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Mariane Rauber 1 UC10 – Problema 4 1. Abordar sobre a flora vaginal normal e patológica. 2. Estudar as principais Vulvovaginites 2.1 epidemiologia 2.2 fisiopatologia 2.3 manifestações clínicas 2.4 FR e prevenção 2.5 DX e tto 3. Estudar as principais IST 4. Compreender os mecanismos de ação dos fármaco. Flora Vaginal Williams, pg 82. OLHAR FREITAS A flora vaginal de uma mulher normal, em idade reprodutiva, assintomática, inclui várias espécies aeróbias ou facultativas, bem como espécies anaeróbias obrigatórias (Tabela 3-1). As anaeróbias predominam e superam as espécies aeróbias na proporção aproximada de 10 para 1. Essas bactérias mantêm uma relação simbiótica com o hospedeiro e sofrem modificações dependendo do microambiente. Localizam-se onde suas necessidades são supridas, e a evolução do processo infeccioso depende da capacidade destrutiva do hospedeiro humano. Contudo, a função desta colonização bacteriana da vagina permanece desconhecida. Dentro desse ecossistema vaginal, alguns microrganismos produzem substâncias, como o ácido láctico e o peróxido de hidrogênio, que inibem os organismos não nativos. Vários outros componentes antibacterianos, denominados bacteriocinas, desempenham um papel similar e incluem peptídeos, como acidocina e lactacina. Além disso, algumas espécies microbianas têm a capacidade de produzir aderências proteicas e de se prender às células epiteliais vaginais. Para proteção contra muitas dessas substâncias tóxicas, a vagina secreta o inibidor da protease dos leucócitos. Essa proteína protege os tecidos locais contra produtos inflamatórios tóxicos e infecções. Determinadas espécies bacterianas normalmente encontradas na flora vaginal têm acesso ao trato reprodutivo superior. Microbioma vaginal Refere-se a seres microscópicos, podendo abranger bactérias e fungos. São comensais, simbióticos e patogênicos, que compartilham os espaços em nosso corpo. O microbioma vaginal é, na grande maioria das vezes, dominado por uma ou duas espécies de Lactobacillus, sendo os mais frequentes Lactobacillus inner, Lactobacillus crispatus, Lactobacillus gasseri ou Lactobacillus jensenii. Até o momento, a espécie de Lactobacillus identificada com maior frequência tem sido a inners, seguida pelas espécies crispatus, gasseri e jensenii. Entretanto, em algumas mulheres assintomáticas e saudáveis, o predomínio no meio vaginal não é dos Lactobacillus, mas sim de outras bactérias, incluindo espécies de Prevotella, Gardnerella, Atopobium e Megasphaera. pH Vaginal Normalmente o pH vaginal varia entre 4 e 4,5. Embora não seja totalmente compreendido, acredita-se que tal pH resulte da produção de ácido láctico, ácidos graxos e outros ácidos orgânicos por espécies de Lactobacillus. Outras bactérias também podem contribuir com ácidos orgânicos produzidos com o catabolismo de proteínas, e bactérias anaeróbias contribuem com a fermentação de aminoácidos. O estrogênio estimula o depósito de glicogênio nas células epiteliais vaginais, que posteriormente é degradado em glicose e ácido lático, por ação dos Lactobacillus. Isso resulta em um pH vaginal igual ou menor a 4,5 na maioria das mulheres assintomáticas na idade reprodutiva, com ciclos menstruais normais. A produção de ácido lático, peróxido de hidrogênio, bacteriocinas e outras substâncias microbicidas pelos Lactobacillus sp. inibe o crescimento de patógenos e outros microrganismos oportunistas. Estudos recentes têm sugerido que o ácido lático é componente ativo da defesa imune inata no trato genital, promovendo ativação de Mariane Rauber 2 UC10 – Problema 4 linfócitos auxiliares da linhagem TH17, que atua contra microrganismos extracelulares. O glicogênio presente na mucosa vaginal saudável fornece nutrientes para muitas espécies no ecossistema vaginal e é metabolizado produzindo ácido láctico. Portanto, à medida que o conteúdo de glicogênio dentro das células epiteliais vaginais diminui após a menopausa, essa redução do substrato para a produção de ácido leva à elevação do pH vaginal. Na ausência de sintomas, o pH vaginal de 6 a 7,5 é bastante sugestivo de menopausa. Além disso, níveis séricos do hormônio folículo-estimulante (FSH, de follicle-stimulating hormone) e do pH vaginal mostraram-se diretamente relacionados. Contudo, observou- se relação inversamente proporcional entre pH e FSH e níveis séricos de estradiol. Outro aspecto importante a ser considerado é a presença de biofilmes no trato genital. Biofilmes são agregados de bactérias formados por colônias de microrganismos que aderem entre si e recobrem uma superfície sólida ou recobrem as suas próprias colônias. Os biofilmes já foram identificados nas superfícies das células vaginais, têm sido mais estudados em mulheres com vaginose bacteriana (VB) e, provavelmente, se associam aos episódios de recorrências. É provável que os Lactobacillus constituintes da flora fisiológica também possam ter a capacidade de produzir biofilmes, que os recobririam e manteriam sua estabilidade no meio vaginal. Entretanto, tal hipótese ainda não foi estudada. Importante ressaltar que a flora vaginal sofre variações em sua composição na dependência de fatores endógenos ou exógenos. As diferentes fases do ciclo menstrual, gestação, uso de contraceptivos, frequência de intercurso sexual, uso de duchas ou produtos desodorantes, antibióticos ou outras medicações com propriedades imunossupressivas podem alterar as condições endovaginais, aumentando ou diminuindo as vantagens seletivas para microrganismos específico. A ação do intercurso sexual desprotegido sobre a microflora vaginal ainda é controversa; um estudo relatou a perda de Lactobacillus e outro não demonstrou efeito sobre os Lactobacillus, mas, sim, elevação dos níveis de Escherichia coli e de bacilos Gram-negativos facultativos. Diante desses conceitos, conclui-se que o meio vaginal é extremamente complexo. As interações entre o microbioma vaginal, os mecanismos de defesa locais e os agentes potencialmente patogênicos podem resultar nos estados de saúde vaginal ou em processos infecciosos e/ou inflamatórios, que tantos problemas causam às pacientes. O correto diagnóstico de tais situações é importante para que a flora vaginal saudável seja mantida e não danificada por tratamentos desnecessários e para que os processos de alteração dela e consequentes afecções patológicas sejam adequadamente diagnosticadas e tratadas. Corrimento vaginal normal Antes de falarmos sobre o corrimento vaginal fisiológico, isto é, o corrimento vaginal normal, não relacionado a doenças, temos que fazer uma rápida revisão da anatomia ginecológica feminina. É muito comum a confusão entre vagina e vulva. Quando olhamos para a genitália externa feminina o que vemos é a vulva; da vagina só conseguimos ver o seu orifício externo, pois a vagina propriamente dita é um canal que fica no interior do corpo e termina no colo do útero, como pode ser visto na ilustração abaixo. O corrimento normalmente se origina na vagina e só se torna perceptível quando sai pelo orifício externo da mesma. Em alguns casos, o corrimento pode ter origem no colo do útero. Todas as mulheres em idade reprodutiva podem ter um corrimento vaginal normal, chamado corrimento vaginal fisiológico. Este corrimento é formado pela combinação de células mortas da vagina, bactérias naturais da flora vaginal e secreção de muco; costuma ter entre 1 e 4 ml de volume diário e sua função é umedecer, lubrificar e manter a vagina limpa, dificultando o surgimento de infecções. O corrimento vaginal fisiológico é estimulado pelo estrogênio e, portanto, pode ter seu volume aumentado em períodos nos quais há maior estimulação hormonal, como na gravidez, uso de anticoncepcionais à base de estrogênios, no meio do ciclo menstrual, perto da ovulaçãoou dias antes da menstruação. O corrimento vaginal normal geralmente tem as seguintes características: pode ser espesso, aquoso ou elástico; sua