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Aula 4 - Abdome Agudo Ginecológico

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Abdome Agudo Ginecológico
Introdução
O quadro de abdome agudo é caracterizado pela presença de dor não-traumática que ocorre de modo súbito, podendo surgir de processo agudo acometendo vísceras ou estruturas contidas na cavidade abdominal previamente normal ou por agudização de um quadro crônico.
Caso Clínico
Você está no PS de sua cidade natal, é no meio da madrugada depois de um dia cheio de trabalho, e aí a enfermeira bate na porta do quarto. Ela relata que “chegou uma mulher de 26 anos que está se queixando de dor abdominal”. Com o olho ainda fechado e depois de uma inspiração profunda, você pede para a enfermeira orientar a colocação de uma compressa com água quente na barriga, pois “se trata apenas de uma cólica pré-menstrual”.
Errou! Errou feio, errou rude! Parabéns, você acaba de “tratar” um abdome agudo ginecológico com uma compressa de água quente e de aumentar o risco de morbimortalidade dessa mulher!
Diante de uma paciente do sexo feminino com dor abdominal, é mandatório pesquisar a possibilidade de um quadro de abdome agudo ginecológico (além de excluir demais causas não ginecológicas).
Diagnóstico Diferencial
Para começarmos a entender o que é o abdome agudo ginecológico, primeiro temos que entender o que não é um abdome agudo ginecológico. Isso porque, na maior parte dos casos, temos um perfil de pacientes mulheres jovens em idade fértil, portanto, a exclusão de um outro quadro se torna importantíssima! Fazemos isso através da localização da dor. Dentre os principais quadros, podemos ter:
Classificação
O abdome agudo em ginecologia pode ser classificado como hemorrágico, inflamatório ou isquêmico. Como principais exemplos de cada classificação, temos:
	HEMORRÁGICAS
	Gravidez ectópica – cisto ovariano hemorrágico – imperfuração himenal
	INFLAMATÓRIAS
	Doença inflamatória pélvica aguda (DIP)
	ISQUÊMICAS
	Torção de anexos – Torção de mioma uterino e de neoplasias – Degeneração de miomas
Tipo Hemorrágico
Diagnóstico: a principal causa de abdome agudo hemorrágico em ginecologia corresponde à gravidez ectópica que pode ser rota ou não. Lembre-se: até que se prove o contrário, toda mulher em idade fértil que se apresenta com dor abdominal súbita pode estar grávida! Mesmo que ela jure de pé junto, em algum momento ela pode ter esquecido de tomar o anticoncepcional ou esqueceu de usar camisinha.
Sintomas: a tríade: dor abdominal na fossa ilíaca ou hipogástrico (ou pélvica) + sangramento vaginal irregular + amenorreia. 
Exame físico: presença de sensibilidade anexial ipsilateral, dor abdominal, massa anexial dolorosa à palpação, aumento uterino, taquicardia, pulso fino e sinais de pré-choque hipovolêmico. Caso o quadro de GE evolua com rotura, podemos ter sinais de irritação peritoneal com dor difusa no abdome, dor referida no ombro por sangue acumulado em região subfrênica com irritação diafragmática (Sinal de Lafond), sensação de peso no reto e bexiga: “grito de Douglas”, sangramento vaginal (reação de Arias Stela).
Exames complementares: associação da dosagem do β-hcg com a ultrassonografia transvaginal e abdominal (líquido livre na cavidade, aumento uterino e massa anexial).
Tratamento: imediatamente reposição volêmica (soluções eletrolíticas e hemotransfusão), monitorização dos padrões vitais, laparotomia e videolaparoscopia.
Imperfuração himenal: o sangue menstrual não é drenado, formando hematocolpo, hematométrio, hematosalpíngeo e hemoperitôneo - como está ocluída a passagem de sangue, ele vai se acumulando e subindo para útero, tubas, ovário e peritônio. A dor é progressiva. Tratamento: incisão em cruz na membrana himenal. Pode haver necessidade de laparotomia.
Tipo Inflamatório
Diagnóstico: A principal causa é a doença inflamatória pélvica (DIP) surge a partir de uma contaminação do canal endocervical, com ascensão bacteriana por contaminação vaginal que pode causar: salpingite, anexite, parametrite, ooforite, salpingo-ooforite, endometrite ou abscesso tubo-ovariano. Principais agentes etiológicos da DIP (vai guiar nossa escolha antimicrobiana no tratamento) são: Neisseria gonorrhoeae e Chlamydia tracomatis.É comum o início do quadro coincidir com o período menstrual, tendo em vista algumas alterações fisiológicas – alteração do pH vaginal, perda do tampão mucoso natural, diminuição da espessura do endométrio, contrações uterinas próprias que impulsionam os microrganismos em direção à tuba uterina. 
