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Síndromes cerebelares Introdução O cerebelo é um órgão essencialmente ligado às funções motoras, como equilíbrio coordenação dos movimentos e tônus muscular. Nesse sentido, trabalhando em conjunto com os sistemas piramidal e extrapiramidal, ele suaviza e coordena os movimentos do corpo que são dirigidos por outras regiões do encéfalo, e ajuda a manter a postura e o equilíbrio Ele se localiza na fossa cerebelar do osso occipital, posterior ao bulbo e à ponte, dos quais está separado pelo quarto ventrículo. É separado do lobo occipital pela tenda do cerebelo. Liga-se à medula e ao bulbo pelo pedúnculo cerebelar inferior, à ponte pelo pedúnculo cerebelar médio; e ao mesencéfalo pelo pedúnculo cerebelar superior. Anatomia ontogenética O cerebelo é formado por 2 regiões distintas: uma porção mediana composta pelo vermis e a zona intermédia e uma porção lateral composta pelos hemisférios cerebelares. A superfície apresenta sulcos de direção transversal, que delimitam lâminas finas denominadas folhas do cerebelo. Existem sulcos mais profundos, as fissuras, que delimitam lóbulos. São ao todo 17 lóbulos e 8 fissuras. Sua divisão anatômica básica é corpo do cerebelo, formado pelos lobos anterior e posterior, e o lobo flóculonodular, formado pelo flóculo e pelo nódulo. Lobo anterior e posterior são separados entre si pela fissura prima e separados do lobo flóculonodular pela fissura pósterolateral. O cerebelo consiste em dois hemisférios cerebelares expandidos e conectados medialmente pelo vérmis do cerebelo. Cada hemisfério é subdivido em 3 grandes lobos: • Flóculonodular (ajusta a postura para manter o equilíbrio e coordena o movimento da cabeça e dos olhos); • Anterior (funções relacionadas ao tônus muscular e propriocepção); • Posterior (coordenação dos movimentos). O cerebelo contém três pedúnculos cerebelares: superior, médio e inferior. • Os pedúnculos cerebelares superiores ligam o cerebelo ao mesencéfalo, transmitindo instruções basicamente eferentes do cerebelo para o córtex cerebral. • Os pedúnculos cerebelares médios são um enorme feixe de fibras que ligam o cerebelo à ponte e constitui a parede dorsolateral da metade cranial do IV ventrículo. Transmitem informação eferente do córtex cerebral e dos núcleos da ponte para o cerebelo. • Os pedúnculos cerebelares inferiores ligam o cerebelo à medula. Transportam fibras basicamente aferentes dos núcleos vestibulares (equilíbrio) e da medula espinal (propriocepção) para o cerebelo Conexões intrínsecas do cerebelo As fibras que penetram no cerebelo se dirigem ao córtex e são de dois tipos: fibras musgosas e fibras trepadeiras (ambas glutamatérgicas). As fibras trepadeiras tem esse nome porque terminam enrolando-se em torno dos dendritos das células de Purkinje, sobre as quais exercem potente ação excitatória. Já as fibras musgosas, ao penetrar no cerebelo, emitem ramos colaterais que fazem sinapses excitatórias com os neurônios dos núcleos centrais. Em seguida, atingem a camada granular, onde se ramificam, terminando em sinapses excitatórias axodendríticas com grande número de células granulares, que através de fibras paralelas, se ligam às células de Purkinje. Constitui-se, assim, um circuito cerebelar básico, através do qual os impulsos nervosos que penetram no cerebelo pelas fibras musgosas ativam sucessivamente os neurônios dos núcleos centrais, as células granulares e as células de Purkinje, as quais inibem os próprios neurônios dos núcleos centrais. Núcleos centrais do corpo medular e do cerebelo a. Núcleo denteado; b. Núcleo emboliforme; c. Núcleo globoso; d. Núcleo fastigial Dos núcleos centrais saem fibras eferentes do cerebelo e nele chegam os axônios das células de Purkinje e colaterais das fibras musgosas. O corpo medular do cerebelo é constituído de substancia branca e formado por fibras mielínicas: • Fibras aferentes ao cerebelo→ penetram pelos pedúnculos cerebelares e se dirigem ao córtex, onde perdem a bainha de mielina. • Fibras formadas pelos axônios das células de Purkinje → dirigem-se aos núcleos centrais e, ao sair do córtex, tornam-se mielínicas As informações são processadas pelo cerebelo da seguinte maneira: 1. O cerebelo recebe informações do cérebro a respeito dos movimentos que estão sendo planejados → a área do cérebro que inicia os movimentos voluntários, o córtex motor, transmite a informação do córtex cerebral através dos núcleos da ponte para a parte lateral dos lobos anterior e posterior do cerebelo. 