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2 3 4 O AUTOR Olá, estudantes. Sou o professor Regys Rodrigues da Mota. Sou bacharel (2007) e licenciado (2008) em Ciências Sociais e mestre em Sociologia (2011) pela Universidade Federal de Goiás. Durante os próximos meses, estaremos juntos realizando uma série de atividades acadêmicas para que possamos aprofundar o conhecimento sobre alguns dos temas abordados pela disciplina de Antropologia e Cultura oferecida pela Faculdade Araguaia. Vamos iniciar a disciplina de Matodologia Científica. Acompanhe cada unidade e leia com atenção todos os materiais. A interação e a troca de experiências são muito importantes para a consolidação do conhecimento, sendo assim, participe de forma intensiva dos fóruns propostos. É muito importante que você se dedique à leitura, às atividades e se comprometa em realizar os exercícios propostos. Lembre-se de trocar informações com o tutor (a) e com os colegas do curso. Tenho certeza de que juntos vamos alcançar o sucesso! Bons estudos! Professor Mestre Regys Rodrigues da Mota 5 FACULDADE ARAGUAIA - FARA 1º Edição - 2017 É proibida a reprodução total ou parcial desta obra, por qualquer meio e para qualquer fim. Obra protegida pela Lei de Direitos Autorais DIRETORIA GERAL: Professor Mestre Arnaldo Cardoso Freire DIRETORIA FINANCEIRA: Professora Adriana Cardoso Freire DIRETORIA ACADÊMICA Professora Ana Angélica Cardoso Freire DIRETORIA ADMINISTRATIVA Professor Hernalde Menezes DIRETORIA PEDAGÓGICA: Professora Mestra Rita de Cássia Rodrigues Del Bianco VICE-DIRETORIA PEDAGÓGICA Professor Mestre Hamilcar Pereira e Costa COORDENAÇÃO GERAL DO NÚCLEO DE TECNOLOGIA EM EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Professor Mestre Leandro Vasconcelos Baptista COORDENAÇÃO GERAL DOS CURSOS TÉCNICOS Professor Doutor Ronaldo Rosa Júnior REVISÃO DE LÍNGUA PORTUGUESA Rafael Souza Simões COORDENAÇÃO E REVISÃO TÉCNICA DE PRODUÇÃO DE CONTEÚDO EM VÍDEO E WEB Professora Doutora Tatiana Carilly Oliveira Andrade DESIGN GRÁFICO E EDITORIAL Bruno Adan Vieira Haringl FACULDADE ARAGUAIA Unidade Centro – Polo de Apoio Presencial Endereço: Rua 18 nº 81 - Centro - Goiânia-GO, CEP: 74.030-040 Fone: (62) 3224-8829 Unidade Bueno Endereço: Av. T-10 nº 1.047, Setor Bueno - Goiânia-GO, CEP: 74.223-060 Fone: (62) 3274-3161 Site Institucional www.faculdadearaguaia.edu.br NÚCLEO DE TECNOLOGIA EM EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Polo Goiânia: Unidade Centro Correio eletrônico: nutec@faculdadearaguaia.edu.br mailto:nutec@faculdadearaguaia.edu.br 6 SUMÁRIO Apresentação ............................................................................................................. 7 UNIDADE 1: METODOLOGIA CIENTÍFICA......................................................... 8 1.1 METOLOGIA E AS DIVERSAS FORMAS DE CONHECIMENTO ...................... 9 1.1.1- O conhecimento do senso comum .......................................................... 10 1.1.2- O senso comum e a propagação de informações ................................... 11 1.1.3- O conhecimento científico ....................................................................... 13 1.1.4- O caráter hipotético do conhecimento científico ...................................... 14 1.1.5- O método de investigação praticado por Sócrates .................................. 15 1.1.6- O método aristotélico ............................................................................... 16 1.1.7- Legado grego .......................................................................................... 17 1.2 CIÊNCIA E MÉTODO ................................................................................. 18 1.2.1- A abordagem da ciência moderna ........................................................... 19 Síntese da unidade ......................................................................................... 22 Atividades 1 .................................................................................................... 