cor é branca, leitosa ou transparente; e tem odor muito suave ou nenhum odor. Uma das dicas mais importantes para identificar um corrimento fisiológico é a ausência de sinais ou sintomas de irritação, como dor, ardência, vermelhidão ou comichão na vagina e/ou vulva. Todavia, é importante salientar que uma discreta irritação na vulva pode ocorrer em algumas mulheres com corrimento fisiológico. Flora alterada A alteração em qualquer elemento dessa ecologia pode modificar a prevalência de várias espécies. Por exemplo, meninas jovens e mulheres pós-menopáusicas que não fazem reposição de estrogênio apresentam menor prevalência de espécies de Lactobacillus comparadas com mulheres em idade reprodutiva. A terapia com reposição hormonal restaurou as populações de lactobacilos vaginais, que têm efeito protetivo contra os patógenos do trato reprodutivo. Há outros eventos que previsivelmente alteram a flora do trato reprodutivo e podem induzir infecção na paciente. Com o ciclo menstrual, observam-se alterações transitórias na flora. Tais alterações são observadas predominantemente nos primeiros dias do ciclo menstrual, e presume-se que estejam associadas a alterações hormonais (Keane, 1997). O fluxo menstrual também pode servir como fonte de nutrientes para várias espécies de bactérias, resultando em aumento do seu crescimento. O papel que esse fato desempenha no desenvolvimento de infecção no trato reprodutivo superior após a menstruação é obscuro, mas é possível que haja associação. Por exemplo, pacientes sintomáticas com infecção gonocócica aguda do trato reprodutivo superior normalmente estão menstruadas ou acabaram de terminar a menstruação. O papel exato desta sequência ou da abertura do canal cervical não foi esclarecido. Finalmente, o tratamento com antibióticos de amplo espectro pode produzir sintomas atribuídos à infecção por Mariane Rauber 3 UC10 – Problema 4 Candida albicans ou outras espécies de Cândida ao eliminar outras espécies competitivas da flora. A histerectomia com remoção do colo uterino altera a flora do trato reprodutivo inferior, com ou sem administração profilática de antimicrobianos. Em geral, mais espécies anaeróbias são identificadas na vagina no período pós-operatório, com aumento particular na prevalência de bacteroides fragilis. Entre as aeróbias, observa-se aumento da prevalência de Escherichia coli e Enterococcus. Essas três espécies são constantemente encontradas em culturas obtidas de mulheres que desenvolveram infecções pélvicas após histerectomia. Entretanto, aumentos similares também são encontrados nas culturas vaginais obtidas após histerectomia em pacientes assintomáticas. Corrimento vaginal de acordo com suas características O corrimento vaginal normal geralmente tem as seguintes características: pode ser espesso, aquoso ou elástico; sua cor é branca, leitosa ou transparente; e tem odor muito suave ou nenhum odor. Marrom Qualquer situação que provoque algum grau de sangramento vaginal ou uterino pode causar um corrimento acastanhado. As principais causas são: Restos da menstruação misturados ao corrimento fisiológico. Traumas na região vaginal ou uterina. Infecções. Corpo estranho na vagina. Tumores ginecológicos. Sangramento uterino provocado pela implantação do embrião no útero nos primeiros dias de gravidez. Atrofia vaginal. Gravidez ectópica. Amarelado O corrimento vaginal amarelado é geralmente sinal de infecção ginecológica, principalmente se acompanhado de mau cheiro, ardência ou coceira vaginal. As principais causas são: Tricomoníase. Gonorreia. Clamídia. O corrimento fisiológico costuma ser branco e claro, mas ao ser exposto ao ar após contato com a calcinha, ele pode ficar meio amarelado. Portanto, se a mulher não tiver sintoma algum e o corrimento não tiver cheiro, o fato dele ser meio amarelado não necessariamente indica alguma infecção em curso. Na dúvida, o melhor é procurar a sua ginecologista para ela poder avaliar o corrimento. Branco ou acinzentando O corrimento brancacento costuma ser normal, principalmente se for fino, em pequena quantidade e se ocorrer próximo do período ovulatório. Porém, se o corrimento for espesso, pastoso, leitoso, com grumos ou acinzentado, principalmente se estiver associado a sintomas irritativos, como coceira, dor vaginal ou mau cheiro, infecções devem ser investigadas. As principais causas são: Candidíase. Vaginose bacteriana. Com mau cheiro Corrimento com mau cheiro é típico de infecção ginecológica. As principais causas são: Vaginose bacteriana (cheiro muito forte). Tricomoníase. Vulvovaginites FEBRASGO, vaginites e vaginosis. Tratado FEBRASGO, pg 776. Dentre as infecções do trato reprodutivo, destacam-se as vulvovaginites e vaginoses, processos nos quais o meio ambiente vaginal fisiológico, composto primordialmente por Lactobacillus, encontra-se alterado, assim, possibilitando a proliferação de outros microrganismos e podendo estar associado a processo inflamatório (vaginites) ou sem evidências de inflamação (vaginoses). As vulvovaginites e vaginoses representam as queixas mais frequentes nos consultórios de ginecologia, sendo responsáveis por aproximadamente 40% dos motivos de consulta. Os sintomas são representados principalmente por corrimento vaginal, em quantidade, coloração e aspecto variáveis, associados a outros sintomas como odor desagradável, prurido, sensação de ardor e/ou queimação, disúria e dispareunia, a depender do(s) agente(s) etiológicos(s). Tais sintomas, além das repercussões anteriormente mencionadas, podem afetar negativamente a qualidade de vida. Vaginose bacteriana Etiologia: é um estado de desequilíbrio da flora vaginal caracterizado pela substituição da flora microbiana dominada por Lactobacillus por bactérias anaeróbias e facultativas. Embora existam variações entre mulheres, as espécies mais frequentemente encontradas são Gardnerella, Atopobium, Prevotella, Megasphaera, Leptotrichia, Sneatia, Bi dobacterium, Dialister, Clostridium e Mycoplasmas. Fisiopatologia: as bactérias associadas à VB alteram a resposta imune local, o que torna o meio vaginal imunossuprimido [portanto, mais suscetível a outros agentes infecciosos, como papilomavírus humano (HPV) e HIV]. Relaciona-se a diversos distúrbios do trato reprodutivo: maior prevalência em mulheres inférteis do que férteis, está associada a risco de abortamento após fertilização in vitro, infecções pelo HPV e neoplasias intraepiteliais cervicais, infecções após cirurgias ginecológicas, aumento da taxa de infecção pelo HIV, aumento da possibilidade de aquisição de agentes sexualmente transmissíveis, aumento do risco de infertilidade tubária; alguns Mariane Rauber 4 UC10 – Problema 4 estudos apontam associações com prematuridade, abortamento espontâneo, baixo peso ao nascer e endometrite pós-parto. Fatores de risco: raça negra, uso de duchas vaginais, tabagistmo, menstruação, estresse crônico, comportamentos sexuais – elevado número de parceiros. Quadro clínico: os sintomas são corrimento de intensidade variável, acompanhado de odor vaginal fétido (“odor de peixe” ou amoniacal), que piora com o intercurso sexual desprotegido e durante a menstruação. O odor ocorre devido à volatização de aminas aromáticas (putrescina, cadaverina, dimetilamina) resultantes do metabolismo das bactérias anaeróbias em contato com a alcalinidade do sêmen ou do sangue menstrual. Diagnostico: Ao exame especular, observa-se o conteúdo vaginal de aspecto homogêneo, em quantidade variável, com coloração esbranquiçada, branco-acinzentada ou amarelada. Os critérios de Amsel requerem trêsdos quatro itens a seguir: 1) corrimento vaginal branco-acinzentado homogêneo aderente às paredes vaginais; 2) medida do pH vaginal maior do que 4,5; 3) teste das aminas (whi- test) positivo 4) presença de “clue cells”. (14) O escore de Nugent baseia- se em elementos avaliados na bacterioscopia do conteúdo vaginal (Gram). O resultado da avaliação é traduzido em escores, assim