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EDUCAÇÃO MATEMÁTICA: ESTRATÉGIAS E DESAFIOS W BA 06 59 _v 1. 0 22 © 2019 POR EDITORA E DISTRIBUIDORA EDUCACIONAL S.A. Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida ou transmitida de qualquer modo ou por qualquer outro meio, eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia, gravação ou qualquer outro tipo de sistema de armazenamento e transmissão de informação, sem prévia autorização, por escrito, da Editora e Distribuidora Educacional S.A. Presidente Rodrigo Galindo Vice-Presidente de Pós-Graduação e Educação Continuada Paulo de Tarso Pires de Moraes Conselho Acadêmico Carlos Roberto Pagani Junior Camila Braga de Oliveira Higa Carolina Yaly Giani Vendramel de Oliveira Juliana Caramigo Gennarini Nirse Ruscheinsky Breternitz Priscila Pereira Silva Tayra Carolina Nascimento Aleixo Coordenador Giani Vendramel de Oliveira Revisor Leonardo de Alcântara Moreira Editorial Alessandra Cristina Fahl Beatriz Meloni Montefusco Daniella Fernandes Haruze Manta Hâmila Samai Franco dos Santos Mariana de Campos Barroso Paola Andressa Machado Leal Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Jesus, Francis Roberta de J58e Educação matemática: estratégias e desafios/ Francis Roberta de Jesus, – Londrina: Editora e Distribuidora Educacional S.A. 2019. 120 p. ISBN 978-85-522-1471-7 1. Educação matemática. 2. Educação. I. Jesus, Francis Roberta de. Título. CDD 370 Responsável pela ficha catalográfica: Thamiris Mantovani CRB-8/9491 2019 Editora e Distribuidora Educacional S.A. Avenida Paris, 675 – Parque Residencial João Piza CEP: 86041-100 — Londrina — PR e-mail: editora.educacional@kroton.com.br Homepage: http://www.kroton.com.br/ mailto:editora.educacional%40kroton.com.br?subject= http://www.kroton.com.br/ 3 3 EDUCAÇÃO MATEMÁTICA: ESTRATÉGIAS E DESAFIOS SUMÁRIO Apresentação da disciplina 4 Pensamento geométrico na relação de continuidade entre a Educação Infantil e o Ensino Fundamental 7 Princípio fundamental da contagem no Ensino Fundamental 32 Grandezas direta e indiretamente proporcionais 56 Produtos notáveis e fatoração 80 Desenvolvimento do pensamento algébrico no Ensino Fundamental II 104 O Enem e as condições atuais do Ensino Médio 129 Estratégias e desafios para o ensino da matemática na atualidade 154 44 Apresentação da disciplina A presente disciplina, intitulada Educação Matemática: Estratégias e Desafios, tem como principal objetivo discutir aspectos interessantes para as condições atuais do ensino e da educação básica brasileira. Essa discussão se faz importante pelo fato da ocorrência de uma reforma curricular muito recente da educação básica. A referida reforma reorganizou metas, objetivos e conteúdos designados para cada etapa educativa, resultando em alterações na legislação nacional que diz respeito à educação, em metas distintas para o Plano Nacional da Educação e o cumprimento da existência de uma base comum para o ensino empreendido em todos os sistemas de educação nacional. A matemática não ficou excetuada dessa reorganização. Longe de fazermos algum juízo de valor, lidamos com o fato de que a educação matemática oferecida pelas instituições escolares tem sido alterada pelas determinações daquela reforma, estando fundamentada numa visão estrita de letramento, alinhada a políticas supranacionais de educação e de constituição social (BRASIL, 2018). Uma das mudanças empreendidas no ensino da matemática foi a designação do ensino de álgebra como campo específico do campo anteriormente designado por números e operações, que reuniam a aritmética num campo específico do conhecimento matemático. Outro exemplo de alteração foi a mudança do campo espaço e forma para geometria, e do tratamento da informação para probabilidade e estatística. Essas alterações podem ser vistas como um movimento de fortalecimento da presença da matemática no currículo formal e o estabelecimento da obrigatoriedade do ensino fundamental no desenvolvimento de competências e habilidades, procedimentos matemáticos, além de uma forte relação de acesso à tecnologia cada vez mais presente na sociedade atual. Tendo esses aspectos em vista e a necessidade de uma educação direcionada para as necessidades da sociedade atual, em tempos pós- modernos, a disciplina Educação Matemática: Estratégias e Desafios 55 5 aborda aspectos interessantes para esse contexto de mudanças em curso. Portanto, instiga reflexões e problematizações pertinentes a essa situação, bem como à função social da matemática escolar, tais como a formação integral do sujeito, para a formação cidadã, como fundamentação para o trabalho, para o acesso ao ensino superior, dentre outras, que se encontram descritas abaixo nos eixos discutidos pela disciplina. A forma tal qual a disciplina se encontra organizada objetiva que você, estudante da pós-graduação e agente da educação, conheça e reflita sobre estratégias que possam ser usadas no cotidiano escolar para o desenvolvimento do pensamento algébrico, atuando de forma reflexiva sobre a formação dos alunos para as próximas etapas da sua formação, conhecendo e retomando estratégias que possam ser usadas para organizar o trabalho docente de modos mais dinâmicos e diversificados e que promovam ações de democratização da aprendizagem em matemática. Os materiais que compõem a disciplina nos moldes de Leituras Fundamentais são constituídos pelas seguintes temáticas centrais: 1. desenvolvimento do pensamento geométrico na relação de continuidade entre a educação infantil e o ensino fundamental; 2. abordagem do princípio fundamental da contagem ao longo do ensino fundamental como instrumento para compreensão dos fenômenos multiplicativos e como fundamento necessário para a compreensão da análise combinatória no Ensino Médio; 3. compreensão das relações entre grandezas como possibilidade de construção do conhecimento intuitivo, proporcionando um processo de aprendizagem apoiado em práticas investigativas e de resolução das situações-problemas; 66 4. abordagem dos tópicos de produtos notáveis e fatoração como estratégias de cálculo e fundamentos para estratégias de cálculos e compreensão de diferentes aspectos da álgebra ao longo do ensino fundamental e de modo relacionado à etapa conseguinte; 5. o desenvolvimento do pensamento algébrico ao longo de todo o ensino fundamental de modo articulado às demais áreas da matemática e para desenvolver aprendizagens significativas; 6. a problematização referente ao Exame Nacional do Ensino Médio e as relações que podem ser estabelecidas com a formação oferecida pela educação básica como um todo, considerando as especificidades de sua organização atual; 7. a apresentação e problematização de desafios para o ensino da matemática ao longo da educação básica de modo a estabelecer relações necessárias aos aspectos diversos da vida dos estudantes, apontando para o uso de estratégias didático- metodológicas que signifiquem a ampliação da aprendizagem e da acessibilidade ao conhecimento matemático para todos. Por meio desse percurso espera-se que o estudante de pós-graduação, como agente promotor de educação matemática, reflita sobre as práticas tradicionais e costumeiras empreendidas para o ensino da matemática, de modo que se constitua em agente transformador do ensino da matemática na atualidade, levando em consideração práticas de ensino que possam, de algum modo, tornar a aprendizagem mais efetiva, autônoma, dinâmica e ao alcance dos diferentes estudantes que compõem o público-alvo da educação básica. Realizem ótimos estudos! 77 7 Pensamento geométrico na relação de continuidade entre a Educação Infantil e o Ensino Fundamental Autora: Francis Roberta de Jesus Objetivos • Refletir sobre a necessidade de estratégias para potencializar o desenvolvimento do pensamento geométrico. • Observar os conteúdos, competências e habilidadessob a perspectiva da continuidade entre diferentes níveis da educação básica. • Abordar a temática do ensino de polígonos para fundamentação do desenvolvimento dos pensamentos geométrico e algébrico. • Refletir sobre estratégias atuais para o ensino da geometria. 88 1. Contextualização Existem alguns aspectos da história da educação matemática que explicitam o lugar menor que era atribuído à geometria dentro das áreas da matemática abordadas nos contextos tanto curricular quanto escolar. Estudos históricos mostram que práticas de ensino enfatizavam fortemente a abordagem da aritmética ao longo de todo o período letivo e que discorriam sobre a geometria apenas quando houvesse tempo disponível. Essa realidade pertence a um passado não muito distante da atualidade. Portanto, é importante questionar sobre qual o lugar da geometria nos currículos escolares, seus objetivos, as funções na relação de integração, interdependência e continuidade entre as diferentes áreas da matemática e etapas da educação básica. A abordagem escolar da geometria necessita do desenvolvimento do pensamento geométrico a partir de uma abordagem menos restrita e que mais valorize essa área de conhecimento. Considerando, inclusive, a importância que esse tipo de pensamento tem para o desenvolvimento de aprendizagens vinculadas a outras áreas da matemática, como a própria aritmética e a álgebra, por exemplo. Assim, problematizar o ensino de geometria partindo da etapa da educação infantil e alcançando o ensino fundamental, questionando como essa relação se dá de uma etapa para outra e se faz numa importante tarefa reflexiva, será progressivamente discutido na presente Leitura Fundamental. 