Para suspeitarmos de uma DIP, é importante estar ciente de alguns fatores de risco, tais como: mulher em idade fértil (principalmente menores de 25 anos), múltiplos parceiros, DIP prévia, colocação de DIU, IST atual ou pregressa, tabagismo, duchas vaginais. Contraceptivos orais: dificultam a penetração bacteriana no muco cervical, mas podem aumentar a ectopia (ferida no colo do útero) e aumentar a infecção por clamídia. 
Consequências: infertilidade, dor crônica, gravidez ectópica e abscesso ovariano.
Sintomas: dor abdominal aguda (suprapúbica, FID, FIE ou difusa), de início repentino (sem atraso menstrual, pós-menstrual), febre, sangramento intermenstrual ou menorragia devido à endometrite por clamídia.
Exame físico: irritação peritoneal (Blumberg positivo), toque bimanual prejudicado pela resistência da paciente (colo doloroso, anexos hipersensíveis), fluxo vaginal mucopurulento pelo colo.
Exames complementares: Laparoscopia: é o padrão ouro e permite o diagnóstico direto de DIP. Ao ultrassom transvaginal para avaliar, gravidez ectópica. Beta-Hch.
Tratamento: depende da Classificação de Monif:
Estágio 1: endometrite e salpingite sem peritonite 
· Tratamento ambulatorial: Tianfenicol 2,5 VO dose única + Doxiciclina 100mg VO 12-12h por 10 dias; abstinência sexual. 
Estágio 2: salpingite aguda com peritonite ou quadro anterior em pacientes gestantes, imunocomprometidos e ausência de melhora do quadro após 72h de tratamento (para o estágio 1).
Estágio 3: Salpingite aguda com oclusão tubária ou comprometimento tubovariano. Abcesso íntegro
· Tratamento hospitalar: Clindamicina (600mg EC 8-8h) + Gentamicina (3mg/kg EV 8-8h). manter esquema venoso por 48 horas seguidos de Doxiciclina 100mg 7 dias. Observar por 48 horas – se não melhorar, indicar cirurgia.
Estágio 4: Abcesso tubovariano roto
o	Tratamento hospitalar: indicação cirúrgica imediata
· Tratar parceiro com contato nos últimos 60 dias com Azitromicina 1g. 
Tipo Vascular ou Isquêmico
Diagnóstico:
Para fechar, com prevalência de cerca de 3% dos quadros de abdome agudo ginecológico, desconfie diante de uma mulher jovem com instalação aguda de dor unilateral intensa, associada a uma massa dolorosa em topografia de anexo em paciente com náuseas e vômitos, sendo que o quadro pode ter sido desencadeado por atividade física. Podemos estar diante de uma torção anexial causada por cistos ou tumores maiores que 7 cm.
Além de fazermos uma busca ao exame físico de sinais de peritonite. Nesse momento, a ultrassonografia pélvica tem seu valor! Seus achados mais comuns incluem: uma massa ovariana, aumento unilateral do ovário, fluido livre em fundo de saco posterior e estruturas císticas periféricas uniformes. “Posso abrir mão de uma TC ou de uma RNM?” Se não tiver sido esclarecido com a USG, pode! E quais são os achados? Principalmente: espessamento das tubas uterinas e da parede do cisto ovariano, ascite e desvio uterino em direção ao anexo torcido. Estamos diante de uma emergência cirúrgica meu povo, então é laparoscopia nela! 
Diagnóstico
Além dos exames específicos para o diagnóstico, temos que fazer: inspeção, palpação (contratura muscular: vista e palpada; defesa: desencadeada pela palpação, descompressão dolorosa), percussão (comprovar a existência da dor, determinar o ponto mais doloroso, reconhecer macicez fixa ou móvel / presença de líquido / timpanismo), ausculta (peristaltismo normal em um paciente com quadro abdominal incaracterístico não exclui a causa cirúrgica, mas permite maior tempo de observação). Importante fazer o exame especular e, se for preciso, toque retal/vaginal. 
Laboratório: exame de urina (ITU?),hemograma completo (anemia, leucocitose), VHS, PCR, bacterioscopia direta pelo Gram. 
Já caiu na prova
· 3 tipos de abdome agudo ginecológico e exemplos
· Diagnóstico, exame clínico, os exames laboratoriais, os exames de imagem, tratamento.
· A prevalência da doença inflamatória pélvica aguda (DIPA) vem aumentando acentuadamente. Sobre a DIPA, é correto afirmar que: a) São fatores de proteção: duchas vaginas frequentes, uso de anticoncepcional hormonal oral combinado e utilização de preservativos nas relações sexuais. b) Relação sexual durante a menstruação é fator de risco em razão do fluxo menstrual. c) São microorganismos que causam a DIPA: gonococo, clamídia, trichomonas, micoplasma e ureaplasma. d) Os espermatozoides podem ser fatores de transporte de bactérias presentes nos órgãos genitais masculinos, na vagina e no colo uterino. e) O gonococo, diferente da clamídia, não atinge a luz tubária e é apenas veículo para outras bactérias.
· A gonorreia e a clamídia infectam tipicamente o epitélio da uretra, a colo do útero, o reto, a faringe ou conjuntiva.

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