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AULA 4 PROBLEMAS AMBIENTAIS – TENDÊNCIAS GLOBAIS Prof.ª Aline Bisinella Ianoski 2 INTRODUÇÃO Embora o solo seja um recurso natural imprescindível para a manutenção da vida na Terra, durante muito tempo ele foi explorado de maneira inadequada, o que resultou em uma série de modificações, que vão desde alterações físicas (como a erosão e a desertificação) até contaminações por pesticidas e hidrocarbonetos derivados do petróleo. Nesta aula, esperamos que você seja capaz de entender como o solo é formado, identificar seus principais problemas ambientais e conhecer as alternativas para tratamento e remoção dos seus principais contaminantes. Ao final deste material, será relatado um estudo de caso, a fim de exemplificar brevemente como identificar o problema e buscar uma solução para ele. TEMA 1 – O SOLO Nos primórdios, o solo era visto pelo homem apenas como uma base para sua locomoção e como suporte para as plantas e animais. À medida que a humanidade passou a semear e cultivar alimentos, as comunidades foram se estabelecendo em um único local. Enquanto essas civilizações eram pequenas, quando o solo se tornava pobre e infértil, toda a comunidade mudava-se em busca de um novo local para se estabelecer. Quando essas populações cresceram, a mudança constante de lugar tornou-se algo inviável (Braga et al. 2005). As populações que foram capazes de manejar o solo adequadamente conseguiram se estabilizar e se desenvolver, porém outras comunidades que fizeram mau uso desse recurso acabaram extintas (Pérez; Brefin; Polidoro, 2016). Alguns anos mais tarde, quando ocorreu a industrialização e o crescimento populacional, a demanda por alimentos, combustíveis, áreas para moradia e instalações fabris aumentaram. Grandes áreas foram desmatadas para aumentar as zonas de plantio e obter o carvão vegetal, muito utilizado na Revolução Industrial, além da madeira para edificações. Como resultado, aqueles problemas que antes eram locais passaram a ter proporções ainda maiores, resultando nos desastres ambientais que vemos até hoje. Não se pensava no solo como um recurso fundamental no equilíbrio dos ecossistemas, porém ele interage com os demais compartimentos ambientais. A essa camada dá-se o nome pedosfera (Molina Júnior, 2017) (Figura 1). 3 Figura 1 – Processos interativos do relacionamento da pedosfera com a biosfera, atmosfera, hidrosfera e litosfera Fonte: Adaptada de Lal et al.,1998 citado por Pérez, Brefin e Polidoro, 2016. Por meio da Figura 1 podemos concluir que quando alteramos a pedosfera estamos influenciando também na sua atuação como reguladora do abastecimento de água, recicladora de matérias-primas, agente modificadora da atmosfera, meio para as obras de engenharia e para o desenvolvimento da agricultura e silvicultura, além de ser o habitat para diversos organismos (Brady; Weil, 2013). Para o uso e ocupação adequados do solo é necessário conhecer o seu processo de formação, as suas características e as suas limitações. 1.1 A formação do solo A crosta terrestre é formada por 3 tipos de rochas, as magmáticas (ou ígneas), as sedimentares e as metamórficas. As rochas magmáticas (ou ígneas) são resultado da solidificação do magma, as sedimentares são formadas pela deposição de partículas de outras rochas expostas na superfície, e as metamórficas são formadas sob altas pressões e temperaturas. Quando qualquer uma dessas rochas sofre ação do intemperismo1, ela vai se degradando e formando partículas cada vez menores. Essas partículas, ao se 1 Ações físicas, químicas e biológicas que causam a desagregação das rochas e consequente formação dos solos (Braga et al., 2005). 