2. A importância do pensamento geométrico Lorenzato (1995, p. 4) afirma que muitos estudos necessitam ser realizados sobre o ensino de geometria e esses estudos estariam a cargo das investigações na área da educação matemática, a qual tem a missão de problematizar questões diversas. 99 9 Algumas delas são: tendo em vista as possíveis exigências do século XXI sobre seus cidadãos, qual deveria ser o currículo geométrico mínimo presente na educação? (LORENZATO; VILA, 1993). Qual é a Geometria necessária e conveniente para nós, brasileiros? Ela deveria ser a mesma para todo o continente brasileiro? Como aproveitar os recentes e enormes avanços tecnológicos, psicológicos e didáticos em favor do ensino e aprendizagem da Geometria? Onde colocar o ponto de equilíbrio dinâmico entre o intuitivo e o dedutivo, o concreto e o abstrato, o experimental e o lógico, tendo em vista uma aprendizagem significativa da Geometria? O pensamento geométrico envolve ações fundamentais que abrangem a percepção em geral, sejam elas: a observação, a percepção e a construção relacionadas às figuras geométricas, à dimensão, à direção, ao sentido, à localização e à movimentação no espaço. Para tanto, é necessário que a aprendizagem seja avaliada conforme as condições de reconhecimento de figuras e possíveis classificações: planas, não planas, regulares, irregulares, polígonos, não polígonos, poliedros, não poliedros, fractais, etc., e as manipulações que produzem redução, ampliação, rotação, transformações, composição, deslocamentos ou decomposição dessas figuras. Essas noções precisam ser abordadas desde as primeiras experiências da educação básica, problematizando a dimensão espacial e sua ocupação por objetos, sendo necessário classificar, a partir de critérios criados e estabelecidos, identificar, nomear, descrever, conhecer e compreender as principais propriedades desses corpos, o que requer a observação do mundo em que se vive, distinguindo as características atribuídas a cada uma das figuras e como se relacionam com aspectos do entorno dos contextos de vida, atribuindo-lhes significados, de modo que possam estabelecer semelhanças entre poliedros e embalagens, observação de superfícies, distinguir figuras planas de arredondadas e aquelas que rolam e que não rolam, a partir da observação e da interação que realizam cotidianamente com o/no mundo físico, por exemplo. 1010 O aspecto da visualização toma grande importância para o ato observatório pelo qual a criança poderá, progressivamente, classificar figuras, nomeá-las e relacionar formatos e figuras geométricas como forma de leitura do mundo e de comunicação matemática, o que significa conhecer, familiarizar-se e fazer uso da linguagem geométrica. Tanto nos termos que compõem uma figura, tais como faces, arestas, lados, vértices, diagonais, ângulos internos e termos ligados às dimensões (comprimento, largura e altura), quanto nos termos que relacionam conceitos a medidas e posicionamentos de um polígono ou de um poliedro em relação a outro e ao relacionamento entre nomenclaturas às composições de polígonos e poliedros, por exemplo, o que possibilita projetar modos como classificação de polígonos, conceituações e adoção de critérios para identificação dessas figuras geométricas e identificando padrões matemáticos contribui para o desenvolvimento do pensamento geométrico em geral. 2.1 Na educação infantil O Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (RCNEI) aponta que a geometria desempenha um importante papel na formação intelectual da criança (BRASIL, 1998), tendo em vista serem seus conteúdos extremamente significativos para o desenvolvimento do seu raciocínio e de outros diversos saberes vinculados à matemática e a outras áreas de conhecimento. Isso pode ser exemplificado com a semelhança geométrica associada aos estudos de proporcionalidade como objetivo de aprofundamento da compreensão desse segundo conteúdo, produzindo influências sobre os modos de compreensão das realidades e dos contextos de que as crianças fazem parte. Entretanto, na etapa da educação infantil, a formalização não deve ser antecipada, nem mesmo a preocupação com a sistematização dos conteúdos propostos deve tomar a centralidade das práticas didático- pedagógicas em geometria. Pelo contrário, deverão estar voltadas às experiências que as vivências investigativas podem proporcionar, bem 1111 11 como as aprendizagens dos conteúdos de geometria de modo situadas e significativo ao desenvolvimento do pensamento geométrico, estando vinculado às etapas tanto anteriores quanto posteriores àquelas em que os alunos se encontram. E também considerando as complexidades dos objetos de aprendizagem de geometria, as quais deverão estar adequadas para o momento da educação, do nível de compreensão e do desenvolvimento em que se encontram, de modo a valorizar a construção de noções básicas e elementares que contribuam para a elaboração de ideias fundamentais ao raciocínio e à compreensão geométricos. ASSIMILE O termo “educação integral” faz referência a uma perspectiva de desenvolvimento educacional que visa à formação humana de forma integral, o que quer dizer em sentido amplo e global. Reconhece a complexidade desse desenvolvimento de modo a criticar sua fragmentação nos aspectos físico, afetivo ou cognitivo e a valorizar uma visão que considera as plurais dimensões constitutivas do desenvolvimento humano, segundo a visão da potencialidade de desenvolvimentos plenos e singulares dos sujeitos envolvidos no processo educativo. Sendo a primeira etapa da educação básica obrigatória a partir dos 4 anos de idade, a educação infantil tem como objetivos o de iniciar e fundamentar aspectos relevantes para o desenvolvimento do pensamento geométrico. É o que a Base Nacional Comum Curricular (BRASIL, 2017) define como sendo “diferentes campos de experiência”, sendo eles: as relações consigo, com o outro e as organizações coletivas na infância; relações e linguagens corporais, gestuais e movimentos; relações com formas, sons, cores e traços; vivências com ênfase na fala, 1212 na escuta, nos diferentes modos de pensar, criar, imaginar e comunicar-se e, por fim, relações com quantidades, espaços, tempos, transformaçõese relações (BRASIL, 2017, p. 51). Por esse estabelecimento, o pensamento geométrico poderia ter lugar privilegiado no último campo de vivências, porém, poderá ser desenvolvido perpassando todos os demais, conforme a perspectiva de formação integral. Esses campos de vivências apresentam possibilidades para problematizar tanto fenômenos socioculturais quanto naturais que envolvem as experiências das infâncias em diversos espaços (rua, bairro, cidade, etc.) e tempos (dia e noite; hoje, ontem e amanhã, etc.), o mundo físico (seu próprio corpo, os fenômenos atmosféricos, os animais, as plantas, as transformações da natureza, os diferentes tipos de materiais e as possibilidades de sua manipulação, etc.) e o mundo sociocultural (as relações de parentesco e sociais entre as pessoas que conhece; como vivem e em que trabalham essas pessoas; quais suas tradições e seus costumes; a diversidade entre elas, etc.). Além disso, nessas experiências e em muitas outras, as crianças também se deparam, frequentemente, com conhecimentos matemáticos (contagem, ordenação, relações entre quantidades, dimensões, medidas, comparação de pesos e de comprimentos, avaliação de distâncias, reconhecimento de formas geométricas, conhecimento e reconhecimento de numerais cardinais e ordinais etc.). Portanto, a Educação Infantil precisa promover experiências nas quais as crianças possam fazer observações, manipular objetos, investigar e explorar seu entorno, levantar hipóteses e consultar fontes de informação para buscar respostas às suas curiosidades e indagações. (BRASIL, 2017, p. 40-41). 