2. O cerebelo compara esses movimentos planejados com a posição e os movimentos reais do corpo → a informação sobre equilíbrio e posição da cabeça é retransmitida dos receptores na orelha interna, através dos núcleos vestibulares no bulbo, paro lobo floculonodular. A informação sobre os movimentos reais dos membros, pescoço e tronco sai dos proprioceptores nos músculos, tendões e articulações e sobe para a medula espinal, chegando ao verme do cerebelo e às partes medianas dos lobos anterior e posterior. 3. Comparação dos sinais de comando com a informação sensitiva → o cerebelo compara a intenção de movimento com o movimento que está sendo realizado de fato. 4. O cerebelo envia instruções de volta ao córtex cerebral a respeito de como resolver quaisquer diferenças entre os movimentos planejados e a posição real → utilizando a retroalimentação do cerebelo, o córtex motor do cérebro reajusta continuamente os comandos motores que envia à medula espinal, fazendo o ajuste fino dos movimentos para que sejam bem coordenados. Coneções extrínsecas Ao contrário do cérebro, o cerebelo influencia os neurônios motores do seu próprio lado. Vestíbulocerebelo • Conexões aferentes→ chegam ao cerebelo pelo fascículo vestibulocerebelar, tem origem nos núcleos vestibulares e se distribuem ao lobo floculonodular. Trazem informações originadas da parte vestibular do ouvido interno sobre a posição da cabeça. • Conexões eferentes→ as células de purkinje do vestibulocerebelo projetam-se para os neurônios dos núcleos vestibulares medial e lateral. Através do núcleo lateral, modulam os tratos vestibulosespinhais lateral e medial que controlam a musculatura axial e extensora dos membros. Já as projeções inibitórias das células de purkinje controlam os movimentos oculares e da cabeça. Espinocerebelo • Conexões aferentes→ tratos espinocerebelar anterior e posterior, que penetram no cerebelo pelos pedúnculos cerebelares superior e inferior. Através do trato posterior, o cerebelo recebe sinais de propriocepção. Já no anterior recebe sinais motores vindos da medula. • Conexões eferentes→ os axônios das células de Purkinje da zona intermédia fazem sinapses no núcleo interpósito, de onde saem fibras para o núcleo rubro e para o tálamo do lado oposto. Cerebrocerebelo • Conexões aferentes→ fibras pontinhas penetram no cerebelo, levando informações de áreas motoras e não motoras do córtex cerebral. • Conexões eferentes→ os axônios das células de Purkinje da zona lateral do cerebelo fazem sinapse no núcleo denteado, de onde o impulso segue para o tálamo e daí para as áreas motoras do córtex. Manifestações clínicas Ataxia Ataxia é a incoordenação ou o desajeitamento de movimentos entre diferentes partes do corpo. Envolve particularmente os músculos axiais e grupos de músculos em torno do ombro e da cintura escapular. A doença pode ser causada por distúrbios vestibulares, cerebelares ou sensoriais (proprioceptivos). A ataxia pode afetar o movimento ocular, a fala (produzindo disartria), membros individuais, o tronco, a postura ou a marcha. A ataxia ocorre por lesão no circuito que envolve os núcleos vestibulares, o lobo FN, lobo anterior do cerebelo e o núcleo fastigial. Sua etiologia mais comum é o alcoolismo crônico. Em decorrência da conexão cruzada entre o córtex cerebral frontal e o cerebelo,a doença frontal unilateral também pode imitar ocasionalmente um distúrbio do hemisfério cerebelar