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Prescrição no plantão - Hemorragia digestiva

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Beatriz Machado de Almeida 
Internato – 10º semestre 
1 
HEMORRAGIA DIGESTIVA ALTA 
CASO 1 
Mulher, 48 anos, com antecedente de cirrose 
hepática secundária à vírus da hepatite C, sem 
história de complicações de cirrose prévia. Apresentou 
quadro de vômitos em borra de café de início há 2 
horas, em grande quantidade. Chegou ao pronto-
socorro ansiosa e com sudorese fria. 
Ao exame: agitada, sudoreica, descorada +/4+, FC 
104bpm, PA 90X65mmHg. Aparelho respiratório: 
MV+, sem RA. Aparelho cardiovascular: BRNF em 2T, 
sem sopros. TGI: fígado à cerca de 4cm do rebordo 
costal direito, presença de ascite na pesquisa de 
macicez móvel e presença de circulação colateral. 
MMII: pulsos +, sem edema periférico e sinais de TVP. 
CAUSAS DE HDA 
• Úlcera péptica: mais comum. 20-25%. 
• Gastrite ou duodenite erosivas. 
• Esofagite. 
• Varizes esofagogástricas: sempre pensar quando 
o paciente apresentar cirrose. 
• Gastropatia portal hipertensiva. 
• Angiodisplasias e Teleangectasias. 
• Mallory-Weiss (laceração mucosa do esôfago pelo 
esforço ao vomitar): geralmente autolimitado. 
• Úlceras de estresse. 
• Lesão de Dieulafoy: dilatação de vaso submucoso. 
• Ectasia vascular gástrica. 
• Fístula aorto-entérica. 
• Doença de Crohn. 
MANEJO INICIAL 
• Prioridade inicial: estabilização hemodinâmica. A 
gente tende a fazer uma hipotensão permissiva 
(manter FC<100 e PAS>100). 
• Acesso venoso calibroso bilateral: jelco 14. 
• Reposição inicialmente com soluções cristaloides: 
ringer lactato. 
• Existe benefício da sonda nasogástrica? Não tem 
benefício! 
• Qual limiar de Hb para transfusão? 
• Limiar para correção de coagulopatia? 
• Quando está indicada a transfusão plaquetária? 
• Qual é o objeto da PA sistólica? 
HIPÓTESE DIAGNÓSTICA 
• Sangramento por varizes esofágicas. 
• Fatores preditores de sangramento varicoso. 
❖ Classificação Child-Pugh B ou C. 
❖ Varizes de grosso calibre. 
❖ Presença de sinais vermelhos à endoscopia. 
CLASSIFICAÇÃO DE CHILD-PUGH: 
Critério/ponto 1 2 3 
Encefalopatia Ausente Graus 
I e II 
Graus 
III e IV 
Ascite Ausente Pequena Volumosa 
RNI <1,7 1,7-2,3 >2,3 
BT <2 2-3 >3 
Albumina >3,5 2,8-3,5 <2,8 
• Child A: até 6 pontos. 
• Child B: até 9 pontos. 
• Child C: >=10. 
CLASSIFICAÇÃO DO CHOQUE: 
 Grau I Grau 
II 
Grau 
III 
IV 
Perda se 
sangue 
<750mL 750-
1.000 
1.500-
2.000 
>2.000 
%volemia <15% 15-30 30-40 >40 
FC <100bpm 100-
120 
120-
140 
>140 
Diurese >30ml/h 20-30 5-15 <5 
SNC Ansied 
leve 
Ansied 
mod 
Confusão Confusão/ 
letargia 
Ressuscitação 
volêmica 
Crist Crist Crist+ 
sangue 
Crist + 
sangue 
 