2.2 Caminhando para o ensino fundamental O caminho da etapa da educação infantil para o ensino fundamental necessita ser visto como um espaço de transição e um aspecto educacional que merece muita atenção, sobretudo no que se refere 1313 13 ao pensamento geométrico. Na educação infantil, deverá estar disperso a práticas de pesquisa, de observação, de manipulação de objetos em geral, com uso de materiais manipulativos com fins educativos, de modo disseminado e significativo aos diferentes campos de vivências, porém vinculado às capacidades de classificar os polígonos, estabelecer relações de semelhança e diferenças, descrever determinadas características, descrever os diferentes polígonos segundo essas características, bem como identificá-los, agrupá-los, reconhecer diferentes representações de um mesmo polígono, realizar construções e estabelecer relações com outros tempos, espaços e transformações. É necessário que a educação infantil desenvolva fundamentos impreteríveis para o aumento da complexidade do pensamento geométrico e que o ensino fundamental não rompa com o desenvolvimento anterior dessas complexidades, porém as retome, integre-as e dê continuidade, guardando a importância de relacioná-las aos demais conhecimentos em veiculação e aos objetivos de cada etapa educacional específica. Sendo assim, o caminho da educação infantil em direção ao ensino fundamental conta com que o aluno realize percursos de continuidades de sua escolarização e formação global em confronto à noção tradicional de fragmentação curricular, fragmentação da formação humana e fragmentação disciplinar dos conhecimentos veiculados no ambiente escolar. Ao longo da aprendizagem da temática polígonos, dificuldades podem ser antecipadas, tais como a identificação dos elementos que compõem os diferentes polígonos e a representação e/ou comunicação das diferentes propriedades de cada figura. Esses aspectos podem ser abordados pelo processo educativo por meio do oferecimento de oportunidades para experimentações, observações, registros, construções, desconstruções, movimentações no espaço 1414 de modo que a criança possa compreender aquelas mesmas propriedades e identificar os elementos constitutivos poligonais até mesmo na ausência dos modelos físicos, o que significa um grau determinado de abstração. Ações tais como observação de objetos, relações entre os polígonos e objetos familiares, identificação de características comuns, nomeação de figura e construção de representações diversas unidas às práticas de sistematização com estabelecimento de relações entre as aprendizagens e linguagem própria e linguagem geométrica proporcionam a aprendizagem geométrica. Desse modo, o desenvolvimento do pensamento geométrico poderá ser efetivado numa relação de aprofundamentos e de continuidades, segundo as habilidades descritas no quadro abaixo. Quadro I – Resumo das aprendizagens relacionadas ao desenvolvimento do pensamento geométrico na relação educação infantil-ensino fundamental. Desenvolvido com fundamento na base comum designada para cada etapa da educação básica Etapa Aprendizagens Educação infantil - Identificar, nomear adequadamente e comparar as propriedades dos objetos, estabelecendo relações entre eles. (A) - Interagir com o meio ambiente e com fenômenos naturais ou artificiais, demonstrando curiosidade e cuidado com relação a eles. (B) - Utilizar vocabulário relativo às noções de grandeza (maior, menor, igual, etc.), espaço (dentro e fora) e medidas (comprido, curto, grosso, fino) como meio de comunicação de suas experiências. (C) - Utilizar unidades de medida (dia e noite; dias, semanas, meses e ano) e noções de tempo (presente, passado e futuro; antes, agora e depois), para responder a necessidades e questões do cotidiano.(D) - Identificar e registrar quantidades por meio de diferentes formas de representação (contagens, desenhos, símbolos, escrita de números, organização de gráficos básicos, etc.).(E) 1515 15 Ensino fundamental – anos iniciais - Localizar objetos e pessoas no espaço, utilizando diversos pontos de referência e vocabulário apropriado e indicação de mudanças de direção e sentido.(F) - Reconhecer e fazer relações com objetos familiares do mundo físico – figuras geométricas espaciais. (G) - Reconhecer formatos de faces de figuras geométricas espaciais – figuras geométricas planas.(H) - Esboçar roteiros e plantas simples. (I) - Reconhecer e caracterizar figuras geométricas espaciais (cubo, bloco retangular, pirâmide, cone, cilindro e esfera). (J) - Reconhecer e caracterizar figuras geométricas planas (círculo, quadrado, retângulo e triângulo). (K) - Reconhecer e analisar características e planificações de figuras geométricas espaciais (cubo, bloco retangular, pirâmide, cone, cilindro e esfera). (L) - Reconhecer e analisar características de figuras geométricas planas (triângulo, quadrado, retângulo, trapézio e paralelogramo). - Reconhecer e analisar congruência de figuras geométricas planas e seus ângulos. (M) - Analisar situações de paralelismo e de perpendicularismo, inclusive em deslocamentos e localizações. (N) - Reconhecer, representar, planificar e caracterizar figuras geométricas espaciais (prismas e pirâmides). (O) - Identificar e classificar ângulos retos e não retos: uso de dobraduras, esquadros e softwares. (P) - Analisar situações que envolvam simetria de reflexão. (Q) - Reconhecer o plano cartesiano, suas coordenadas cartesianas (1º quadrante) e representações de deslocamentos nesse plano. (R) - Ampliar e reduzir figuras poligonais em malhas quadriculadas: reconhecimento da congruência dos ângulos e da proporcionalidade dos lados correspondentes. (S) Fonte: BRASIL, 2017. Os itens identificados de “A” a “S” no quadro relacional entre as etapas da educação básica em questão expressam um percurso possível para o desenvolvimento do pensamento geométrico no que diz respeito ao ensino de polígonos para crianças. Com suas capacidades de compreensão e ao longo de um processo de formalização consoante a esses aspectos e segundo a lógica da ampliação e do aprofundamento dos conteúdos que compõem a abordagem escolar obrigatória mínima 1616 para o ensino de polígonos, passando por fronteiras mais fluidas e contínuas em relação às duas primeiras etapas que trabalham esse tema geométrico na educação básica, processo ilustradopela imagem abaixo: Figura 1 – Abordagem curricular do ensino de polígonos Fonte: imagem desenvolvida pela autora, com base na abordagem de ampliação e continuidade dos conteúdos poligonais a serem ensinados ao longo da educação infantil, em seu processo de continuidade na etapa seguinte. 2.3 Desenvolvimento do pensamento geométrico e organização do trabalho docente: relação importante para a aprendizagem A fim de que os diferentes conteúdos designados curricularmente para cada etapa da educação básica sejam desenvolvidos em continuidade, e para que a aprendizagem seja vista como processo e o ensino como constituído necessariamente pelo planejamento de experiências em etapas comunicativas e construtivas de conhecimentos, é necessário que a organização do trabalho docente envolva o conhecimento das formas de aprendizagem dos alunos, do contexto educacional, social e cultural em que se encontram. Também é necessário o conhecimento do conteúdo que será abordado, conhecimento pedagógico do conteúdo, Complexidade Formalização Educação Infantil Ensino Fundamental Conteúdos geométricos em que há expressão direta do objeto de ensino e de aprendizagem polígonos Movimento de ampliação e de aprofundamento dos aspectos que deverão ser desenvolvidos com o objeto da aprendizagem relativa a figuras poligonais Desenvolvimento do pensamento geométrico 1717 17 a saber, de estratégias, metodologias e de aproximações didáticas que permitam desenvolver por etapas o conteúdo que deverá ser ensinado, estabelecendo o nível de generalização, abstração e formalização que se possa alcançar com os alunos, considerando suas identidades de aprendizagens, estabelecimento de pontos, contextos e práticas de partida, de investigação e de problematização. Cada um desses conhecimentos instrumentalizam a prática docente do ensino e valoriza os conteúdos específicos que apresentam a necessidade do conhecimento do professor para efetivar práticas de ensino significativas, pois envolvem a necessidade de a geometria passar por tratamento menos genérico e que problematize o ensino de cada um dos objetos de conhecimento que aparecem no currículo com o objetivo do desenvolvimento do modo de pensar geometricamente. Essa preocupação é necessária tanto do ponto de vista do sujeito que aprende quanto daquele que ensina. Esses conhecimentos habilitam a criação de situações de aprendizagens à compreensão e uso das ações, argumentações e produções dos alunos para “ampliar a compreensão e expandir o leque de suas possibilidades interpretativas por meio do acesso a conexões poderosas e práticas apropriadas” (CARVALHO, 2017, p. 25), a fim de comunicar conceitos por meio da prática de ensino, que pode ser constituída por momentos de abordagem de “definições, algoritmos, metáforas, imagens, aplicações, gestos, entre outros” (COUTINHO; BARBOSA, 2016, apud CARVALHO, 2017, p. 36), que são realizações não fixas, mas que emergem de diferentes escolhas a partir da necessidade de ensinar, seguindo objetivos específicos e segundo uma visão particular docente, que problematize as seguintes abordagens didáticas: Tema geral: estudo de polígonos/ Tema específico: estudo de quadrados. 1818 Figura 2 – Abordagem de situação de aprendizagem 1. A partir de uma definição formal – polígono convexo cujos lados e ângulos são congruentes. 2. A partir de uma imagem específica ou, ainda, de uma representação geométrica daquela figura – desenho de um quadrilátero. 3. A partir de uma aplicação, um problema, contexto ou situação. 