4 misturarem com material mineral, matéria orgânica, água e ar, constituem o solo, que é a camada que cobre a crosta terrestre (Braga et al., 2005). A formação do solo está relacionada a: material de origem (rocha matriz), idade (tempo), relevo, clima e matéria orgânica. Esses cinco fatores são responsáveis pelos inúmeros tipos e formas de solo que existem (Braga et al., 2005). As camadas que formam o solo são denominadas horizontes do solo e podem ser visualizadas por meio do que chamamos perfil do solo (Figura 2). Figura 2 – Perfil do solo Crédito: Khadi Ganiev/Shutterstock. Por meio da Figura 2 podemos observar que existem quatro horizontes principais em um solo, que diferem entre si (Quadro 1). O A B C 5 Quadro 1 – Os horizontes do solo Horizontes do solo O Há presença de material orgânico em processo recente de decomposição sobre uma camada de material em decomposição mais avançada. Geralmente, apresenta coloração preta ou marrom. A O material orgânico é misturado com o material mineral. A coloração varia de cinza-escuro a marrom. A lixiviação2 carrega a argila e outros materiais desta camada para o horizonte B. B Também é conhecido como zona de acumulação. Há presença de carbonato, argila, sílica e óxidos de ferro e alumínio, que podem ser resultado da lixiviação das camadas superiores ou simplesmente resultado do intemperismo deste mesmo local. C Apresenta material parcialmente intemperizado na parcela próxima ao horizonte B pela presença de algumas raízes, microrganismos e reações bioquímicas, e um local menos intemperizado, mais próximo à rocha solidificada. Fonte: Adaptado de Braga et al., 2005; Botkin e Keller, 2011; Brady e Weil, 2013. A avaliação de características, como cor, textura, estrutura, pH e composição do material mineral, principalmente silte, argila e areia, nos traz informações sobre o tipo de solo e, consequentemente, qual será o uso e a ocupação mais adequados. Quando não há preocupação em avaliar o solo previamente para definir as atividades que podem ou não ser desenvolvidas na região, uma série de impactos ambientais, tanto físicos como químicos e biológicos, pode acontecer. TEMA 2 – DEGRADAÇÃO DO SOLO A degradação do solo pode ocorrer por processos naturais, como o intemperismo, e também como reflexo de atividades antrópicas, como a agricultura, o turismo ou a urbanização. Entre os processos naturais estão: a desertificação, a salinização, a compactação e a erosão. A desertificação é um processo que ocorre em regiões áridas, semiáridas e subúmidas secas. Ou seja, em locais em que quase não chove, em que se evapora muito mais do que se precipita, sendo locais naturalmente frágeis. Essa alteração do solo pode ocorrer tanto por ações antrópicas, como o sobrepastoreio, quanto por processos naturais, como as secas prolongadas, nas quais o solo 2 Infiltração de água ou outros líquidos no solo que acabam promovendo a dissolução, drenagem, lavagem e transporte de materiais, nutrientes, poluentes dentro do solo (Botkin; Keller, 2011). 6 perde nutrientes, umidade e torna-se cada vez mais árido, até se transformar em um deserto (Vieira et al.,2015). Existem alternativas para a prevenção ou recuperação dessas áreas. Entre elas estão: a construção de barreiras subterrâneas para contenção da água, a recuperação da mata ciliar e de plantas resistentes, assim como a instalação de sistemas de irrigação por gotejamento. Nessas regiões, a erosão geralmente é severa, pois, ainda que a chuva seja escassa, ela tende a ser intensa (Botkin; Keller, 2005). A salinização ocorre em solos que não possuem drenagem e que estão em uma região árida ou semiárida, o que favorece a evapotranspiração. Sendo assim, quando a chuva cai, a água fica retida, mas quando ela evapora, os sais minerais presentes na solução do solo3 continuam no mesmo lugar, não sendo lixiviados para as outras camadas, tornando este solo saturado em sais (Allen; Metternicht; Wiedmann, 2017). Os principais causadores da salinizaçãodo solo, além dos fatores naturais, são a irrigação e a fertirrigação inapropriadas dos cultivos (Silva et al., 2013). Algumas alternativas para recuperar o solo são: adição de solução de sulfato de cálcio (gesso agrícola), que irá auxiliar na permeabilização do solo e na lixiviação dos sais, e plantação de espécies tolerantes à salinidade (Sá, 2013; Albuquerque et al., 2018). A compactação do solo é um processo oriundo da movimentação de animais e veículos. Nesse processo há aumento da densidade e redução da sua porosidade devido à retirada de ar do solo. Em níveis intermediários a compactação do solo pode favorecer a fixação das plantas quando comparada a solos muitos desagregados, mas quando existe um alto nível de compactação, o enraizamento é prejudicado e a obtenção de água e nutrientes também. As alternativas preventivas podem ser realizadas por meio da manutenção da umidade do solo, do controle do tempo de pastagem dos animais e da passagem e pressão exercida pelas máquinas, assim como pela colocação de esteiras de borracha. Para solos já compactados, existe a possibilidade de introdução de minhocas e plantas com diferentes sistemas radiculares e da adição de matéria orgânica (Reichert; Suzuki; Reinert, 2007). 