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gestão empresarial ComuniCação EmprEsarial gEral ComuniCação em Crise - ConCeitos ComuniCação EmprEsarial gEral ComuniCação em Crise - ConCeitos ObjetivOs da Unidade de aprendizagem Ao final da Unidade de Aprendizagem, você deverá ser capaz de entender que crises são inevitáveis, imprevisí- veis, mas que há meios de se lidar com elas. COmpetênCias Entendimento das ações pré-crise, durante a crise e pós- -crise. Habilidades Planejamento de atuação em crises. 15 ApresentAção Você já deve ter ouvido falar que é na dificuldade que se conhece os verdadeiros amigos. Com as empresas ocorre algo parecido: é nos momentos em que ocorrem problemas graves, que a empresa mostra o quanto é or- ganizada, o quão eficientes são seus recursos e principal- mente qual é o verdadeiro caráter da empresa. Quais os desdobramentos desse fato e como, afinal, as empresas têm de agir durante a ocorrência de acidentes é o que vamos ver nesta Unidade de Aprendizagem. pArA ComeçAr Conforme já visto no início do curso, a Comunicação Em- presarial surgiu a partir do gerenciamento de uma crise: a imagem do milionário Rockefeller. Lembra-se do ideograma chinês 危机 (crise = peri- go + oportunidade)? Se o ideograma significa que crise é um momento perigoso, mas que pode gerar oportu- nidade, tais ocasiões devem ser utilizadas justamente para fortalecer a imagem das organizações que enfren- tam esses períodos. Alguns estudos sobre o assunto mostram que crises são tão comuns, que ocorrem todos os dias. Nesse sen- tido, uma discussão entre colaboradores já poderia ser considerada como crise. Outros consideram crise aque- les assuntos que extrapolam o interior da organização e chegam ao público externo. De qualquer forma, geren- ciar crise(s) é tarefa imprescindível nas organizações. O gerenciamento de crise é uma função organizacio- nal crítica. Falhas podem resultar em sérios prejuízos às partes interessadas, perdas para a organização e até mesmo seu fim. O assunto é considerado tão importan- te, que grandes organizações possuem equipes especiais para tratar do gerenciamento de crises. Comunicação Empresarial Geral / UA 15 Comunicação em Crise - Conceitos 4 A ilustração abaixo mostra humoristicamente que as flutuações provo- cadas podem derrubar, fazer naufragar, mas também há quem consiga se segurar, e sair fortalecido. FundAmentos 1. Crises e sUa gestãO Muito já foi escrito sobre o assunto tanto por pessoas que trabalham em organizações como por pesquisadores de várias disciplinas, o que trans- forma em desafio sintetizar o que se conhece sobre o gerenciamento de crises e a suas práticas. Há muitas definições para crise. Aqui, a definição reflete pontos fun- damentais encontrados em várias discussões: assim ela está associada à ameaça significativa para as operações, ameaça que pode ter consequên- cias negativas se não for tratada adequadamente. Nos EUA a disciplina gestão de crises ainda é genericamente deno- minada crisis management, o que a associa ao fato ocorrido e não à ges- tão de um sistema. No entanto, a expressão crisis administration, por se preocupar com o caráter mais estratégico, demonstra uma abordagem sistêmica, ou seja, a crise passa por momentos diferentes em que é preciso lidar com elementos diversos. Nesse sentido, a comunicação de crise acontece de várias formas, diretas e indiretas: resposta às si- tuações de emergência, gerenciamento, comunicação durante a crise, comunicação de risco, plano de crise, manual de comunicação de crise, estudo de vulnerabilidades. Figura 1. Crise financeira. Comunicação Empresarial Geral / UA 15 Comunicação em Crise - Conceitos 5 2. as ameaças Em gerenciamento de crises a ameaça é o dano potencial que ela acarre- ta em uma organização, em suas partes interessadas e ao próprio ramo de atividade. As crises podem gerar três tipos de ameaças, diretamente relacionadas à: → Segurança do público; → Perda financeira; → Perda de reputação. Algumas crises, como acidentes industriais e danos a produtos podem resultar em lesões e mesmo perdas de vidas, além de prejuízos financei- ros. Como consequência, podem gerar diminuição da fatia de mercado e de intenções de compra. Podem ainda suscitar ações judiciais com danos significativos. Robert Dilenschneider (2000), autor de um livro chamado Bíblia da Comunicação Corporativa, afirma que todas as crises, se não geridas de forma adequada, podem se transformar em ameaças à imagem de uma organização, além de refletir de modo danoso a sua reputação. Essas ameaças estão inter-relacionadas. Lesões ou mortes causam perda fi- nanceira e direta e danos à imagem. Estas, por sua vez, têm impacto financeiro nas organizações. 