considerados: 1) escore de 0 a 3 – padrão normal; 2) escore de 4 a 6 flora vaginal intermediária; 3) escore de 7 a 10 –VB. TTO: visa eliminar os sintomas e restabelecer o equilíbrio da flora vaginal fisiológica, principalmente pela redução dos anaeróbios. Metronidazol 500 mg por via oral (VO) duas vezes ao dia durante sete dias; OU Metronidazol gel 0,75% – 5g (um aplicador) intravaginal ao deitar-se durante cinco dias; OU Clindamicina creme 2% – 5g (um aplicador) intravaginal ao deitar-se durante sete dias. Alternativamente: Tinidazol 2g por VO duas vezes ao dia, durante dois dias; OU Tinidazol 1g VO uma vez ao dia, durante cinco dias; OU Clindamicina 300 mg por VO a cada 12 horas, durante sete dias. Recomendações: abstinência de álcool, abstenção sexual. Candidíase Etiologia: é o processo inflamatório vaginal causado pela proliferação de fungos no meio vaginal que levem ao aparecimento de sintomas (corrimento, prurido, disúria, dispareunia). Candida albicans é o agente mais frequente (85% a 95% dos casos); outras espécies de Candida (glabrata, tropicalis, parapsilosis, guilliermondii, entre outras) são encontradas em aproximadamente 10% dos casos. Denomina-se candidíase vaginal recorrente o aparecimento de quatro ou mais episódios confirmados clínica e laboratorialmente em um período de 12 meses. Os mecanismos que impedem ou que favorecem a passagem da Candida albicans do estado de comensal para o estado patogênico ainda não são totalmente conhecidos, mas estão particularmente relacionados à atuação do sistema imune do hospedeiro. A colonização vaginal por fungos parece ser hormônio dependente, já que é rara na infância e pós-menopausa e frequente na idade reprodutiva ou em mulheres em uso de terapia hormonal. Condições que alterem a concentração hormonal como gravidez e uso de contraceptivos de alta dosagem facilitam a proliferação dos fungos. A ingestão de antibióticos atua no mesmo sentido, provavelmente por alterar a flora protetora lactobaciliar. Quando o sistema imune não consegue inibir a proliferação dos fungos, ocorre a passagem do estado saprófita para o patogênico, com consequente aparecimento de sinais e sintomas. É importante lembrar que a concentração de fungos associada aos sintomas é diferente para cada mulher, já que existem diferenças individuais de resposta imune. Assim, baixa concentração pode levar ao aparecimento de sintomas em uma mulher, enquanto outra, mesmo tendo concentração elevada dos microrganismos, pode permanecer assintomática. Fisiopatologia: Candida albicans pode fazer parte da flora normal em baixas concentrações. Por fatores ainda pouco conhecidos, todavia, passa do estado de saprófita para o estado infeccioso, então, ocorrendo invasão das camadas do epitélio vaginal, resposta inflamatória e aparecimento de sintomas. São produzidas enzimas com atividade proteolítica (proteinases) que favorecem a aderência e o dano às células epiteliais, o que favorece a invasão. Possuem, ainda, a capacidade de formação de biofilmes, o que facilita as recidivas. Quadro clínico: as principais queixas são pruridas e corrimento geralmente esbranquiçado (fluido ou com aspecto de “leite talhado”), mais intensos no período pré-menstrual. Disúria e dispareunia, também, podem estar presentes. Diagnostico: Ao exame ginecológico, observam-se hiperemia vulvar, edema e, eventualmente, fissuras e escoriações; ao exame especular, verificam-se hiperemia da mucosa vaginal e presença de conteúdo vaginal esbranquiçado ou amarelado, em quantidade variável, de aspecto fluido, espesso ou flocular, podendo estar aderido às paredes vaginais. O pH vaginal encontra-se abaixo de 4,5. A presença de fungos é confirmada por meio de: 1) exame a fresco do conteúdo vaginal com hidróxido de potássio (KOH) a 10% ou soro siológico; 2) bacterioscopia com coloração pelo método de Gram; 3) cultura em meios específicos. O exame a fresco possui sensibilidade em torno de 50% a 60%. A positividade do exame a fresco dispensa a continuidade da investigação. Entretanto, se tal exame for negativo e houver sintomas, está indicada a continuação do processo diagnóstico, com a bacterioscopia pelo Gram e cultura, particularmente nos casos recorrentes. Para o tratamento e prevenção de novos episódios, é importante a eliminação ou pelo menos o controle de fatores predisponentes como diabetes melitus descompensada, estados de imunossupressão, tabagismo, distúrbios alimentares com excesso de ingestão de hidratos de carbono, hábitos de higiene ou vestuário inadequados, estresse excessivo e outros fatores, se presentes. TTO: consideram-se duas formas de candidíase. Não complicada: fenticonazol (creme na concentração de 0,02 g/g, um aplicador ao deitar, durante sete dias, ou óvulo com 600 mg em dose única), clotrimazol (creme 10 mg/g por sete dias, ou comprimido vaginal 500 mg em dose única), miconazol (creme 20 Mariane Rauber 5 UC10 – Problema 4 mg/g por 14 dias), econazol (creme 10 mg/g por 14 dias), butaconazol (20 mg/g em dose única), terconazol (8 mg/g por cinco dias), tioconazol (20 mg/g por sete dias, ou óvulo 300 mg em dose única); entre os poliênicos, nistatina (creme vaginal 25.000 UI/g por 14 dias) na forma de creme vaginal. Para uso sistêmico: fluconazol (comprimido de 150 mg em dose única), cetoconazol (comprimidos de 200 mg, posologia dois comprimidos - 400 mg, durante cinco dias); e itraconazol (cápsulas de 100 mg, uma cápsula pela manhã e outra à noite, por apenas um dia). Complicada: recorrente ou severa. Tricomoníase Etiologia: tem como agente etiológico o parasita flagelado Trichomonas vaginalis, de transmissão sexual e que tem a capacidade de fagocitar bactérias, fungos e vírus, transportando-os para o trato genital superior. Como nas demais infecções de transmissão sexual, a incidência depende de vários fatores como idade, atividade sexual, número de parceiros sexuais, sexo desprotegido, outras ISTs e condições socioeconômicas. Fisiopatologia: após penetrar na vagina, o Trichomonas vaginalis adere fortemente às células epiteliais, ligando uma proteína de sua superfície (lipofosfoglicano) à membrana das células. Para sua sobrevivência, o parasita adquire nutrientes do meio externo, fagocitando bactérias, fungos e células do hospedeiro. Eritrócitos incorporam sua membrana celular para adquirir o ferro, que utiliza para seu metabolismo e aumento de virulência. Provoca resposta in- amatória e facilita a aquisição de ouras infecções, inclusive a do HIV. A tricomoníase tem sido associada a complicações durante o ciclo gravídico puerperal. A resposta imune celular à Trichomonas vaginalis pode ser agressiva, com inflamação da mucosa da vagina e exocérvice em mulheres e da uretra em homens. Ocorre intensa infiltração de leucócitos, incluindo os da linhagem TCD4, que são alvo do HIV. Ao penetrar na vagina, o parasita cobre-se com as proteínas do hospedeiro, o que permite a evasão dos mecanismos de defesa locais; além disso, possui a capacidade de sobreviver no meio vaginal ácido, hostil, durante longos períodos de tempo, permanecendo firmemente ligado às células da mucosa vaginal. Quadro clínico: os sintomas são de corrimento geralmente profuso, amarelado ou amarelo-esverdeado, acompanhado de ardor genital, sensação de queimação, disúria e dispareunia. Os sintomas acentuam-se no período pós-menstrual devido à elevação do pH vaginal e à aquisição de ferro da hemoglobina peloparasita, o que aumenta sua virulência. Diagnostico: Ao exame ginecológico, geralmente se observam hiperemia dos genitais externos e presença de corrimento exteriorizando-se pela fenda vulvar. Ao exame especular, verifica-se aumento do conteúdo vaginal de coloração amarelada ou amarelo - esverdeada, por vezes, acompanhado de pequenas bolhas. As paredes vaginais e a ectocérvice apresentam-se hiperemiadas, observando-se ocasionalmente o “colo uterino com aspecto de morango” (colpitis macularis) em razão das sufusões hemorrágicas. O pH vaginal encontra-se