PRESCRIÇÃO NO PLANTÃO: EMERGÊNCIA E ENFERMARIA 
Beatriz Machado de Almeida 
Internato – 10º semestre 
2 
Paciente do caso: FC>100, PA tendendo a hipotensão → 
choque grau II → reposição de cristaloides (1 litro de 
ringer lactato). 
APRESENTAÇÃO CLÍNICA 
• Achado de melena ou hematêmese. 
• Quadro dispéptico prévio: ex. úlcera péptica. 
• Presença de hepatopatia: ex. cirrose. 
• Uso de álcool: ex. neoplasia gástrica. 
• Perda de peso. 
• Uso de medicamentos: ex. AINES. 
• Lesões cutâneas. 
• Toque retal. 
EXAMES COMPLEMENTARES 
• Endoscopia digestiva alta (EDA). 
• Hemograma ou hematócrito e hemoglobina 
seriados (a cada 4-12h). 
• Coagulograma. 
• Função renal: ureia, creatinina. 
• Função hepática: TGO, TGP, GGT, FA, 
Bilirrubina total e frações, albumina. 
• Eletrólitos: sódio, potássio, magnésio. 
CONTINUAÇÃO CASO 
RESULTADO DE EXAMES: 
• Hb 9,8g/dL | Ht 29,6%. 
• Plaquetas 95.000 | RNI 2,3. 
• Ureia 42mg/dL | Creatinina 1,0mg/dL. 
• Bilirrubinas totais 2,6mg/dL. 
• AST 58 | ALT 54 | Albumina 2,7g/dL. 
• Na 132 | K 3,9. 
Nos pacientes com RNI>1,5 há uma tendência em 
repor plasma fresco congelado (em geral, 15-
30mL/kg). A reposição de plaqueta só é feita quando 
sangramento importante (plaqueta <50.000). Em 
relação a transfusão sanguínea, esta só é realizada 
quando Hb<7. 
• Reposição de volume – forma conservadora: 
❖ PAS<80mmHg. 
❖ FC>100/minuto. 
❖ HT entre 25-29%. 
TRATAMENTO ESPECÍFICO 
• Droga vasoativa: é a primeira linha de 
tratamento. 
• Uso precoce de terapia farmacológica: 
❖ Facilita a endoscopia. 
❖ Melhora o controle do sangramento. 
❖ Reduz o sangramento precoce. 
 
 Terlipressina: 2mg em bolus e, depois, 1mg a cada 
4 horas, por 24-48h. Vantagem: não necessita do 
uso de uma bomba de infusão contínua. Fazer 
monitorização cardíaca. 
 Octeotride: 50mcg em bolus e, depois, 50mcg por 
hora, em bomba de infusão. Em geral, 48-72h. 
 Somatostatina: 250mcg em bolus e, depois, 250 
mcg por hora, em infusão contínua. 
TRATAMENTO ENDOSCÓPICO 
• Tratamento de escolha: ligadura elástica. 
• Falha em 10-20% dos casos. 
• A terapia endoscópica pode ser repetida no 1º 
sangramento. 
• Tamponamento por balão. 
• TIPS e shunts cirúrgicos. 
Para profilaxia de varizes esofágicas, ligadura é 
comparável ao uso de betabloqueador. Em 
sangramento, escleroterapia é uma opção. Pra 
pacientes com varizes gástricas, o tratamento é cola 
com cianoacrilato. Nos casos de sangramento 
importante, pode-se passar o balão (ponte para outra 
terapia – estabilização – 24-48h). 
PRESCRIÇÃO 
1. Jejum. 
2. Plasma fresco congelado 4U EV agora: pode 
repetir, eventualmente. 
3. Terlipressina 2mg IV agora e depois 1mg a cada 
4/4 horas, por aproximadamente 72h. 
4. Ceftriaxone 2g IV 1x/dia, por 7 dias: se paciente 
com sangramento de varizes esofágicas, fazer 
profilaxia de PBE (peritonite bacteriana 
espontânea). 
 
Beatriz Machado de Almeida 
Internato – 10º semestre 
3 
REVERSÃO DE COAGULOPATIAS 
• Corrigir INR>1,5 ou plaquetas inferiores a 
50.000 m/m³: plasma 15-30mL/kg. 
• Aplicação intravenosa de vitamina K (5-10mg) 
para reverter a coagulopatia por deficiência. 
• Complexo protrombínico reverte rapidamente 
coagulopatias associadas a deficiência de 
fatores II, VII, IX e X. 
• Fator VIIa recombinante: reservado apenas para 
pacientes com hemorragia com risco de vida. 
• A varfarina pode ser reintroduzida após controle 
do sangramento. 
• Se fibrinogênio baixo, considerar crioprecipitado. 
• Pacientes em uso de medicações antitrombóticas 
não necessitam de transfusão de plaquetas de 
rotina. 
• Em relação aos novos anticoagulantes como os 
inibidores do fator Xa e da trombina 
(dabigartran, apixaban e rivaroxaban) não existem 
antídotos para eles. 
 