3 Corresponde à parte líquida do solo. 7 A erosão é um processo que está relacionado a todos os processos de degradação já citados. Por esse motivo, ela será apresentada em um novo subitem. 2.1 Erosão A erosão do solo diz respeito à perda de solo de uma região. Ocorre pela ação do intemperismo e representa uma etapa natural da pedogênese.4 O processo erosivo promove a renovação lenta e constante do solo e se dá em três fases: desprendimento, transporte e deposição (Panachuki et al., 2006). O desprendimento refere-se à desagregação da estrutura do solo; o transporte é o arraste dos fragmentos do solo; e a deposição corresponde à sedimentação do material em um novo local. Alguns fatores que influenciam na erosão dos solos são: clima, declividade do terreno, tipo de solo e manejo do solo (Lepsch, 2010): • clima: a água e o vento são os principais agentes erosivos; • declividade do solo: conforme a inclinação do terreno, o arraste das partículas do solo pode ser lento ou rápido; • tipo de solo: as características físicas do solo, como textura, permeabilidade e profundidade, determinam a vulnerabilidade dos solos; • manejo do solo: o manejo inadequado do solo pode vir a ocasionar o aceleramento dos processos erosivos. As atividades antrópicas podem causar a aceleração do processo erosivo no empobrecimento do solo, a queda da produtividade e qualidade dos alimentos, a inundação de cidades no assoreamento dos corpos hídricos pelo transporte e a deposição das partículas do solo (Wang et al., 2016). A erosão é um problema global e afeta as regiões do mundo de diferentes maneiras. Recentemente, foi divulgado que dos 49 sítios pertencentes ao Patrimônio Mundial Cultural da Unesco que ficam nas regiões costeiras baixas do Mediterrâneo, 42 correm risco de erosão (Reimann et al., 2018). A China sofre com erosões caudadas pelo desmatamento e práticas agrícolas intensivas e não sustentáveis. No litoral sul da Califórnia, o aumento acelerado do nível do mar e a consequente erosão costeira podem acabar com as praias e construções localizadas na região costeira (Vitousek, 2017). 4 Processo de formação do solo. 8 No Brasil, o desmatamento, a pecuária e a agricultura são atividades antrópicas que se destacam como potencialmente capazes de provocar o aceleramento do processo erosivo. Isso porque o desmatamento expõe o solo às intempéries, a pecuária transforma áreas enormes em pasto (além do solo ser constantemente pisoteado e compactado pelo gado), e a agricultura é praticada de modo insustentável e intensivo, sem avaliar a capacidade de recuperação do solo. Ao remover a cobertura vegetal de um solo, retira-se a sua proteção. Sem as plantas e suas raízes, as gotas de chuva caem com mais impacto, a força do vento não é dissipada e a infiltração ocorre mais rapidamente, lavando as partículas de solo e levando os seus nutrientes para as regiões sedimentares. Progressivamente, esse solo perderá a sua fertilidade e o seu potencial de produtividade. Existem quatro formas de erosão: a laminar, os sulcos, as ravinas e as voçorocas. A erosão laminar remove a camada superficial do solo. Já os sulcos são representados por incisões rasas na superfície. As ravinas e voçorocas representam erosões em estágios mais avançados, sendo a primeira resultante do aprofundamento dos sulcos e a segunda, a mais grave, é resultado da combinação da ação das águas do escoamento superficial e subterrâneo, formando grandes valas no terreno e de difícil recuperação. Para prevenir a erosão é necessário manter a cobertura do solo, já que as plantas impedem o seu carregamento pela chuva e pelo vento, assim como permitem a constante