaba recolhendo-se ao hospital por um tempo. O narrador passa, então, a acompanhar outra história, a de D. Isabel e de sua filha Pombinha. A mulher tivera uma vida boa, mas após a morte do seu marido, teve que se recolher ao cortiço, esperando que sua filha, casando-se com um bom homem, poderia tirá-las daquela estalagem. O problema era que a menina ainda não menstruara. No dia em que houve a briga entre Firmo e Jerônimo, aconteceu também um outro embate: entre Pombinha e Léonie, uma prostituta que frequentava o cortiço e era bem querida de todos. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 60 A menina e a mãe tinham ido visitar Léonie. Dona Isabel, depois do almoço, retirou –se para dormir, deixando a filha em companhia da prostituta. A cortesã, quando se viu a sós com a menina, atirou-se sobre ela, seduzindo-a e a despertando para o sexo. No dia seguinte, a jovem sentiu-se mal e teve a sua primeira menstruação. Nesse ponto, o narrador retoma a história de João Romão. O vendeiro, agora, tinha dado para invejar o Miranda, pois este conquistara um título de barão. Começa uma transformação interior desse personagem. Agora, o homem, descontente com sua vida de mascate, começa a pensar no prestígio social. O velho Botelho sugere ao vendeiro que se case com a filha do Miranda. Com os fios narrativos assim emaranhados, o narrador começa a preparar o desfecho. Jerônimo retorna do hospital e mata Firmo, abandona sua mulher e filha e vai morar com Rita Baiana. Torna-se displicente. Pombinha casa-se como o seu noivo, mas logo percebe que ela não poderia confiar no sexo masculino. Trai algumas vezes seu esposo, que acaba por abandoná-la. Resolve então aventurar-se na vida de sua mestra, Léonie. Torna-se também prostituta e D. Isabel morre de desgosto. O cortiço passa por mudanças. A Bruxa, na tentativa de se vingar de João Roma, põe fogo no cortiço. Porém, o homem tinha colocado toda a propriedade no seguro. João Romão lucra com a tragédia. Constrói um sobrado maior do que o do Miranda, moderniza o cortiço e agora torna-se burguês com negócios variados. Já circula na Rua do Ouvidor, lugar de exibição da elite endinheirada. Falta-lhe o casamento. O impedimento é Bertoleza, precisa livrar-se da negra. Botelho, ao saber que ela é escrava ainda, aconselha João Romão a denunciá-la aos donos como negra fujona. Botelho o ajuda na empreitada. No capítulo final, os guardas chegam para prendê-la e devolvê-la ao dono. Percebendo o que vai acontecer, Bertoleza se mata, enquanto entra no sobrado de João Romão uma comissão de abolicionistas que vinha trazer-lhe “o diploma de sócio benemérito”. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 61 Interpretação O Cortiço representa, entre nós, o exemplar mais bem formulado do Naturalismo. Aluísio Azevedo fez uma pesquisa de campo para descrever a vida em tal circunstância. Apresenta uma espécie de romance de tese, pois os personagens são determinados pelo meio, pela raça e pela situação histórica. Os mulatos e negros são representados como inferiores e marcados pela animalidade: Rita Baiana é pura sensualidade e Bertoleza é representada como se fosse um animal de carga. Ambas, diz o narrador, procuravam instintivamente nos parceiros brancos uma forma de melhorar sua raça. Outros elementos que submetem os homens a todo tipo de baixeza são o calor e a sensualidade. O sol dos trópicos e a sensualidade de Rita Baiana arrastam Jerônimo para a degradação moral. Também Pombinha, dada sua interpretação enviesada da realidade, própria de quem cresceu num monturo (dirá o narrador), deixa-se levar pela volúpia. Resta João Romão, que, sabendo se aproveitar desses indivíduos inferiores, consegue o êxito de um burguês que lutou até conseguir um lugar na sociedade. Aluísio Azevedo carrega nas tintas de um português cruel que se aproveita de brasileiros, expressando, nesse romance, um sentimento antilusitano bastante evidente no final do século XIX. Ao final do romance, percebe-se que não há mocinhos e que a liberdade é uma ilusão. O cortiço (1890) CATEGORIA DEFINIÇÃO ESTRUTURA 23 capítulos. PERSONAGENS João Romão, Bertoleza, Miranda,Jerônimo, Rita Baiana, Piedade, Pombinha. TEMPO 1890. ESPAÇO Cortiço do Rio de Janeiro. ENREDO Trata-se da uma narrativa de uma coletividade. O narrador se vale de uma narrativa central, a ascensão de João Romão, o proprietário do cortiço, entremeada pelas histórias particulares dos habitantes da estalagem. Ele se junta com uma escrava, Bertoleza, e apropria-se do dinheiro que ela está guardando para forjar uma carta de alforria. Compra o terreno adjacente ao armazém e começa a construir casinhas. Ele e Bertoleza trabalham dia e noite sem descanso para ampliar o negócio. Opõe- se ao rico vizinho Miranda. CONFLITO É narrado o trabalho das lavadeiras. Chega um outro personagem que terá muita importância para a trama: Jerônimo, um português, honesto, trabalhador. Conhece Rita Baiana, por quem é seduzido. Outra história, a de D. Isabel e de sua filha Pombinha, mas ela menstrua e tem um relacionamento lésbico, Léonie, prostituta que frequentava o cortiço. CLÍMAX Com os fios narrativos assim emaranhados, o narrador começa a preparar o desfecho. Jerônimo retorna do hospital e mata Firmo, abandona sua mulher e filha e vai morar com Rita Baiana. Pombinha casa-se como o seu noivo, mas logo percebe que ela não poderia confiar no sexo masculino. Trai algumas vezes seu esposo, que acaba por abandoná-la. DESFECHO No capítulo final, os guardas chegam para prender Bertoleza e devolvê-la ao dono. Percebendo o que vai acontecer, Bertoleza se mata; João Romão uma comissão de abolicionistas que vinha trazer-lhe “o diploma de sócio benemérito”. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 62 TRECHOS DE O CORTIÇO TRECHO I Jerônimo via e escutava, sentindo ir-se-lhe toda a alma pelos olhos enamorados. Naquela mulata estava o grande mistério, a síntese das impressões que ele recebeu chegando aqui: ela era a luz ardente do meio-dia; ela era o calor vermelho das sestas da fazenda; era o aroma quente dos trevos e das baunilhas, que o atordoara nas matas brasileiras; era a palmeira virginal e esquiva que se não torce a nenhuma outra planta; era o veneno e era o açúcar gostoso; era o sapoti mais doce que o mel e era a castanha do caju, que abre feridas com o seu azeite de fogo; ela era a cobra verde e traiçoeira, a lagarta viscosa, a muriçoca doida, que esvoaçava havia muito tempo em torno do corpo dele, assanhando- lhe os desejos, acordando-lhe as fibras embambecidas pela saudade da terra, picando-lhe as artérias, para lhe cuspir dentro do sangue uma centelha daquele amor setentrional, uma nota daquela música feita de gemidos de prazer, uma larva daquela nuvem de cantaridas que zumbiam em torno da Rita Baiana e espalhavam-se pelo ar numa fosforescência afrodisíaca. Aluísio Azevedo, O cortiço. Comentários O trecho aborda uma síntese de impressões sensoriais causadas pela mulher, que também é animalizada, chegando a ser comparada com lagarta, muriçoca e larva. TRECHO II E assim, pouco a pouco, se foram reformando todos os seus hábitos singelos de aldeão português: e Jerônimo abrasileirou-se. A sua casa perdeu aquele ar sombrio e concentrado que a entristecia; já apareciam por lá alguns companheiros de estalagem, para dar dois dedos de palestra nas horas de descanso, e aos domingos reunia-se gente para o jantar. A revolução afinal foi completa: a aguardente de cana substituiu o vinho; a farinha de mandioca sucedeu à broa; a carne-seca e o feijão-preto ao bacalhau com batatas e cebolas cozidas; a pimenta-malagueta e a pimenta-de-cheiro invadiram vitoriosamente a sua mesa; o caldo verde, a açorda e o caldo de unto foram repelidos pelos ruivos e gostosos quitutes baianos, pela muqueca, pelo vatapá e pelo caruru; a couve à mineira destronou a couve à portuguesa; o pirão de fubá ao pão de rala, e, desde que o café encheu a casa com o seu aroma quente, Jerônimo principiou a achar graça no cheiro do fumo e não tardou a fumar também com os amigos. Aluísio de Azevedo – O cortiço. Domínio público. Fonte: https://tinyurl.com/c454sss. Acesso em: 11 fev. 2020. Comentários Nesse fragmento, constata-se um processo de mudança de costumes e construção de uma nova identidade. O que pode se constatar com o neologismo “abrasileirou-se”. Isto é, João Romão, comerciante imigrante vindo de Portugal, adapta-se aos costumes das terras brasileiras, costumes estes que vão desde à culinária até o fumo, por exemplo: “Jerônimo principiou a achar graça no cheiro do fumo e não tardou a fumar também com os amigos”. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 63 3.3 – Raul Pompéia Raul Pompéia (1863-1895) nasceu no município de Angra dos Reis e, ainda criança, mudou-se para o Rio de Janeiro. Sua família era abastada, o que lhe permitiu frequentar os melhores colégios da corte. Depois de terminar os estudos no Colégio D. Pedro II, ele se muda para São Paulo, onde cursa Direto na Faculdade do Largo de São Francisco. Inicialmente, foi bem recebido pelo corpo docente, mas logo depois se indispõe com alguns catedráticos por sua defesa da causa republicana e abolicionista. Depois de sua passagem por São Paulo, Pompéia retorna ao Rio e passa a escrever em vários jornais, além de ocupar um cargo público já na República. Com a ascensão de Floriano Peixoto, o escritor, por apoiar o militar, passa a acumular desafetos. Prudente de Morais se torna presidente e, por causa de um discurso inflamado a favor de Peixoto, Raul Pompéia foi demitido do cargo de Diretor da Biblioteca Nacional. Nessa época, polemizou com Olavo Bilac e Luís Murat. Sentiu-se ultrajado pelo artigo “Um louco no cemitério”. Em 25 de dezembro de 1895 suicidou-se, deixando um bilhete no qual declarava ser “um homem de honra”. O Ateneu O Ateneu foi publicado no ano de 1888 e costuma ser classificado como uma obra realista. Estilisticamente, o texto não segue alguns pressupostos do Realismo. O narrador não é em terceira pessoa, mas em primeira, e a linguagem incorpora alguns elementos naturalistas sem que se perceba com nitidez o estofo cientificista. Isso tem a ver com a própria natureza do romance. O enredo gira em torno das lembranças de Sérgio, da época em que ele ficou num internato. A crítica costuma destacar que se trata de um álter ego do próprio autor. Ou seja, o protagonista, embora seja um ente ficcional, incorpora muitas circunstâncias que foram vividas pelo próprio Pompéia. A estada de Sérgio no Internato foi perturbadora e deixou marcas profundas no adulto que agora conta sua adolescência. Por conta disso, ao descrever os personagens e as situações, o narrador os deforma, criando imagens que parecem saídas de um filme expressionista. • Narrador: primeira pessoa memorial; Sérgio, já mais velho, lembra-se do que passou no colégio interno. • Tempo: o tempo cronológico abrange o período em que Sérgio entra no internato até o incêndio que destrói o prédio. Predomina o tempo psicológico, daí os fragmentos de história, os flashbacks e as impressões de momento. • Espaço: o internato no Rio de Janeiro. FICHA DE LEITURA Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 64 Enredo O narrador conta os episódios mais marcantes dos dois anos que passou no internato. Aos 11 anos, o pai leva o menino para se matricular no Ateneu. As palavras dele: “vais encontrar o mundo” são proféticas. Na instituição, o menino se depara com a hipocrisia, mandos e desmandos, sistemas de proteção e a sexualidade – a sua e a dos outros internos. Ao entrar, recebe um conselho de não admitir protetores.Contudo, no primeiro dia de aula de educação física, na piscina, alguém o puxa e o Sanches o salva. Aceita a orientação do novo colega que o ajuda nos estudos, mas que se aproxima pegajosamente dele. Tenta se isolar, torna-se místico e aproxima-se de Franco, um garoto ressentido e maldoso que prepara uma vingança contra os colegas. Quebra garrafas e joga os cacos na piscina esperando que os meninos se machuquem, quando forem nadar. Sérgio, atormentado pelo remorso, não consegue dormir. No dia seguinte, por sorte, a piscina tinha sido esvaziada e os meninos não puderam se banhar. Termina a fase de aproximação com Franco. Torna-se amigo de Bento, um rapaz forte e misterioso. Sente-se protegido pelo garoto, mas logo essa relação desperta os ciúmes de um antigo rival. O inimigo de Sérgio estimula uma briga entre Bento e Malheiro, que tinha como pivô o próprio narrador. Depois disso, Bento muda de comportamento para com o protagonista. Começa a fase de Egbert, um bonito rapaz de origem inglesa. Tornam-se inseparáveis e, por conta das boas notas que tiraram, são convidados para jantar com o diretor, Aristarco, e sua mulher. Sérgio fica encantado por Dona Ema. A amizade por Egbert começa a esfriar. Sérgio muda de dormitório. Entra em cena a camareira Ângela, que desperta a sexualidade dos meninos. Há solenidades de final de ano com a presença de vultos da cidade: a Princesa Regente e o Ministro do Império. Os meninos se preparam para deixar o colégio. Contudo Sérgio, doente, foi obrigado a ficar na enfermaria durante as férias, sendo atendido por D. Ema. Nesse momento, tem sensações ambíguas: amor filial, carinho e erotismo. É nessas circunstâncias que, um dia, Sérgio testemunha o incêndio do Ateneu. Américo, um menino antissocial, era o suspeito do ato de vandalismo. Interpretação O Ateneu surge como microcosmo da sociedade. O autor, com seus personagens, vai denunciando uma sociedade marcada por adulações, hipocrisia e jogo de poder. Escancara a violência própria do sistema educacional. Num determinado episódio, Sérgio descobre que a família de Franco não arcava mais com as despesas do colégio particular, fato que faria qualquer aluno ser desligado da instituição. Contudo Franco continua a frequentar as aulas, pois, como péssimo aluno, é castigado com frequência. Fica clara a necessidade cruel de bodes expiatórios no sistema educacional. Alunos de pais mais influentes recebiam atenção especial de Aristarco, e boa parte das solenidades não tinham função didática, eram puro marketing. Os alunos não eram melhores que o corpo docente: invejosos, ciumentos e hipócritas, reproduziam a dinâmica dos adultos. Fo n te : P ix ab ay . Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 65 A classificação da obra é um caso à parte. A crítica costuma destacar uma sobreposição de estilos: parnasiano, simbolista, naturalista, impressionista e expressionista. Neste estudo resumido da obra, não cabe mostrar como essas características se apresentam em trechos descritos ou narrativos. A filiação ao Realismo se impõe, seja pela marcação temporal – foi publicado em 1888, data de vigência da escola literária –, seja pela análise do caráter humano e das relações sociais. O Ateneu (1888) CATEGORIA DEFINIÇÃO ESTRUTURA 12 (XII) capítulos. PERSONAGENS Sérgio; Franco; Bento; Egberto; Aristarco; dona Ema. TEMPO O tempo cronológico abrange o período em que Sérgio entra no internato até o incêndio que destrói o prédio. Predomina o tempo psicológico, daí os fragmentos de história, os flashbacks e as impressões de momento. ESPAÇO O internato no Rio de Janeiro. ENREDO O narrador conta os episódios mais marcantes dos dois anos que passou no internato. Aos 11 anos, o pai leva o menino para se matricular no Ateneu. Na instituição, o menino se depara com a hipocrisia, mandos e desmandos, sistemas de proteção e a sexualidade – a sua e a dos outros internos. CONFLITO Tenta se isolar, torna-se místico e aproxima-se de Franco, um garoto ressentido e maldoso que prepara uma vingança contra os colegas. Termina a fase de aproximação com Franco. CLÍMAX Torna-se amigo de Bento, um rapaz forte e misterioso. Começa a fase de Egbert, um bonito rapaz de origem inglesa. DESFECHO Sérgio muda de dormitório. Entra em cena a camareira Ângela, que desperta a sexualidade dos meninos. Há solenidades de final de ano com a presença de vultos da cidade: a Princesa Regente e o Ministro do Império. Os meninos se preparam para deixar o colégio. Contudo Sérgio, doente, foi obrigado a ficar na enfermaria durante as férias, sendo atendido por D. Ema. Nesse momento, tem sensações ambíguas: amor filial, carinho e erotismo. É nessas circunstâncias que, um dia, Sérgio testemunha o incêndio do Ateneu. Américo, um menino antissocial, era o suspeito do ato de vandalismo. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 66 TRECHO DE O ATENEU A doutrina cristã, anotada pela proficiência do explicador, foi ocasião de dobrado ensino que muito me interessou. Era o céu aberto, rodeado de altares, para todas as criações consagradas da fé. Curioso encarar a grandeza do Altíssimo; mas havia janelas para o purgatório a que o Sanches se debruçava comigo, cuja vista muito mais seduzia. E o preceptor tinha um tempero de unção na voz e no modo, uma sobranceria de diretor espiritual, que fala do pecado sem macular a boca. Expunha quase compungido, fincando o olhar no teto, fazendo estalar os dedos, num enlevo de abstração religiosa; expunha, demorando os incidentes, as mais cabeludas manifestações de Satanás no mundo. Nem ao menos dourava os chifres, que me não fizessem medo; pelo contrário, havia como que o capricho de surpreender com as fantasias do Mal e da Tentação, e, segundo o lineamento do Sanches, a cauda do demônio tinha talvez dois metros mais que na realidade. Insinuou- me, é certo, uma vez, que não é tão feio o dito, como o pintam. O catecismo começou a infundir-me o temor apavorado dos oráculos obscuros. Eu não acreditava inteiramente. Bem pensando, achava que metade daquilo era invenção malvada do Sanches. E quando ele punha-se a contar histórias de castidade, sem atenção à parvidade da matéria do preceito teológico, mulher do próximo, Conceição da Virgem, terceiro-luxúria, brados ao céu pela sensualidade contra a natureza, vantagens morais do matrimônio, e porque a carne, a inocente carne, que eu só conhecia condenada pela quaresma e pelos monopolistas do bacalhau, a pobre carne do beef, era inimiga da alma; quando retificava o meu engano, que era outra a carne e guisada de modo especial e muito especialmente trinchada, eu mordia um pedacinho de indignação contra as calúnias à santa cartilha do meu devoto credo. Mas a coisa interessava e eu ia colhendo as informações para julgar por mim oportunamente. Na tabuada e no desenho linear, eu prescindia do colega mais velho; no desenho, porque achava graça em percorrer os caprichosos traços, divertindo-me a geometria miúda como um brinquedo; na tabuada e no sistema métrico, porque perdera as esperanças de passar de medíocre como ginasta de cálculos, e resolvera deixar a Maurílio ou a quem quer que fosse o primado das cifras. Em dois meses tínhamos vencido por alto a matéria toda do curso; e, com este preparo, sorria-me o agouro de magnífico futuro, quando veio a fatalidade desandar a roda. (Raul Pompéia. O Ateneu. Rio de Janeiro: Biblioteca Universal Popular, 1963.) Comentários Nesse trecho, o narrador comenta suas reações ao ensino que recebia no colégio. As entidades referidas no primeiro parágrafo dizem respeito à dualidade Bem e Mal, contextualizadas na religião cristãatravés de Deus (“céu” e “Altíssimo”) e Demônio (Satanás”, “chifres”, “cauda”). Enquanto ao primeiro estão associados o Bem e as Virtudes, ao segundo se associam o pecado e a condenação, eterna (Inferno) ou temporária (Purgatório). Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos ==5e4da== 67 Fonte: Shutterstock. 4 – A ARTE NO FINAL DO SÉCULO XIX Nas Artes, assim como na Literatura, percebe-se, na segunda metade do século XIX, uma reação ao sentimentalismo exacerbado, característica do Romantismo. O tema retratado pelo artista, de certa forma, passa a determinar a técnica utilizada. O pintor, tentando se aproximar da realidade e recusar a evasão, dá maior nitidez e definição na pintura, tentando captar as cores como as vemos. Observem a mudança temática radical entre um e outro movimento. O nome do quadro ao lado é: “Dois homens observando a lua” de Caspar David Friedrich (1774-1840). O nome da pintura por si nos dá uma das características mais importantes do Romantismo, a evasão. Os homens encontram-se de costas para quem observa o quadro, conduzindo o olhar do espectador para a natureza. A lua ocupa o centro da tela e a árvore, em primeiro plano, toma quase todo o plano pictórico. O declive acidentado e a árvore retorcida obrigam o intérprete a encontrar beleza na natureza bruta e na incomensurabilidade de um mundo que parece esmagar os homens, mas que, por isso mesmo, enche-o de admiração. O foco da arte realista é outro: o próprio homem. Se há algum esmagamento, ele não ocorre por forças místicas do mundo, mas pelas próprias relações sociais, que surgem como fatores determinantes de como as pessoas vivem. A beleza deve estar no cotidiano, mesmo que miserável. A arte nas mãos de Honoré Daumier, por exemplo, vai além do “belo pelo belo”, devendo servir como expressão de denúncia social. 4.1 – Realismo Aliás, a história do pintor nos dá uma boa ideia do Realismo na pintura. Nasceu em 1808 em Marselha e morreu em 1879 em Valmondois. Na adolescência, começa a se interessar por artes e teve aulas no ateliê de um ex-aluno de David. Trabalhou como ilustrador. Em 1831, por causa de uma caricatura na qual ridicularizava o rei Luís Felipe, foi preso. Em liberdade, assina contrato com revistas de ilustrações e caricaturas de Paris. Em 1843, produziu litografias sobre os inconvenientes do transporte ferroviário. Desse estudo, ele produziu a obra com a qual começamos a aula “O vagão de terceira classe”. A intenção dele era descrever com maior precisão a realidade social ou humana, quase como um documentário. O artista acreditava que: Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 68 havia uma luta entre homem e natureza (não, a natureza não era confidente do sujeito!) ou luta entre classes sociais; a realidade seria determinada por questões materiais; e havia momentos na simplicidade do cotidiano que poderiam revelar muito sobre a condição humana. Os detalhes da imagem são surpreendentemente perturbadores. A mulher em primeiro plano olha fixamente para o espectador numa atitude de resignação, mas também de acusação. A criança que se recosta nela dorme, denunciando o cansaço. Alguns passageiros do segundo plano também olham para frente numa atitude de desafio ao olhar de quem os observa. A mulher ao lado amamenta o filho, alheia a tudo e a todos. Trata-se da apoteose do cotidiano. A obsessão pelo “real” pode ser observada em algumas das obras significativas desse período. A francesa Rosa Bonheur (1822-1899) se especializou na pintura de animais, que manifesta uma pesquisa quase científica voltada para a representação figurativa. Um outro exemplo dessa confluência entre ciência e arte pode ser percebido no quadro “A clínica de Agnew”, do americano Thomas Eakins (1844-1916). Pintor realista, ele provocou polêmica ao pintar uma cirurgia de câncer de mama feita pelo Dr. Agnew diante de uma galeria de estudantes e médicos. Outro autor que provocou controvérsia foi Gustave Coubert (1819-1877). Influenciado por Velázques, vale-se do claro e escuro para dar dramaticidade ao cotidiano dos trabalhadores (“Os quebradores de pedra”, por exemplo). A pedido de um diplomata turco, Gustave Coubert produziu uma das mais polêmicas obras de arte. Trata-se do quadro “A origem do mundo”, uma representação realista do púbis de uma mulher deitada de pernas abertas. Não se vê o rosto da modelo, apenas o seu quadril exposto. A imagem incomoda até hoje. 4.2 – Impressionismo Mas afinal o que é o real? Ora, além de não ser possível responder com precisão essa pergunta, o artista do fim do século XIX tinha plena consciência de que a arte era representação, era uma espécie de imagem de segunda mão, já que um quadro representava o que o olho do artista captou para que o espectador pudesse agora captar a imagem da imagem. Influenciados pelas teorias físicas sobre a cor, os impressionistas radicalizaram a representação da realidade. A cor era resultado da refração da luz, portanto, uma ilusão. A realidade dessa ilusão deveria ser captada. Nada de pinturas em estúdio ou em lugares fechados. A luz estava lá fora, nos https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Thomas_Eakins,_T he_Agnew_Clinic_1889.jpg, acessado em 11.09.2019) Fo n te : S h u tt er st o ck Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 69 parques, lagos e campos. O artista, como um cientista, deveria registrar essa iluminação e estudá-la, pintando a mesma cena em diferentes horas do dia. Além, disso, deveria provocar o espectador para que ele se tornasse consciente da ilusão. O uso de pontos, o famoso pontilhismo, para pintar o quadro expõe o trabalho do artista. De perto, o quadro é um amontoado de pontos, de longe, percebe-se a figura. Os temas eram menos miseráveis do que aqueles retratados pelos realistas. Era comum a representação da burguesia em momentos de descontração. Contudo isso não impediu algumas obras mais ousadas, como “O piquenique”, de Monet, no qual se observam homens, na paisagem bucólica, sobriamente vestidos conversando com uma mulher totalmente despida, uma prostituta. Por sua vez, Edgar Degas (1834-1917) pintou algumas obras que lembram o Naturalismo, seja pelo contorcionismo de algumas de suas bailarinas ou pelo quadro cujo título já é um espanto: “O estupro”. O Impressionismo foi apresentado ao público em 1874. Os impressionistas rejeitavam as idealizações, a perspectiva do Renascimento e a pintura de estúdio. Foi iniciado por Claude Monet (1840-1926) e seguido por Pierre-Auguste Renoir (1841-1919), Paul Cézanne (1839-1906), Edgar Degas (1834-1917), entre outros. 4.3 – Rodin A escultura também segue o caminho das artes em geral. Os artistas abandonam o idealismo próprio tanto do neoclassicismo quanto do Romantismo e adotam outras formas de expressão para captar melhor a conturbada metade final do século XIX. Os escultores deixam de lado os temas mitológicos e dão preferência a temas mais contemporâneos, às vezes com nítida intenção política. François-Auguste-René Rodin (1840-1917) foi o mais importante escultor desse período. Suas obras apresentam traços da escultura clássica, mas o seu realismo e a impressão do seu gesto de esculpir na própria obra tornam a peça algo único. Segundo o sociólogo e filósofo Georg Simmel (1858-1918), Rodin conseguia fixar momentos passageiros como um beijo, uma angústia ou um instante de reflexão. Em suas obras, aparece a tensão entre a pedra bruta e o movimentohumano, como se fossem formas sendo despertadas do mármore. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 70 4.4 – Realismo no Brasil A história das artes no Brasil começa de forma institucional com a vinda da família real, que traz para o Brasil a missão francesa. Artistas como Taunay (1755-1830) e Debret (1768-1848) deixam uma grande quantidade de quadros que exprimem o cotidiano no Brasil. Em 1826, a Academia Imperial de Belas-Artes abriu seus cursos. Surge uma arte acadêmica que abrangia retratos, temas bíblicos e históricos. Batalha do Avaí (1877) e Independência ou Morte (1888), de Pedro Américo (1843-1905), exemplificam esse tipo de arte. Mas foi Almeida Junior (1850-1899) que altera os rumos da pintura dita acadêmica. Depois de concluído o curso de Belas-Artes, ele recebe uma bolsa de estudos dada pelo Imperador e vive em Paris entre 1876-1882. Quando retorna, expõe quadros com temática mais cotidiana como Leitura, Picando fumo e O violeiro. Nas duas últimas, observa-se inspiração regionalista. Alteram-se os temas consagrados pela academia. A imitação dos clássicos e dos temas mitológicos ou heroicos cede lugar para o cotidiano. Os grandes nomes dessa nova vertente artística são: Belmiro Barbosa de Almeida (1858-1935) e Benedito Calixto (1853-1927). 4.5 – Interpretação de Obra Realista As obras realistas são fáceis de serem interpretadas. A preocupação social e a procura por um estilo ou técnica capaz de produzir um efeito de verossimilhança que aproxima a pintura da fotografia dá o tom no Realismo Nesse sentido, o tema torna-se o elemento que mais facilmente permite a classificação da obra. Os pintores focalizam o cotidiano mais banal ou os momentos em que as questões sociais se revelam. Não se procura a beleza de imediato, mas a apreciação técnica pela capacidade de o artista conseguir eternizar o momento com verossimilhança, como se o grande elogio fosse: “nossa como essa imagem parece com o real”. 5 – QUADRO SINÓPTICO MOVIMENTO CARACTERÍSTICAS REALISMO Representa desvios morais para expor a hipocrisia social; romance documental; finalidade: “fotografar a realidade”; explorar as motivações mais íntimas dos indivíduos. NATURALISMO Representa os desvios sociais a partir de explicações deterministas de cunho sexual ou social; romance de tese; arte engajada; exploração de questões sociais. “Puxão de orelha” Almeida Junior Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 71 PORTUGAL AUTOR OBRAS/CARACTERÍSTICAS EÇA DE QUEIRÓS OBRAS (ROMANCES) O crime do Padre Amaro (1875). O primo Basílio (1878). Os Maias (1888). A ilustre casa de Ramires (1900). A cidade e as serras (1901). CARACTERÍSTICAS Denúncia da sociedade portuguesa a partir da crítica das classes que a compões: clero, elite e classes médias. Na fase final do escritor, reconcilia-se com Portugal. Crítica moralista e pessimista em relação ao país. Romance como meio de análise da sociedade. Linguagem enxuta, precisa e “jornalística”. Descrições precisas e longas. ANTERO DE QUENTAL OBRA (POESIA) Odes modernas (1865). CARACTERÍSTICAS Participou da polêmica que dá início ao Realismo em Portugal (Questão Coimbrã, uma discussão literária que opôs românticos a Realistas). Elabora uma poesia de elogio à Razão; propõe uma literatura engajada que deve conduzir a Humanidade ao progresso. Apresenta fases: pré-realista, realista/combativa e existencial (influência do niilismo e o budismo). Oscila entre otimismo e pessimismo profundo. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 72 BRASIL AUTOR OBRAS/CARACTERÍSTICAS MACHADO DE ASSIS OBRAS (ROMANCES) Memórias póstumas de Brás Cubas (1881). Quincas Borba (1891). Dom Casmurro (1899). Esaú e Jacó (1904). Memorial de Aires (1908). OBRAS (CONTOS) Papéis avulsos (1882). Histórias sem data (1884). Várias histórias (1896). CARACTERÍSTICAS Psicologismo: Machado de Assis tem uma visão única da alma humana, consegue como poucos esquadrinhar as motivações não confessáveis de seus personagens. Denuncia a hipocrisia através de intrigas envolvendo a traição conjugal efetiva ou imaginada. Romances marcados pelo pessimismo e pela crítica ao cientificismo da época. Descreve o comportamento da elite carioca do final do Império. Na forma, observam-se os seguintes elementos: narrativa não linear, ironia, diálogo com o leitor e digressão. ALUÍSIO AZEVEDO OBRAS (ROMANCES) O mulato (1881). O cortiço (1890). CARACTERÍSTICAS Em O Cortiço, produz um romance de tese. As histórias dos moradores do cortiço servem para que o autor comprove as ideias deterministas. Focaliza as mazelas sociais; gosto por aspectos fisiológicos degradantes, comparações entre homens e animais e plantas e exploração dos desejos sexuais. RAUL POMPÉIA OBRA (ROMANCE) O Ateneu (1888). CARACTERÍSTICAS Critica o sistema educacional que para o autor é um microcosmo da sociedade. Relações entre os jovens marcadas pela hipocrisia, interesse, sensualidade etc. Espécie de romance memorialista. O narrador em primeira pessoa expressa suas impressões da época em que viveu no internato. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 73 Linguagem marcada por hipérboles caricatas e deformação dos personagens apresentados. 6 – CRÍTICA LITERÁRIA Pois bem, concurseiros. O ideal é que a Crítica Literária dialogue com os termos abordados em cada aula. Nesse sentido, hoje escolhi dois texto, sendo um deles uma publicação da Editora do Senado Federal: Lucia Miguel Pereira – Machado de Assis (estudo crítico e biográfico). Roberto Schwarz – Um mestre na periferia do capitalismo. TEXTO I CAPÍTULO XIV – O CRIADOR: OS GRANDES ROMANCES Oliveira Lima, que conheceu de perto Machado de Assis, diz que o Brás Cubas é uma “fotografia da sua alma”. Talvez fosse mais preciso dizer espelho da sua visão de mundo. A Mário de Alencar, que lhe perguntou um dia como, depois de ter escrito Helena, pôde escrever o Brás Cubas, explicou o romancista que se modificara porque perdera todas as ilusões sobre os homens. Depois da crise por que passou em 1879, já não os via com os mesmos olhos, com os olhos afeitos ao aspecto convencional, mas com a visão interior, implacável e penetrante. Através das palavras polidas, descobria o sentimento egoísta ou cínico, através do sorrido e dureza do coração. A sua vocação de romancista realizava-se plenamente, a um tempo tormento e delícia. Tormento de não poder crer nas criaturas, de lhes perceber todos os cálculos, todas as espertezas, mas delícia suprema de apreciar o jogo dos sentimentos, de ver como nascem e morrem as paixões, de ser o espectador que aprecia o jogo dos sentimentos, de ver como nascem e morrem as paixões, de ser o espectador que aprecia há um tempo a plateia e os bastidores. Desse tormento e dessa delícia nasceu o seu humorismo, fruto da simpatia humana aliada ao pendor crítico, da piedade jungida à lucidez, da ternura unida à inteligência. Ao lado do coração que compadecia, estava o espírito que buscava explicações, que observava friamente as reações. Muito mais do que a influência dos ingleses, foi esse dualismo, essa dissociação que levou Machado ao cultivo do humour. Qualquerpsicólogo, dotado de grande visão de conjunto, sem prejuízo da observação minuciosa, e que não possua nenhuma inclinação mística, cairá quase fatalmente no humorismo. Porque, observada em si mesma, a agitação humana tem uma aparência de inutilidade que a torna burlesca. Essa sensação de falta de sentido da vida, misturada a um sentimento de compaixão pelos vãos esforços do homem, fez de Machado de Assis o grande humorista que se revelou no Brás Cubas. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 74 (...) Que é, afinal, esse Brás Cubas? O primeiro dos tipos mórbidos em que Machado extravasou as próprias esquisitices de nevropata. Uma natureza complexa, cheia de contradições, ambicioso e retraído, vaidoso e displicente, apaixonado e indiferente. Sua alma “foi tablado em que se deram peças de todo gênero, o drama sacro, o austero, o piegas, a comédia louçã, a desgrenhada farsa, os autos, as bufonerias.” E ele, como que desdobramento da personalidade, assistia a essas peças, via-se. Com isso gastou os seus dias todos, numa autoanálise estéril e empolgante. (...) Sem dúvida eram, todas essas, sensações que Machado experimentava, mas embrionariamente, pois reagiu contra elas na vida, só as deixando espraiarem-se nos livros. É que, nele, o espírito cruel se compensava pelo coração bem formado. Em Brás Cubas, ao contrário, tudo foi contaminado. O sadismo, no romancista um pendor puramente intelectual, foi reforçado no seu herói pela educação. Narrando-lhe a primeira infância, Machado de Assis, tão acusado de se haver alheado aos grandes problemas do seu tempo, traçou sem digressões, sem palavras difíceis, a crítica da organização servil e familiar de então. Mostrou o mal que fez a escravidão a brancos e negros. Sem o moleque Prudêncio para lhe servir de cavalo, sem as pretas para alvos passivos das suas judiarias, sem os costumes relaxados que a promiscuidade das escravas com os sinhô-moços facilitava, o Brás Cubas não teria sido o que foi. Também a vaidade do menino era cultivada pela beata administração dos pais. Tudo contribuiu para fazer dele um perfeito egoísta. Representou o resultado do meio e da educação viciada agindo sobre o temperamento mórbido. PEREIRA, Lucia Miguel. Machado de Assis (estudo crítico e biográfico). Brasília: Senado Federal, 2019 (p. 190-192, grifo meu). Já introduzimos a figura da crítica literária brasileira Lucia Miguel Pereira anteriormente. Neste trecho em particular, a pensadora explora o traço estilístico humorístico machadiano. Esse humor não é só cômico, pois também advém de uma visão desiludida do mundo. Afinal, Machado de Assis era filho da época que nasceu, tendo compartilhado traços do decadentismo francês. Brás Cubas seria mórbido também por causa disso. O que é interessante em sua construção o fato é de ele poder se ver, como se estivesse encenando em um palco, já que é um defunto-autor que narra suas peripécias post mortem. Outra distinção importante é o que está representado no livro e a opinião do próprio autor, que nem sempre coincidem. Logo, Machado de Assis é capaz de criar Brás Cubas sem, contudo, compartilhar de seu cinismo e suas atrocidades. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 75 TEXTO II Mas passemos ao Humanitismo, a mais célebre das filosofias machadianas. Como sugere o nome, trata-se de uma sátira à floração oitocentista de ismos, com alusão explícita à religião comtiana da humanidade. Os raciocínios fazem pensar em mais outras filiações, já que em lugar dos princípios positivistas afirmam a luta de todos contra todos, à maneira do darwinismo social. A própria guerra generalizada, contudo, não passa de ilusão, pois tem fundamento monista: Humanitas é o princípio único de todas as coisas, residindo igualmente nas partes vencida e vencedora, no condenado e no algoz, de sorte que não há perda alguma onde parece haver uma desgraça. Daí que a dor não existe nem tem cabimento. “(...) substancialmente, é Humanitas que corrige em Humanitas uma infração à lei de Humanitas” [Memórias póstumas de Brás Cubas]. A par das teses da struggle for life, o Humanitismo inclui o elogio da sociedade hierárquica e ritualizada, difícil de conciliar com aquelas primeiras. A inconsistência contribui para o tom geral de disparate, sem prejuízo de captar admiravelmente a aspiração por “ordem e progresso” de várias teorias sociológicas do tempo, que ao propósito científico e antitradicional uniam uma posição conservadora, bem como formas sucedâneas de providencialismo e culto religioso. SCHWARZ, Roberto. Um mestre na periferia do capitalismo – Machado de Assis. 3. ed. São Paulo: Editora 34, 1997, p. 155. Roberto Schwarz (1938-...), além de ser um dos maiores críticos literários brasileiros ainda vivos, é também um dos maiores críticos literários de Machado de Assis. Ele chega a dizer que Machado de Assis estava tão à frente de seu tempo que ainda não somos contemporâneos dele. No romance Quincas Borba, há uma sátira às várias doutrinas que surgiram no fim do século XIX, muitas sem nem mesmo embasamento e algumas até cruéis, como é o caso da fria Humanitas, cunhada pelo filósofo antes de morrer. Roberto Schwarz sugere que o lema “Ao vencedor as batatas!” seja a tradução abrasileirada da expressão clássica inventada por Herbert Spencer (1820-1903): surviving the fittest (sobrevivência do mais apto). Suas ideias encontram-se em seus First Principles of a New System of Philosophy (Primeiros princípios para um novo sistema de filosofia). Distorção e oposto do humanismo e humanitismo – dos quais, pelo menos por causa do nome, parece ter sido derivada –, a filosofia de Humanitas prescreve que a ordem do mundo favorece a hierarquia. Pode ser considerada como uma sátira do darwinismo, sátira porque é como se fosse um darwinismo “que não deu certo”. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 76 7 – LISTA DE QUESTÕES Prezados concurseiros. Antes de começar, eis algumas informações práticas. O Senado Federal não tem tradição de cobrança na área de Literatura. Portanto, as questões que iremos abordar virão das seguintes fontes: Banca Cebraspe. Vamos resolver questões também da mesma banca, mas para outros concursos, e ainda questões adaptadas, aproveitando algum texto ou alguma lógica de cobrança. Questões de outras bancas. Realizei uma pesquisa detalhada de como a disciplina de Literatura cai em outros concursos públicos, ainda que seja em cargos especializados. Vamos tratar dessas questões aqui também. Nesse caso, pode ser que a tipologia de questão varie em relação à tradicional cobrança de julgar certo ou errado do Cebraspe. Questões inéditas e autorais. Tive o prazer de elaborar questões para contribuir com o seu estudo. Fiz isso me baseando em pesquisas e análises minuciosas. A banca Cebraspe normalmente referencia-se aos textos cobrados usando o sistema de indicação por linhas. Para simplificar, fiz marcações em negrito e sublinhado. Aqui, tentei trazer para vocês imagens com qualidade boa, o que pode não acontecer no dia da prova. Caso no dia vocês não consigam ler ou entender algo, sobretudo na parte de Artes Visuais, vocês devem se dirigir ao fiscal da sala. Observação: a lista de questões presente não esgota o nosso treino no assunto. Assim que o edital sair, o seu material será adaptado e um volume significativo de questões será criado de acordo com o conteúdo programático. 1. (ITAME – Prefeitura Municipal de Aloândia/GO– Fiscal de Vigilância Sanitária – 2015 – adaptada) Julgue o item a seguir. Os escritores brasileiros seguindo de perto as tendências do Realismo na França e em Portugal, enveredaram pela crítica social, fazendo da literatura uma análise da realidade brasileira. 2. (ITAME – Prefeitura Municipal de Aloândia/GO – Fiscal de Vigilância Sanitária – 2015 – adaptada) Julgue o item a seguir. Diferentemente dos românticos, os autores do Realismo buscaram retratar de forma subjetiva a realidade, inclusive a realidade psicológica. 3. (COMEDE – Prefeitura Municipal da Jaqueira/PE – Professor de 5ª a 8ª Série de Língua Portuguesa – 2009 – adaptada) Julgue o item a seguir. Em uma conferência intitulada a “A literatura Nova” o escritor Eça de Queiroz define, em linhas gerais, o projeto literário desta estética: o Naturalismo é a anatomia do caráter, produzir por meio GRAU DE DIFICULDADE DAS QUESTÕES FÁCIL, MÉDIO E DIFÍCIL Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 77 da arte uma representação da realidade que permita condenar o que há de mau na sociedade. A alternativa que completa corretamente o texto. 4. (ADM&TEC – Prefeitura Municipal de Rio Largo/AL – Professor de 6o ao 9o ano do Ensino Fundamental – 2019 – adaptada) Julgue o item a seguir. A obra Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis, é uma das mais importantes obras da literatura nacional. Nela, o autor dá voz a um narrador defunto que zomba do caráter das pessoas com quem conviveu. 5. (ADVISE – Prefeitura Municipal do Riachão do Poço/PB – Educador Social – 2019 – adaptada) Julgue o item a seguir. Em relação a Machado de Assis, suas obras são divididas em duas fases: a fase romântica (ou de amadurecimento) e a fase realista (ou de maturidade). Além disso, foi no jornal que Machado iniciou sua carreira como escritor, e em 1859 vêm a público suas primeiras crônicas. 6. (ADM&TEC – Prefeitura Municipal de Sertânia/PE – Professor de Língua Portuguesa – 2019 – adaptada) Julgue o item a seguir. A obra O Ateneu, de Raul Pompeia, é um romance narrado em primeira pessoa por Sérgio, que conta suas experiências como soldado do Exército Brasileiro durante a Guerra de Canudos. 