acima de 4,5 e o teste das aminas (whi- test) pode ser positivo devido à presença de germes anaeróbios associados à VB. O método mais utilizado para o diagnóstico é a bacterioscopia a fresco, pelo qual se observa o parasita com movimentos pendulares (sensibilidade de 51% a 65%). A bacterioscopia com coloração pelo Gram também permite a identificação do T. vaginalis, nesse caso, imóvel. A cultura (meio de Diamond) é recomendada quando existirem sintomas e os exames anteriores tiverem sido negativos. TTO: os esquemas de tratamento recomendados são metronidazol 2g por VO em dose única ou tinidazol 2g por VO em dose única. Alternativamente, pode ser utilizado metronidazol 500 mg a cada 12 horas, durante sete dias. Tratar casal. Vaginose citolítica Etiologia: é causada pela excessiva proliferação de Lactobacillus, pela redução do pH vaginal e pela citólise, levando ao aparecimento de sintomas. Os fatores desencadeantes são desconhecidos. Fisiopatologia: os fatores que determinam a proliferação excessiva de Lactobacillus não são conhecidos (assim como não são totalmente conhecidos os fatores determinantes do pH vaginal). Discute-se se o pH mais ácido facilitaria o desenvolvimento dos Lactobacillus ou se ocorreria o inverso. De qualquer maneira, o excesso lactobacilar aumenta o processo citolítico, cujos produtos são responsáveis pelo aparecimento de sintomas. Provavelmente, fatores metabólicos tornam o meio vaginal propício à proliferação excessiva de Lactobacillus, os quais, isoladamente ou em conjunção com outros microrganismos, danificam as células da camada intermediária vaginal e induzem a citólise. Os produtos celulares liberados, associados à acidez vaginal excessiva, resultam nos sintomas acima mencionados. A exacerbação dos sintomas ocorre na fase lútea do ciclo e particularmente no período pré-menstrual. Quadro clínico: os sintomas são corrimento esbranquiçado e abundante, prurido de intensidades variáveis que piora no período pré-menstrual. Ardor, queimação, disúria e dispareunia podem estar associados. Diagnostico: Ao exame clínico, observa-se o conteúdo vaginal geralmente aumentado, de aspecto flocular, fluido ou em grumos, aderente ou não às paredes vaginais. O pH encontrase igual ou menor que 4. A bacterioscopia do conteúdo vaginal (Gram) revela aumento excessivo de Lactobacillus, raros leucócitos ou ausência deles, núcleos desnudos e restos celulares devido à lise das células epiteliais. Não são encontrados elementos fúngicos (hifas e/ou esporos). Vaginite inflamatória descamativa Etiologia: é uma forma pouco frequente, mas severa, de vaginite purulenta crônica. A etiologia é desconhecida; em alguns casos, têm sido identificados Streptococcus do grupo B e Escherichia coli, e o processo inflamatório é intenso. Existe a hipótese de que fatores imunológicos e de ciência de estrogênios contribuam para a afecção. Fisiopatologia: embora bactérias como Streptococcus do grupo B e Escherichia coli possam ser responsáveis pela estimulação do sistema Mariane Rauber 6 UC10 – Problema 4 imune com intensa resposta inflamatória, existem dúvidas se a afecção seria primariamente uma alteração do sistema imune, com infecção bacteriana secundária. Diagnostico: a queixa, comumente de longa duração, é de corrimento profuso ou em moderada quantidade, acompanhado de desconforto acentuado, dispareunia, ardor. O exame ginecológico revela processo inflamatório, de intensidade variável, com eritema, podendo haver petéquias ou mesmo equimoses na mucosa do trato genital; a cérvice pode estar envolvida. Por vezes, é necessário remover o conteúdo vaginal para melhor observar o processo inflamatório na mucosa. Importante excluir tricomoníase. Pela microscopia, observam-se aumento nos polimorfonucleares e nas células parabasais, ausência de Lactobacillus e presença de outras bactérias. O pH vaginal encontra-se acima de 4,5. O tratamento tem como objetivo reduzir a população bacteriana e o processo inflamatório. Vaginite aeróbica Etiologia: é um estado de alteração do meio vaginal caracterizado por micro- ora contendo bactérias aeróbicas entéricas (sendo as mais frequentes Enterococcus faecalis, Escherichia coli, Staphylococcus aureus, Staphylococcus epidermidis, Streptococcus do grupo B), redução ou ausência de Lactobacillus e processo inflamatório de diferentes intensidades. Existem questionamentos a respeito de se a flora aeróbia seria a causa da vaginite aeróbica ou secundária a alterações imunológicas. Fisiopatologia: em reposta à população bacteriana presente, ocorre aumento na produção de citocinas em graus variados de processo in- amatório; também é questionado o papel do sistema imune local. Diagnostico: os sintomas são corrimento vaginal, por vezes com aspecto purulento e odor desagradável; dependendo do grau de inflamação, há queixa de disúria e dispareunia. Ao exame ginecológico, observa-se inflamação do vestíbulo; ao exame especular, hiperemia da mucosa vaginal e aumento do conteúdo vaginal, em graus variáveis. O quadro clínico severo de vaginite aeróbia assemelha-se ao da vaginite inflamatória descamativa; para alguns autores, ambas seriam da mesma entidade. Por meio da microscopia do conteúdo vaginal (com microscópio de contraste de fase em aumento de 400 vezes), são avaliadas a - ora microbiana e a presença de leucócitos. De acordo com a quantidade de cada elemento, a vaginite aeróbica é classificada em quatro graus, denominados de “graus lactobacilares”. Certamente, na prática, a utilização de tal classificação apresenta limitações pela não disponibilidade de treinamento profissional e equipamento adequado. IST Tratado FEBRASGO, pg 754 - 823. Gonorreia A gonorreia apresenta prevalência muito menor que a Chlamydia, porém atinge cerca de 1% a 2% da população feminina, A Neisseria gonorrhoeae (NG), agente etiológico da gonorreia de transmissão sexual, é uma bactéria diplococos Gram-negativa, não flagelada, não formadora de esporos, encapsulada, e anaeróbia facultativa. A gonorreia é uma DST, permanecendo como um problema de saúde pública em todo o mundo. A sua importância é significativa, pois pode acarretar sequelas, como infertilidade, gravidez ectópica, DIP, trabalho de parto prematuro ou prematuridade. Embora nos últimos anos tenha ocorrido declínio na incidência da gonorreia, permanece como causa significante de morbidade nas nações em desenvolvimento. Fatores de virulência da Neisseria gonorrhoeae (Edwards e Apicella, 2004): PILI/fímbrias: é o primeiro mecanismo na base da patogenicidade; para haver infecção, tem de haver adesão. É responsável pela adesão às células e transferência de material genético e aquisição de resistências aos antimicrobianos; OMP: proteínas de membrana externa; OPA: proteína de adesão da bactéria a célula; Por B - porina – forma poros para inserção do gonococo; LOS (lipo-oligossacarídeos): desencadeia intensa resposta inflamatória, com liberação de fator de necrose tumoral alfa (TNFα), responsável pelo recrutamento de leucócitos, inflamação e aparecimento dos sintomas. Um grande mecanismo de patogenicidade dos Gram (-) é a produção de endotoxinas, que está presente na parede dos LOS, bloqueia anticorpos e vai mediar a maioria dasmanifestações clínicas; IgA protease: destrói e elimina a IgA das mucosas. Etapas da patogênese da Neisseria gonorrhoeae (Edwards e Apicella, 2004): Adesão: N. gonorrhoeae adere às células das mucosas, mediadas pelo Pili, OPA e outras proteínas de superfície; Invasão: os microrganismos são pinocitados por células que os transportam da mucosa ao espaço subepitelial; Endotoxina (LOS): prejudica a motilidade ciliar e contribui para a destruição das células ciliares; LOS: dano celular e invasão da submucosa por neutrófilos, formação de abscessos e exsudação de material purulento; Disseminação do gonococo: devido à incapacidade dos anticorpos e à falha do sistema (Figura 24.2). Mariane Rauber 7 UC10 – Problema 4 Em decorrência do processo inflamatório