23 REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 24 7 Apresentação O objetivo desta disciplina, ministrada pela Faculdade Araguaia no Ensino a Distância, é capacitar os (as) acadêmicos (as) com conhecimentos fundamentais da Metodologia Científica, buscando a interdisciplinaridade ao tratar dos procedimentos que devem ser seguidos para o desenvolvimento de pesquisas científicas. Dessa forma, a intenção é trabalhar no decorrer das aulas diversos assuntos relacionados à produção científica. Na primeira unidade, a proposta é abordar sobre a teoria do conhecimento, apresentando as diferenças entre o senso comum e o conhecimento científico, bem como a evolução de diversos métodos de investigação no decorrer da história humana que contribuíram para a construção do que chamamos hoje de metodologia na produçãoo científica. Na segunda unidade, o objetivo específico é o de compreender as diferenças entre alguns tipos de produções didáticas/científicas, apresentando os elementos que caracterizam o fichamento, a resenha, o resumo simples, o resumo expandido, o relatório técnico e o resumo técnico, além de apresentar uma primeira definição do que é o projeto de pesquisa que culminará no desenvolvimento do artigo científico. A proposta da terceira unidade é analisar de forma mais aprofundada os elementos que caracterizam o projeto científico e o artigo científico, elementos estes orientados pela Associação Nrasileira de Normas Técnicas (ABNT). Na quarta unidade, o objetivo é o de apresentar os tipos de pesquisa, bem como suas especificidades. Após se ter a noção dos elementos que constituem o projeto de pesquisa e o artigo é possível realizar uma classificação metodológica a partir dos objetivos e dos procedimentos que caracterizam uma investigação de caráter científico. 8 UNIDADE 1: METODOLOGIA CIENTÍFICA A disciplina de Metodologia Científica está presente em praticamente todas as grades de aulas de todos os cursos acadêmicos, sejam cursos englobados nas áreas de Humanas, Biológicas ou Exatas. A partir de tal disciplina, o estudante entra em contato com a normatização para a produção de trabalhos científicos e com as técnicas de coleta e análise de dados obtidos com a realização de pesquisas. No entanto, outras dimensões são apresentadas. Realizar uma pesquisa é muito mais do que aplicar técnicas de coleta, analisar dados e escrever no final do processo um trabalho seguindo uma normatização pré-determinada. Para a confecção de um trabalho científico, é necessário primeiramente se pensar na postura que deve ser adotada pelo pesquisador, nas diferentes formas de ver o mundo, no tipo de conhecimento que almeja ser construído. Um pesquisador deve se fazer, o tempo todo, algumas perguntas para não correr o risco de que o resultado final de sua produção seja invalidado. Estou sendo imparcial ou parcial na condução desse estudo? Essa opinião caracteriza-se por ser determinista? O material produzido utiliza-se de fontes adequadas ou está bebendo 9 do senso comum? É necessário que, no final das contas, eu confirme minha hipótese inicial de pesquisa para que o que eu fiz seja válido? Essas são algumas das perguntas que devem ser feitas constantemente no ato de se pesquisar. Ou pelo menos deveriam ser feitas. O aluno, em alguns casos, é colocado diretamente em contato com a técnica, com o instrumento de coleta de dados, com a urgência de se fazer logo “um bom Referencial Teórico”, sem antes estabelecer uma discussão metodológica do que é senso comum, do que é determinismo, do que são ou não fontes confiáveis de informações ou mesmo o que é um Referencial Teórico.Assim, o aluno aprende o que tem que fazer para a construção do trabalho científico, mas nem sempre aprende a conectar corretamente as partes do trabalho. Para compreender os diferentes componentes presentes na metodologia de uma pesquisa realizada na atualidade, é necessário inicialmente olhar para o passado e compreender as várias discussões metodológicas estabelecidas em diferentes períodos da história humana. 