3. O bOm gerenCiamentO de Crises Por outro lado, quando bem gerenciadas, as crises acabam por fortalecer a imagem da empresa (é o caso da água mineral Perrier, de que tratamos quando falamos de Ética). Atenção Crises nem sempre provocam resultados inteiramente nega- tivos. Quando bem gerenciadas, podem fortalecer a imagem da empresa e prepará-la para situações semelhantes. O im- portante é não apenas superá-las, mas aprender com elas. Você se lembra do acidente com a aeronave da Air France? A empresa emitiu três notas: a primeira às nove horas e sete minutos do dia primeiro de junho de 2009; a segunda às onze horas e doze minutos e a terceira às treze horas e quarenta e nove minutos. Essa preocupação com a emissão de notas oficiais já se configura como intenção em manter a boa imagem. Comunicação Empresarial Geral / UA 15 Comunicação em Crise - Conceitos 6 A seguir, uma das comunicações publicada na mídia. Procurem observar os critérios adotados neste comunicado e quais os impactos que tal texto poderiam causar no leitor (cliente externo). Primeira Nota da Air France sobre acidente: (1/6/09 - 9h07) Air France lamenta informar que se encontra sem notícias do voo AF 447 que efetuava a ligação entre Rio de Janeiro e Paris Charles de Gaulle, com chegada prevista às 11h15 da manhã (hora local). O voo decolou do Rio no dia 31 de maio às 19 horas locais. 216 passageiros estão a bordo. A tripulação é composta de 12 pessoas: 3 tripulantes técnicos e 9 comissários. Um toll free está disponível: 0800 881 2020 para o Brasil, 0800 800 812 para a França, e 33 1 57 02 10 55 para outros países. A Air France divide a emoção e a inquietação das famílias envolvidas. Os familiares serão recebidos num local especialmente reservado no aeroporto de Paris Charles de Gaulle 2 assim como no Salão Nobre do Galeão. O texto da nota parece objetivo em uma primeira leitura. É claro, conciso e tem a pretensão de se mostrar objetivo. O redator procurou mostrar objetividade por meio de marcadores de tempo e lugar, além de utilizar numerais para reforçar o caráter de isenção: [...] o voo AF 447 que efetuava a ligação entre Rio de Janeiro e Paris [...] às 11h15 (hora local). O voo decolou do Rio no dia 31 de maio às 19 h locais. 216 passageiros estão a bordo. A tripulação é composta de 12 pessoas: 3 tripulantes técnicos e 9 comissários. Perceba que a escolha de termos associados à exatidão dos horários, à colocação do número de passageiros e à descrição numérica dos tripu- lantes mostra ao leitor que a empresa não pretende esconder informa- ções. Esses marcadores conferem um caráter de verdade a esse texto, que transmite imagem de seriedade e aumento de credibilidade. Apesar de alguns aspectos subjetivos, marcados principalmente pe- los adjetivos e a presença de alguns substantivos de caráter emocio- nais, o texto pretende uma proximidade com o auditório, formado pe- los leitores, principalmente pelos familiares e amigos dos passageiros. Isso se dá por meio de apelo ao lado emocional. Observe a primeira Comunicação Empresarial Geral / UA 15 Comunicação em Crise - Conceitos 7 frase: A Air France lamenta informar que se encontra sem notícias [...]. Embora escrito em terceira pessoa (a Air France) para demonstrar dis- tanciamento, há uma personificaçãoda empresa. À Air France são atri- buídas características próprias do indivíduo – lamentar não é atributo de pessoa jurídica. Como você pode observar, é intenção construir e preservar a imagem de empresa séria, íntegra, ética, sólida em seus propósitos. As outras no- tas emitidas seguem esse mesmo estilo. 4. estratégias de COmUniCaçãO de Crise O gerenciamento efetivo de crises lida com as ameaças de modo sequen- cial. A primeira preocupação deve ser a segurança do público. Uma falha em tratar essa segurança pode intensificar os danos. A reputação e as preocupações financeiras são consideradas somente após eliminados os perigos relativos à segurança do público. De modo abrangente é possível dizer, como Rosenthal e Kouzmin (1997), que o gerenciamento de crise se destina a proteger uma organização e suas partes interessadas de amea- ças e/ou reduzir o impacto percebido. Trata-se, conforme comentado, de um processo e, como tal, não con- siste de uma única linha de ação. Está dividido em três fases: 1. Pré-crise, que consiste em prevenção e preparação; 2. Resposta à crise, que ocorre quando a gerência da organização res- ponde efetivamente a uma crise; 3. Pós-crise, que consiste na procura por caminhos que preparem para uma próxima crise e permitam o cumprimento de compromissos assumidos durante a crise. Essa fase inclui informação sobre as pos- síveis