desencadeado, a cervicite por NG costuma ser quase sempre muito mais exuberante e sintomática. Os sinais inflamatórios mais importantes são: Exsudato purulento ou mucopurulento endocervical visível no canal endocervical ou em uma amostra de swab endocervical (vulgarmente designado por “cervicite mucopurulenta” ou cervicite); Sangramento endocervical facilmente induzido pela passagem suave de um cotonete ou escovinha através do orifício endocervical. Um ou ambos os sinais podem estar presentes. O colo fica edemaciado e aumenta seu volume, ficando com aspecto congesto. Outras queixas (Gonçalves et al., 2017; Gonçalves et al., 2016; Brasil, 2016; Workowski e Bolan, 2015): Corrimento e/ou sangramento vaginal irregular no período intermenstrual e sangramento pós-coito; Fluxo vaginal anormal ou disúria; Bartholinite; Doença inflamatória pélvica. Considerando-se a possibilidade da associação da N. gonorrhoeae e C. trachomatis e a dificuldade prática do diagnóstico, recomenda se o tratamento de ambas: Ciprofloxacino 500 mg, VO, DU, + azitromicina 500 mg, dois comprimidos, VO, DU; ou ceftriaxona 500 mg, intramuscular (IM), DU, + azitromicina 500 mg, dois comprimidos, VO, DU; Ciprofloxacino é contraindicado em gestantes e menores de 18 anos, sendo a ceftriaxona o medicamento de escolha; Ciprofloxacino está contraindicado nos estados do RJ, MG e SP, substituindo o tratamento pela ceftriaxona, devido à circulação de cepas de gonococos resistentes; Na indisponibilidade de ceftriaxona, usar cefalosporina de terceira geração, como a cefotaxima 1.000 mg IM, DU; Considerando-se a possibilidade da associação da N. gonorrhoeae e C. trachomatis e a dificuldade prática do diagnóstico, recomenda-se o tratamento de ambas. Tratamento das gestantes: Estearato de eritromicina 500 mg, VO, de 6 em 6 horas, por 10 dias; Ampicilina 3,5g, em DU, VO, precedido de probenecida, 1g em DU; Amoxicilina 3g, em DU, VO, precedido de probenecida, 1g em DU. A frequente escassez de sintomas da infecção por Chlamydia justifica a importância da sua busca ativa, e a gravidade das sequelas exige tratamento precoce. A busca ativa da CT em grupos de risco (gestantes, adolescentes, pessoas com outras DSTs) é primordial para prevenir sequelas interromper a cadeia de transmissão. O tratamento deverá ser instituído o mais precocemente possível, independentemente da sintomatologia. Tratar casal. Sífilis Também conhecida por lues, cancro duro e protossifiloma, é uma doença infectocontagiosa, de evolução sistêmica (crônica), ocorrendo, principalmente, por transmissão sexual e por outros contatos íntimos. O agente etiológico é o Treponema pallidum. Pode ser transmitida da mãe para o feto (intraútero) ou pelo contato da criança com as lesões maternas durante o parto (transmissão vertical). As manifestações clínicas dependem do tempo da doença. Na sífilis recente, observa-se a presença de lesão única (podendo ser múltipla em raros casos), com bordas endurecidas pelo processo inflamatório linfoplasmocitário (cancro duro ou cancro de inoculação). É mais comum ser visível no homem, no sulco bálano prepucial, que na mulher. O cancro duro, se não for tratado, pode persistir por 30 a 90 dias, involuindo espontaneamente. Na mulher, muito raramente se observa lesão em vulva. O cancro duro desaparece em 21 a 30 dias. Além dele, adenopatia satélite ocorre e é bilateral (inguinal), indolor e não inflamatória. Ambos são conhecidos como sífilis primária. Em todas as fases da sífilis, pode-se usar a sorologia para fazer o diagnóstico. Existem sorologias treponêmicas (FTA-Abs; MHA-TP, teste rápido) e a não treponêmica (VDRL, mais usado, RPR, Elisa). O VDRL reator com título igual ou superior a 1/8 é entendido como doença e o paciente deve ser tratado. A sífilis adquirida é confirmada quando o indivíduo apresenta evidência clínica da doença (presença de cancro duro ou cancro plano, roséolas, madarose etc.) e testes não treponêmico e treponêmicos reagentes. Outra situação ocorre quando o indivíduo é assintomático, mas tem um teste não treponêmico reagente (titulação baixa e teste treponêmico reagente). O VDRL com titulação baixa pode indicar um falso-positivo, devido à possibilidade de reações cruzadas ou um falso-negativo, no início da fase primária ou mesmo na fase latente tardia. O mesmo pode ocorrer com exames treponêmicos, porém com menor frequência. Os testes treponêmicos costumam ficar positivos por toda a vida do indivíduo. Segundo o Ministério da Saúde do Brasil, caso suspeito em grávida ocorre quando existem evidências clínicas de sífilis ou teste não treponêmico reagente (qualquer titulação). O caso é considerado confirmado quando a gestante apresenta teste não treponêmico reagente (qualquer titulação) e teste treponêmico reagente, independentemente de qualquer evidência clínica de sífilis. Gestantes com teste treponêmico reagente e teste não treponêmico não reagente (ou não realizado) também devem ser consideradas positivas. A sífilis secundária e a sífilis tardia não costumam apresentar ulceração, contudo as lesões planas da sífilis secundária podem ulcerar. Habitualmente, o condiloma plano (sífilis secundária) localiza-se na área genital devido a umidade, oclusão e trauma. Tratamento: Sífilis primária, sífilis secundária e latente recente (até um ano de duração): Penicilina G benzatina, 2,4 milhões UI, intramuscular (IM), dose única (1,2 milhão UI em cada glúteo). Alternativa: Mariane Rauber 8 UC10 – Problema 4 Doxiciclina 100 mg, VO, duas vezes ao dia, por 15 dias (exceto para gestantes); Ceftriaxona 1g, IV ou IM, uma vez ao dia, por 8 a 10 dias para gestantes e não gestantes. Sífilis latente tardia (mais de um ano de duração) ou latente com duração ignorada e sífilis terciária: Penicilina G benzatina, 2,4 milhões UI, IM (1,2 milhão UI em cada glúteo), semanal, por três semanas. Dose total de 7,2 milhões UI. Alternativa: Doxiciclina 100 mg, VO, duas vezes ao dia, por 30 dias (exceto para gestantes); Ceftriaxona 1g, IV ou IM, uma vez ao dia, por 8 a 10 dias para gestantes e não gestantes. Critério de cura: VDRL 3, 6 e 12 meses após o tratamento. Deverá haver queda de quatro títulos da sorologia ou sua negativação em seis meses a um ano. As gestantes devem ser acompanhadas mensalmente. Deverá ser feito um novo tratamento se a sorologia aumentar quatro títulos. O esperado é a diminuição de um título por mês. Cancro mole O cancro mole é uma doença infecciosa aguda de transmissão sexual e ulcerativa, localizada nos genitais, pouco frequente em nosso meio. Pode estar associado à adenopatia inguinal uni ou bilateral. É causado pelo cocobacilo (ou bastonete curto) Gramnegativo Haemophilus ducreyi. O período de incubação é de três a sete dias. Pequenas pápulas dolorosas rapidamente se rompem para formar úlceras rasas, com bordas irregulares. Logo depois, ocorre erosão fagedênica, que ocasionalmente leva à destruição tecidual acentuada. Os linfonodos inguinais se tornam dolorosos, aumentados e aderidosentre si e podem formar um abscesso com flutuação (bubão) na virilha. O diagnóstico deve ser feito pelo exame bacterioscópico após limpeza da lesão com soro fisiológico, coletando-se, com alça de platina ou espátula, exsudato purulento do fundo da lesão, preferencialmente sob as bordas. A positividade ocorre em 50% dos casos. A cultura para H. ducreyi e a biópsia da UG podem ser úteis no diagnóstico diferencial ou em casos não responsivos à terapia empregada. Não se deve esquecer de que o teste para HIV deverá ser feito rotineiramente em pacientes com úlcera genital. Os regimes de tratamento recomendados pelo Ministério da Saúde são azitromicina 500 mg, dois comprimidos, VO, em dose única, ou ceftriaxona 500 mg, IM, em dose única. Como segunda opção, usa-se também ciprofloxacino 500 mg, um comprimido, VO, duas vezes ao dia, por três dias O tratamento sistêmico deve ser acompanhado de medidas locais de higiene, e o tratamento das parcerias sexuais é recomendado, mesmo