1.1 AS DIVERSAS FORMAS DE CONHECIENTO Metodologia é uma palavra derivada de “método”, do latim “methodus”, cujo significado é “caminho ou a via para a realização de algo”. Método é o processo para se atingir determinado fim ou para se chegar ao conhecimento. Dessa forma, metodologia é o campo em que se estuda os melhores métodos praticados em determinada área para a produção do conhecimento (LAKATOS e MARCONI, 2015). Assim sendo, para compreender esse campo de estudo é necessário compreender primeiramente os diferentes tipos de conhecimento. O ser humano é um ser jogado ao mundo, condenado a viver sua existência. Por ser existencial, tem que interpretar a si e ao mundo em que vive, atribuindo-lhes significações, criando intelectualmente representações significativas da realidade, representações que, por sua vez, são chamadas de conhecimento. Dependendo da forma pela qual se chega a uma determinada representação significativa, o conhecimento pode ser, em linhas gerais, classificado em diversos tipos: mítico, ordinário, artístico, filosófico, religioso, dentre outros. 10 As duas formas que estão mais presentes e que mais interferem nas decisões da vida diária do homem são o conhecimento do senso comum e o científico. Ambas as formas partem da necessidade de se compreender o mundo, mas os caminhos que percorrem são diferentes. Não só os caminhos são diferentes, como os instrumentos utilizados para a produção de significados também são. Até mesmo quando as representações dos significados são os mesmos, o processo de validação e propagação de tais representações apresentam características particulares. 1.1.1 O conhecimento do senso comum A forma mais usual utilizada para interpretar a si mesmo, o seu mundo e o universo como um todo, produzindo interpretações significativas, é a do senso comum (conhecimento ordinário, comum ou empírico). Essa forma de conhecimento surge como consequência da necessidade de resolver problemas imediatos, que aparecem na vida prática e decorrem do contato direto com fatos e fenômenos que vão acontecendo no dia a dia, notados principalmente através da percepção sensorial. Não é um conhecimento programado ou planejado, pois, à medida que a vida vai acontecendo, ele se desenvolve, sendo caracterizado por ser espontâneo e instintivo (LAKATOS e MARCONI, 2015). Por ser vivencial é também superficial, sem aprofundamento crítico ou racionalista, é um “viver sem conhecer”. Apresenta um caráter predominantemente utilitarista, não especificando as razões ou fundamentos teóricos que demonstram ou justificam o seu uso, possível correção ou confiabilidade. 11 Por se basear em soluções de problemas imediatos, sem compreender ou conhecer as explicações a respeito do seu sucesso, o senso comum transforma-se em convicção, em crença, que é repassada de indivíduo para indivíduo, de geração para geração. A utilização de ervas medicinais, por exemplo, é reproduzida sem a devida reflexão a respeito das razões que levam a tal utilização. Sabe-se apenas que o uso de erva X possibilita o benefício Y, ou pelo menos se imagina que possibilita o benefício Y, pois nem isso pode ser confirmado, já que não existe um estudo rigoroso a respeito. O açúcar cristal, por exemplo, é utilizado para a cicatrização de ferimentos. Ninguém, a não ser quem tenha obtido a informação de alguma fonte científica, sabe dizer por que esse açúcar possui esse poder bactericida e cicatrizante. Aliás, baseado exclusivamente no senso comum, sequer é possível comprovar se o açúcar possui realmente essas capacidades. Na maioria dos casos, as pessoas conhecem apenas o efeito benéfico, ou mesmo reproduz o que outros falaram, instituindo uma tradição, um costume que é passado adiante (LAKATOS e MARCONI, 2015). Esse tipo de conhecimento é muito subjetivo e tem baixo poder de crítica, subordinado a um envolvimento afetivo e emotivo do sujeito que o elabora/reproduz. É incapaz de ser isento, pois baseia-se em interpretações sustentadas apenas por crenças pessoais e não resiste quando submetido à crítica sistemática. 1.1.2. O senso comum e a propagação de informações Essa forma de conhecimento superficial encontra-se também na reprodução de informações dentro da sociedade. Discursos são constantemente reproduzidos, mas não são analisados. Na atualidade, onde o mundo encontra-se “conectado”, a quantidade de informações disponibilizadas é muito grande, mas a forma como são tratadas ainda é muito precária. Nas redes sociais, discursos são instituídos de maneira muito rápida. Uma notícia ganha força ao ser compartilhada, mas nem todos buscam a veracidade da fonte ou mesmo analisam o conteúdo do que está sendo reproduzido. Passar adiante uma chamada bombástica está a “um clique” de distância. Agora, analisar o que está sendo lido, associar com um contexto maior, refletir a respeito do que está sendo falado pode levar mais tempo, o que nem todos estão dispostos a “perder”. 