4. A partir de associações entre a figura a um objeto presente em contextos de uso cotidiano – faces de coletâneas embalagens –, envolvendo as dimensões matemáticas didático- pedagógicas específica e a instituída. Fonte: Elaborada pela autora, com base na obra de Carvalho (2017). Nesse sentido, objetivar as habilidades de classificação de polígonos variados quanto ao ângulos e ao número de lados envolve a criação de procedimentos didáticos que motivem os alunos a classificar figuras planas, o que pode envolver: Figura 2 – Aspectos envolvidos em um procedimento de ensino fundamentado nas diferentes dimensões de conhecimento que compõem a organização do trabalho docente e sua realização Fonte: desenvolvida pela autora. O procedimento acima envolve a perspectiva que abarca os itens 3 e 4 acerca das práticas de ensino. Deverá ser norteado pelos objetivos da prática de ensino, considerando a necessidade de superar rupturas em relação ao conhecimento matemático, às etapas educacionais e envolver observação, manipulação, movimentação e deslocamento de objetos, análise de registros e representações diversas, uso de recursos didáticos, reflexão docente e discente sobre as atividades desenvolvidas, Situação- problema Prática social Contexto Estabelecimento de critérios *Instituídos *Estabelecidos coletivamente Exploração de figuras Exploração de figuras Revisão de conteúdos estudados anteriormente Nomenclaturas Ângulos Lados Paralelismo Perpendicularismo Características Classificação Composição Decomposição Medidas Área Simetria Perímetro Quadriláteros Triângulos Poliedros Planificações Círculos Circunferências 1919 19 uso de tecnologias de apoio, as organizações coletivas dos alunos para compartilhamentos, discussões e argumentações em relação à linguagem matemática, à sistematização e à abstração progressivas (BRASIL, 2017). Assim, o pensamento funcional e as transformações geométricas associadas às representações, às construções e às interdependências se tornam essenciais para o desenvolvimento do pensamento geométrico e devem elencar características das formas tridimensionais e bidimensionais associadas a figuras espaciais e às suas planificações para que os alunos possam nomeá-las e comparar polígonos usando diferentes critérios e dimensionem espaços com a percepção de relações de tamanho e forma. Além disso, deverão interpretar, descrever e representar posições de movimentações no espaço a partir de análises, estudar simetrias, rotações e translações que favoreçam a compreensão de diferentes aspectos da geometria dinâmica. Desse modo, ensinar geometria no ensino fundamental envolve considerar as relações entre o aluno e o saber geométrico por meio de experiências contextualizadas, da resolução de problemas e de aprendizagens situadas que conduzam a diferentes percursos para se pensar geometricamente e fazer matemática no contexto escolar com diferentes recursos. Para investigarem uma situação que possam enfrentar, a partir do contexto situado da prática sociocultural de ir ao teatro, por exemplo, poderão deparar-se com uma situação semelhante a esta: os assentos estão dispostos em 12 fileiras e 8 colunas. Como essa situação poderia ser problematizada do ponto de vista geométrico? Como seria abordada, considerando os conhecimentos docentes de diferentes naturezas, a partir da perspectiva da organização de uma prática de ensino específica? Como levar em consideração as relações acima citadas? Como poderiam ser problematizados objetos de conhecimento relacionados à unidade temática dos polígonos? Como poderia ser 2020 articulada a outras áreas da matemática? Como associar essa situação à aritmética, aos conceitos de área, perímetro e a outras configurações retangulares semelhantes e diferentes, à classificação e à descrição de polígonos? E a outras situações-problemas significativas aos alunos? Como trabalhar conceitos relevantes para o desenvolvimento do pensamento geométrico e encadeá-los a outros já consolidados e outros ainda que necessitam ser introduzidos? Como adaptar a abordagem do problema a determinado estágio de determinada etapa da educação básica? Como segmentar etapas para o ensino dos conceitos em questão? Como contribuir para a percepção espacial da criança por diferentes pontos de vista? Como a situação proposta e o percurso trilhado contribuempara o desenvolvimento do raciocínio geométrico? Como pensar ou representar o espaço, uma figura ou um objeto na ausência do mesmo ou fora do campo sensível? Como as definições de ponto, de reta e de plano se relacionam com o campo perceptivo da criança a partir da situação dada? Essas são questões que podem ser colocadas para todas e quaisquer situações de ensino, com o objetivo de indicar que tipos de metodologias e de práticas de ensino precisam ser problematizadas. 3. Uma ampliação possível: relações entre os pensamentos geométrico e algébrico Figura 3 – Observação de triângulos presentes na imagem a partir das características do polígono Fonte: elaborada pela autora. 2121 21 Tal como explicitado na introdução desta leitura, existe uma cultura de centralidade do ensino da matemática na abordagem do pensamento numérico e aritmético. Contudo, ser hábil nos conteúdos e procedimentos aritméticos não é suficiente para que os alunos da educação básica desenvolvam habilidades específicas do raciocínio geométrico. Nem mesmo colabora para a formação integral, pois, partindo de uma situação-exemplo em que poderiam ser questionados sobre quantos triângulos podem-se visualizar numa imagem tal como a que se encontra ao lado (Figura 3), os alunos poderão enfrentar desafios referentes ao fato de não terem sido apresentados números e nem medidas, exatamente pelo fato de a análise da imagem e uma possibilidade de devolutiva à questão dentro de um contexto situado exigir o estabelecimento de relações entre as imagens e um raciocínio visual que apresenta diferenças em relação ao aritmético, o que envolve também uma percepção específica, que evoque conceitos, elementos, características e a linguagem geométrica como fatores relevantes para o desenvolvimento desse tipo de pensamento, a saber, geométrico. Em relação ao pensamento funcional, também necessário para analisar a imagem acima e dar uma devolutiva à questão feita, além da disposição e da apresentação das formas nela presentes, podem desempenhar o papel de apoio para a compreensão da situação, com certo grau de complexidade. Ao levar em conta a necessidade dos conhecimentos geométricos que permitam aos alunos reconhecer, identificar e descrever um determinado triângulo e triângulos em geral, além da habilidade de estabelecer relações entre polígonos e polígonos dessa classe. Essas possibilidades levam a concluir que a relação entre a álgebra e a geometria é um caminho possível para potencializar tanto o pensamento algébrico quanto o geométrico e de forma relacionada, consoante à visão da integralidade. Considerando o caso do ensino dos elementos e das características poligonais como um exemplo, é possível construir e descrever aquelas mesmas figuras no plano cartesiano, definindo pontos, segmentos de reta 2222 e planos, a fim de que os alunos compreendam e distingam, inclusive, aspectos de figuras bi e tridimensionais, de modo a associarem aqueles elementos a eixos, direção, plano, sentido, por meio de coordenadas. A relação entre padrões e regularidades também pode ser expressão do ensino de geometria interligado a outras áreas da matemática. Na relação com o pensamento algébrico, possibilitam o desenvolvimento dos aspectos de formalização e generalização e que podem ser observados em repetições cujas organizações são apresentadas como aspectos regulares organizados no espaço. Essas repetições organizadas espacialmente podem ser manipuladas e guiadas sintaticamente em relação à geometria e em relação à álgebra e podem ser expressadas tanto aritmeticamente quanto por meio de relações, e com o uso de uma linguagem específica que expresse essas relações de forma generalizada. Branco (2008), fundamentada no trabalho de Zazkis e Liljedahl (2008), explicita a existência de padrões cíclicos que se apresentam em sequências de sons, sequências de formas, sequências de números e que podem ser traduzidos de uma situação para outra, permitindo verificar como essas repetições são formadas. Os últimos autores mostram um percurso de ensino em que crianças, mesmo muito pequenas, desde a educação infantil e ao longo do ensino fundamental, identificam a reapresentação de uma determinada unidade sequencial de elementos em padrões diversos, sendo essa repetição visível em um comprimento n. No caso, apresentam situações de ensino mostrando que no processo de desenvolvimento do pensamento geométrico apoiado no algébrico (vice-versa) pode-se conduzir um processo investigativo em que se pode questionar se é possível determinar o elemento conseguinte a partir do comprimento dado inicialmente, pelo que os alunos poderão observar uma igualdade entre cada elemento constituinte dos padrões e seus primeiros elementos, ou, ainda, entre cada elemento do padrão e o elemento numa posição anterior ao padrão dado. Essa situação permite a continuidade da sequência do padrão oferecido, pela percepção da unidade que se repete, a fim de determinar ordens dos elementos e 2323 23 buscar regularidades, terminando por estabelecer generalizações, o que é progressivamente desenvolvido ao longo da educação básica e de forma apropriada em cada um de seus ciclos. Paulus Gerdes é um teórico que realizou diversos estudos étnicos relevantes para a história da educação matemática. A partir da observação da prática sociocultural de cestarias em diferentes culturas de povos africanos, tais como em Moçambique, observou exaustivamente a produção de padrões e como se relacionavam às linguagens numérica, geométrica e algébrica, além de produzir análises diversas e categorias inovadoras de cálculos superiores. Verificou num contexto específico que através do entrelaçamento de tiras na produção de cestarias de diferentes culturas africanas, padrões são criados, sendo as figuras abaixo uma ilustração dessas práticas: Figuras 4 e 5 – Ilustração do entrelaçamento de tiras, uma prática realizada por diversas culturas de povos africanos 4 5 Fonte: GUERDES, 2012, p. 65. Guerdes explicita em seus estudos que há a possibilidade de uma forte relação entre os contextos sociocultural e educacional, bem como de reconhecimento dos conhecimentos geométricos presentes nas práticas de cestarias, sendo possível a relação com o conhecimento algébrico. A mudança dos ângulos das dobras das tiras, por exemplo, é uma das problematizações empreendidas pelo pesquisador, que mostra que podem produzir diferentes dobragens, do mesmo modo que imagens e padrões distintos criados pelo efeito da variação angular sobre as tiras que compõem as cestas, o que poderá ser analisado a partir da quantidade de triângulos necessários para construir cada tipo de padrão, A e B, por exemplo. 