troca de nutrientes. Nos casos em que o processo erosivo já acontece, mas não está em estágio avançado, há a possibilidade de se repor a vegetação e assim estabelecer novos caminhos para a água da chuva por meio da correção do sistema de drenagem. Nos casos em que o processo erosivo já está bem avançado nem sempre é possível ou vantajoso economicamente solucionar o problema. Porém, caso a área seja pequena e exista a necessidade de proteger áreas ainda não atingidas pela erosão, pode-se captar a água da chuva e desviá-la por manilhas antes que atinjam as áreas susceptíveis, como também construir barreiras físicas e colocar mantas orgânicas (fibra de coco) para reforçar os declives (Verdum; Vieira; Caneppele, 2016). 9 TEMA 3 – CONTAMINAÇÃO DO SOLO A contaminação do solo pode ocorrer de diversas maneiras. Neste tópico falaremos sobre as três principais fontes de contaminação do solo: os resíduos sólidos urbanos, os pesticidas e os hidrocarbonetos derivados do petróleo: benzeno, tolueno, etilbenzeno e xileno (BTEX). 3.1. Resíduos sólidos urbanos (RSU) Os resíduos sólidos compreendem todos os materiais resultantes das atividades domésticas, industriais, comerciais, hospitalares, de limpeza urbana, da construção civil e agrícola. Na nossa rotina é quase impossível não gerar ao menos um resíduo sólido durante o dia. Porém é necessário refletir sempre que possível para não gerar resíduos. Caso contrário, deve-se seguir os 3 Rs da sustentabilidade: Reduzir, Reutilizar e Reciclar. É preciso ter em mente que os resíduos sólidos, quando mal destinados, causam não só problemas ambientais, mas também sociais e de saúde. O último relatório do Banco Mundial intitulado What a Waste: A Global Review of Solid Waste Management (2012) traz dados quanto à geração e coleta dos resíduos sólidos urbanos (RSU) para os países, conforme mostra a Tabela 1. Tabela 1 – Geração de RSU por país - Dados atuais e projeções para 2025 País Dados referentes ao ano de 2012 Projeção para o ano de 2025 População Urbana Geração de RSU per capita (kg/capita/dia) Geração de RSU (ton/dia) População Urbana Geração de RSU per capita (kg/capita/dia) Geração de RSU (ton/dia) Angola 8,973,498 0.48 4,329 18,862,000 0.7 13,203 Brasil 144,507,175 1.03 149,096 206,850,000 1.6 330,960 China 511,722,970 1.2 520,548 822,209,000 1.7 1,397,755 Itália 39,938,760 2.23 89,096 42,205,000 2.05 86,520 Fonte: Hoornweg e Bhada-Tata, 2012. De acordo com esse relatório, em 2025, acredita-se que o número de humanos no planeta será de 4,3 bilhões vivendo nas áreas urbanas e será produzido aproximadamente 1,42 kg / capita / dia de RSU, o que corresponderá a 2,2 bilhões de toneladas por ano. 10 Além de ocuparem um enorme espaço no planeta, os RSU ainda estão relacionadosà poluição dos ecossistemas e à inúmeras zoonoses. Eles estão presentes em todas as esferas da Terra, desde a atmosfera até as profundezas dos oceanos. Dessa forma, inovações desse setor buscam trazer alternativas de destinação e tratamento dos resíduos sólidos que agreguem valor econômico a esses materiais e a seus subprodutos. Alguns exemplos são os biodigestores compactos, que apresentam baixo custo operacional e degradam rapidamente os resíduos orgânicos. O efluente gerado pode ser utilizado na irrigação de hortas ou descartado na rede de esgoto, e o gás produzido pode ser utilizado como combustível. Há projetos que captam os gases gerados em aterros sanitários, na produção de suínos e nas estações de tratamento de esgoto, por exemplo, e os aplicam na geração de energia elétrica. Outra possibilidade é fazer uso da biomassa residual (bagaço de cana-de-açúcar) da indústria sucroalcooleira para a produção de biogás. Embora existam alternativas para a reutilização e reciclagem dos resíduos sólidos, é preciso verificar a sua disponibilidade e sua vantagem energética e econômica, que nem sempre são viáveis, principalmente para os países menos desenvolvidos. 