consequências. DicA Essa visão de processo em três partes, significa que um programa de gerenciamento de crises também pode ser dividido em três fases: 1) pré-planejamento, 2) desenvolvi- mento e implantação e 3) pós-implantação (ROSENTHAL e KOUZMIN, 1997). A fase pré-crise se caracteriza pela busca na redução dos riscos que podem levar à crise e redução das consequências. A lista mos- tra de modo resumido que essa etapa consiste de atuação contínua, e Comunicação Empresarial Geral / UA 15 Comunicação em Crise - Conceitos 8 pretende minimizar os efeitos da crise. Assim, sugere-se que a empre- sa: possua um plano de gerenciamento de crises e o atualize ao menos uma vez por ano; estabeleça uma equipe de gerenciamento de crises treinada de modo adequado; conduza um exercício ao menos anual para teste do plano e equipe de gerenciamento de crises e elabore uma minuta sobre notas oficiais, com revisão e aprovação pelo depar- tamento jurídico. Um dos tópicos do treinamento mencionado deve incluir o conheci- mento retórico de notas oficiais. A elaboração da minuta cuida do lado pragmático da redação das notas oficiais. É preciso observar que cada crise é um acontecimento inesperado. Assim, a equipe responsável pelo gerenciamento de crise e em particular a de redação de notas oficiais têm de tomar decisões. Conhecimentos de retórica e pragmática certamente contribuem para a elaboração dessas notas. A fase de resposta à crise é constituída pela comunicação e apresenta duas etapas: a resposta inicial e a restauração da imagem. Durante a resposta inicial, o enfoque prático contém três recomenda- ções: rapidez, exatidão e consistência. A necessidade de rapidez valoriza as minutas redigidas na fase de preparação. A exatidão determina que somente informações corretas sejam fornecidas e a consistência define que mensagens não podem ser contraditórias entre si e em relação aos fatos e ações. As recomendações para essa segunda fase são: tentativa de emissão da comunicação inicial na primeira hora após o evento; verificação cui- dadosa dos fatos; garantia de informação aos porta-vozes; segurança ao público como primeira prioridade; utilização de todos os canais dispo- níveis de comunicação, interna e externa; demonstração de simpatia de preocupação para com as vítimas; garantia de acompanhamento médico e psicológico para as vítimas, familiares e amigos. A estratégia de restauração de imagem depende da causa da crise, porém mais ainda, da elaboração de comunicados da organização. A tabela a seguir mostra as estratégias possíveis. Você percebe o caráter pragmático de algumas dessas estratégias. estratégia Comentário 1 Atacar o acusador Aplica-se quando a crise é causada por uma acusação falsa proveniente de pessoa ou grupo sem credenciais. 2 Negar Afirmar que não há crise. Aplica-se principalmente a boatos, infelizmente causadores frequentes de crises. Tabela 1. Estratégias para restauração da imagem. Fonte: Adaptado de W. Timothy Coombs. Comunicação Empresarial Geral / UA 15 Comunicação em Crise - Conceitos 9 estratégia Comentário 3 Acusar um terceiro Culpar pessoa ou grupo externo à organização pela crise. É caso, por exemplo, de desastre aéreo causado por pista de pouso em más condições. 4 Apresentar uma causa externa Negar intencionalidade ou negligência e mostrar a impossibilidade de controlar os eventos que provocaram a crise. Pode assumir uma das formas que seguem. Suscitação Atribuir a crise a uma resposta a ações de terceiros. Imprevisibilidade Falta de informação sobre os eventos que levaram à crise. Imponderabilidade Impossibilidade de controle sobre os eventos que levaram à crise. Boas intenções A organização pretendia efetuar uma ação benéfica. 5 Amenizar Minimizar a percepção do dano causado pela crise, construindo um ou mais cenários plausíveis. 6 Lembrar Apresentar às partes interessadas um histórico de ações positivas efetuadas pela organização. 7 Elogiar Congratular as partes interessadas por suas ações, presentes e passadas. 8 Compensar Oferecer reparações tangíveis às vítimas e suas famílias, sem se limitar a declarações de solidariedade. 