2424 Problematizar a continuação das dobragens, quais seriam as próximas sequências, as posições ocupadas pelos triângulos ou determinar um elemento seguinte específico buscando uma regra que determina a sequência são relações que permitem ao aluno: (a) a identificação do reconhecimento da regularidade; (b) estabelecer relações entre a posição do elemento na sequência e a sua forma; (c) verificação do estabelecimento de uma correspondência entre as ordens e as figuras presentes no padrão; (d) a identificação do método de generalização para determinar elementos da sequência que não podem ser visualizados nas imagens e, por fim, (e) a identificação de um procedimento de generalização para a regra de formação da sequência (BRANCO, 2008). Pelo que se tornam competentes em utilizar modelos matemáticos para produzir representações que expressam compreensões sobre relações e variações quantitativas e qualitativas que vêm a ser os aspectos da alternância (variação de um conjunto ou como relação entre termos sucessivos dentro do próprio padrão fornecido) presente nos padrões com repetições, componente de progressões geométrica ou aritmética) e componente do aspecto simétrico do padrão, ou, ainda, o aspecto linear, nos casos expressos poran+b, por exemplo, em que se apresenta o estabelecimento de relações e de representação por meio de expressões. Esses aspectos mostram que a álgebra pode ter como procedimento de desenvolvimento desse tipo de raciocínio a exploração e transformação de padrões como ponto gerador de uso e da compreensão da sintaxe algébrica, o que pode ocorrer em situações de aprendizagens em que os alunos sejam incitados a produzir relações funcionais entre os padrões observados e as suas ordens, o que seria outro aspecto da ampliação e do aprofundamento relativos aos pensamentos geométrico e algébrico. PARA SABER MAIS Com o objetivo de aprofundar os estudos em relação à mobilização de conceitos matemáticos tomando diferentes práticas socioculturais como ponto de partida e unidades de 2525 25 problematização em contextos de aprendizagem, a leitura da obra Etnomatemática: cultura, matemática, educação, de Paulus Gerdes, é indicada. Para acessar a obra, consulte as referências bibliográficas desta Leitura Fundamental. 4. Considerações finais • Ao longo do percurso realizado nesta Leitura Fundamental, foi possível ter contato com discussões normativas, investigações e contribuições teóricas que apontam para a necessidade de atenção para os processos de ensino e condições de aprendizagem atuais da geometria. • Abordar o estatuto do ensino da geometria na educação infantil, no ensino fundamental e na mudança que caracteriza a passagem de um nível a outro de modo inter-relacionado e significativo, reflexões sobre a necessidade de estratégias para potencializar o desenvolvimento do pensamento geométrico sem deixar de abordar a temática do ensino de polígonos para fundamentação do desenvolvimento desse tipo de pensamento e do algébrico levou a refletir sobre estratégias para o ensino da geometria. TEORIA EM PRÁTICA Imagine que você trabalha em uma rede de ensino (privada, filantrópica ou pública) e se deparou com um convite feito pelo órgão responsável de supervisão e de gestão educacional dessa rede, solicitando uma ação formativa a um grupo de professores de matemática que trabalha com crianças de 4 a 12 anos de idade na educação formal. Dado seu aceite para ministrar a formação e passado o contexto de dificuldades de aprendizagem e para o ensino 2626 de geometria e de álgebra, planeje uma formação para este público-alvo docente. Para seu planejamento, retome à seção 2.3 da presente Leitura Fundamental, considerando a necessidade de problematizar situações de sala de aula e da prática cotidiana escolar que contemple os questionamentos apresentados naquela sessão: como esta situação poderia ser problematizada do ponto de vista geométrico? Como seria abordada considerando os conhecimentos docentes de diferentes naturezas, a partir da perspectiva da organização de uma prática de ensino específica? Bons estudos! VERIFICAÇÃO DE LEITURA 1. Por qual razão, dentre as listadas abaixo, a discussão sobre o ensino da geometria é uma ação educacional necessária na atualidade? Assinale a alternativa que aponta uma razão válida e real apontada pelos estudos da história da educação matemática. a. Existem alguns aspectos da história da educação matemática que explicitam o lugar maior e privilegiado que era atribuído à geometria desde as primeiras organizações escolares brasileiras. b. Estudos históricos mostram que práticas de ensino que enfatizavam fortemente a abordagem da geometria ao longo de todo o período letivo e que abordavam a álgebra apenas quando houvesse tempo disponível pertencem a um passado não muito distante da atualidade. 2727 27 c. Os questionamentos sobre qual o lugar da geometria nos currículos escolares, seus objetivos, as funções na relação de integração, interdependência é uma discussão desnecessária, tendo em vista a elevação dos índices de aprendizagem nos últimos 20 anos. d. Existem alguns aspectos da história da educação matemática que explicitam o lugar indiferente atribuído à geometria nos currículos escolares, sendo este domínio menos importante para a formação cidadã. e. Há aspectos da história da educação matemática que apontam para o lugar menor que era atribuído à geometria dentro das áreas da matemática abordadas nos contextos tanto curricular quanto escolar. 2. Assinale a alternativa que apresenta as ações fundamentais que o pensamento geométrico envolve, considerando a necessidade de desenvolvimentos impreteríveis dessas ações para potencializar o desenvolvimento do pensamento geométrico no percurso da educação básica. a. Observação, percepção, classificação, construção e orientação espacial. b. Síntese, análise, ordem, classes e orientações espacial. c. Observação, classificação, ordem, seriação e orientação espacial. d. Quantificação, visualização, cálculo mental e classificação. e. Observação, manipulação, construção, análise, argumentação e hipotetização. 2828 3. Sobre a relação entre a etapa da educação infantil e a etapa do ensino fundamental na educação básica, é correto afirmar que: a. É necessário que a educação infantil deixe de desenvolver fundamentos impreteríveis para o aumento da complexidade do pensamento geométrico, sendo esta função especificamente do ensino fundamental. b. O ensino fundamental tem como objetivo romper com o desenvolvimento dos fundamentos impreteríveis para a diminuição da complexidade do pensamento. c. A etapa da educação infantil tem a missão de iniciar o processo de desenvolvimento do pensamento geométrico, partindo das etapas de generalização, abstração e do uso da linguagem formal, com crianças de 4 a 5 anos, conforme normatiza a Base Nacional Comum Curricular. d. A educação infantil tem como preocupação o desenvolvimento dos fundamentos impreteríveis para o aumento da complexidade do pensamento geométrico, que devem ser continuados ao longo do ensino fundamental, sob a perspectiva de retomada, ampliação e aprofundamento dos conceitos geométricos. e. Pelo fato de as complexidades serem decrescentes, cada etapa da educação básica deverá preocupar- se com seus objetivos específicos, sendo a transição de uma etapa a construções de percursos distintos e isolados na escolarização dos alunos, o que é natural ao ser humano. 2929 29 Referências bibliográficas BRANCO, N. C. V. O estudo de padrões e regularidades no desenvolvimento do pensamento algébrico. 2008. 251 f. Dissertação (Mestrado). Lisboa: Universidade de Lisboa – Faculdade de Ciência – Departamento de educação – Área de Especialização em Didática da Matemática, 2008. BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: Matemática. Brasília, DF: MEC/SEF, 1997. . Secretaria de Educação Fundamental. Referenciais Curriculares Nacionais de Educação Infantil. v. 3. Brasília, DF: MEC/SEF, 1998. . Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: Secretaria de Educação Básica, 2017. CARVALHO, H. A. F. de. Aprendendo a ensinar Geometria nos anos iniciais do ensino fundamental: um estudo com alunos de pedagogia do curso de uma universidade federal mineira. 2017. 192 f. Dissertação (Mestrado Profissional) – Departamento de Matemática, Universidade de Ciências Exatas e Biológicas, Universidade Federal de Ouro Preto, Ouro Preto, 2017. DOBRÁNSZKY, E. A.; MONTEIRO, A. (Org.) Cotidiano escolar: questões de leitura, matemática e aprendizagem. 