PROFILAXIA PRIMÁRIA 
• Pacientes com CHILD B ou C e/ou varizes de 
médio/grande calibre (>5mm). 
• Dependendo do tamanho da variz e fatores de 
risco associados. 
• Betabloqueador: primeira opção. 
• Ligadura endoscópica. 
• Sem benefício com escleroterapia. 
 
PROFILAXIA SECUNDÁRIA 
• Betabloqueador e ligadura endoscópica são 
opções possíveis: ideal. 
• Betabloqueador combinado com nitrato. 
• Combinação de terapia farmacológica e ligadura. 
CASO 2 
Paciente do sexo masculino, 42 anos de idade, 
procurou o departamento de emergência (DE) 
referindo dor epigástrica em queimação há 2 
semanas, com piora associada a alimentação. Nega 
disfagia, vômitos e outros sintomas associados. Sem 
antecedentes patológicos dignos de nota. Não faz uso 
de nenhuma medicação. 
Ao exame: BEG, corado, hidratado, anictérico, 
acianótico. PA 110X70mmHg, FC 80bpm. Aparelho 
respiratório: MV+, sem RA. Aparelho cardiovascular: 
BRNF em 2T, sem sopros. TGI: plano, flácido, dor 
discreta à palpação de epigástrio, descompressão 
brusca negativa, sem visceromegalias e massas 
palpáveis. 
HIPÓTESE DIAGNÓSTICA E CONDUTA 
• Síndrome dispéptica ou Dispepsia. 
• Paciente sem sinais de alarme, não tendo indicação 
de realizar Endoscopia Digestiva Alta (EDA). 
• Modificações dos hábitos de vida, como por 
exemplo, diminuição da ingesta de álcool e café, 
procurar observar quais alimentos desencadeiam 
com maior frequência estes sintomas e evitar 
anti-inflamatórios. 
• Sintomáticos: IBP ou bloqueadores H2. 
*Lembrete:Indicações de EDA: pacientes >=50anos 
e/ou sinais de alarme (disfagia, odinofagia, 
icterícia, sangramento, perda de peso, alteração no 
exame físico). 
CONTINUAÇÃO DO CASO 
O paciente descontinuou o uso da medicação após 1 
semana de uso com melhora dos sintomas. 
Apresentou posteriormente quadro de lombalgia para 
o qual foi prescrito o uso de diclofenaco, que estava 
usando já por 3 semanas, com melhora parcial dos 
Beatriz Machado de Almeida 
Internato – 10º semestre 
4 
sintomas. Apresentou, entretanto, recorrência da 
epigastralgia na última semana, procurando o pronto-
socorro desta feita com relato de fezes escurecidas 
e um episódio de vômito com laivos de sangue em seu 
conteúdo. Ao exame, apresenta-se com PA 
110X80mmHg e FC 90bpm. 
CONDUTAS IMEDIATAS 
• Indicar endoscopia digestiva alta. 
• Avaliação volêmica: conservadora. Se o paciente 
tiver FC<100 e PA>100, não há necessidade. 
• Sonda nasogástrica? Não indicada! 
ESCORE GLASGOW-BLATCHFORD SIMPLIFICADO 
É um score utilizado para verificação da necessidade 
de ser fazer ou não endoscopia no departamento de 
emergência. Não há necessidade se: 
• Hb>=13 g/dL em homens e 12g/dL em mulheres. 
• PAS>=110mmHg. 
• FC<100bpm. 
• Ureia<30 mg/dL. 
• Sem melena ou síncope na apresentação. 
• Sem história de doença hepática ou cardíaca. 
ESCORE GLASGOW-BLATCHFORD COMPLETO 
Variável Pontuação 
Hb 12-12,9 em homens e 
10-10,9 em mulheres 
1 
Hb de 10-11,9 em homens 3 
Hb <10 em homens ou mulheres 6 
PAS entre 100-109 mmHg 1 
PAS entre 90-99mmHg 2 
PAS<90mmHg 6 
FC>=100bpm 1 
Ureia>30mg/dL 1 
História de melena ou síncope 
na apresentação 
1 
História de doença hepática 
ou cardíaca 
2 
• Até a pontuação de 1: pode ser solicitada 
endoscopia ambulatorial. Fora dessas 
circunstâncias, faz em departamento de 
emergência. 
ESCORE ROCKALL PRÉ-ENDOSCOPIA 
Variável Pontuação 
<60 anos 0 
60-79 anos 1 
>= 80 anos 2 
Sem alterações hemodinâmicas 0 
FC>100bpm e PAS>=100mmHg 1 
PAS <100mmHg 2 
Sem comorbidades 0 
IC ou comorbidade grave 2 
CA metastásico, IRA ou 
insuficiência hepática. 
3 
• Escore – Taxa de ressangramento: 
❖ 0 → 0,2%. 4 → 24,6%. 
❖ 1 → 2,4%. 5 → 39,6%. 
❖ 2 → 5,6%. 6 → 48,9%. 
❖ 3 → 11%. 7 → 50%. 
ESCORE DE ROCKAL PÓS-ENDOSCOPIA 
• Mallory-Weiss: 0 pontos. 
• Outros diagnósticos: 1 ponto. 
• Câncer do TGI superior: 2 pontos. 
• Sem estigmas de risco de sangramento na 
endoscopia: 0 pontos. 
• Estigma de risco: 2 pontos. 
• Soma de pontos pré e pós-endoscopia: 8 pontos: 
risco >40% e 0-1 com risco de 0%. 
TEMPO PARA REALIZAÇÃO DA EDA 
• Idealmente 24 horas. 
• Considerar eritromicina 3mg/kg de 20 a 120 
minutos antes do procedimento. 
TRATAMENTO MEDICAMENTOSO INDICADO 
• Uso de Inibidores da Bomba de Prótons (IBP). 
• Dose usual 80mg EV ao dia. 
• Dose em pacientes com estigma de alto risco: 
80mg EV em bolus seguidos de 8mg/hora em 
infusão contínua por 72 horas. 
Beatriz Machado de Almeida 
Internato – 10º semestre 
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*Endoscopia com achado de úlcera não sangrante com 
vaso visível. 
CLASSIFICAÇÃO DE FORRESTER 
 