12 Diante dessa postura, o senso comum vai ganhando força, pois ele é rápido, exige menos crítica e é cômodo, pois encontra respaldo em uma coletividade. Seguir a maioria, o que todos estão falando, pode oferecer mais conforto do que, por exemplo, pensar por si mesmo e chegar a uma conclusão diferente por meio da reflexão constante (MARCONI, 2013). Fontes não científicas ganham força, pois não existe debate. A mídia aparece como uma fonte totalmente verídica e o que ela fala ganha rapidamente peso de verdade, pois o confronto de ideias pode não encontrar espaço para ser praticado. Costumes, tabus e preconceitos são estabelecidos a partir dessa ausência de discussão e, consequentemente, ausência de reflexão. De certa forma, é impossível afirmar que determinada pessoa é livre por completo do senso comum, pois a informação contida nesse conhecimento é mais imediata e fácil de ser acessada. Como dito anteriormente, remete a um envolvimento afetivo e emotivo do sujeito que o elabora/reproduz. No entanto, como será exposto mais adiante, aquilo que é tido como verdade só se mantém com tal status aos olhos da ciência quando é constantemente exposto a um método rigoroso de análise. Ciências exatas, humanas e biológicas trabalham com a exposição do objeto estudado à constante verificação de sua veracidade. No campo das ideias, essa verificação passa pelo livre debate, pela exposição de diferentes opiniões na tentativa de se produzir novas formas de conhecimento e não pela simples e mecânica reprodução do que a maioria está dizendo. A produção do conhecimento científico trata-se, portanto, de uma tarefa mais árdua, que exige concentração, disciplina, rigor metodológico e da mente aberta por parte do pesquisador, pois as respostas obtidas por ele dentro de uma pesquisa nem sempre estarão de acordo com o mundo e as informações que constituem a sua subjetividade, sendo necessário sempre se reinventar diante da descoberta de novos paradigmas, de novas técnicas, de novos conceitos e de diferentes perspectivas. 1.1.3 O conhecimento científico 13 O conhecimento científico surge da necessidade de o homem não assumir uma posição meramente passiva, de testemunha dos fenômenos, sem poder de ação ou controle dos mesmos. Cabe ao ser humano, otimizando o uso da sua racionalidade, propor uma forma sistemática, metódica e crítica da sua função de desvelar o mundo, compreendê-lo, explicá-lo e dominá-lo.O que impulsiona o homem em direção à ciência é a necessidade de compreender a cadeia de relações que se esconde por trás das aparências sensíveis dos objetos, fatos ou fenômenos, captadas pela percepção sensorial e analisadas de forma superficial e subjetiva pelo senso comum. Sócrates, por volta de 469 a 399 a.C., já fazia a distinção entre um Mundo Sensível e um Mundo das Ideias. Para ele, o Mundo Sensível é o lugar que leva ao erro, leva à percepção errada das coisas, baseado apenas no que cada um vê ou escuta, sem procurar enxergar a essência real das coisas. É um lugar onde impera o preconceito, a imagem, o estereótipo, a superficialidade, o ato de ver apenas a fachada das coisas, o ato de julgar um livro pela capa. Por outro lado, o Mundo das Ideias é um lugar à parte onde só é possível se chegar por meio da constante reflexão, predominando a busca pelo conhecimento, pela verdade das coisas (MINAYO, 2004). Apesar da força do alcance e do comodismo do senso comum, o ser humano quer ir além dessa forma de ver a realidade imediatamente percebida por meio dos olhos e ouvidos e descobrir os princípios explicativos que servem de base para a 14 compreensão da organização, classificação e ordenação da natureza em que está inserido. Através dessa particularidade, a realidade passa a ser percebida aos olhos da ciência não de uma forma desordenada, fragmentada, como ocorre na visão subjetiva do senso comum, mas sob o enfoque de um critério orientador, de um princípio explicativo que esclarece e proporciona a compreensão do tipo de relação que se estabelece entre fatos, coisas e fenômenos, unificando a visão de mundo. O conhecimento científico é produto resultante da investigação científica, investigação esta iniciada a partir do momento que se tem uma dúvida, uma pergunta que ainda não tem resposta ou cujo o conhecimento já existente é insuficiente ou inadequado para apresentar uma resposta satisfatória (LAKATOS e MARCONI, 2015). 