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Portanto, questionar qual o lugar da geometria nos currículos escolares, seus objetivos, as funções na relação de integração, interdependência e continuidade entre as diferentes áreas da matemática e etapas da educação básica e para a formação humana e cidadã. Questão 2 – Resposta A O pensamento geométrico envolve ações fundamentais que abrangem a percepção em geral, sejam elas a observação, a percepção e a construção representativa relacionadas às figuras geométricas, à dimensão, à direção, ao sentido, à localização, à movimentação no espaço. Essas noções necessitam ser abordadas nas primeiras experiências da educação básica, problematizando a dimensão espacial e sua ocupação por objetos, sendo necessário classificar a partir de critérios criados e estabelecidos e identificar, nomear, descrever, conhecer e compreender as principais propriedades desses corpos, o que requer a observação do mundo em que se vive, distinguindo as características atribuídas a cada uma das figuras e como se relacionam com aspectos do entorno dos contextos de vida, atribuindo-lhes significados de diferentes ordens. Questão 3 – Resposta D É necessário que a educação infantil desenvolva fundamentos impreteríveis para o aumento da complexidade do pensamento geométrico e que o ensino fundamental não rompa com o desenvolvimento anterior dessas complexidades, porém as retome, integre e dê continuidade guardando a importância de relacioná- las aos demais conhecimentos em veiculação e aos objetivos de cada etapa educacional específica. O caminho da educação infantil em direção ao ensino fundamental conta com que o aluno realize percursos de continuidades de sua escolarização. 323232 Princípio fundamental da contagem no Ensino Fundamental Autora: Francis Roberta de Jesus Objetivos • Conhecer o papel do princípio fundamental da contagem para o desenvolvimento do pensamento numérico e raciocínio lógico-matemático ao longo da educação básica. • Compreender a importância de abordagens didático- metodológicas para a promoção e identificação, caracterização, compreensão e generalização de fenômenos multiplicativos. • Compreender a necessidade do estabelecimento de relações entre o princípio fundamental da contagem com fundamento para o desenvolvimento de habilidades necessárias ao longo do ensino médio. 3333 33 1. Contextualização O tema central da presente Leitura Fundamental é de extrema importância para o alcance dos objetivos gerais de matemática para a educação básica, sobretudo do desenvolvimento da competência numérica. Essa competência está relacionada à formação, por meio da qual os alunos sejam capazes de realizar observações sistemáticas a ponto de questionar, buscar percursos e soluções, representar, comunicar informações referentes a aspectos quantitativos e qualitativos de/em diferentes contextos de práticas socioculturalmente estabelecidas. Um exemplo seria a solução de problemas de contagem, sendo o aluno capaz de apresentar de quantas maneiras diferentes se podem contar elementos de coleções diferentes, como contar essas coleções quando se apresentam restrições à situação apresentada e a comparação entre as contagens realizadas em ambos os casos, sendo possível a aplicação do Princípio Fundamental da Contagem como recurso, pelo que podem lançar mão de uma ferramenta matemática para modelar as situações distintas. Compreendendo essas necessidades como um processo que pode ser contemplado em meio às funções educativas, conhecer o papel do Princípio Fundamental da Contagem no desenvolvimento da competência numérica e abordagem deste tema para a produção argumentativa em relação a diferentes fenômenos e problemas são fundamentais para o desenvolvimento de uma formação diversa e que problematize múltiplos contextos. Discussões sobre esses aspectos serão apresentadas adiante. 2. Princípio fundamental da contagem O princípio fundamental da contagem (PFC) pode ser compreendido como um recurso para realizar contagem, de grande importância para o desenvolvimento da competência numérica de crianças, adolescentes 3434 e adultos, e influenciará suas capacidades de compreensão aritmética a procederem à resolução de problemas que envolvam as diferentes áreas da matemática. Dificuldades relativas à contagem poderão repercutir em dificuldades relativas aos diversos tipos de pensamento matemático,bem como lógico. A contagem estabelece a necessidade de compreensão dos seguintes aspectos: • a noção de ordem; • a noção de equivalência; • diferentes sequências numéricas; • diferentes modos de quantificar atributos; • interpretação de argumentos fundamentados em quantidades; • estimativas; • cardinalidade; • ordinalidade; • contagem um a um; • agrupamentos e comparações; • cálculo mental; • compreensão do funcionamento e manipulação de propriedades do sistema decimal de numeração (posicionalidade, composição, decomposição, ordens, classes, base decimal, potência, múltiplos, leitura e diferentes representações numéricas). Ao longo do processo de compreensão desses princípios, os alunos desenvolverão capacidade cada vez mais abstrata de contagem, analisando, por exemplo, situações em que a ordem é determinante (situações de ordem estável) para a contagem e quando se faz irrelevante indicação de quantidades, indicação de ordem, organização de informações e identificação em diferentes situações cotidianas, ou, 3535 35 ainda, situações matemáticas e cotidianas em que a contagem se faz necessária para compreender e atuar naquele determinado contexto. Para tanto, as noções relativas ao pensamento numérico, incluindo práticas de contagem, requerem uma noção aprofundada diante de tarefas que envolvam contagens simples, medições, combinações de elementos de conjuntos distintos, de problemas geométricos, de forma que reconheçam diferentes usos dos números com apoio das possíveis relações de contagem. Diante dessas tarefas, os alunos deverão reconhecer qual tipo de contagem é necessária e como organizá-la, sendo os procedimentos combinatórios uma dessas possibilidades, a fim de determinar as combinações possíveis dentro da situação que estabelece uma referida tarefa e as quantidades de combinações possíveis ao contexto, respeitando os critérios que se apresentem logicamente como necessários. Um desses critérios é a análise da situação proposta de modo a verificar o tipo de relevância da ordem, as etapas, os agrupamentos ou fatos apresentados pela situação e modos de combiná-los, caso a relação de contagem necessária seja a de análise de possibilidades. Por exemplo: uma situação que envolve dois fatos que indicam que uma atividade possa ser realizada de a e b maneiras distintas, cuja combinação implicará a x b como o total de maneiras distintas de realização dessa tarefa. Indicando o produto entre as quantidades de elementos dos conjuntos a e b e a x b o total das combinações possíveis, ou seja, o produto entre os dois fatores independentes que caracterizaram a situação apresentada. Assim, é possível afirmar que o PFC está relacionado a situações que envolvam possibilidades de um evento determinado ocorrer e que podem ser organizados de formas diferentes, de modos (pessoas numa fila, objetos em recipientes, categorias distintas), combinações (peças de roupas, sabores de sorvete, placas de automóveis, modelos de produtos, etc.). Sendo a estrutura elementar para atividades de combinações em que se tornam impreteríveis a análise e o desenvolvimento de técnicas de contagem e de organização das mesmas. 3636 O PFC está encarregado de estudar habilidades de contagem, sempre contextualizadas, em uma situação de escolha ou de combinação. Considerando a seguinte situação: três amigos moram num mesmo bairro, sendo suas casas próximas. O amigo A deseja ir à casa de C, sendo que a casa de B se encontra entre as outras duas. Sabendo que não existe acesso direto e que existem três ruas diferentes que ligam diretamente a casa de A à casa de B e duas ruas que ligam a casa deste último à de C, de quantas maneiras diferentes é possível que A cumpra seu objetivo? Figura 6 – Visualização de percurso Fonte: Elaborada pela autora. Um modo de comumente utilizado para organizar a descrição dessas possibilidades é pela construção de Árvores de Possibilidades ou Diagrama de Possibilidades, como o exemplo seguinte: Figura 7 – Esquema representativo de percurso A B B B C C C C C C m n o 1 1 1 2 2 2 (m, 1) (m, 2) (n, 1) (n, 2) (o, 1) (o, 2) Fonte: Elaborado pela autora. 