7. (INSTITUTO EXCELÊNCIA – Prefeitura Municipal de Tremembé/SP – Língua Portuguesa – 2019 – adaptada) Leia o texto a seguir para responder à questão. Óbito do autor Algum tempo hesitei se devia abrir estas memórias pelo princípio ou pelo fim, isto é, se poria em primeiro lugar o meu nascimento ou a minha morte. Suposto o uso vulgar seja começar pelo nascimento, duas considerações me levaram a adotar diferente método: a primeira é que eu não sou propriamente um autor defunto, mas um defunto autor, para quem a campa foi outro berço; a segunda é que o escrito ficaria assim mais galante e mais novo. Moisés, que também contou a sua morte, não a pôs no intróito, mas no cabo: diferença radical entre este livro e o Pentateuco. Dito isto, expirei às duas horas da tarde de uma sexta-feira do mês de agosto de 1869, na minha bela chácara de Catumbi. Tinha uns sessenta e quatro anos, rijos e prósperos, era solteiro, possuía cerca de trezentos contos e fui acompanhado ao cemitério por onze amigos. Onze amigos! Verdade é que não houve cartas nem anúncios. Acresce que chovia — peneirava — uma chuvinha miúda, triste e constante, tão constante e tão triste, que levou um daqueles fiéis da última hora a intercalar esta engenhosa idéia no discurso que proferiu à beira de minha cova: "Vós, que o conhecestes, meus senhores, vós podeis dizer comigo que a natureza parece estar chorando a perda irreparável de um dos mais belos caracteres que têm honrado a humanidade. Este ar sombrio, estas gotas do céu, aquelas nuvens escuras que cobrem o azul como um crepe funéreo, tudo isso é a dor crua e má que lhe rói à natureza as mais íntimas entranhas; tudo isso é um sublime louvor ao nosso ilustre finado". Bom e fiel amigo! Não, não me arrependo das vinte apólices que lhe deixei. E foi assim que cheguei à cláusula dos meus dias; foi assim que me encaminhei para o undiscovered country de Hamlet, sem as ânsias nem as dúvidas do moço príncipe, mas pausado e trôpego como quem se retira tarde do espetáculo. Tarde e aborrecido. Viram-me ir umas nove ou dez pessoas, entre elas três Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 78 senhoras, minha irmã Sabina, casada com o Cotrim, a filha, — um lírio do vale, — e... Tenham paciência! Daqui a pouco lhes direi quem era a terceira senhora. Contentem-se de saber que essa anônima, ainda que não parenta, padeceu mais do que as parentas. É verdade, padeceu mais. Não digo que se carpisse, não digo que se deixasse rolar pelo chão, convulsa. Nem o meu óbito era coisa altamente dramática... Um solteirão que expira aos sessenta e quatro anos, não parece que reúna em si todos os elementos de uma tragédia. E, dado que sim, o que menos convinha a essa anônima era aparentá-lo. De pé, à cabeceira da cama, com os olhos estúpidos, a boca entreaberta, a triste senhora mal podia crer na minha extinção. — Morto! Morto! dizia consigo. E a imaginação dela, como as cegonhas que um ilustre viajante viu desferirem o vôo desde o Ilisso às ribas africanas, sem embargo das ruínas e dos tempos, a imaginação dessa senhora também voou por sobre os destroços presentes até às ribas de uma África juvenil... Deixá-la ir; lá iremos mais tarde; lá iremos quando eu me restituir aos primeiros anos. Agora, quero morrer tranquilamente, metodicamente, ouvindo os soluços das damas, as falas baixas dos homens, a chuva que tamborila nas folhas de tinhorão da chácara, e o som estrídulo de uma navalha que um amolador está afiando lá fora, à porta de um correeiro. Juro-lhes que essa orquestra da morte foi muito menos triste do que podia parecer. De certo ponto em diante chegou a ser deliciosa. A vida estrebuchava-me no peito, com uns ímpetos de vaga marinha, esvaía-se-me a consciência, eu descia à imobilidade física e moral, e o corpo fazia-se-me planta, e pedra, e lodo, e coisa nenhuma. Morri de uma pneumonia; mas, se lhe disser que foi menos a pneumonia, do que uma idéia grandiosa e útil, a causa da minha morte, é possível que o leitor me não creia, e todavia é verdade. Vou expor-lhe sumariamente o caso. Julgue-o por si mesmo. (ASSIS, Machado de. Memórias póstumas de Brás Cubas. São Paulo: Editora Moderna, 1994) Julgue o item abaixo quanto às características do movimento literário presente no texto. Propõe uma representação mais verossímil da vida humana, recorrendo à maior subjetividade e valorização da imaginação. 8. (Cebraspe – Prefeitura Municipal de São Cristóvão/SE – Professor de Educação Básica/Português – 2019 – adaptada) Leia o texto a seguir para responder à questão. No Realismo ficcional, a mente cientificista também é responsável pelo esvaziar-se do êxtase que a paisagem suscitava nos escritores românticos. O que se entende pela preferência dada agora aos ambientes urbanos e, em nível mais profundo, pela não identificação do escritor realista com aquela vida e aquela natureza transformadas pelo positivismo em complexos de normas e fatos indiferentes à alma humana. O determinismo reflete-se na perspectiva em que se movem os narradores ao trabalhar as suas personagens. A pretensa neutralidade não chega ao ponto de ocultar o fato de que o autor carrega sempre de tons sombrios o destino das suas criaturas. Atente-se, nos romances desse período, para a galeria de seres distorcidos ou acachapados pelo Fatum. Alfredo Bosi. História concisa da literatura brasileira. São Paulo: Cultrix, 2004,p. 172-3 (com adaptações). Considerando o fragmento de texto, julgue o item a seguir, a respeito do Realismo e do Naturalismo na literatura brasileira. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 79 Em O Cortiço, de Aluísio Azevedo, a abordagem estética pela retórica da ciência imprime ao narrador uma voz objetiva, destituída de juízos de valor, como no trecho a seguir, em que descreve uma das personagens do romance: “A filha tinha quinze anos, a pele de um moreno quente, beiços sensuais, bonitos dentes, olhos luxuriosos de macaca. Toda ela estava a pedir homem”. 9. (VUNESP – Polícia Militar do Estado de São Paulo – Aluno Oficial – 2019 – adaptada) Leia o texto a seguir para responder à questão. [19 de maio de 1888] Bons dias! Eu pertenço a uma família de profetas après coup1, post factum2, depois do gato morto, ou como melhor nome tenha em holandês. Por isso digo, juro se necessário for, que toda a história desta lei de 13 de maio estava por mim prevista, tanto que na segunda-feira, antes mesmo dos debates, tratei de alforriar um molecote que tinha, pessoa de seus dezoito anos, mais ou menos. Alforriá-lo era nada; entendi que, perdido por mil, perdido por mil e quinhentos, e dei um jantar. Levantei-me eu com a taça de champanha e declarei que, acompanhando as ideias pregadas por Cristo, há dezoito séculos, restituía a liberdade ao meu escravo Pancrácio; que entendia que a nação inteira devia acompanhar as mesmas ideias e imitar o meu exemplo; finalmente, que a liberdade era um dom de Deus que os homens não podiam roubar sem pecado. Pancrácio, que estava à espreita, entrou na sala, como um furacão, e veio abraçar-me os pés. Todos os lenços comovidos apanharam as lágrimas de admiração. Caí na cadeira e não vi mais nada. De noite, recebi muitos cartões. Creio que estão pintando o meu retrato, e suponho que a óleo. No dia seguinte, chamei o Pancrácio e disse-lhe com rara franqueza: – Tu és livre, podes ir para onde quiseres. Aqui tens casa amiga, já conhecida e tens mais um ordenado, um ordenado que... – Oh! meu senhô! fico... – Um ordenado pequeno, mas que há de crescer. Tudo cresce neste mundo: tu cresceste imensamente. Quando nasceste eras um pirralho deste tamanho; hoje estás mais alto que eu. Deixa ver; olha, és mais alto quatro dedos... – Artura não qué dizê nada, não, senhô... – Pequeno ordenado, repito, uns seis mil-réis: mas é de grão em grão que a galinha enche o seu papo. Tu vales muito mais que uma galinha. – Justamente. Pois seis mil-réis. No fim de um ano, se andares bem, conta com oito. Oito ou sete. Pancrácio aceitou tudo: aceitou até um peteleco que lhe dei no dia seguinte, por me não escovar bem as botas; efeitos da liberdade. Mas eu expliquei-lhe que o peteleco, sendo um impulso natural, não podia anular o direito civil adquirido por um título que lhe dei. Ele continuava livre, eu de mau humor; eram dois estados naturais, quase divinos. Tudo compreendeu o meu bom Pancrácio: daí para cá, tenho-lhe despedido alguns pontapés, um ou outro puxão de orelhas. E chamo-lhe besta quando lhe não chamo filho do diabo; coisas todas que ele recebe humildemente, e (Deus me perdoe!) creio que até alegre. (Machado de Assis. Bons dias. www.dominiopublico.gov.br. Adaptado) 1après coup: [francês] pós-golpe. 2post factum: [latim] depois do fato. Julgue o item subsequente. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 80 Uma marca do estilo de Machado de Assis verificada no texto é o discurso espontâneo e emotivo, bem como o tom inflamado e grandiloquente, próprio de uma retórica a favor de causas libertárias, que buscava a adesão do leitor por meio do melodrama. 10. (VUNESP – Polícia Militar do Estado de São Paulo – Aluno Oficial – 2018 – adaptada) Leia o texto a seguir para responder à questão. Leia o trecho de Dom Casmurro, de Machado de Assis, para responder à questão. A imagem de Capitu ia comigo, e a minha imaginação, assim como lhe atribuíra lágrimas, há pouco, assim lhe encheu a boca de riso agora: vi-a escrever no muro, falar-me, andar à volta, com os braços no ar; ouvi distintamente o meu nome, de uma doçura que me embriagou, e a voz era dela. (Obra completa. Vol. 1. Rio de Janeiro, Nova Aguilar, 1992, p. 840) Julgue o item a seguir. Em Dom Casmurro, assim como em grande parte da prosa de Machado de Assis, observa-se a ênfase na caracterização social e psicológica de personagens tipicamente urbanas. 11. (CEV/UECE – Secretaria do Estado de Educação do Ceará – Professor de Língua Portuguesa – 2018 – adaptada) Julgue o item a seguir. Os naturalistas enfatizam o fato de a hereditariedade física e psicológica determinar o comportamento das personagens. 12. (CEV/UECE – Secretaria do Estado de Educação do Ceará – Professor de Língua Portuguesa – 2018 – adaptada) Julgue o item a seguir. O desequilíbrio das personagens realistas permanece latente até que o ambiente físico e social favoreça sua manifestação, portanto, juntando-se os fatores herança biológica e ambiente, criam-se condições para que se manifeste o conflito dramático da personagem realista. 13. (CEV/UECE – Secretaria do Estado de Educação do Ceará – Professor de Língua Portuguesa – 2018 – adaptada) Julgue o item a seguir. A Revolução Francesa está diretamente associada ao nascimento da estética realista. Ela desencadeou mudanças tão profundas no modo de produção que se tornou responsável pela reordenação da economia mundial no século XIX. 14. (CEV/UECE – Secretaria do Estado de Educação do Ceará – Professor de Língua Portuguesa – 2018 – adaptada) Julgue o item a seguir. O interesse pelo funcionamento e pela organização da sociedade leva os escritores realistas a abordarem as necessidades materiais humanas (alimentação, moradia, etc.) e discutir as condições econômicas (aspectos referentes ao mundo do trabalho) necessárias para satisfazer tais necessidades. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 81 15. (CEV/UECE – Secretaria do Estado de Educação do Ceará – Professor de Língua Portuguesa – 2018 – adaptada) Julgue o item a seguir. Mudanças profundas ocorreram no Brasil na segunda metade do século XIX, afetando a economia, a política, a arte, como, por exemplo, a extinção do tráfico de escravos, o imigrante assalariado como nova mão de obra; livre comércio com o exterior; ampliação da burguesia mercantil; o avanço científico e o progresso tecnológico; crise entre a Igreja e o Governo; cisão entre o exército e o imperador; além da influência do positivismo, sobretudo no meio militar, na burguesia e entre alguns grupos de intelectuais. 16. (MSCONCURSOS – Câmara Municipal de Itaguara/MG – Auxiliar Administrativo – 2018 – adaptada) Leia o texto para responder à questão. É a história de um professor mineiro, Rubião, para quem um filósofo deixa todos os seus bens, com a condição de que o herdeiro cuide de seu cachorro, que também tinha o nome do filósofo. De posse da fortuna e tendo aprendido do filósofo alguns elementos de sua filosofia, o Humanitismo, Rubião muda-se para o Rio de Janeiro. Desabituado com a vida na cidade grande, cercado de pessoas que vivem de seu dinheiro, Rubião apaixona-se por Sofia, mulher de Cristiano Palha, seu sócio. Ao saber que Rubião estava a fim de sua mulher, Palha divide-se entre dois sentimentos: o ciúme que tem da mulher fá-lo pensar em atitudes radicais, mas sua dependência econômica de Rubião o leva a não ofender o sócio. Sofia, astuciosamente, consegue manter intactos,tanto o interesse de Rubião quanto a fidelidade conjugal. Aos poucos Rubião começa a agir de maneira estranha: acredita-se Napoleão, fantasia a realidade, fala sozinho na rua e, pouco a pouco, perde toda sua fortuna e também a razão. Arruinado, Rubião deixa de ser útil e é abandonado pela roda de parasitas que o cercava. Palha e Sofia afastam-se cada vez mais e ele acaba sendo internado num asilo de onde foge para voltar a Minas. Morre lá, em pleno delírio de grandeza, acompanhado de seu cão e repetindo uma frase do Humanitismo: “Ao vencedor, as batatas”. Julgue o item a seguir. O resumo fala da obra: Quincas Borba de Machado de Assis. 17. (QUADRIX – Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal – Língua Portuguesa – 2018 – adaptada) Julgue o item a seguir. Em O cortiço, afastado da visão naturalista que regia seus romances anteriores, Aluísio Azevedo compôs um retrato fiel da sociedade brasileira, ao descrever os habitantes do cortiço para além da perspectiva determinista que submetia os destinos humanos às determinações da raça e do meio. 18. (FADESP – Instituto Federal de Educação, Ciências e Tecnologia do Pará – Professor de Ensino Básico e Técnico – 2018 – adaptada) Julgue o item a seguir. Sobre a obra de Machado de Assis, é correto afirmar que se desdobra em diferentes gêneros literários: poesia, teatro, prosa de ficção (romances, crônicas, contos), crítica literária. Nesse último gênero, o autor superou-se e suplantou todos os demais. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 82 19. (FADESP – Instituto Federal de Educação, Ciências e Tecnologia do Pará – Professor de Ensino Básico e Técnico – 2018 – adaptada) Leia o texto a seguir para responder à questão O Escritor Machado de Assis (1839/1904) faz parte do Realismo brasileiro, movimento fundamentado por um “novo ideário”, conforme Alfredo Bosi, que assinala, também: “O tema da Abolição e, em segundo tempo, o da República serão o fulcro das opções ideológicas do homem culto brasileiro a partir de 1870.” (BOSI, Alfredo. História concisa da literatura brasileira. São Paulo: Cultrix, 2006). Julgue o item com relação à obra de Machado de Assis e ao que Bosi assinalou. No romance Esaú e Jacó (1904), Machado de Assis retrata questões atinentes à proclamação da República brasileira e no conto Pai contra mãe (1906), dramas ligados à escravidão dos afrodescendentes. 