 
 
 
 
I – Sangramento ativo 
Ia - sangue esguichando 
Ib - sangue babando 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
II – Estigmas de 
sangramento 
IIa – vaso visível 
IIb – coágulo aderido na 
base da úlcera 
IIc – mancha 
pigmentada plana 
III – úlcera com base 
limpa sem sinais de 
sangramento 
 
• Ia, Ib e IIa: indicação de omeprazol em bomba 
de infusão contínua e terapia endoscópica. 
• IIb: tentar tirar o coágulo para procura de vaso. 
Na dúvida, faz omeprazol. 
• Demais pacientes (IIc e III): não precisam do 
omeprazol em bomba. Usar a dose convencional: 
40-80mg/dia. 
TRATAMENTO ENDOSCÓPICP 
• Métodos de injeção. 
• Métodos térmicos. 
• Métodos mecânicos. 
❖ Geralmente, é feita a combinação de 2 métodos. 
FATORES ASSOCIADOS A RECORRÊNCIA 
• Uso de anti-inflamatórios. 
• H.pylori positiva. 
PRESCRIÇÃO 
1. Jejum. 
2. Ringer lactato 500mL EV a critério médico. 
3. Omeprazol 80mg EV em bolus e depois 8mg EV por 
hora por 72 horas em bomba de infusão contínua. 
PACIENTE POSTERIORMENTE TESTOU 
POSITIVO PARA BACTÉRIA H.PYLORI 
• Omeprazol 40mg VO cedo. 
• Claritromicina 500mg VO 12/12 horas. 
• Amoxacilina 1g 12/12h por 14 dias. 
 
TRATAMENTO DE RESGATE 
• Cirurgia. 
• Embolização angiográfica. 
PREVENÇÃO 
• Erradicação do H.pylori. 
• Tratamento medicamentoso da úlcera péptica. 
• Profilaxia de úlcera de estresse (ex. paciente em 
ventilação mecânica, choque séptico).

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