3.2 Pesticidas Décadas atrás, os pesticidas surgiram como um “produto mágico” capaz de atender a demanda da população, que não parava de crescer, por alimentos. Contudo, não havia conhecimento sobre quais as consequências que o seu uso, mesmo quando realizado de acordo com as orientações do fabricante, poderiam causar em longo prazo ao meio ambiente. Dessa forma, quanto mais resistente uma praga tornava-se, mais pesticida era aplicado. O desenvolvimento de equipamentos laboratoriais capazes de detectar esses compostos, mesmo em concentrações muito baixas, possibilitou o avanço das pesquisas acerca da sua distribuição nos ecossistemas e na sua interferência na saúde dos seres vivos. Hoje, eles estão presentes em todos os compartimentos ambientais e são relacionados a diversas doenças, como o Parkinson e o câncer. No Brasil, inúmeros dos herbicidas que são autorizados e aplicados nas plantações são proibidos em outros países. A Figura 3 compara o número de 11 pesticidas autorizados para algumas culturas no Brasil e que estavam proibidos na União Europeia nos anos 2015 e 2017. Figura 3 – Número de agrotóxicos autorizados por cultura no Brasil e proibidos na União Europeia Fonte: Bombardi, 2017 citado por MAPA/Agrofit. Podemos observar que o número de pesticidas liberados para uso no Brasil em relação à União Europeia só não aumentou para a banana, mas para todas as outras culturas pesquisadas esse número aumentou até 94% num período de dois anos. Uma vez aplicados na lavoura, os herbicidas podem ficar retidos no solo, serem transformados (degradação, biodegradação e mineralização) ou transportados (volatilização, escoamento superficial e lixiviação). A mobilidade do pesticida no solo lixiviado pela água da chuva pode chegar às camadas mais profundas e contaminar inclusive o lençol freático (Bittencourt Júnior; e Soares, 2013). Ao entrar em contato com o solo, o pesticida também atinge todos os seres vivos que ali habitam, como os cupins, as formigas e as minhocas, que são importantes para pedosfera por abrirem caminhos dentro do solo para a passagem de água e gases, além de atuarem na melhoria da fertilidade do solo. Existem algumas formas alternativas de produção de visam a não aplicação ou a redução na aplicação dos pesticidas, como o controle biológico das pragas, o uso de defensivos naturais e o investimento em tecnologias que otimizem a aplicação dos produtos, evitando a necessidade de repetição da aplicação na mesma safra. Para recuperação dos solos contaminados, uma alternativa é a biorremediação, ou seja, a degradação do pesticida por fungos, e a utilização de 12 espécies fitorremediadoras, que são espécies de plantas capazes de absorver e retirar os pesticidas do solo. Pode-se ainda estimular o aumento natural da microbiota presente no solo por meio da adição de material orgânico no mesmo. 3.3 Hidrocarbonetos derivados do petróleo: benzeno, tolueno, etilbenzeno e xileno (BTEX) O petróleo e seus derivados estão entre os compostos que mais despertam preocupação quanto à contaminação ao meio ambiente e ao risco à saúde. Dentre esses compostos destacam-se os hidrocarbonetos benzeno, tolueno, etilbenzeno e xileno (BTEX). O BETX faz parte dos compostos orgânicos voláteis (COV), portanto contaminam não só o solo mas também a atmosfera. Eles estão presentes na gasolina e em outros derivados do petróleo. Além de voláteis, eles são persistentes, de difícil degradação, solúveis em água, principalmente quando misturados ao etanol, sendo capazes de contaminar grandes áreas (Oliveira, 2017). A contaminação do solo e da água por essas substâncias acontece principalmente por vazamentos ou derramamentos acidentais durante a sua exploração, refino, armazenamento e transporte. O BTEX apresenta potencial tóxico e carcinogênico mesmo quando presente no ambiente em pequenas quantidades (Andrade; Augusto; Jardim, 2010). Esses compostos devem ser constantemente monitorados a fim de localizar o mais rápido possível a fonte e a área contaminada. O tratamento dos hidrocarbonetos derivados do petróleo representa um problema ambiental de difícil solução e por esse motivo será abordado no próximo tópico. TEMA 4 – ALTERNATIVAS PARA O TRATAMENTO DO BTEX NO SOLO Neste tópico serão apresentadas características e vias de tratamento dos hidrocarbonetos derivados do petróleo, mas cabe salientar que muitas vezes a contaminação do solo ocorre de maneira semelhante para diferentes contaminantes. Por isso, algumas das classificações e tecnologias aqui ilustradas também são aplicáveis para outros compostos, como os pesticidas. 