20. (AGIRH – Prefeitura Municipal de Aparecida de São Paulo – Monitor de Creche – 2018 – adaptada) TEXTO PARA AS PRÓXIMAS 4 QUESTÕES Algum tempo hesitei se devia abrir estas memórias pelo princípio ou pelo fim, isto é, se poria em primeiro lugar o meu nascimento ou a minha morte. Suposto o uso vulgar seja começar pelo nascimento, duas considerações me levaram a adotar diferente método: a primeira é que eu não sou propriamente um autor defunto, mas um defunto autor, para quem a campa foi outro berço; a segunda é que o escrito ficaria assim mais galante e mais novo. Moisés, que também contou a sua morte, não a pôs no intróito, mas no cabo: diferença radical entre este livro e o Pentateuco. Dito isto, expirei às duas horas da tarde de uma sexta-feira do mês de agosto de 1869, na minha bela chácara de Catumbi. Tinha uns sessenta e quatro anos, rijos e prósperos, era solteiro, possuía cerca de trezentos contos e fui acompanhado ao cemitério por onze amigos. Onze amigos! Verdade é que não houve cartas nem anúncios. Acresce que chovia — peneirava — uma chuvinha miúda, triste e constante, tão constante e tão triste, que levou um daqueles fiéis da última hora a intercalar esta engenhosa idéia no discurso que proferiu à beira de minha cova: "Vós, que o conhecestes, meus senhores, vós podeis dizer comigo que a natureza parece estar chorando a perda irreparável de um dos mais belos caracteres que têm honrado a humanidade. Este ar sombrio, estas gotas do céu, aquelas nuvens escuras que cobrem o azul como um crepe funéreo, tudo isso é a dor crua e má que lhe rói à natureza as mais íntimas entranhas; tudo isso é um sublime louvor ao nosso ilustre finado". Bom e fiel amigo! Não, não me arrependo das vinte apólices que lhe deixei. E foi assim que cheguei à cláusula dos meus dias; foi assim que me encaminhei para o undiscovered country de Hamlet, sem as ânsias nem as dúvidas do moço príncipe, mas pausado e trôpego como quem se retira tarde do espetáculo. Tarde e aborrecido. Viram-me ir umas nove ou dez pessoas, entre elas três senhoras, minha irmã Sabina, casada com o Cotrim, a filha, — um lírio do vale, — e... Tenham paciência! Daqui a pouco lhes direi quem era a terceira senhora. Contentem-se de saber que essa anônima, ainda que não parenta, padeceu mais do que as parentas. É verdade, padeceu mais. Não digo que se carpisse, não digo que se deixasse rolar pelo chão, convulsa. Nem o meu óbito era coisa altamente dramática... Um solteirão que expira aos sessenta e quatro anos, não parece que reúna em si todos os elementos de uma tragédia. E, dado que sim, o que menos convinha a essa anônima era aparentá-lo. De pé, à cabeceira da cama, com os olhos estúpidos, a boca entreaberta, a triste senhora mal podia crer na minha extinção. — Morto! Morto! dizia consigo. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 83 E a imaginação dela, como as cegonhas que um ilustre viajante viu desferirem o vôo desde o Ilisso às ribas africanas, sem embargo das ruínas e dos tempos, a imaginação dessa senhora também voou por sobre os destroços presentes até às ribas de uma África juvenil... Deixá-la ir; lá iremos mais tarde; lá iremos quando eu me restituir aos primeiros anos. Agora, quero morrer tranquilamente, metodicamente, ouvindo os soluços das damas, as falas baixas dos homens, a chuva que tamborila nas folhas de tinhorão da chácara, e o som estrídulo de uma navalha que um amolador está afiando lá fora, à porta de um correeiro. Juro-lhes que essa orquestra da morte foi muito menos triste do que podia parecer. De certo ponto em diante chegou a ser deliciosa. A vida estrebuchava-me no peito, com uns ímpetos de vaga marinha, esvaía-se-me a consciência, eu descia à imobilidade física e moral, e o corpo fazia-se-me planta, e pedra, e lodo, e coisa nenhuma. Morri de uma pneumonia; mas, se lhe disser que foi menos a pneumonia, do que uma idéia grandiosa e útil, a causa da minha morte, é possível que o leitor me não creia, e todavia é verdade. Vou expor-lhe sumariamente o caso. Julgue-o por si mesmo. (Assis, Machado de. Memórias póstumas de Brás Cubas. Disponível em: http://machado.mec.gov.br/images/stories/pdf/romance/marm05.pdf. Acesso em: 21/01/07). Em relação aos aspectos literários da obra, julgue o item a seguir. A narração é feita em primeira pessoa e postumamente. Isso não permite, porém, que o narrador conte suas memórias da maneira como lhe convir, pois ele está preocupado com a recepção da obra por parte de seu leitor. 21. (AGIRH – Prefeitura Municipal de Aparecida de São Paulo – Monitor de Creche – 2018 – adaptada) Em relação aos aspectos literários da obra, julgue o item a seguir. O narrador aproveita-se da situação de morto para se livrar dos julgamentos de qualquer pessoa viva. Por essa razão, chega a ser até considerado um narrador agressivo e irônico. 22. (AGIRH – Prefeitura Municipal de Aparecida de São Paulo – Monitor de Creche – 2018 – adaptada) Em relação aos aspectos literários da obra, julgue o item a seguir. O tempo da narrativa pode ser considerado cronológico e ausenta-se da obra o que os críticos denominam de "tempo psicológico". 23. (AGIRH – Prefeitura Municipal de Aparecida de São Paulo – Monitor deCreche – 2018 – adaptada) Em relação aos aspectos literários da obra, julgue o item a seguir. O romance retrata a história de Brás Cubas, um homem bem-sucedido, que teve filhos e que realizou grandes feitos enquanto vivo, como a criação e conclusão do Emplasto Brás Cubas, um remédio excepcional que teria como propósito amenizar a tristeza do homem e curar a hipocondria humana. 24. (IFB – Instituto Federal de Educação, Ciências e Tecnologia de Brasília – Português – 2016 – adaptada) Julgue o item a seguir, que faz referência ao romance O cortiço de Aluísio de Azevedo. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 84 O autor sofreu influência de Émile Zola, cuja qualidade é representar a realidade com rigor científico. Assim, traça um perfil da personagem João Romão, por exemplo, que o coloca como uma metonímia de todas as criaturas que imigram, sofrem e se perdem no sentido de apenas possuir. 25. (MOURA MELO – Prefeitura Municipal de Queluz/SP – Psicólogo – 2011 – adaptada) Leia o texto para responder à questão. “Tinha-me lembrado a definição que José Dias dera deles, "olhos de cigana oblíqua e dissimulada." Eu não sabia o que era obliqua, mas dissimulada sabia, e queria ver se podiam chamar assim. Capitu deixou-se fitar e examinar. Só me perguntava o que era, se nunca os vira, eu nada achei extraordinário; a cor e a doçura eram minhas conhecidas. A demora da contemplação creio que lhe deu outra idéia do meu intento; imaginou que era um pretexto para mirá-los mais de perto, com os meus olhos longos, constantes, enfiados neles, e a isto atribuo que entrassem a ficar crescidos, crescidos e sombrios, com tal expressão que... Retórica dos namorados, dá-me uma comparação exata e poética para dizer o que foram aqueles olhos de Capitu. Não me acode imagem capaz de dizer, sem quebra da dignidade do estilo, o que eles foram e me fizeram. Olhos de ressaca? Vá, de ressaca. É o que me dá idéia daquela feição nova. Traziam não sei que fluido misterioso e enérgico, uma força que arrastava para dentro, como a vaga que se retira da praia, nos dias de ressaca. Para não ser arrastado, agarrei-me às outras partes vizinhas, às orelhas, aos braços, aos cabelos espalhados pelos ombros, mas tão depressa buscava as pupilas, a onda que saía delas vinha crescendo, cava e escura, ameaçando envolver-me, puxar-me e tragar-me. (...)” Julgue o item a seguir. O movimento literário ao qual pertence o trecho de romance, acima, é o Romantismo. 26. (IAUPE – Polícia Militar do Estado de Pernambuco – Oficial – 2007 – adaptada) Leia o texto para responder à questão. Jantei triste. Não era a falta do relógio que me pungia, era a imagem do autor do furto, e as reminiscências de criança, e outra vez a comparação, e a conclusão... Desde a sopa começou a abrir em mim a flor amarela e mórbida do capítulo XXV, e então jantei depressa, para correr à casa de Virgília. Virgília era o presente; eu queria refugiar-me nele, para escapar às opressões do passado, porque o encontro do Quincas Borba tornara-me aos olhos do passado, não qual fora deveras, mas um passado roto, abjeto, mendigo e gatuno. Saí de casa, mas era cedo; iria achá-los à mesa. Outra vez passei no Quincas Borba, e tive então um desejo de tornar ao Passeio Público, a ver se o achava; a idéia de o regenerar surgiu-me como uma forte necessidade. Fui; mas já não o achei. Indaguei do guarda; disse-me que efetivamente ”esse sujeito” ia por ali às vezes. – A que horas? – Não tem hora certa. ASSIS, Machado de. Memórias póstumas de Brás Cubas, São Paulo: Egéria, 1980. p. 99. Julgue o item a seguir quanto à identificação do fragmento do texto com características do Realismo brasileiro. Quincas Borba tornara-me aos olhos do passado, não qual fora deveras, mas um passado roto, abjeto mendigo e gatuno = descrição e adjetivação objetivas tentando captar o real como ele se apresenta. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 85 27. (FUNCAB – SESC/BA: Analista em Literatura – 2009 – adaptada) TEXTO PARA AS PRÓXIMAS 2 PERGUNTAS Olhos de ressaca Enfim, chegou a hora da encomendação e da partida. Sancha quis despedir-se do marido, e o desespero daquele lance consternou a todos. Muitos homens choravam também, as mulheres todas. Só Capitu, amparando a viúva, parecia vencer-se a si mesma. Consolava a outra, queria arrancá-la dali. A confusão era geral. No meio dela, Capitu olhou alguns instantes para o cadáver tão fixa, tão apaixonadamente fixa, que não admira lhe saltassem algumas lágrimas poucas e caladas... As minhas cessaram logo. Fiquei a ver as dela; Capitu enxugou-as depressa, olhando a furto para a gente que estava na sala. Redobrou de carícias para a amiga, e quis levá-la; mas o cadáver parece que a retinha também. Momento houve em que os olhos de Capitu fitaram o defunto, quais os da viúva, sem o pranto nem palavras desta, mas grandes e abertos, como a vaga do mar lá fora, como se quisesse tragar também o nadador da manhã. MACHADO DE ASSIS. Olhos de ressaca. In: Dom Casmurro. 8 ed. São Paulo. Ática. 1978. p. 133-4. Julgue o item a seguir. Do ponto de vista do narrador, a personagem que reage de modo aparentemente diferente dos demais é Capitu. 28. (FUNCAB – SESC/BA: Analista em Literatura – 2009 – adaptada) Julgue o item a seguir. O título do capítulo Olhos de ressaca, do livro Dom Casmurro, se refere à seguinte afirmação: “Os olhos de Capitu pareciam querer reter a imagem do defunto”. 29. (Cebraspe/Universidade de Brasília – 2013/1o semestre – adaptada) TEXTO PARA AS PRÓXIMAS 2 QUESTÕES Conto de escola A escola era na Rua do Costa, um sobradinho de grade de pau. O ano era de 1840. Naquele dia ― uma segunda-feira, do mês de maio ―, deixei-me estar alguns instantes na Rua da Princesa a ver onde iria brincar a manhã. Hesitava entre o morro de S. Diogo e o Campo de Sant’Ana, que não era então esse parque atual, construção de gentleman, mas um espaço rústico, mais ou menos infinito, alastrado de lavadeiras, capim e burros soltos. Morro ou campo? Tal era o problema. De repente disse comigo que o melhor era a escola. E guiei para a escola. [...] Raimundo recuou a mão dele e deu à boca um gesto amarelo, que queria sorrir. Em seguida, propôs-me um negócio, uma troca de serviços; ele me daria a moeda, eu lhe explicaria um ponto da lição de sintaxe. Não conseguira reter nada do livro, e estava com medo do pai. E concluía a proposta esfregando a pratinha nos joelhos... Tive uma sensação esquisita. Não é que eu possuísse da virtude uma ideia antes própria de homem; não é também que não fosse fácil empregar uma ou outra mentira de criança. Sabíamos ambos enganar ao mestre. A novidade estava nos termos da proposta, na troca de lição e dinheiro, compra franca, positiva, toma lá, dá cá; tal foi a causa da sensação. Fiquei a olhar para ele, à toa, sem poder dizer nada. Machado de Assis. Conto de escola. Internet:<www.dominiopublico.org>. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 86 Tendo como referência o fragmento acima, da obra Conto de escola, de Machado de Assis, julgue o item a seguir. No fragmento apresentado, é relatada uma situação que corresponde a um processo de incorporação de um valor social que gera conflito no narrador-personagem. Esse valor social é a liberdade de troca entre indivíduos. 30. (Cebraspe/Universidade de Brasília – 2013/1o semestre – adaptada) Julgue o item a seguir. No 3.º período do texto, para apresentar detalhe relativo ao tempo da narrativa, Machado de Assis utilizaestrutura sintática de aposto explicativo, que corresponde ao trecho entre travessões. 8 – GABARITO 1. C 2. E 3. E 4. C 5. C 6. E 7. E 8. E 9. E 10. C 11. C 12. E 13. E 14. C 15. C 16. C 17. E 18. E 19. C 20. E 21. C 22. E 23. E 24. C 25. E 26. C 27. C 28. C 29. C 30. E 9 – QUESTÕES COMENTADAS 1. (ITAME – Prefeitura Municipal de Aloândia/GO – Fiscal de Vigilância Sanitária – 2015 – adaptada) Julgue o item a seguir. Os escritores brasileiros seguindo de perto as tendências do Realismo na França e em Portugal, enveredaram pela crítica social, fazendo da literatura uma análise da realidade brasileira. Comentários Questão de conhecimento de características de movimentos literários. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 87 O Realismo foi um movimento literário-artístico que chegou antes na Europa do que no Brasil. Dessa forma, quando chega em território nacional, os artistas espelham-se nas técnicas e temas já recorrentes, mas estipulam sua crítica orientada para a realidade local. O grau de dificuldade dessa questão é: fácil. Gabarito: C. 2. (ITAME – Prefeitura Municipal de Aloândia/GO – Fiscal de Vigilância Sanitária – 2015 – adaptada) Julgue o item a seguir. Diferentemente dos românticos, os autores do Realismo buscaram retratar de forma subjetiva a realidade, inclusive a realidade psicológica. Comentários Questão de conhecimento de características de movimentos literários. Os realistas se diferenciaram, sim, dos românticos, mas não por essa característica. Eram os românticos que eram subjetivos; os realistas retratam a realidade psicológica (interior) sem descuidar da crítica à realidade exterior (sociedade). O grau de dificuldade dessa questão é: fácil. Gabarito: E. 3. (COMEDE – Prefeitura Municipal da Jaqueira/PE – Professor de 5ª a 8ª Série de Língua Portuguesa – 2009 – adaptada) Julgue o item a seguir. Em uma conferência intitulada a “A literatura Nova” o escritor Eça de Queiroz define, em linhas gerais, o projeto literário desta estética: o Naturalismo é a anatomia do caráter, produzir por meio da arte uma representação da realidade que permita condenar o que há de mau na sociedade. A alternativa que completa corretamente o texto. Comentários Questão de preencher lacuna/conhecimento de características de movimentos literários. Cuidado: Naturalismo e Realismo foram movimentos simultâneos, mas com estéticas muito diferentes entre si. Porque Eça de Queiroz está falando de denúncia de comportamentos sociais no texto o autor está se remetendo diretamente ao Realismo e não o Naturalismo. O grau de dificuldade dessa questão é: médio. Gabarito: E. 4. (ADM&TEC – Prefeitura Municipal de Rio Largo/AL – Professor de 6o ao 9o ano do Ensino Fundamental – 2019 – adaptada) Julgue o item a seguir. A obra Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis, é uma das mais importantes obras da literatura nacional. Nela, o autor dá voz a um narrador defunto que zomba do caráter das pessoas com quem conviveu. Comentários Questão conhecimento de características de movimentos literários. O defunto-autor coloca-se assim nessa situação privilegiada para criticar a tudo e a todos, inclusive a si mesmo. É importante lembrar que ele não está isento a autocríticas. O grau de dificuldade dessa questão é: médio. Gabarito: C. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 88 5. (ADVISE – Prefeitura Municipal do Riachão do Poço/PB – Educador Social – 2019 – adaptada) Julgue o item a seguir. Em relação a Machado de Assis, suas obras são divididas em duas fases: a fase romântica (ou de amadurecimento) e a fase realista (ou de maturidade). Além disso, foi no jornal que Machado iniciou sua carreira como escritor, e em 1859 vêm a público suas primeiras crônicas. Comentários Questão conhecimento da biografia do autor. Machado de Assis é um dos principais escritores da Literatura Nacional; portanto, podem ser cobrados, sim, fatos sobre sua biografia. É importante notar também que o item foi elaborado em mais de uma parte, mas todas elas estão corretas. Quem motivou o início da carreira de Machado de Assis foi o romântico Joaquim Manuel Macedo. O grau de dificuldade dessa questão é: médio. Gabarito: C. 6. (ADM&TEC – Prefeitura Municipal de Sertânia/PE – Professor de Língua Portuguesa – 2019 – adaptada) Julgue o item a seguir. A obra O Ateneu, de Raul Pompeia, é um romance narrado em primeira pessoa por Sérgio, que conta suas experiências como soldado do Exército Brasileiro durante a Guerra de Canudos. Comentários Questão de conhecimento de cânone. As informações referem-se à obra Os Sertões (1902) do pré-modernista Euclides da Cunha e não a O Ateneu, que é uma obra realista de cunho autobiográfico. O grau de dificuldade dessa questão é: médio. Gabarito: E. 7. (INSTITUTO EXCELÊNCIA – Prefeitura Municipal de Tremembé/SP – Língua Portuguesa – 2019 – adaptada) Leia o texto a seguir para responder à questão. Óbito do autor Algum tempo hesitei se devia abrir estas memórias pelo princípio ou pelo fim, isto é, se poria em primeiro lugar o meu nascimento ou a minha morte. Suposto o uso vulgar seja começar pelo nascimento, duas considerações me levaram a adotar diferente método: a primeira é que eu não sou propriamente um autor defunto, mas um defunto autor, para quem a campa foi outro berço; a segunda é que o escrito ficaria assim mais galante e mais novo. Moisés, que também contou a sua morte, não a pôs no intróito, mas no cabo: diferença radical entre este livro e o Pentateuco. Dito isto, expirei às duas horas da tarde de uma sexta-feira do mês de agosto de 1869, na minha bela chácara de Catumbi. Tinha uns sessenta e quatro anos, rijos e prósperos, era solteiro, possuía cerca de trezentos contos e fui acompanhado ao cemitério por onze amigos. Onze amigos! Verdade é que não houve cartas nem anúncios. Acresce que chovia — peneirava — uma chuvinha miúda, triste e constante, tão constante e tão triste, que levou um daqueles fiéis da última hora a intercalar esta engenhosa idéia no discurso que proferiu à beira de minha cova: "Vós, que o conhecestes, meus senhores, vós podeis dizer comigo que a natureza parece estar chorando a perda irreparável de um dos mais belos caracteres que têm honrado a humanidade. Este ar sombrio, estas gotas do céu, aquelas nuvens escuras que cobrem o azul como um crepe funéreo, tudo isso é a dor crua e má que lhe rói à natureza as mais íntimas entranhas; tudo isso é um sublime louvor ao nosso ilustre finado". Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 89 Bom e fiel amigo! Não, não me arrependo das vinte apólices que lhe deixei. E foi assim que cheguei à cláusula dos meus dias; foi assim que me encaminhei para o undiscovered country de Hamlet, sem as ânsias nem as dúvidas do moço príncipe, mas pausado e trôpego como quem se retira tarde do espetáculo. Tarde e aborrecido. Viram-me ir umas nove ou dez pessoas, entre elas três senhoras, minha irmã Sabina, casada com o Cotrim, a filha, — um lírio do vale, — e... Tenham paciência! Daqui a pouco lhes direi quem era a terceira senhora. Contentem-se de saber que essa anônima, ainda que não parenta, padeceu mais do que as parentas. É verdade, padeceu mais. Não digo que se carpisse, não digo que se deixasse rolar pelo chão, convulsa. Nem o meu óbito era coisa altamente dramática... Um solteirão que expira aos sessenta e quatro anos, não parece que reúna em si todos os elementosde uma tragédia. E, dado que sim, o que menos convinha a essa anônima era aparentá-lo. De pé, à cabeceira da cama, com os olhos estúpidos, a boca entreaberta, a triste senhora mal podia crer na minha extinção. — Morto! Morto! dizia consigo. E a imaginação dela, como as cegonhas que um ilustre viajante viu desferirem o vôo desde o Ilisso às ribas africanas, sem embargo das ruínas e dos tempos, a imaginação dessa senhora também voou por sobre os destroços presentes até às ribas de uma África juvenil... Deixá-la ir; lá iremos mais tarde; lá iremos quando eu me restituir aos primeiros anos. Agora, quero morrer tranquilamente, metodicamente, ouvindo os soluços das damas, as falas baixas dos homens, a chuva que tamborila nas folhas de tinhorão da chácara, e o som estrídulo de uma navalha que um amolador está afiando lá fora, à porta de um correeiro. Juro-lhes que essa orquestra da morte foi muito menos triste do que podia parecer. De certo ponto em diante chegou a ser deliciosa. A vida estrebuchava-me no peito, com uns ímpetos de vaga marinha, esvaía-se-me a consciência, eu descia à imobilidade física e moral, e o corpo fazia-se-me planta, e pedra, e lodo, e coisa nenhuma. Morri de uma pneumonia; mas, se lhe disser que foi menos a pneumonia, do que uma idéia grandiosa e útil, a causa da minha morte, é possível que o leitor me não creia, e todavia é verdade. Vou expor-lhe sumariamente o caso. Julgue-o por si mesmo. (ASSIS, Machado de. Memórias póstumas de Brás Cubas. São Paulo: Editora Moderna, 1994) Julgue o item abaixo quanto às características do movimento literário presente no texto. Propõe uma representação mais verossímil da vida humana, recorrendo à maior subjetividade e valorização da imaginação. Comentários Questão de interpretação de texto literário/conhecimento das características do movimento literário. Representação verossímil da vida humana, sim, mas objetiva, sem maior subjetividade. A imaginação exaltada é da senhora misteriosa e não de Brás Cubas. Ele, pelo contrário, mostra-se impassível até mesmo na morte: “Agora, quero morrer tranquilamente, metodicamente”. É tão pragmático que não reconhece tragédia no fato de um homem de sessenta e quatro homens morrer (afinal, já era longevo), tampouco nos sons que percebia ao redor, pois se tratava de sons comuns da realidade. A verossimilhança revela-se ainda mais instigante ao fim do trecho, pois Brás Cubas quer convencer o leitor, comprovando-lhe os fatos. O texto é uma oportunidade para revisarmos alguns traços estilísticos machadianos: A ironia. Presente no susto que Brás Cubas leva ao repara quão poucos amigos comparecem ao seu velório: “e fui acompanhado ao cemitério por onze amigos. Onze amigos!” A intertextualidade. Presente na alusão à peça teatral Hamlet de William Shakespeare. O grau de dificuldade dessa questão é: difícil. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 90 Gabarito: E. 8. (Cebraspe – Prefeitura Municipal de São Cristóvão/SE – Professor de Educação Básica/Português – 2019 – adaptada) Leia o texto a seguir para responder à questão. No Realismo ficcional, a mente cientificista também é responsável pelo esvaziar-se do êxtase que a paisagem suscitava nos escritores românticos. O que se entende pela preferência dada agora aos ambientes urbanos e, em nível mais profundo, pela não identificação do escritor realista com aquela vida e aquela natureza transformadas pelo positivismo em complexos de normas e fatos indiferentes à alma humana. O determinismo reflete-se na perspectiva em que se movem os narradores ao trabalhar as suas personagens. A pretensa neutralidade não chega ao ponto de ocultar o fato de que o autor carrega sempre de tons sombrios o destino das suas criaturas. Atente-se, nos romances desse período, para a galeria de seres distorcidos ou acachapados pelo Fatum. Alfredo Bosi. História concisa da literatura brasileira. São Paulo: Cultrix, 2004, p. 172-3 (com adaptações). Considerando o fragmento de texto, julgue o item a seguir, a respeito do Realismo e do Naturalismo na literatura brasileira. Em O Cortiço, de Aluísio Azevedo, a abordagem estética pela retórica da ciência imprime ao narrador uma voz objetiva, destituída de juízos de valor, como no trecho a seguir, em que descreve uma das personagens do romance: “A filha tinha quinze anos, a pele de um moreno quente, beiços sensuais, bonitos dentes, olhos luxuriosos de macaca. Toda ela estava a pedir homem”. Comentários Questão de Crítica Literária/conhecimento de características do movimento literário. Compreende-se que o trecho é essencialmente subjetivo e não objetivo pela adjetivação: beiços sensuais, dentes bonitos e olhos luxuriosos e, além por cima, com forte juízo de valor: de macaca. O grau de dificuldade dessa questão é: médio. Gabarito: E. 9. (VUNESP – Polícia Militar do Estado de São Paulo – Aluno Oficial – 2019 – adaptada) Leia o texto a seguir para responder à questão. [19 de maio de 1888] Bons dias! Eu pertenço a uma família de profetas après coup1, post factum2, depois do gato morto, ou como melhor nome tenha em holandês. Por isso digo, juro se necessário for, que toda a história desta lei de 13 de maio estava por mim prevista, tanto que na segunda-feira, antes mesmo dos debates, tratei de alforriar um molecote que tinha, pessoa de seus dezoito anos, mais ou menos. Alforriá-lo era nada; entendi que, perdido por mil, perdido por mil e quinhentos, e dei um jantar. Levantei-me eu com a taça de champanha e declarei que, acompanhando as ideias pregadas por Cristo, há dezoito séculos, restituía a liberdade ao meu escravo Pancrácio; que entendia que a nação inteira devia acompanhar as mesmas ideias e imitar o meu exemplo; finalmente, que a liberdade era um dom de Deus que os homens não podiam roubar sem pecado. Pancrácio, que estava à espreita, entrou na sala, como um furacão, e veio abraçar-me os pés. Todos os lenços comovidos apanharam as lágrimas de admiração. Caí na cadeira e não vi mais nada. De noite, recebi muitos cartões. Creio que estão pintando o meu retrato, e suponho que a óleo. No dia seguinte, chamei o Pancrácio e disse-lhe com rara franqueza: – Tu és livre, podes ir para onde quiseres. Aqui tens casa amiga, já conhecida e tens mais um ordenado, um ordenado que... Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 91 – Oh! meu senhô! fico... – Um ordenado pequeno, mas que há de crescer. Tudo cresce neste mundo: tu cresceste imensamente. Quando nasceste eras um pirralho deste tamanho; hoje estás mais alto que eu. Deixa ver; olha, és mais alto quatro dedos... – Artura não qué dizê nada, não, senhô... – Pequeno ordenado, repito, uns seis mil-réis: mas é de grão em grão que a galinha enche o seu papo. Tu vales muito mais que uma galinha. – Justamente. Pois seis mil-réis. No fim de um ano, se andares bem, conta com oito. Oito ou sete. Pancrácio aceitou tudo: aceitou até um peteleco que lhe dei no dia seguinte, por me não escovar bem as botas; efeitos da liberdade. Mas eu expliquei-lhe que o peteleco, sendo um impulso natural, não podia anular o direito civil adquirido por um título que lhe dei. Ele continuava livre, eu de mau humor; eram dois estados naturais, quase divinos. Tudo compreendeu o meu bom Pancrácio: daí para cá, tenho-lhe despedido alguns pontapés, um ou outro puxão de orelhas. E chamo-lhe besta quando lhe não chamo filho do diabo; coisas todas que ele recebe humildemente, e (Deus me perdoe!) creio que até alegre. (Machado de Assis. Bons dias. www.dominiopublico.gov.br. Adaptado) 1après coup: [francês]pós-golpe. 2post factum: [latim] depois do fato. Julgue o item subsequente. Uma marca do estilo de Machado de Assis verificada no texto é o discurso espontâneo e emotivo, bem como o tom inflamado e grandiloquente, próprio de uma retórica a favor de causas libertárias, que buscava a adesão do leitor por meio do melodrama. Comentários Questão de interpretação de texto literário/conhecimento do estilo do autor. Não tem nada de espontâneo o texto machadiano, mas sim passa por procedimentos, pensamento e racionalidade. O tom inflamado e grandiloquente é típico do condoreirismo, terceira geração romântica, porém a menção à abolição da escravidão por Machado de Assis é crítica e irônica e não melodramática. Pela recusa insistente do ex-escravo Pancrácio em deixar o senhorio, mesmo quando podia, pois estava livre, indica que no fundo o ex-escravo pressentia que lá fora iria encontrar condições de vulnerabilidade social ainda piores que enfrentava ali. De alguma maneira, devia se sentir protegido para querer ficar. Tudo isso Machado de Assis indica com sutileza, nas entrelinhas, por exemplo, com a pontuação das reticências na fala de Pancrácio. O grau de dificuldade dessa questão é: difícil. Gabarito: E. 10. (VUNESP – Polícia Militar do Estado de São Paulo – Aluno Oficial – 2018 – adaptada) Leia o texto a seguir para responder à questão. Leia o trecho de Dom Casmurro, de Machado de Assis, para responder à questão. A imagem de Capitu ia comigo, e a minha imaginação, assim como lhe atribuíra lágrimas, há pouco, assim lhe encheu a boca de riso agora: vi-a escrever no muro, falar-me, andar à volta, com os braços no ar; ouvi distintamente o meu nome, de uma doçura que me embriagou, e a voz era dela. (Obra completa. Vol. 1. Rio de Janeiro, Nova Aguilar, 1992, p. 840) Julgue o item a seguir. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 92 Em Dom Casmurro, assim como em grande parte da prosa de Machado de Assis, observa-se a ênfase na caracterização social e psicológica de personagens tipicamente urbanas. Comentários Questão de interpretação de texto literário/conhecimento de características do movimento literário. Cuidado: apenas pelo trecho até parece um excerto romântico, pelo sentimentalismo expresso. Porém, devemos lembrar que se trata de uma obra complexa, estruturada em primeira pessoa, e que estes sentimentos são descritos de maneira que parece exagerada justamente porque partem dessa noção subjetiva. O importante é entender que o Realismo opera o trânsito entre esse universo interior e o exterior (a sociedade). O grau de dificuldade dessa questão é: média. Gabarito: C. 11. (CEV/UECE – Secretaria do Estado de Educação do Ceará – Professor de Língua Portuguesa – 2018 – adaptada) Julgue o item a seguir. Os naturalistas enfatizam o fato de a hereditariedade física e psicológica determinar o comportamento das personagens. Comentários Questão de conhecimento de características do movimento literário. Essa hereditariedade é justificada por teorias do fim do século XIX tais como Positivismo, Determinismo e Darwinismo. O grau de dificuldade dessa questão é: média. Gabarito: C. 12. (CEV/UECE – Secretaria do Estado de Educação do Ceará – Professor de Língua Portuguesa – 2018 – adaptada) Julgue o item a seguir. O desequilíbrio das personagens realistas permanece latente até que o ambiente físico e social favoreça sua manifestação, portanto, juntando-se os fatores herança biológica e ambiente, criam-se condições para que se manifeste o conflito dramático da personagem realista. Comentários Questão de conhecimento de características do movimento literário. Herança biológica e determinação do ambiente são características naturalistas e não realistas. Muito provavelmente a banca vai tentar confundir os dois. O grau de dificuldade dessa questão é: média. Gabarito: E. 13. (CEV/UECE – Secretaria do Estado de Educação do Ceará – Professor de Língua Portuguesa – 2018 – adaptada) Julgue o item a seguir. A Revolução Francesa está diretamente associada ao nascimento da estética realista. Ela desencadeou mudanças tão profundas no modo de produção que se tornou responsável pela reordenação da economia mundial no século XIX. Comentários Questão acerca do contexto histórico-social do movimento literário. Estética iluminista, mais ligada ao Arcadismo, e não realista. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 93 O grau de dificuldade dessa questão é: média. Gabarito: E. 14. (CEV/UECE – Secretaria do Estado de Educação do Ceará – Professor de Língua Portuguesa – 2018 – adaptada) Julgue o item a seguir. O interesse pelo funcionamento e pela organização da sociedade leva os escritores realistas a abordarem as necessidades materiais humanas (alimentação, moradia, etc.) e discutir as condições econômicas (aspectos referentes ao mundo do trabalho) necessárias para satisfazer tais necessidades. Comentários Questão acerca do contexto histórico-social do movimento literário. O que está associado também ao interesse pela doutrina do materialismo no século XIX. O grau de dificuldade dessa questão é: média. Gabarito: C. 15. (CEV/UECE – Secretaria do Estado de Educação do Ceará – Professor de Língua Portuguesa – 2018 – adaptada) Julgue o item a seguir. Mudanças profundas ocorreram no Brasil na segunda metade do século XIX, afetando a economia, a política, a arte, como, por exemplo, a extinção do tráfico de escravos, o imigrante assalariado como nova mão de obra; livre comércio com o exterior; ampliação da burguesia mercantil; o avanço científico e o progresso tecnológico; crise entre a Igreja e o Governo; cisão entre o exército e o imperador; além da influência do positivismo, sobretudo no meio militar, na burguesia e entre alguns grupos de intelectuais. Comentários Questão acerca do contexto histórico-social do movimento literário. Mudanças como Abolição da Escravidão (13 de maio de 1888) e Proclamação da República (1889). Em meio a isso, surgem novas doutrinas como o Positivismo, que aqui no Brasil influenciou o lema da nossa bandeira nacional: “Ordem e Progresso”. O grau de dificuldade dessa questão é: média. Gabarito: C. 16. (MSCONCURSOS – Câmara Municipal de Itaguara/MG – Auxiliar Administrativo – 2018 – adaptada) Leia o texto para responder à questão. É a história de um professor mineiro, Rubião, para quem um filósofo deixa todos os seus bens, com a condição de que o herdeiro cuide de seu cachorro, que também tinha o nome do filósofo. De posse da fortuna e tendo aprendido do filósofo alguns elementos de sua filosofia, o Humanitismo, Rubião muda-se para o Rio de Janeiro. Desabituado com a vida na cidade grande, cercado de pessoas que vivem de seu dinheiro, Rubião apaixona-se por Sofia, mulher de Cristiano Palha, seu sócio. Ao saber que Rubião estava a fim de sua mulher, Palha divide-se entre dois sentimentos: o ciúme que tem da mulher fá-lo pensar em atitudes radicais, mas sua dependência econômica de Rubião o leva a não ofender o sócio. Sofia, astuciosamente, consegue manter intactos, tanto o interesse de Rubião quanto a fidelidade conjugal. Aos poucos Rubião começa a agir de maneira estranha: acredita-se Napoleão, fantasia a realidade, fala sozinho na rua e, pouco a pouco, perde toda sua fortuna e também a razão. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 94 Arruinado, Rubião deixa de ser útil e é abandonado pela roda de parasitas que o cercava. Palha e Sofia afastam-secada vez mais e ele acaba sendo internado num asilo de onde foge para voltar a Minas. Morre lá, em pleno delírio de grandeza, acompanhado de seu cão e repetindo uma frase do Humanitismo: “Ao vencedor, as batatas”. Julgue o item a seguir. O resumo fala da obra: Quincas Borba de Machado de Assis. Comentários Questão sobre conhecimento de obra do cânone. Questão fácil, mas apenas se o enredo fosse conhecido. Portanto, trata-se de um interessante modo de a banca cobrar enredos. Bastava lembrar que em Quincas Borba, embora este romance leve em seu título um nome próprio, o papel de protagonista não é ocupado pelo mesmo (no caso, o filósofo que falece no início do livro), mas sim por Rubião. Trata-se de um jogo machadiano de inverter alçar uma personagem periférica à condição de central. O grau de dificuldade dessa questão é: fácil. Gabarito: C. 17. (QUADRIX – Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal – Língua Portuguesa – 2018 – adaptada) Julgue o item a seguir. Em O cortiço, afastado da visão naturalista que regia seus romances anteriores, Aluísio Azevedo compôs um retrato fiel da sociedade brasileira, ao descrever os habitantes do cortiço para além da perspectiva determinista que submetia os destinos humanos às determinações da raça e do meio. Comentários Questão sobre conhecimento de características do movimento literário. Cuidado: o retrato do cortiço não vai além do determinismo, pois se propunha a seguir o modelo padrão do romance de tese. Neste tipo de literatura, há influência do cientificismo e o objetivo maior buscar comprovações. Confira abaixo um trecho paradigmático: SUZANNE Não sei. Só consegui vê-lo através da luneta, sabe? Devia ser bem longe, muito longe, lá para os lados do St. Sulpice. Quando eu olhava a olho nu, só conseguia ver manchas cinzentas dos terraços com as manchas azuis dos telhados de ardósia... Quase perdi o rapaz de vista. O telescópio saiu do lugar, e precisei tornar a percorrer uma viagem imensa pelo mar de chaminés... Mas agora eu já tenho um ponto de referência, o catavento de uma casa vizinha à nossa (ZOLA, 2007, p. 98). O grau de dificuldade dessa questão é: médio. Gabarito: E. 18. (FADESP – Instituto Federal de Educação, Ciências e Tecnologia do Pará – Professor de Ensino Básico e Técnico – 2018 – adaptada) Julgue o item a seguir. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 95 Sobre a obra de Machado de Assis, é correto afirmar que se desdobra em diferentes gêneros literários: poesia, teatro, prosa de ficção (romances, crônicas, contos), crítica literária. Nesse último gênero, o autor superou-se e suplantou todos os demais. Comentários Questão sobre conhecimento do autor. De fato, Machado de Assis escreveu até poesia em sua fase romântica, especialmente dedicada à esposa Carolina, escreveu algumas peças de teatro e também Crítica Literária (tem um texto importante sobre Eça de Queirós, por exemplo), mas não se sobressaiu na crítica, mas sim em seus romances. O grau de dificuldade dessa questão é: médio. Gabarito: E. 19. (FADESP – Instituto Federal de Educação, Ciências e Tecnologia do Pará – Professor de Ensino Básico e Técnico – 2018 – adaptada) Leia o texto a seguir para responder à questão O Escritor Machado de Assis (1839/1904) faz parte do Realismo brasileiro, movimento fundamentado por um “novo ideário”, conforme Alfredo Bosi, que assinala, também: “O tema da Abolição e, em segundo tempo, o da República serão o fulcro das opções ideológicas do homem culto brasileiro a partir de 1870.” (BOSI, Alfredo. História concisa da literatura brasileira. São Paulo: Cultrix, 2006). Julgue o item com relação à obra de Machado de Assis e ao que Bosi assinalou. No romance Esaú e Jacó (1904), Machado de Assis retrata questões atinentes à proclamação da República brasileira e no conto Pai contra mãe (1906), dramas ligados à escravidão dos afrodescendentes. Comentários Questão sobre conhecimento de obras do cânone. Em Esaú e Jacó, os irmãos gêmeos encarnam os pontos de vista políticos do republicanismo versus monarquismo. Já no conto Pai contra mãe, Candinho Neves é um caçador de escravos fugidos. Acaba por caçar uma que estava grávida e sofre aborto espontâneo assim que sabe que vai ser restituída ao senhor, diante de situação de tamanho estresse. O grau de dificuldade dessa questão é: médio. Gabarito: C. 20. (AGIRH – Prefeitura Municipal de Aparecida de São Paulo – Monitor de Creche– 2018 – adaptada) TEXTO PARA AS PRÓXIMAS 4 QUESTÕES Algum tempo hesitei se devia abrir estas memórias pelo princípio ou pelo fim, isto é, se poria em primeiro lugar o meu nascimento ou a minha morte. Suposto o uso vulgar seja começar pelo nascimento, duas considerações me levaram a adotar diferente método: a primeira é que eu não sou propriamente um autor defunto, mas um defunto autor, para quem a campa foi outro berço; a segunda é que o escrito ficaria assim mais galante e mais novo. Moisés, que também contou a sua morte, não a pôs no intróito, mas no cabo: diferença radical entre este livro e o Pentateuco. Dito isto, expirei às duas horas da tarde de uma sexta-feira do mês de agosto de 1869, na minha bela chácara de Catumbi. Tinha uns sessenta e quatro anos, rijos e prósperos, era solteiro, possuía cerca de trezentos contos e fui acompanhado ao cemitério por onze amigos. Onze amigos! Verdade é que não houve cartas nem anúncios. Acresce que chovia — peneirava — uma chuvinha miúda, triste e constante, tão constante e tão triste, que levou um daqueles fiéis da última hora a intercalar esta engenhosa idéia no discurso que proferiu à beira de minha cova: "Vós, que o conhecestes, meus senhores, vós podeis dizer comigo que a natureza parece estar chorando a perda irreparável de um dos mais belos caracteres que têm Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 96 honrado a humanidade. Este ar sombrio, estas gotas do céu, aquelas nuvens escuras que cobrem o azul como um crepe funéreo, tudo isso é a dor crua e má que lhe rói à natureza as mais íntimas entranhas; tudo isso é um sublime louvor ao nosso ilustre finado". Bom e fiel amigo! Não, não me arrependo das vinte apólices que lhe deixei. E foi assim que cheguei à cláusula dos meus dias; foi assim que me encaminhei para o undiscovered country de Hamlet, sem as ânsias nem as dúvidas do moço príncipe, mas pausado e trôpego como quem se retira tarde do espetáculo. Tarde e aborrecido. Viram-me ir umas nove ou dez pessoas, entre elas três senhoras, minha irmã Sabina, casada com o Cotrim, a filha, — um lírio do vale, — e... Tenham paciência! Daqui a pouco lhes direi quem era a terceira senhora. Contentem-se de saber que essa anônima, ainda que não parenta, padeceu mais do que as parentas. É verdade, padeceu mais. Não digo que se carpisse, não digo que se deixasse rolar pelo chão, convulsa. Nem o meu óbito era coisa altamente dramática... Um solteirão que expira aos sessenta e quatro anos, não parece que reúna em si todos os elementos de uma tragédia. E, dado que sim, o que menos convinha a essa anônima era aparentá-lo. De pé, à cabeceira da cama, com os olhos estúpidos, a boca entreaberta, a triste senhora mal podia crer na minha extinção. — Morto! Morto! dizia consigo. E a imaginação dela, como as cegonhas que um ilustre viajante viu desferirem o vôo desde o Ilisso às ribas africanas, sem embargo das ruínas e dos tempos, a imaginação dessa senhora também voou por sobre os destroços presentes até às ribas de uma África juvenil... Deixá-la ir; lá iremos mais tarde; lá iremos quando eu me restituir aos primeiros anos. Agora, quero morrertranquilamente, metodicamente, ouvindo os soluços das damas, as falas baixas dos homens, a chuva que tamborila nas folhas de tinhorão da chácara, e o som estrídulo de uma navalha que um amolador está afiando lá fora, à porta de um correeiro. Juro-lhes que essa orquestra da morte foi muito menos triste do que podia parecer. De certo ponto em diante chegou a ser deliciosa. A vida estrebuchava-me no peito, com uns ímpetos de vaga marinha, esvaía-se-me a consciência, eu descia à imobilidade física e moral, e o corpo fazia-se-me planta, e pedra, e lodo, e coisa nenhuma. Morri de uma pneumonia; mas, se lhe disser que foi menos a pneumonia, do que uma idéia grandiosa e útil, a causa da minha morte, é possível que o leitor me não creia, e todavia é verdade. Vou expor-lhe sumariamente o caso. Julgue-o por si mesmo. (Assis, Machado de. Memórias póstumas de Brás Cubas. Disponível em: http://machado.mec.gov.br/images/stories/pdf/romance/marm05.pdf. Acesso em: 21/01/07). Em relação aos aspectos literários da obra, julgue o item a seguir. A narração é feita em primeira pessoa e postumamente. Isso não permite, porém, que o narrador conte suas memórias da maneira como lhe convir, pois ele está preocupado com a recepção da obra por parte de seu leitor. Comentários Questão de interpretação de texto literário/conhecimento de características do movimento literário. Pelo contrário: é justamente o lugar privilegiado que lhe poupa de ser julgado pela crítica e acaba lhe conferindo privilégios que em outro caso não seria possível. O grau de dificuldade dessa questão é: fácil. Gabarito: E. 21. (AGIRH – Prefeitura Municipal de Aparecida de São Paulo – Monitor de Creche– 2018 – adaptada) Em relação aos aspectos literários da obra, julgue o item a seguir. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 97 O narrador aproveita-se da situação de morto para se livrar dos julgamentos de qualquer pessoa viva. Por essa razão, chega a ser até considerado um narrador agressivo e irônico. Comentários Questão de interpretação de texto literário/conhecimento de características do movimento literário. O grande traço da personalidade de Brás Cubas é seu cinismo, também verificado em sua maneira de ver o mundo e encarar a realidade. O grau de dificuldade dessa questão é: médio. Gabarito: C. 22. (AGIRH – Prefeitura Municipal de Aparecida de São Paulo – Monitor de Creche– 2018 – adaptada) Em relação aos aspectos literários da obra, julgue o item a seguir. O tempo da narrativa pode ser considerado cronológico e ausenta-se da obra o que os críticos denominam de "tempo psicológico". Comentários Questão de interpretação de texto literário/conhecimento de características do movimento literário. A marcação do tempo também é psicológica, cheia de digressões. Confiram abaixo alguns conceitos importantes. O TEMPO Os fatos de uma narração apresentam relações com o tempo em dois níveis: cronológico e psicológico. Tempo cronológico É o tempo que transcorre na ordem natural dos fatos no enredo, do começo para o final. Está ligado ao enredo linear, ou seja, à ordem em que os fatos ocorrem. Chama-se tempo cronológico porque pode ser medido em horas, meses, anos, séculos. Tempo psicológico É o tempo que transcorre numa ordem determinada pela vontade, pela memória ou pela imaginação do narrador ou personagem. É característico do enredo não linear, ou seja, do enredo em que os acontecimentos estão fora da ordem natural. Técnica do flashback O flashback é um recurso narrativo que consiste em voltar no tempo. Ocorre, por exemplo, quando uma personagem lembra um ato ou conta a outras personagens fatos que acrescentam informações ou esclarecem uma situação, um enigma, etc. Em nossa literatura, o romance Memórias póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis, apresenta essa técnica: o tempo para o narrador-personagem Brás Cubas tem como referência a sua condição de morto, o que lhe permite voltar ao passado recente e contar como morreu, por exemplo, ou voltar ao passado mais distante e contar fatos de sua infância e juventude. Fonte: (CEREJA; MAGALHÃES, 2005, p. 281-283). O grau de dificuldade dessa questão é: médio. Gabarito: E. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 98 23. (AGIRH – Prefeitura Municipal de Aparecida de São Paulo – Monitor de Creche– 2018 – adaptada) Em relação aos aspectos literários da obra, julgue o item a seguir. O romance retrata a história de Brás Cubas, um homem bem-sucedido, que teve filhos e que realizou grandes feitos enquanto vivo, como a criação e conclusão do Emplasto Brás Cubas, um remédio excepcional que teria como propósito amenizar a tristeza do homem e curar a hipocondria humana. Comentários Questão de interpretação de texto literário/conhecimento de características do movimento literário. Brás Cubas não é bem-sucedido. Mesmo sendo da elite, leva uma vida medíocre e nunca obteve sucesso em nada que fez. Não foi ministro, não teve filho, não constituiu família, sequer terminou seu almejado emplasto. O capítulo final dá a tônica negativo para a sua vida cheia de fracassos. O grau de dificuldade dessa questão é: médio. Gabarito: E. 24. (IFB – Instituto Federal de Educação, Ciências e Tecnologia de Brasília – Português – 2016 – adaptada) Julgue o item a seguir, que faz referência ao romance O cortiço de Aluísio de Azevedo. O autor sofreu influência de Émile Zola, cuja qualidade é representar a realidade com rigor científico. Assim, traça um perfil da personagem João Romão, por exemplo, que o coloca como uma metonímia de todas as criaturas que imigram, sofrem e se perdem no sentido de apenas possuir. Comentários Questão de interpretação de texto literário/conhecimento de características do movimento literário. Aluísio de Azevedo sofreu influência no sentido do romance de tese. Metonímia é uma figura de linguagem que representa a parte pelo todo. Assim, João Romão é a parte que representa a imigração portuguesa no Brasil, sobretudo aquela visando ao lucro. O grau de dificuldade dessa questão é: difícil. Gabarito: C. 25. (MOURA MELO – Prefeitura Municipal de Queluz/SP – Psicólogo – 2011 – adaptada) Leia o texto para responder à questão. “Tinha-me lembrado a definição que José Dias dera deles, "olhos de cigana oblíqua e dissimulada." Eu não sabia o que era obliqua, mas dissimulada sabia, e queria ver se podiam chamar assim. Capitu deixou- se fitar e examinar. Só me perguntava o que era, se nunca os vira, eu nada achei extraordinário; a cor e a doçura eram minhas conhecidas. A demora da contemplação creio que lhe deu outra idéia do meu intento; imaginou que era um pretexto para mirá-los mais de perto, com os meus olhos longos, constantes, enfiados neles, e a isto atribuo que entrassem a ficar crescidos, crescidos e sombrios, com tal expressão que... Retórica dos namorados, dá-me uma comparação exata e poética para dizer o que foram aqueles olhos de Capitu. Não me acode imagem capaz de dizer, sem quebra da dignidade do estilo, o que eles foram e me fizeram. Olhos de ressaca? Vá, de ressaca. É o que me dá idéia daquela feição nova. Traziam não sei que fluido misterioso e enérgico, uma força que arrastava para dentro, como a vaga que se retira da praia, nos dias de ressaca. Para não ser arrastado, agarrei-me às outras partes vizinhas, às orelhas, aos braços, aos cabelos espalhados pelos ombros, mas tão depressa buscava as pupilas, a onda que saía delas vinha crescendo, cava e escura, ameaçando envolver-me, puxar-me e tragar-me. (...)” Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional -Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 99 Julgue o item a seguir. O movimento literário ao qual pertence o trecho de romance, acima, é o Romantismo. Comentários Questão de interpretação de texto literário/conhecimento de características do movimento literário. Embora trate da situação de namorados, o trecho acima pertence à obra Dom Casmurro do realista Machado de Assis, o que pode ser depreendido a partir do nome das personagens. Percebam como a banca realizou o caminho oposto na cobrança dessa questão. O grau de dificuldade dessa questão é: médio. Gabarito: E. 26. (IAUPE – Polícia Militar do Estado de Pernambuco – Oficial – 2007 – adaptada) Leia o texto para responder à questão. Jantei triste. Não era a falta do relógio que me pungia, era a imagem do autor do furto, e as reminiscências de criança, e outra vez a comparação, e a conclusão... Desde a sopa começou a abrir em mim a flor amarela e mórbida do capítulo XXV, e então jantei depressa, para correr à casa de Virgília. Virgília era o presente; eu queria refugiar-me nele, para escapar às opressões do passado, porque o encontro do Quincas Borba tornara-me aos olhos do passado, não qual fora deveras, mas um passado roto, abjeto, mendigo e gatuno. Saí de casa, mas era cedo; iria achá-los à mesa. Outra vez passei no Quincas Borba, e tive então um desejo de tornar ao Passeio Público, a ver se o achava; a idéia de o regenerar surgiu-me como uma forte necessidade. Fui; mas já não o achei. Indaguei do guarda; disse-me que efetivamente ”esse sujeito” ia por ali às vezes. – A que horas? – Não tem hora certa. ASSIS, Machado de. Memórias póstumas de Brás Cubas, São Paulo: Egéria, 1980. p. 99. Julgue o item a seguir quanto à identificação do fragmento do texto com características do Realismo brasileiro. Quincas Borba tornara-me aos olhos do passado, não qual fora deveras, mas um passado roto, abjeto mendigo e gatuno = descrição e adjetivação objetivas. Comentários Questão de interpretação de texto literário/conhecimento de características do movimento literário. Questão que cobra conhecimento de mais de uma obra. No caso, roto, “abjeto mendigo e gatuno” são adjetivos que descrevem o passado olhado por Quincas Borba. A metáfora de “tornar-se os olhos do passado” lembra a teoria do reflexo realista. O grau de dificuldade dessa questão é: difícil. Gabarito: C. 27. (FUNCAB – SESC/BA: Analista em Literatura – 2009 – adaptada) TEXTO PARA AS PRÓXIMAS 2 PERGUNTAS Olhos de ressaca Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 100 Enfim, chegou a hora da encomendação e da partida. Sancha quis despedir-se do marido, e o desespero daquele lance consternou a todos. Muitos homens choravam também, as mulheres todas. Só Capitu, amparando a viúva, parecia vencer-se a si mesma. Consolava a outra, queria arrancá-la dali. A confusão era geral. No meio dela, Capitu olhou alguns instantes para o cadáver tão fixa, tão apaixonadamente fixa, que não admira lhe saltassem algumas lágrimas poucas e caladas... As minhas cessaram logo. Fiquei a ver as dela; Capitu enxugou-as depressa, olhando a furto para a gente que estava na sala. Redobrou de carícias para a amiga, e quis levá-la; mas o cadáver parece que a retinha também. Momento houve em que os olhos de Capitu fitaram o defunto, quais os da viúva, sem o pranto nem palavras desta, mas grandes e abertos, como a vaga do mar lá fora, como se quisesse tragar também o nadador da manhã. MACHADO DE ASSIS. Olhos de ressaca. In: Dom Casmurro. 8 ed. São Paulo. Ática. 1978. p. 133-4. Julgue o item a seguir. Do ponto de vista do narrador, a personagem que reage de modo aparentemente diferente dos demais é Capitu. Comentários Questão de interpretação de texto literário. Capitu, segundo Bentinho, estaria olhando para o defunto de maneira suspeita demais, apaixonada demais, que destoava do resto no velório e, sobretudo, revelava sentimentos inadequados. O grau de dificuldade dessa questão é: médio. Gabarito: C. 28. (FUNCAB – SESC/BA: Analista em Literatura – 2009 – adaptada) Julgue o item a seguir. O título do capítulo Olhos de ressaca, do livro Dom Casmurro, se refere à seguinte afirmação: “Os olhos de Capitu pareciam querer reter a imagem do defunto”. Comentários Questão de interpretação de texto literário. Uma das imagens poéticas com mais força no livro, os olhos de ressaca de Capitu traem o que sentem. Vão e voltam em seus sentimentos, como a maré, evidenciando o jogo da essência/aparência. O grau de dificuldade dessa questão é: médio. Gabarito: C. 29. (Cebraspe/Universidade de Brasília – 2013/1o semestre – adaptada) TEXTO PARA AS PRÓXIMAS 2 QUESTÕES Conto de escola A escola era na Rua do Costa, um sobradinho de grade de pau. O ano era de 1840. Naquele dia ― uma segunda-feira, do mês de maio ―, deixei-me estar alguns instantes na Rua da Princesa a ver onde iria brincar a manhã. Hesitava entre o morro de S. Diogo e o Campo de Sant’Ana, que não era então esse parque atual, construção de gentleman, mas um espaço rústico, mais ou menos infinito, alastrado de lavadeiras, capim e burros soltos. Morro ou campo? Tal era o problema. De repente disse comigo que o melhor era a escola. E guiei para a escola. [...] Raimundo recuou a mão dele e deu à boca um gesto amarelo, que queria sorrir. Em seguida, propôs- me um negócio, uma troca de serviços; ele me daria a moeda, eu lhe explicaria um ponto da lição de sintaxe. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 101 Não conseguira reter nada do livro, e estava com medo do pai. E concluía a proposta esfregando a pratinha nos joelhos... Tive uma sensação esquisita. Não é que eu possuísse da virtude uma ideia antes própria de homem; não é também que não fosse fácil empregar uma ou outra mentira de criança. Sabíamos ambos enganar ao mestre. A novidade estava nos termos da proposta, na troca de lição e dinheiro, compra franca, positiva, toma lá, dá cá; tal foi a causa da sensação. Fiquei a olhar para ele, à toa, sem poder dizer nada. Machado de Assis. Conto de escola. Internet:<www.dominiopublico.org>. Tendo como referência o fragmento acima, da obra Conto de escola, de Machado de Assis, julgue o item a seguir. No fragmento apresentado, é relatada uma situação que corresponde a um processo de incorporação de um valor social que gera conflito no narrador-personagem. Esse valor social é a liberdade de troca entre indivíduos. Comentários Questão de interpretação de texto literário. Pois ele estaria trocando um serviço (um bem não material), ou seja, a lição de sintaxe, em troca de moeda. Logo, o personagem põe-se em dúvida. O grau de dificuldade dessa questão é: médio. Gabarito: C. 30. (Cebraspe/Universidade de Brasília – 2013/1o semestre – adaptada) Julgue o item a seguir. No 3.º período do texto, para apresentar detalhe relativo ao tempo da narrativa, Machado de Assis utiliza estrutura sintática de aposto explicativo, que corresponde ao trecho entre travessões. Comentários Questão de Gramática aplicada à Literatura. A terceira oração começa logo em seguida, após o verbo “deixei-me”. O grau de dificuldade dessa questão é: difícil. Gabarito: E. 10 – REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de filosofia. Trad. Alfredo Bosi e Ivone Castilho Benedetti. 5. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007. Disponível em: http://tinyurl.com/y5d7eheb. Acesso em: 21 set. 2020. AZEVEDO, Aluísio de. O cortiço. Domínio público. Fonte: https://tinyurl.com/c454sss. Acesso em: 11 fev. 2020. CEREJA; William Roberto; MAGALHÃES, Thereza Cochar. Texto e interação:uma proposta de produção textual a partir de gêneros e projetos. São Paulo: Atual, 2005. IMDB. Cartazes oficiais de filmes. Disponível em: https://www.imdb.com/. Acesso em: 13 set. 2020 LOPES, Óscar; SARAIVA, António José. História da Literatura Portuguesa. 13. ed. Porto: Porto Editora, 1985. MARTINS, Nilce Sant’Anna. Introdução à estilística: a expressividade na língua portuguesa. 4. ed. São Paulo: Editora da USP, 2011 (Acadêmica, 71). PEREIRA, Lucia Miguel. Machado de Assis (estudo crítico e biográfico). Brasília: Senado Federal, 2019. POMPÉIA, Raul. O Ateneu. Rio de Janeiro: Biblioteca Universal Popular, 1963. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 102 QUEIRÓS, Eça de. O primo Basílio. Disponível em: https://tinyurl.com/yynxnls8. Acesso em: 05 out. 2020. ______. A ilustre casa de Ramires. Disponível em: https://tinyurl.com/y3f2klpz. Acesso em: 05 out. 2020. ______. Os Maias: episódios da vida romântica. São Paulo: Nova Alexandria, 2000. SCHWARZ, Roberto. Um mestre na periferia do capitalismo – Machado de Assis. 3. ed. São Paulo: Editora 34, 1997. TOLSTÓI, Liév. Anna Kariênina. Trad. Rubens Figueiredo. São Paulo: Cosac Naify, 2005. ZOLA, Émile. Thérèse Raquin. Trad. Sergio Flaksman. São Paulo: Peixoto Neto, 2007. 10.1 – Referências Bibliográficas das Imagens [1] Honoré Daumier – Carruagem de Terceira Classe. Disponível em: https://tinyurl.com/w5k5tfk. Acesso em: 11 mar. 2020. [2] A. Thiers – Historia del Consulado y del Imperio, 1879 "Congreso de Viena". Disponível em: https://tinyurl.com/qkplgtl. Acesso em: 11 mar. 2020. [3] H. Vernet – Barricade rue Soufflot. Disponível em: https://tinyurl.com/uvxbrrx. Acesso em: 11 mar. 2020. [4] B. Braqueais – Barricade Voltaire Lenoir Commune Paris 1871. Disponível em: https://tinyurl.com/tqzyf8t. Acesso em: 11 mar. 2020. [5] Proudhon atelier Nadar BNF Gallica. Disponível em: https://tinyurl.com/umdabnh. Acesso em: 11 mar. 2020. [6] Karl Marx 001. Disponível em: https://tinyurl.com/t6o66nw. Acesso em: 11 mar. 2020. [7] Madame Bovary 1857 (hi-res). Disponível em: https://tinyurl.com/uk9tsll. Acesso em: 11 mar. 2020. [8] Olavo Bilac – Via Láctea. Fonte: Domínio Público. Disponível em: https://tinyurl.com/y5lyhken. Acesso em: 11 mar. 2020. [9] Imagem de cérebro. Fonte: Pixabay. Disponível em: https://tinyurl.com/tv5mbcg. Acesso em: 11 mar. 2020. [10] Puxão de Orelha. In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras. São Paulo: Itaú Cultural, 2019. Disponível em: https://tinyurl.com/sgah47c. Acesso em: 11 mar 2020. (Verbete da Enciclopédia; ISBN: 978-85-7979-060-7). 11 – CONSIDERAÇÕES FINAIS Eu me coloco à disposição de vocês para sanar eventuais e possíveis dúvidas. Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos 103 Tenho a meta de responder ao Fórum de Dúvidas, com a qualidade e profundidade exigidas, assim como podem me encontrar em redes sociais. Versão Data Modificações 1 05/10/2020 Primeira versão do texto. 2 13/04/2022 Correção na resolução da questão 12 e introdução do novo Instagram. Professora Luana Signorelli Instagram: @profa.luana.signorelli Telegram: Luana Signorelli Facebook: /luana.signorelli YouTube: Professora Luana Signorelli Luana Signorelli Aula 04 Senado Federal (Técnico - Policial Legislativo) Literatura Nacional - Cebraspe 2022 www.estrategiaconcursos.com.br 38626603164915195 - Willy Clayton Alves dos Santos