contralateral. As manifestações clínicas da ataxia cerebelar consistem em irregularidades na taxa, no ritmo, na amplitude e na força dos movimentos voluntários. Ataxia Sensitiva a ataxia sensorial é consequência de doença do nervo periférico que afeta principalmente as fibras sensoriais; doença dos gânglios da raiz posterior ou das colunas posteriores da medula espinal; interrupção das vias proprioceptivas no tronco encefálico; ou doença do lobo parietal. A incoordenação por ataxia sensorial pode ser muito semelhante a ataxia cerebelar Ataxia do Lobo Frontal a ataxia do lobo frontal é o distúrbio da coordenação causado por disfunção do lobo frontal contralateral; pode assemelhar-se a déficits por anormalidades do hemisfério do cerebelo ipsilateral. É causada por doença das fibras frontopontocerebelares no trajeto até a sinapse nos núcleos da ponte. Reflete uma falta de integração entre o córtex cerebral, os gânglios da base e o cerebelo. As lesões do lobo frontal podem causar outras anormalidades, como hiperreflexia, aumento do tônus e reflexos patológicos, ao passo que lesões puramente cerebelares geralmente causam hipotonia, reflexos diminuídos ou pendulares e ausência de reflexos patológicos O paciente traz comprometimento da coordenação manifestada por um perseveração, que é dificuldade para passar de um movimento para outro. Além disso, perda em movimentos axiais complexos (aprendidos durante a vida) também ocorrem e são mais precoces que aquelas verificadas em relação ao movimento apendicular. Ataxia Talâmica A hemiataxia isolada e a perda sensorial ipsilateral (a síndrome de hemiataxia-hipestesia ou síndrome de ataxia talâmica) podem ocorrer com infarto no território talamogênico que envolve a parte lateral do tálamo (núcleo ventral posterior e núcleo ventral lateral). A disfunção “cerebelar” contralateral e a perda sensorial são devidas a uma lesão da via dentatorubrotalâmica e das vias sensoriais ascendentes no tálamo. Decomposição do movimento Em circunstancias normais, os músculos envolvidos em determinada tarefa contraem-se ou relaxam com intensidade adequada, no momento correto e seguindo uma sequência apropriada. Na disfunção cerebelar, a integração dos componentes individuais de um movimento é prejudicada, e o ato motor é decomposto, tornando-se lento, com pequenas pausas, errático e desajeitado. Dismetria Consiste na execução defeituosa de movimentos que visam atingir um alvo, pois o indivíduo não consegue dosar exatamente a 'quantidade' de movimentos necessários para isso. Pode-se testar esse sinal pedindo ao paciente para colocar o dedo na ponta do nariz e verificando se ele é capaz de executar a ordem. A forma mais comum é a hipermetria, quando o paciente ultrapassa o alvo, ou seja, quando tem a incapacidade de utilizar o movimento antagonista para frear o movimento. Menos comumente pode ocorrer a hipometria, quando a contração do antagonista ocorre precocemente e o movimento para antes de alcançar o alvo. Disdiadococinesia O termo diadococinesia se refere à capacidade de realizar movimentos rápidos e alternados, enquanto disdiadococinesia é a incapacidade da realização desses movimentos A realização desse tipo de movimento requer contração muscular, seguindo uma sequência do tipo agonista-antagonista-agonista. Na disfunção cerebelar, a ação do músculo agonista pode se prolongar muito e invadir o período de contração do músculo antagonista, ou a contração do agonista pode ser muito fugaz. Os pacientes têm dificuldade de realizar tarefas, como bater a palma e o dorso da mão nas coxas de forma alternada ou de bater alternadamente o dedo indicador e o médio contra o polegar: a tarefa é executada com erros de ritmo, alvo e movimentação de articulações secundárias ao movimento programado Tremor É um movimento oscilatório em torno de um eixo. Diferentemente do tremor parkinsoniano, que é um tremor de repouso, grosseiro, amplo e alternante (entre agonistas e antagonistas), o tremor