3737 37 As relações (m, 1), (m, 2), (n, 1), (n, 2), (o, 1) expressam as possibilidades de tomada de decisão sobre o caminho a seguir em dois momentos distintos: de A para B e de B para C. A organização das etapas mostra o princípio que as relaciona entre si ao considerar dois eventos diferentes, sendo que o primeiro evento pode ser realizado de três maneiras diferentes, e o segundo, de duas maneiras diferentes, a saber, com o princípio multiplicativo. Esse princípio relaciona parte da relação entre conjuntos de possibilidades constituídos por elementos finitos. No diagrama acima, é possível enumerar os elementos combinados em cada etapa; entretanto, o princípio multiplicativo permite realizar a contagem das possibilidades sem que haja necessidade de enumeração de cada elemento, compondo, assim, um recurso de facilitação da contagem. Solução semelhante poderia ter sido organizada por meio do recurso de uma tabela de dupla entrada, expressando que o evento apresenta dois estágios, sendo que na primeira existem m possibilidades e para cada uma delas, n possibilidades que compõem a segunda etapa, resultando na relação m x n maneiras distintas de o evento acontecer. E naquele caso, indica também adição de parcelas iguais e uma organização espacial que pode ser representada de forma retangular. Assim, o PFC se refere ao princípio multiplicativo, à regra do produto, ao princípio combinatório indicador de quantas formas diferentes um evento pode acontecer, uma vez formado por estágios independentes e sucessivos. O PFC pode ser utilizado como recurso de resolução de problemas relacionados a contagem e problemas de tipo combinatório. Resolver problemas desse tipo é importante desde os anos iniciais da educação básica, pois exerce papel fundamental no desenvolvimento do raciocínio matemático, tendo em vista fazer parte da matemática discreta, uma área que mobiliza a necessidade de preocupação com modos de ensino que analisem conhecimentos prévios e comuns dos alunos, suas estratégias próprias de resolução de problemas. O foco curricular da retomada do PFC ao longo de toda a educação básica aponta para a análise dos conhecimentos docentes sobre os usos desse recurso como estratégia de resolução de problemas de contagem e de 3838 situações combinatórias. Também sinaliza o conhecimento comum que o docente apresenta sobre o princípio, o conhecimento especializado que deve apresentar sobre o assunto e as relações necessária entre o princípio multiplicativo e as práticas de ensino, como também entre o conhecimento matemático e os currículos instituídos. É necessário ao professor compreender que o desenvolvimento dos conhecimentos, tanto docentes quanto discentes, partindo de problemas simples, tais como o dos caminhos, possibilita o alcance da condição superior em relação à complexidade, ao nível de abstração e à formalidade no ensino médio, que caracterizarão o campo da combinatória. ASSIMILE O trabalho com o PFC ao longo da educação básica deve ter os processos de generalizações que se apresentam nas etapas finais da educação, pois possibilitarão o reconhecimento da natureza multiplicativa de problemas de contagem e de combinatória. Isso facilitará a compreensão de situações em que PFC é válido como estratégia de solução, pois é uma estratégia de resolução de problemas e a base de fórmulas utilizadas no estudo de combinatória, e serve de base para a construção de procedimentos formais da análise combinatória por ser um princípio implícito na resolução dos problemas desse campo matemático. 3. PFC e análise combinatória É necessário que as relações entre o PFC e outros tópicos diversos da matemática sejam estabelecidas de modo fundante ao longo de toda a educação básica. Ao longo de todo o ensino fundamental, os alunos deverãoaprofundar gradativamente a noção de número, pelo que é importante se depararem com tarefas como a resolução de problemas 3939 39 de contagem simples, tal qual o exemplo apresentado na seção 2 e como o estabelecimento do número de agrupamentos possíveis quando cada elemento de uma coleção é combinado com todos os elementos de outra, utilizando estratégias e formas de registros pessoais e analisando quando essas estratégias se tornam insuficientes para cada situação. Ao longo do curso da escolarização, os alunos deverão se tornar capazes de resolver e elaborar aqueles tipos de problemas usando estratégias informais e depois convencionais de registros e de organização dos dados da situação, compreendendo quais estratégias são mais apropriadas para cada tipo de problema: desenhos, agrupamentos, listagens, operações aritméticas, esquemas, tabelas simples, tabelas de dupla entrada, diagramas, etc. Os tipos de problemas também têm seus níveis de complexidade, aumentado em relação às condições para ocorrência dos eventos apresentados pelas situações-problemas, em relação à estratégia organizativa mais conveniente e em relação a como aplicar o princípio multiplicativo. É necessário também que aprenda a identificar o tipo específico de problema com que está se deparando, ou, ainda, que deverá investigar/problematizar. Os tipos principais de problemas combinatórios são propriamente os de combinação, arranjo, permutação – geralmente abordado ao longo do ensino médio – e os problemas de produto cartesiano – mais comumente abordados nos anos iniciais do ensino fundamental. Nos casos dos dois últimos tipos citados, estão em consonância as etapas de ensino cuja abordagem os últimos documentos curriculares brasileiros (BRASIL, 2018) indicam enfoque de modo mais alinhado aos conselhos internacionais de discussões do currículo de matemática para a educação básica. Ainda no ensino fundamental, o princípio multiplicativo está relacionado a problemas que solicitam análises de chances de ocorrência de eventos aleatórios, cálculos de probabilidade de eventos equiprováveis, cálculo de probabilidade como a razão entre o número de resultados 4040 favoráveis e o total de resultados possíveis em um espaço amostral, cálculos de probabilidades por meio de repetições de um experimento e de cálculos de frequências de ocorrências de um determinado evento (BRASIL, 2018). Portanto, aparece relacionado à combinatória e à probabilidade. Isso mostra que o PFC é fundamento para a etapa do ensino médio, em que aparece de forma centralizada na análise e cálculos das probabilidades de eventos aleatórios. Esses eventos podem ser dependentes ou independentes na elaboração e resolução de problemas de contagem que envolvam agrupamentos ordenáveis ou não de elementos. O que envolve a análise da necessidade de usos específicos de estratégias de solução matemática por meio dos princípios multiplicativo e aditivo na identificação e na descrição de espaços amostrais de eventos aleatórios, realizando contagem das possibilidades e cálculos de probabilidades de ocorrências aleatórias sucessivas (BRASIL, 2018). Assim, as situações-problemas não são específicas do trabalho combinatório e de contagem para o ensino fundamental e as fórmulas de introduções diretas e específicas para o trabalho do ensino médio. Porém, a partir de situações ofertadas em todas as etapas educativas, com aumento das classes e de ordens numéricas envolvidas, de modo relacionado a eventos, experimentos e contextos significativos, possibilitando o uso de estratégias diversas. Assim o pensamento combinatório é composto de modo diferente da aplicação sucessiva de fórmulas, as quais devem assumir o papel de resultados do processo de desenvolvimento desse tipo de pensamento, com o objetivo de tornar os cálculos mais rápidos e simplificá-los. Desse modo, a diversificação das estratégias de solução de situações combinatórias passa a ser uma dimensão importante de resistência ao ensino tradicional, que não requer reflexão, análise, criatividade nem mesmo criticidade. Considerando que a complexidade e a superioridade do pensamento combinatório são gradativas, o PFC constitui uma estratégia-chave para o ensino de combinatória e para a compreensão de situações desse 4141 41 campo, desde que abordado a partir das estratégias informais, servindo de base para a construção de um percurso crescente de formalização. Isso, pois, mediante a abordagem de conteúdos relacionados à combinatória, os alunos podem desenvolver estratégias diversas de resolução e compreender a natureza multiplicativa. Em relação àqueles tipos de problemas anteriormente citados, Lima (2015, p. 20-21) afirma que permitem aos alunos desenvolver, ao longo de toda a educação básica, capacidades relativas à quantificação de conjuntos de situações ou de objetos que fazem parte de um determinado conjunto, a partir de estratégias ou do uso de fórmulas específicas, com o objetivo de conhecer quantos eventos ou quantos elementos são possíveis ou prováveis de ocorrência numa dada situação. Acrescenta ainda que cada condição estabelecedora do tipo de problema combinatório indica uma forma específica de estratégia de organização dos dados e do raciocínio combinatório empreendido para analisar e solucionar a questão. Assim, a relação entre o PFC e a análise combinatória está no fato de aquele constituir um recurso que pode ser aplicado a diferentes situações combinatórias, servindo de apoio para a construção de procedimentos e compreensões mais formais daquele campo de conhecimento, entendido como “um princípio implícito na resolução de todos os tipos de problemas combinatórios” (LIMA, 2015, p. 26). A partir desse modo de compreender o PFC, é possível entendê-lo como um fundamento das fórmulas empregadas em análise combinatória no ensino médio. Como principais tipos de problemas combinatórios que fornecem base sólida para o desenvolvimento da análise combinatória, Lima (2015) apresenta os problemas de produto cartesiano, problemas de arranjo (condicionais ou não), problemas de permutação e os problemas de combinação (condicionais ou não). Nos casos de problemas que apresentam o aspecto da condicionalidade, o PFC é combinado com o princípio aditivo, como no caso da seguinte situação: “se A e B são dois conjuntos disjuntos, com p e q elementos, respectivamente, então A U B possui p + q