quando assintomáticas. Herpes genital O herpes genital (HG) é uma doença sexualmente transmissível de alta prevalência em nosso meio. O herpes simples vírus (HSV) pode provocar lesões na pele e nas mucosas dos órgãos genitais masculinos e femininos. O HG manifesta-se por pequenas vesículas que se agrupam nos genitais masculinos e femininos. Às vezes, elas estão presentes dentro do meato uretral ou, por contiguidade, podem atingir a região anal e perianal, de onde se disseminam se não houver bom controle por meio do sistema imunológico de cada indivíduo. Falta de sono, traumas, trabalho excessivo, uso de drogas, constrangimentos emocionais, má alimentação (desnutrição), aids (síndrome da imunodeficiência adquirida), uso de altas doses de corticoide, neoplasias, quimioterapia, entre outras, são as principais causas de imunossupressão. As lesões do HG costumam regredir espontaneamente, mesmo sem tratamento, nos indivíduos imunocompetentes. Nos imunodeprimidos, incluindo os infectados pelo HIV, porém, elas podem adquirir dimensões extraordinárias. O Centro de Controle de Doenças Americano considera caso definidor de aids a presença de lesão herpética em mucosas por mais de 30 dias. Quadro clínico: Caracterizam-se por apresentar ardor, prurido, formigamento e adenomegalia, que podem anteceder a erupção cutânea. Hiperemia aparece alguns dias após e depois evoluem para vesículas agrupadas, que, depois, se rompem formando exulceração dolorosa seguida de cicatrização. O vírus migra pela raiz nervosa até alojarse num gânglio neural, onde permanece quiescente até a recidiva seguinte. Diagnóstico: é essencialmente clínico (anamnese e exame físico). A cultura e a biópsia são raramente utilizadas, pois sua sensibilidade diminui com a duração da lesão. A pesquisa de HSV por técnicas de biologia molecular – PCR – pode ser útil, mas é desnecessária na prática. A detecção da glicoproteína específica do HSV para determinar a etiologia da lesão pelo HSV-2, utilizando-se testes rápidos, é defendida pelos norte-americanos, principalmente em gestantes, com a finalidade de se estabelecerem medidas profiláticas da transmissão vertical, ou entre casais sorodiscordantes para o HIV, com o intuito de reduzir a transmissão horizontal. Não existe ainda tratamento eficaz para a cura da doença. O tratamento tem por objetivo diminuir as manifestações da doença ou aumentar o intervalo entre as crises. Inibe a síntese de DNA, possui ação na fase aguda e não atua na latente. As drogas antivirais mais comumente empregadas, com suas respectivas posologias: Primoinfecção: Aciclovir 400 mg, três vezes ao dia (7 a 14 dias); Valaciclovir 1.000 mg, duas vezes ao dia (7 a 14 dias); Fanciclovir 250 mg, três vezes ao dia (7 a 14 dias); Recorrência: Aciclovir 400 mg, três vezes ao dia (cinco dias); Valaciclovir 500 mg, duas vezes ao dia (cinco dias); Fanciclovir 125 mg, duas vezes ao dia (cinco dias); Supressão: Aciclovir 400 mg, uma vez ao dia (seis meses); Valaciclovir 500/1.000 mg, uma vez ao dia (seis meses); Fanciclovir 250 mg, duas vezes ao dia (seis meses); Gestantes. Mariane Rauber 9 UC10 – Problema 4 Tratar o primeiro episódio em qualquer trimestre da gestação, conforme o tratamento para o primeiro episódio. O tratamento da gestante se impõe, principalmente na primoinfecção. Está liberado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) o uso de aciclovir nas doses recomendadas: Infecção primária: 400 mg, três vezes ao dia (7 a 14 dias); Recorrentes: 400 mg, três vezes ao dia, ou 800 mg, duas vezes ao dia (cinco dias); Supressão: 400 mg, três vezes ao dia, a partir de 36 semanas até o parto; Infecção disseminada: 5 a 10 mg/kg intravenoso (IV), de 8 em 8 horas, por dois a sete dias e manter via oral (VO) 400 mg, três vezes ao dia, por no mínimo 10 dias. A escolha da via de parto deve considerar que o período seguro de rotura das membranas não está comprovadamente definido, mas acredita-se que, após 4 horas, a contaminação fetal já tenha ocorrido, dessa forma, a cesárea não contribuiria para a redução da transmissão, devendo ser realizada apenas se houver outra indicação associada. Condiloma acuminado – HPV O papilomavírus humano (HPV) é considerado o agente da infecção viral sexualmente transmissível mais prevalente em todo o mundo. A maioria dos indivíduos sexualmente ativos (mais de 80%) se infectará em algum momento da vida. No entanto, as infecções serão predominantemente assintomáticas e serão clareadas em cerca de dois anos (Tota et al., 2011). Já foram identificados mais de 200 tipos de HPV, cerca de 40 infectam o trato anogenital e algo em torno de 12 são efetivamente oncogênicos, ou seja, associados a tumores invasivos. Desses, o que tem mais sido estudado é o câncer de colo uterino (Bravo et al., 2015). O vírus é composto por uma cápsula dentro da qual há um DNA em dupla fita de cerca de 8 mil pares de bases. O genoma do HPV é dividido em áreas com funções determinadas (Figura 26.1): uma que codifica proteínas não estruturais, chamada de E (Early), que tem cerca de 4 mil pares de bases ou 4 kb, dividida em E1, E2, E4, E5, E6 e E7; outra região que codifica as proteínas do capsídeo viral chamada L (Late) com 3 kb, dividida em L1 e L2; e uma região de controle que regula a replicação viral e a expressão de genes com 1 kb (LCR – long control region). A classificação do vírus é baseada na sequência de nucleotídeos do gene L1 (Bravo et al., 2015; De Villiers et al., 2004). Deve haver pelo menos 10% de diferença da sequência de nucleotídeos para classificar um novo genótipo de HPV. Os tipos são agrupados em grandes grupos filogenéticos, categorizados com letra grega e seguidos pelo número que indica a espécie. O vírus é genótipohospedeiro específico e há preferência de determinados tipos por sítios anatômicos, onde causam lesões com características clínicas e patológicas distintas. A infecção é transmitida por contato, e não apenas pelo coito. O uso regular de preservativo pode conseguir algo em torno de 60% de proteção, mas áreas não protegidas podem estar associadas à transmissão. Há grande possibilidade de transmissão genital sem que tenha havido a coitarca, apenas com o contato pele a pele dos genitais dos parceiros (Shew et al., 2013). Por razões ainda não entendidas, nem todo parceiro sexual se contamina, e a concordância de infecção por HPV entre parceiros sexuais varia de 40% a 60% (Burchell et al., 2010). A transmissão pode também ser não sexual (Winer et al., 2003; Eleutério et al., 2013). Alguns estudos apontam a transmissão por fômites (Ryndock e Meyers, 2014; Sabeena et al., 2017). Pode haver passagem de HPV de mãe para o concepto, em especial em casos de lesões genitais na passagem do canal de parto, o que pode causar a papilomatose respiratória (Venkatesanet al., 2012). Tem sido sugerido que haja transmissão vertical em uma taxa de aproximadamente 20%. No entanto, a maioria dos neonatos elimina a infecção até o primeiro ano de vida. O HPV é um vírus presente em todo o mundo. A maior incidência ocorre em jovens, entre mulheres especialmente, de 15 a 19 anos. Cerca de 90% dessas jovens eliminarão o vírus em um período médio de dois anos. A grande maioria não desenvolve qualquer lesão. No entanto, é no pequeno percentual de mulheres em que o vírus é persistente que há risco de associação com quadro mais preocupante de risco para lesão neoplásica invasiva (Sellors et al., 2003). Considera- se ainda que há um novo pico na incidência, embora menor que o primeiro, na faixa dos 50 anos de idade, talvez por conta de novos parceiros sexuais (Smith et al., 2008) e da menor resposta imunológica. O sistema imunológico é importante no controle das infecções pelo vírus. Há evidência de envolvimento de células T helper na regressão de lesões e concomitante resposta humoral e celular contra antígenos do HPV durante a regressão do quadro (zurHausen, 2002). O HPV tem a habilidade de se resguardar de uma resposta imune