13 Os hidrocarbonetos derivados do petróleo podem ser classificados de acordo com a sua densidade (Quadro 2), o que auxilia a compreensão de seu comportamento no solo. Quadro 2 – Classificação dos compostos de fase líquida não aquosa (NAPL) de acordo com a sua densidade LNAPL — Compostos de fase líquida leve não aquosa Caracterizados por serem mais leves que a água. Exemplos: benzeno, tolueno e xileno (BTEX). DNAPL — Compostos de fase líquida densa não aquosa Caracterizados por serem mais densos que a água. Exemplos: 1, 2 dicloroetano. Fonte: Moreira e Dourado, 2005. Por serem mais leves que a água, os compostos BTEX são os primeiros derivados do petróleo a atingirem o lençol freático. Portanto, para avaliar uma área contaminada pelo vazamento de hidrocarbonetos de petróleo deve-se observar inicialmente duas propriedades: a persistência e a mobilidade do composto. A persistência refere-se à degradação desse composto no solo, quanto menos degradável, mais tempo ele irá durar na área subterrânea, podendo até mesmo apresentar-se como recalcitrante. A mobilidade é a capacidade de locomoção desses poluentes no solo, ligada principalmente a sua densidade e solubilidade, que podem atingir longas distâncias desde a fonte de contaminação. O caminho que o BTEX percorre forma a pluma de contaminação. Essa pluma sofre várias etapas de degradação pela microbiota presente no solo durante o seu espalhamento (Figura 4). 14 Figura 4 – Zonas de degradação de hidrocarbonetos Fonte: Rabus; Heiter, 1998. Vale relembrar que esses compostos e seus produtos de degradação, embora biodegradáveis, são tóxicos e, portanto, podem acabar com a microbiota do solo quando presentes em altas concentrações. Dessa forma os BTEX continuam no solo. Existem diversas tecnologias empregadas na remediação dos solos contaminados. Elas podem ser físico-químicas e biológicas. Algumas dessas alternativas são apresentadas no Quadro 3.5 Quadro 3 – Algumas tecnologias de remediação dos solos contaminados TecnologiaDescrição Aplicação Tr at am en to b io ló gi co Biorremediação Estimulação da atividade dos microrganismos que ocorre naturalmente na área contaminada para reforçar a degradação biológica dos contaminantes orgânicos. In situ Landfaming (assumindo escavação) Degradação biológica de resíduos em uma camada superior de solo, que é periodicamente revolvida para promover aeração. Ex situ 5 Sugestão de leitura: Guia de Elaboração de Planos de Intervenção para o Gerenciamento de Áreas Contaminadas. 1. ed. São Paulo: IPT - Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo: BNDS, 2014 15 Compostagem (considerando escavação) O solo contaminado é escavado e misturado com materiais orgânicos, tais como lascas de madeira, resíduos animais e vegetais, com o objetivo de aumentar a porosidade e o conteúdo orgânico da mistura a ser decomposta. Ex situ Enriquecimento em oxigênio por Air Sparging Ar é injetado sob pressão, abaixo do nível d’água, para aumentar a concentração de oxigênio na água subterrânea e para aumentar a taxa de degradação biológica de contaminantes orgânicos por microrganismos que ocorrem naturalmente. In situ Ex situ Tr at am en to fi si co -q uí m ic o Escavação e disposição O material contaminado é removido e transportado para fora da área contaminada até aterros apropriados para a disposição do material escavado. Pode haver necessidade de pré-tratamento do material. In situ Ex situ Lavagem de solo Contaminantes adsorvidos nas partículas finas do solo são separados por um sistema de base aquosa com base no tamanho das partículas. A ação da água de lavagem pode ser aumentada com o uso de um agente de lixiviação básico, surfactante, ajuste de pH ou quelante para ajudar a remover os materiais orgânicos e os metais pesados. Ex situ Tr at am en to té rm ic o Dessorção térmica à alta temperatura Os resíduos são aquecidos a 315–540° C para volatilizar a água e os contaminantes orgânicos. Um sistema de coleta de gases ou sistema de vácuo transporta água e os orgânicos volatilizados para um sistema de tratamento de gases. Ex situ Extração de vapor do solo forçada termicamente Injeção de ar/vapor quente ou aquecimento por radiofrequência são usados para aumentar a mobilidade de compostos voláteis e facilitar sua extração. O processo inclui um sistema para manipulação dos gases extraídos. In situ Fonte: Moraes; Teixeira; Maximiano, 2014 citado por DOD ETTC, 1994; Clarinet, 2002. 