elementos” (MORGADO et al., 1991 apud LIMA, 4242 2015, p. 26). Situação esta em que o princípio aditivo se apresenta como mais uma estratégia para solução de problemas de contagem e, mais especificamente, combinatórios, os quais estão necessariamente relacionados à aplicação do princípio multiplicativo. Aqueles problemas devem ser analisados considerando a aplicação do PFC para combinações e possibilidades se: • existem condições de escolha na situação-problema apresentada; • no caso de as condições de escolha serem confirmadas, torná-las explícitas; • classificar as condições apresentadas em condições de posicionamento dos elementos dos conjuntos envolvidos e que deverão ser relacionados pelas combinações solicitadas. Em todas essas condições e situações combinatórias, o PFC se apresenta como um recurso para a análise das estruturas das relações discretas, a fim de demonstrar a existência de subconjuntos não vazios de conjuntos cujos elementos dados são finitos e satisfazem certas condições e para a classificação ou para a contagem de subconjuntos de um conjunto finito ao satisfazerem condições estabelecidas. Assim, permite quantificar subconjuntos ou conjuntos de situações ou de elementos selecionados a partir de determinadas estratégias, que podem, em grau mais elevado de abstração, ser comunicadas e argumentadas por meio de determinadas fórmulas. Alguns dos agrupamentos possíveis de elementos e de conjuntos podem ser simples, circulares (com repetições), ou, ainda, condicionais, reunindo uma série de procedimentosque possibilita a aproximação de elementos e construção de conteúdos conforme as condições dadas pela situação, que apresentam detalhes importantes sobre a regulamentação para agrupar os elementos ou os conjuntos dados. Essas regulamentações e diferentes tipos de situações combinatórias produzem agrupamentos e são objetos de ensino e de aprendizagem ao longo dos ensinos fundamental e médio, sendo alguns de seus tipos os que seguem abaixo: 4343 43 Tabela 2 – Tipos de relações combinatórias Tipo de problema/ situação/ agrupamento combinatório Breve descrição Exemplo de problema Representação fazendo uso do PFC Pr od ut os c ar te si an os Constituem determinados a partir da escolha de elementos de diferentes conjuntos. Assim, considerando dois conjuntos, A e B, o produto cartesiano é caracterizado pela relação A x B, portanto, pelos pares ordenados organizados com um elemento de A (abcissa) e por um elemento de B (ordenada). Joaquim foi à livraria comprar seu material escolar. Para montar seu kit, a livraria lhe ofereceu: 3 modelos de caderno, 4 modelos de lápis, 8 modelos de borracha e 2 modelos de caneta azul. De quantas formas diferentes Joaquim pode montar seu kit? 3 . 4 . 8 . 2 Quantidade de modelos possíveis (QMP) de cadernos X QMP de lápis X QMP de borracha X QMP de canetas. Ar ra nj os s im pl es Os elementos são escolhidos a partir de um conjunto único, porém nem todos os elementos constituem as possibilidades a serem enumeradas. Neste caso, a ordem dos elementos escolhidos indica possibilidades distintas. Assim, constitui um grupo formado com n elementos escolhidos de uma coleção com m elementos, de forma que os n elementos sejam distintos entre si. Podem ser simples ou com repetições e os elementos não são todos utilizados na escolha de cada possibilidade. Na final do campeonato de judô, 5 meninas estão disputando os 3 primeiros lugares do torneio. De quantas formas diferentes podemos ter os três primeiros colocados? 5 . 4 .3 Quantidade de meninas que podem ocupar o 1º lugar X quantidade de meninas que podem ocupar o 2º lugar X quantidade de meninas que podem ocupar o 3º lugar. 4444 Co m bi na çã o si m pl es São escolhidos alguns elementos de um conjunto único e a ordem em que os elementos aparecem não indica possibilidades distintas. Um técnico tem que escolher, dentre 12 atletas, 5 para compor a equipe titular de um time de basquete. Qual o total de possibilidades que o técnico tem para montar sua equipe? 12 . 11 . 10 . 9 . 8 5 . 4 . 3 . 2 . 1 Quantidade de escolhas para o 1º atleta X quantidade de escolhas para o 2º atleta X quantidade de escolhas para o 3º atleta X quantidade de escolhas para o 4º atleta X quantidade de escolhas para o 5º atleta. Após, divide- se pela permutação dos elementos repetidos, no caso dos 5 atletas. Pe rm ut aç ão s im pl es Todos os elementos do conjunto dado são tomados em ordens distintas. Assim, constituem agrupamentos com todos os p elementos distintos entre si pela ordem. Constitui um caso particular dos arranjos em que todos os elementos do conjunto dado são utilizados. De quantos modos distintos 5 pessoas podem se posicionar em um banco de 5 lugares? 5 . 4 . 3 . 2 . 1 Quantidade de pessoas que podem ocupar a 1ª posição X quantidade de pessoas que podem ocupar a 2ª posição X quantidade de pessoas que podem ocupar a 3ª posição X quantidade de pessoas que podem ocupar a 4ª posição X quantidade de pessoas que podem ocupar a 5ª posição. Ar ra nj o co nd ic io na l É um arranjo em que todos os elementos aparecem em cada grupo de n elementos, porém existe uma condição que deve ser satisfeita em relação a alguns elementos. Ana, Júlia, Marcos, Pedro e Laís estão participando de uma corrida. De quantos modos diferentes podemos ter os 3 primeiros colocados se Julia sempre chegar em primeiro lugar? 1 . 4. 3 1º lugar ocupado por Júlia X quantidade de participantes que podem ocupar o 2º lugar X quantidade de participantes que podem ocupar o 3º lugar. Fontes: LIMA; BORBA, 2014, p. 2.694; LIMA, 2015, p. 28. 4545 45 Conforme as discussões até aqui explicitam e com as informações relacionadas na tabela acima, fica evidente que o PFC pode ser instrumento para: • demonstrar a existência de subconjuntos de elementos de um conjunto não vazio e finito dado e que satisfaçam certas circunstâncias; • classificar ou contar subconjuntos de um conjunto não vazio e finito que satisfaçam certas circunstâncias; • resolver diferentes tipos de problemas combinatórios, podendo ser problemas simples, problemas condicionais e que apresentam diferentes quantidades de etapas de escolha; • obter técnicas básicas e muito eficientes de contagem. Os diferentes tipos de situações combinatórias acima exemplificados expressam soluções que tomam o PFC como estratégia de resolução de problemas de contagem, o que é diverso do fato de partir de definições diretas, ou, ainda, de fórmulas, tais como: para produtos cartesianos: A x B = {( x , y )/x є A e y є B}, para arranjos simples A (m,n) = m! (m–n)! , para situações de permutações simples P (m) = m! e para combinações simples, C (m,n) = m! (m–n)! n! . Embora seja um dos objetivos abordar fórmulas de modo a elevar o nível de superioridade do raciocínio combinatório por meio de métodos tais como o dedutivo, é necessário que a introdução dessa linguagem e o alcance e veiculação desses níveis de abstrações sejam realizados nos momentos apropriados. E que estejam conforme os conhecimentos docentes sobre: o conteúdo a ser ensinado, a didática do ensino da matemática e também sobre a lógica que opera sobre o currículo ao designar as etapas mais elevadas a manipulação de fórmulas (BRASIL, 2018), sem deixar de lado o desenvolvimento, aproveitamento, a problematização de alguns aspectos de generalizações por meio do uso de estratégias pessoais e diferentes suportes para organizações das práticas de contagens. 4646 Com isso é possível verificar que, além de constituir fundamento para o desenvolvimento do raciocínio combinatório e além de ser uma estratégia para solução de problemas de contagem e combinatórios de diferentes tipos, é tomado por alguns autores como uma regra para solução dessas categorias de situações-problemas, denominada regra do produto. Assim ficam claras as necessidades de distinguir cada tipo de problema, abordá-los a partir de situações com significado e considerar a complexidade gradual em relação à etapa escolar em que se encontram os desafios de aprender e de ensinar números, contagem e análise combinatória, processos em que o PFC aparece como instrumento, também passível de compreensão e de ensino. 4. Estratégias para ensino do PFC Algumas estratégias para práticas de ensino que favoreçam já foram apontadas nas seções anteriores deste material, tais como a garantia de procedimentos de formalização e de sistematização de forma gradual de acordo com o nível específico de ensino, a recomendação do ensino de números que proceda ao ensino da combinatória, que a resolução de problemas seja central na análise que culminará em diferentes graus de argumentação matemática e que os problemas de contagem sejam abordados de forma a envolver o princípio multiplicativo, sendo trabalhados a partir de diferentes técnicas, como o diagrama de possibilidades, tabelas e esquemas, do mesmo modo que os problemas que envolvam arranjos, permutações e combinações, sem e posteriormente com o uso de fórmulas, partir das estratégias informais dos alunos, tomando o PFC como um fundamento para o ensino de análise combinatória. Para tanto, é necessário que o professor tenha conhecimento sobre como abordar o PFC ao longo de cada etapa da educação básica, em distintas situações combinatórias e de como este é articulado em 4747 47 cada uma delas. É preciso apresentar
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