mais robusta e clarear lentamente (Grabowska e Riemer, 2012). São estratégias importantes nesse processo a supressão da resposta inflamatória e se tornar “invisível” a resposta imune, por conta de não causar citólise ou morte celular. Além disso, a supressão da resposta de interferona, a resistência à apoptose imunemediada e a redução da regulação de moléculas de adesão a células apresentadoras de antígenos interferem no processo-padrão do reconhecimento de antígenos, enquanto uma produção prejudicada de componentes de complexo de histocompatibilidade contribui para minimizar a exposição de antígenos do vírus a células epiteliais e do sistema imune. O vírus tem predileção por células imaturas em divisão celular. A infecção pode ocorrer em células da camada basal do epitélio escamoso, células subcilíndricas de reserva, células reparativas e, mais recentemente, foi descrito um tipo específico de células originalmente da junção escamocolunar denominado de células juncionais (Herfs e Crum, 2013). Dependendo da forma em que o vírus interaja com a célula e com o tipo celular, podem aparecer, ou não, lesões morfológicas diagnosticadas clinicamente ou por citologia ou biópsia. A maioria das infecções será identificada apenas por métodos de detecção do DNA viral (por biologia molecular), não havendo lesão morfologicamente detectável. São as infecções latentes. Tendem a desaparecer espontaneamente em cerca de dois anos (Schiffman et al., 2007). Mariane Rauber 10 UC10 – Problema 4 Algumas infecções podem causar lesões identificadas por métodos de magnificação (colposcopia ou citologia) (Figuras 26.2 e 26.3), não sendo visíveis a olho nu. É a manifestação subclínica da lesão. Por fim, a infecção pode se manifestar clinicamente, ou seja, com lesão visível a olho nu (Figura 26.4). A maioria desses casos é de lesões verrucosas genitais e associadas a HPV de baixo risco. O HPV é responsável por cerca de 7% a 8% dos cânceres e está associado com virtualmente 100% dos casos de câncer de colo uterino, 93% dos cânceres de ânus, 64% dos de vagina, 50% dos de vulva, 40% dos de pênis e 60% dos cânceres de orofaringe. TRATAMENTO A conduta deve variar conforme a apresentação do quadro infeccioso. Infecção latente em qualquer sítio: conduta expectante. Lesão subclínica: LSIL: pode ser expectante com seguimento até sua involução. Quadros persistentes podem ser tratados com métodos destrutivos, imunomodulação ou exérese dependendo do sítio; HSIL: dependendo da idade pode ser seguimento (≤ 24 anos) ou tratamento (> 24 anos). Lesão clínica: pode ser por imunomodulação, exérese ou destruição conforme o sítio, número de lesões e experiência do especialista (Tabela 26.6). Linfogranuloma – Clamídia Também conhecido por linfogranuloma inguinal, mula, bubão ou doença de Nicolas-Favre, caracteriza-se pelo aparecimento de lesão genital (lesão primária) de curta duração e que se apresenta como ulceração (ferida) ou pápula e tem como agente etiológico a Chlamydia trachomatis L1, L2 e L3. Apresenta um período de incubação que varia de 3 a 32 dias, após o que surge a papulovesícula ou pequena erosão, que em geral passa despercebida, pois cicatriza em poucos dias. A localização preferencial é na genitália externa. Assim como o cancro mole, o LGV tem baixíssima prevalência em nosso meio, sendo diagnóstico de exceção. O diagnóstico deve considerar, além do quadro clínico, que muitas vezes se apresenta de forma incaracterística, alguns exames complementares que poderão ajudar na propedêutica diagnóstica. Portanto, o diagnóstico é embasado na clínica, epidemiologia e exclusão de outras etiologias para proctites, linfadenomegalia inguinal ou UGs ou retais. Lesões genitais, material retal e material do linfonodo podem ser testados para C. trachomatis por cultura, imunofluorescência direta ou detecção dos ácidos nucleicos. Entre os exames utilizados, podemos citar: Citopatológico: raramente positivo (ver inclusões citoplasmáticas características); ELISA: alta sensibilidade, identificação dos anticorpos contra o antígeno do grupo e não dos diferentes sorotipos; Cultura com células de McCoy: alta especificidade, tornandose positiva em três dias, contudo é feita em poucos lugares e exige profissional experiente; Sorológico (reação de fixação do complemento): teste mais empregado, tem alta sensibilidade e baixa especificidade. Positividade não implica atividade da doença; Sorologia de Ct (fixação do complemento com títulos superiores a 1:64 ou microimunofluorescência com títulos maiores que 1:256): diagnóstico do LGV em contexto clínico apropriado; Microimunofluorescência: método mais sensível no diagnóstico da doença, capaz de detectar anticorpos específicos aos diferentes sorotipos; PCR e captura híbrida: alta sensibilidade e especificidade. O custo, anteriormente caro, tem se tornado acessível e facilita a realização e a interpretação. Tratamento: Deve ter início precoce, antes mesmo da confirmação laboratorial, a fim de minimizar eventuais sequelas. A tetraciclina e a azitromicina são medicações de escolha e devem ser empregadas, salvo contraindicações (gravidez, infância, intolerância ou alergia). Doxiciclina 100 mg, VO, um comprimido, duas vezes ao dia, por 21 dias, é a primeira opção de tratamento. Como segunda opção, temos a azitromicina 500 mg, dois comprimidos, VO, uma vez por semana, por 21 dias, com uso preferencial nas gestantes. Se a parceria sexual for assintomática, recomenda-se um dos tratamentos abaixo: azitromicina 500 mg, dois comprimidos, VO, em dose única, ou doxiciclina 100 mg, um comprimido, VO, duas vezes ao dia, por sete dias O prolongamento da terapia pode ser necessário até a resolução dos sintomas. A antibioticoterapia não tem efeito expressivo na duração da linfadenopatia inguinal, mas os sintomas agudos são frequentemente erradicados de modo rápido. Os antibióticos não revertem sequelas como estenose retal ou elefantíase genital. Os linfonodos apresentando flutuação devem ser aspirados com agulha grossa e nunca drenados ou excisados, pois, além de retardarem a cicatrização, esses dois últimos procedimentos podem disseminar a doença e propiciar o aparecimento de elefantíase. Donovanose É uma DST crônica ulcerativa também conhecida como granuloma venéreo, granuloma tropical ou úlcera venérea crônica. É causada pela bactéria Gram-negativa intracelular Klebsiella granulomatis. Após um período de incubação de oito dias a seis meses, aparece lesão nodular em número variável, que evolui para úlcera. A lesão é não dolorosa e altamente vascularizada, sangrando facilmente com o contato. Outrasapresentações: lesões vegetantes, vegetantes e Mariane Rauber 11 UC10 – Problema 4 ulcerosas, elefantiásicas e, eventualmente, pode haver manifestações sistêmicas. Exames histopatológicos e citopatológicos podem identificar os corpúsculos de Donovan, confirmando o diagnóstico. Tratamento: Doxiciclina 100 mg, um comprimido, VO, duas vezes ao dia, por pelo menos 21 dias ou até o desaparecimento completo das lesões. O critério de cura é o desaparecimento da lesão, não tendo sido relatada infecção congênita. Devido à baixa infectividade, não é necessário fazer o tratamento das parcerias sexuais (Figura 22.3). Mecanismo de ação fármacos Clark, pg 439 Metronidazol Metronidazol é um antibiótico bactericida. Ele entra nas paredes celulares bacterianas, rompe o DNA e inibe a síntese do DNA em certos microrganismos. Mecanismo: Alguns parasitas protozoários anaeróbios (incluindo amebas) possuem proteínas de transporte de elétrons com baixo potencial redox, tipo ferrodoxina, que participam nas reações de remoção de elétrons metabólicos. O grupo nitro do metronidazol é capaz de servir como aceptor de elétrons, formando compostos citotóxicos reduzidos que se ligam às proteínas e ao DNA, resultando em morte celular. Tinidazol é um nitroimidazol relacionado com um mecanismo de ação semelhante, mas uso clínico mais limitado. Metronidazol oral é bem