16 TEMA 5 – ESTUDO DE CASO Sempre que pensamos em áreas contaminadas, devemos levar em conta alguns fatores, como: • histórico da área; • tipo de solo; • fonte de contaminação; • amostragem; • pluma de contaminação; • a tecnologia de remediação que será aplicada; • a medida preventiva que será adotada. Ao herdar o posto de combustíveis, que pertence a sua família há mais de 40 anos, João foi informado de que durante todo esse tempo nunca havia sido realizada a verificação de possíveis contaminações no solo ou lençol freático ou mesmo uma adequação à legislação vigente do órgão ambiental do estado e à Resolução do CONAMA 420/2009. Com medo de que um possível vazamento pudesse acontecer e resultar em grandes gastos, ele decidiu contratar uma empresa de gerenciamento de áreas impactadas para verificar se tudo estava bem e o que poderia ser feito para se prevenir. Ao avaliar a área, a empresa enviou um laudo a João com as informações presentes no Quadro 4. Quadro 4 – Laudo do posto de combustíveis Histórico da área Ausência de monitoramento de contaminação Tipo de solo Silte argiloso com alta porosidade e horizonte O bem desenvolvido Fonte possível de contaminação Tanque de armazenamento de combustível Profundidade do lençol freático 22 metros da superfície Direção de migração da água subterrânea Sudoeste Amostragem (análise dos gases, do solo e da água subterrânea) Negativo para presença de contaminantes Pluma de contaminação Não há Tecnologia de remediação que será aplicada Sem necessidade 17 Medida preventiva que será adotada Sugere-se: troca do tanque de armazenamento de combustíveis; análises rotineiras nos poços de monitoramento Para alegria de João, os resultados mostraram que não há vazamentos no tanque de armazenamento de combustíveis. Porém ele já está fora do prazo de validade, que é de aproximadamente 25 anos, sendo necessário realizar a sua troca. João então providenciou a troca do tanque de armazenamento de gasolina, conforme sugerido pela empresa. Durante a troca, houve um pequeno derramamento acidental de gasolina residual do tanque antigo, para o desespero de João! Algumas ações já foram tomadas rapidamente, como a retirada do solo visivelmente contaminado pela gasolina e a sua destinação para tratamento em Landfarming. Posteriormente foi realizada a extração de vapor do solo forçada termicamente. Amostras de solo e da água subterrânea foram novamente coletadas dos poços de monitoramento e os resultados avaliados durante o período de um ano, para alívio de João, mostraram que não houve contaminação do lençol freático, e o pouco que restou de contaminação do solo poderá ser remediada in situ por meio da técnica biorremediação, favorecida pelo horizonte bem desenvolvido na região. O alívio de João não foi à toa, já que a maior preocupação quando há um solo contaminado é que esta contaminação atinja o lençol freático, pois a remediação da área torna-se mais complexa, longa e, principalmente, cara do ponto de vista legal. Além disso haveria a possibilidade de contaminação da água de abastecimento de toda uma cidade, resultando em penalidades que muitas vezes levam ao fechamento do estabelecimento. 18 REFERÊNCIAS ALBUQUERQUE, A. S. et al. Atributos químicos em solo salino-sódico e efeito do ácido sulfúrico no crescimento da Prosopis juliflora. Revista de Ciências Agrárias, v. 61, p. 1-8, abr. 2018. ALLEN, C.; METTERNICHT, G.; WIEDMANN, T. An iterative framework for national scenario modelling for the sustainable development goals (SDGS). Sustainable Development, v. 25, p. 372-385, jan. 2017. ANDRADE, J. A.; AUGUSTO, F.; JARDIM, I. C. S. F. Biorremediação de solos contaminados por petróleo e seus derivados. Eclética Química, v. 35, p. 17-43, set. 2010. 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