cerebelar é um tremor que piora com a ação e é uma co-contratação de agonista e antagonista, de forma que a direção do tremor é definida pela musculatura que contraiu com mais intensidade. É importante salientar que alguns tremores costumam diminuir quando a atividade realizada é extrapiramidal, quando a pessoa está muito focada na ação que está realizando e sem estar pensando no tremor em si. De intenção é um tremor de ação que piora com a intenção, ou seja, quando um alvo é definido e o paciente deve alcançá-lo. Esse tipo de temor piora quanto mais próximo do alvo se está e, portanto, com a necessidade de maior de precisão. Rubral é um tremor que ocorre devido a uma lesão na via dentato-rubro-talâmica, mais precisamente, próxima ao núcleo rubro. É grosseiro, de grande amplitude, porém baixa frequência, sendo classicamente descrito como um “morcego batendo asas”. É do tipo que ocorre em repouso, piora com a ação e ainda mais com a intenção. Titubeação: é um tremor de corpo e/ou cabeça no sentido anteroposterior. É do tipo fino, semelhante ao que ocorre em situações de ansiedade e ao hipertireoidismo (uma vez que os hormônios tireoidianos aumentam os receptores de catecolaminas). Os tremores de ansiedade são, na verdade, um aumento da amplitude do tremor fisiológico, que é tão fino e em tão alta frequência que é muito difícil de ser observado. Hipotonia Corresponde à diminuição do tônus muscular esquelético. O paciente costuma ter a musculatura mais flácida do lado acometido, aparentando estar esparramada sobre o leito quando ele está deitado. Realizando teste de punho- ombro e calcanharnádega¸ o paciente apresentará hipotonia. É característica de distúrbios cerebelares Disartria Caracteriza-se pela incapacidade de articular palavras corretamente. O paciente fala palavras erradas e forma frases inapropriadas, demonstrando falha na progressão ao falar. Pode ser: Discurso arrastado: é quando, durante a fala, o paciente tem dificuldade de fazer a transição de uma sílaba para a outra e assim prolonga a primeira antes de começar a segunda Discurso silábico: é a situação de dificuldade de transição entre sílabas, causando um intervalo exagerado entre elas Alterações de volume: como o paciente cerebelar algumas vezes não consegue controlar adequadamente sua respiração durante a fala, ele acaba aumentado seu volume (fala explosiva) ou abaixando (fala implosiva) Nistagmo O nistagmo é uma oscilação involuntária anormal dos olhos. Ocorre de modo involuntário quando o paciente tenta fixar o olhar em um dos lados do campo visual. Como resultado, os olhos executam movimentos rápidos e trêmulos e sem fixação duradoura. Rechaço Pede-se pro paciente forçar a flexão do antebraço contra uma resistência que se faz no punho. No indivíduo doente quando se retira a resistência do punho a pessoa não consegue controlar o movimento e acaba por dar um tapa no próprio rosto (por causa da incoordenação). Anormalidade da marcha As anormalidades da marcha com ataxia cerebelar incluem a dificuldade com a localização precisa dos pés, que geralmente estão muito separados. Os principais aspectos da marcha cerebelar são uma base larga, passadas instáveis e desvio lateral. As passadas são incertas, algumas são mais curtas e outras mais longas que o pretendido, sendo que o paciente pode compensar estas anormalidades encurtando suas passadas e arrastando os pés, mantendo ambos os pés no chão de modo simultâneo A marcha ebriosa (atáxica) faz com que o paciente oscile durante as passadas. Seus movimentos são incoordenados, o que pode levar a quedas ou desequilíbrios. Para evitar isso, ele anda com base alargada e cambaleante, o que pode sugerir embriaguez. Se uma lesão hemisférica cerebelar unilateral for a responsável, existe uma tendência adesviar em direção ao lado da lesão quando o paciente tenta andar em linha reta ou em círculos, ou marchar sem sair do lugar com os olhos fechado
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