absorvido. Em geral, o uso IV é necessário somente para pacientes que não podem ser tratados por via oral. É distribuído amplamente em líquidos do corpo e alcança altas concentrações no líquido cerebrospinal. Metronidazol é metabolizado, presumivelmente, no fígado e excretado principalmente na urina, mas sua eliminação não é diminuída em pacientes com insuficiência renal. Entretanto, como os metabólitos do metronidazol podem se acumular em pacientes com doença renal terminal, deve-se monitorá-los quanto a efeitos adversos associados ao metronidazol, como efeitos no sistema nervoso central, cefaleias, convulsão e neuropatia periférica (principalmente entorpecimento ou parestesias em um membro). O tinidazol tem meia-vida ligeiramente mais longa que o metronidazol, o que possibilita uma dosagem menos frequente. Metronidazol é ativo contra todas as bactérias anaeróbias obrigatórias (é inativo contra bactérias aeróbias e anaeróbias facultativas) Certos parasitas protozoários (p. ex., Trichomonas vaginalis, Entamoeba histolytica, Giardia intestinalis [lamblia]) O metronidazol é usado principalmente em infecções causadas por anaeróbios obrigatórios, na maioria das vezes associado a outros antimicrobianos. Metronidazol é o fármaco de escolha para vaginites bacterianas. Esse fármaco tem outras indicações clínicas. Metronidazol ou tinidazol, 2 g, por via oral, em dose única, cura até 95% das mulheres com tricomoníase se os parceiros sexuais forem tratados simultaneamente. A efetividade de esquemas de única dose em homens não é evidente, de modo que o tratamento geralmente é feito com metronidazol ou tinidazol, 500 mg por via oral duas vezes ao dia durante 5 a 7 dias. Se a infecção persistir nas mulheres e a reinfecção por parceiros sexuais foi excluída, as mulheres são novamente tratadas primeiro com metronidazol ou tinidazol 2 g por via oral uma vez ou metronidazol 500 mg duas vezes ao dia, por 7 dias. Se o esquema inicial de retratamento falhar, metronidazol ou tinidazol 2 g uma vez ao dia durante 5 dias pode ser eficaz. O metronidazol pode causar leucopenia, reações semelhantes às de dissulfiram com álcool, ou superinfecções por Candida. É relativamente contraindicado no início da gestação, embora possa não apresentar risco ao feto após o 1º trimestre. A segurança do tinidazol na gestação não foi comprovada e, portanto, este não é utilizado. Parceiros sexuais devem ser vistos e tratados para tricomoníase com tinidazol 2 g em dose única ou metronidazol 500 mg duas vezes ao dia por 5 dias e devem ser examinados para outras infecções sexualmente transmissíveis. Se houver probabilidade de má aderência ao acompanhamento clínico pelos parceiros sexuais, o tratamento pode ser iniciado em parceiros sexuais de pacientes com tricomoníase documentada, sem confirmação de diagnóstico no parceiro. Secnidazol O secnidazol é um derivado semissintético da série dos nitro- imidazoles. Possui propriedades antiparasitárias e antiprotozoárias e atua como um amebicida essencialmente tecidular. Atua como paraseticida frente a entamoeba histolítica e possui atividade sobre a giardia lamblia e trichomonas vaginalis. Antifúngicos As infecções fúngicas mais difíceis de tratar são as micoses sistêmicas, que em geral ameaçam a sobrevivência. Ao contrário das bactérias, os fungos são eucariotos. Eles têm parede celular rígida composta principalmente de quitina - um polímero de N-acetil- glicosamina -, em vez de peptideoglicano (um componente característico da maioria das paredes celulares bacterianas). As membranas celulares fúngicas contêm ergosterol, em vez de colesterol, encontrado nas membranas de mamíferos. Essas características Mariane Rauber 12 UC10 – Problema 4 químicas são úteis no direcionamento dos fármacos quimioterápicos contra as infecções fúngicas. As infecções fúngicas em geral são resistentes aos antibióticos usados no tratamento das infecções bacterianas, e, ao contrário, as bactérias são resistentes aos fármacos antifúngicos. Cetoconazol O cetoconazol foi o primeiro azol ativo por via oral disponível para o tratamento de micoses sistêmicas. Mecanismo de ação. Os azóis são predominantemente fungistáticos. Eles inibem a C14 a-desmetilase (uma enzima CI P450), bloqueando, assim, a desmetilação do lanosterol em ergosterol, o principal esterol das membranas dos fungos (Figura 35.8). Essa inibição desorganiza a estrutura e a função da membrana, o que, por sua vez, inibe o crescimento da célula fúngica. (Nota: infelizmente, como ocorre com frequência para o membro inicial de uma classe de fármacos, a seletividade do cetoconazol contra seus alvos não é tão precisa como a dos azóis mais recentes. Por exemplo, além de bloquear a síntese do ergosterol do fungo, o fármaco também inibe a síntese de esteroides suprarrenais e gonadais humanos, diminuindo a produção de cortisol e testosterona. Além disso, o cetoconazol inibe as enzimas hepáticas biotransformadoras de fármacos dependentes do CIP450. Farmacocinética. Quando o cetoconazol é administrado por via oral (Figura 35.9), ele necessita do ácido gástrico para dissolução e é absorvido pela mucosa intestinal. Fármacos que aumentam o pH gástrico, como os antiácidos, ou que interferem na secreção ácida, como os bloqueadores de receptor H2 da histamina e os inibidores da bomba de prótons, impedem a absorção. A administração de agentes acidificantes, como os refrigerantes de cola, antes de o fármaco ser administrado pode aumentar a absorção em pacientes com acloridria. O cetoconazol é extensamente ligado às proteínas plasmáticas. Embora a penetração nos tecidos seja limitada, é eficaz no tratamento da histoplasmose nos pulmões, ossos, pele e tecidos moles. Ele não penetra o líquido cerebrospinal. Ocorre extensa biotransformação hepática e a excreção é primariamente através da bile. Os níveis na urina são demasiado baixos para serem eficazes contra infecções no trato urinário. Efeitos adversos. Além das alergias, distúrbios gastrintestinais dose-dependentes, incluindo náuseas, anorexia e êmese, são os efeitos adversos mais comuns do tratamento com cetoconazol. Efeitos endócrinos, como ginecomastia, diminuição da libido, impotência e irregularidades menstruais, resultam do bloqueio da síntese de androgênios e esteroides suprarrenais pelo cetoconazol. Fluconazol O fluconazol é membro da classe dos antifúngicos triazóis. E importante clinicamenteporque não tem os efeitos adversos endócrinos do cetoconazol e por sua excelente penetração no LCS em meninges normais e inflamadas. O fluconazol é empregado profilaticamente, com algum sucesso, para reduzir a infecção fúngica em recebedores de transplante de medula óssea. Ele inibe a síntese do ergosterol da membrana do fungo do mesmo modo que o cetoconazol e é o fármaco de escolha contra Criptococcus neoformans após o tratamento com anfotericina 8, contra cândida e coccidioidomicose. O fluconazol é eficaz contra a maioria das formas mucocutâneas de candidíase. O fluconazol é administrado por via oral ou IV. Para o tratamento da candidíase vaginal, a dose oral simples é de 150 mg. Sua absorção é excelente e, ao contrário do cetoconazol, ele não depende da acidez gástrica. A ligação às proteínas plasmáticas é mínima. Diferente do cetoconazol, o fluconazol é pouco biotransformado. Ele é excretado por via renal, e as doses precisam ser reduzidas em pacientes com função renal comprometida. Os efeitos adversos do fluconazol são menores do que os com cetoconazol. O fluconazol não causa efeitos endócrinos, pois não inibe o sistema CI P450 responsável pela síntese de androgênios. Contudo, ele pode inibir o sistema de citocromos que biotransformam outros fármacos listados na Figura 35.1 O. Náuseas, êmese e urticária são alguns problemas. Deve haver cautela com os pacientes que tem disfunções hepáticas. O fluconazol é teratogênico e, como os outros azóis, não deve ser usado durante a gestação.
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