9 Desculpar-se Indicar que a organização assume a inteira responsabilidade por suas falhas ou omissões e pedir desculpas às partes interessadas. Embora a tabela apresente um caráter prático, é possível observar argu- mentos persuasivos ou convincentes para utilizar quaisquer das estraté- gias ou mesmo a combinação de algumas delas. Basta observar cada uma delas para saber que existe uma prática retórica (convencimento). Existe, como estratégia de resposta, uma nomenclatura de atribuições de responsabilidade: crises de mínima responsabilidade, baixa respon- sabilidade e forte responsabilidade. As crises de responsabilidade míni- ma são, por exemplo, os desastres naturais, rumores sem fundamento, agressões pessoais e utilização indevida de produto. As mais graves ou de maior responsabilidade acontecem quando acidentes decorrem por erro humano, defeitos em produtos ou falhas organizacionais que produzem danos sérios. Determinada a atribuição de responsabilidade, é possível escolher a combinação de estratégias. Na fase de pós-crise, a organização deixa de ser o foco das atenções, embora ainda seja necessário certo cuidado. A restauração da imagem pode depender de uma continuidade à sequência de ações iniciadas ou Comunicação Empresarial Geral / UA 15 Comunicação em Crise - Conceitos 10 mesmo prometida durante a fase anterior, principalmente no que se re- fere ao fornecimento de informações detalhadas. Não se pode negligenciar, em nenhum momento, a força das palavras escolhidas para garantir a manutenção da boa imagem, mesmo na fase pós-crise. A gestão de crises corporativas tem evoluído rapidamente em função das realidades e necessidades. As organizações vivenciam problemas ori- ginados em situações inerentes ao negócio e recebem ataques e acusa- ções, verdadeiras ou falsas, que envolvem seus produtos, imagem, repu- tação, marca e condicionam o futuro. Empresas, assim como indivíduos, têm identidades, personalidades. A transformação dessa identidade em imagem é um processo no qual a comunicação, interna e externa, é considerada central. A comunicação de uma empresa, quando bem planejada e executada, transmite a seus públicos um sentido de quem a organização é. A identidade corporativa diferencia uma empresa, é o que a faz única aos olhos de seus colaboradores e demais partes interessadas e pode ser definida como o conjunto de atributos que torna uma empresa especial. Fascioni (2010) lembra que osatributos podem ser essenciais (valores, cultura, propósito) ou acidentais (logotipo, código de vestimenta, slogans publicitários). Os atributos essenciais são os que influenciam decisiva- mente a identidade corporativa. Os acidentais servem à descrição da em- presa, mas não definem sua essência. Uma organização pode, por meio de sua identidade, transmitir uma imagem de honestidade, justiça ou de preocupação com seu papel na sociedade. Robert Heller (1988), autor de livros celebrados sobre administração, lembra que assim, a comunicação empresarial integrada, em termos de imagem e identidade, pode promover uma cultura forte e um senso de cidadania corporativa. O profissionalismo na comunicação inclui também uma relação com a imprensa, que compreende respostas rápidas e res- ponsáveis a situações de crise. O sucesso da comunicação da crise vai depender em larga medida do que a empresa tiver construído em suas relações com a imprensa e a comunidade. antena pArAbóliCA O recall, prática muito comum na indústria automobilísti- ca, ocorre quando uma montadora descobre um defeito em veículos já vendidos e em circulação. A montadora convoca os proprietários e faz os reparos necessários sem ônus para o comprador. No início, costumavam cha- mar muita atenção, agora se tornaram rotineiros e até reforçam positivamente a imagem das empresas. Um caso, no entanto, que ficou evidente de maneira negativa foi o de uma montadora de origem asiática que primava pelo cuidado de fabricação e construiu sua imagem em grande parte baseada nisso. Por uma questão estratégi- ca surgida nos últimos anos, descentralizou a montagem e afrouxou os controles. O resultado foi o de vários re- calls seguidos, que resultou em crise de imagem, ou seja, a empresa foi seriamente afetada. Isso mostra que não existe uma única receita anticrise. e AgorA, José? Depois de conhecer como ocorrem as crises e quais be- nefícios ou malefícios elas podem gerar na empresa, você verá como se efetiva o relacionamento com clientes além de informações sobre o terceiro setor. Comunicação Empresarial Geral / UA 15 Comunicação em Crise - Conceitos 12 reFerênCiAs COOMBS, W. T. �Crisis Management and Com- munications. Disponível em: <http://bit.ly/ bspcDO>. [s.d.]. Acesso em: set. 2010. DILENSCHNEIDER. R.� The Corporate Commu- nications Bible. Milwaukee: New Mille- nium, 2000. FASCIONI, L.� DNA Empresarial – Identidade Corporativa. S. Paulo: Integrare, 2010. KUNSCH, M, M. K. �Planejamento de relações públicas na comunicação integrada. São Paulo: Summus, 2003. ROSENTHAL, U. & KOOUZMIN, A.� Crises and Cri- sis Management: Toward Comprehensive Government Decision Making. Journal of Public Administration, Research and The- ory, 1997, 7(2). HELLER, R. �Essential Managers Manual. New York: DK Publishing, 1998.