1.1.4 O caráter hipotético do conhecimento científico O conhecimento científico, assim como o senso comum, embora mais seguro do que esse último, também é falível. Pode o investigador, por exemplo, à luz do seu referencial teórico, elaborar hipóteses inadequadas, excluindo fatores significativos relacionados com a situação problema, não planejar corretamente o processo de testagem de suas hipóteses, não prever a utilização de instrumentos e técnicas de observação e de medida adequados, válidos ou fidedignos, não perceber provas contrárias ou ainda, influenciado pela sua subjetividade, que jamais é eliminada ou anulada, ou levado pela precipitação e por um raciocínio incorreto, extrair uma conclusão imprópria. Por se reconhecer a natureza hipotética do conhecimento científico, ele deve ser constantemente submetido a uma revisão crítica, tanto na consciência lógica interna de suas teorias, quanto na validade de seus métodos e técnicas de investigação (GIL, 2002). O que distingue essa forma de conhecimento das demais não é o assunto, o tema ou o problema, e sim a forma especial que adota para investigar os problemas. 15 Como será exposto no decorrer desta disciplina, a ciência esteve presa durante muito tempo a uma concepção determinista/positivista do universo, incorporando em si o status de que “o que é científico é uma verdade absoluta”. Apesar de combater o dogmatismo religioso, durante o final da Idade Média e Início do Renascimento, o conhecimento científico, durante muito tempo, se apresentou com ares de dogmatismo. No entanto, essa concepção foi abandonada e hoje trabalha-se com a noção de falibilidade da própria ciência. O que é verdade hoje, amanhã pode não ser a partir da descoberta de novas informações, de novas técnicas de investigação. A resposta de hoje, amanhã pode já não mais satisfazer frente à luz de novas perspectivas, de novas perguntas a serem respondidas, de novos paradigmas. 1.1.5 O método de investigação praticado por Sócrates Relatos históricos afirmam que Sócrates procurava lançar questões para alimentar o debate entre seus discípulos e estimular a reflexão sobre diferentes assuntos a respeito da vida humana. Passado o debate, os discípulos manifestavam as suas ideias. Após a formulação e exposição das opiniões, Sócrates procurava mostrar, por meio de questionamentos, a contradição no pensamento dos discípulos a fim de produzir um novo conhecimento a partir da reflexão. Esse movimento não só produzia conhecimento aos alunos como também produzia para o mestre, ao entrar em contato com diferentes opiniões, diferentes argumentos e perspectivas. 16 A intenção não seria a de ganhar o debate, como propunham os sofistas e sim a de criar uma via de mão dupla de troca e produção de informações. Essa forma de aprendizagem perdurou entre os discípulos de Sócrates, com destaque para Platão. Aristóteles, discípulo de Platão, também deu continuidade a esse processo com algumas mudanças de perspectivas, que serão abordadas mais a frente nesse texto. Os três filósofos encaravam o ser humano como um ser do conhecimento e procuravam contextualizá-lo no tempo e na história. A obra “A República” de Platão e a obra “A política”, de Aristóteles, foram as primeiras a tratar das relações entre homens e a constituição de grupos de interação (sociedades) de maneira sistemática e separada da religião, mas não independente dos regimes políticos e econômicos. 1.1.6 O método aristotélico Diferente de Sócrates, Aristóteles (384 a 322 a.C.) acreditava ser possível chegar ao verdadeiro conhecimento a partir da colaboração do Mundo Sensível ao Mundo das Ideias. Propunha um método de investigação baseado na observação e na dedução, ou seja, a partir do que se vê e se ouve (Mundo Sensível) é possível chegar à realidade das coisas por meio da reflexão e constatação de evidências (Mundo das Ideias). A teoria do conhecimento que se utilizava desse método ficou conhecida pelo nome de empirismo (LAKATOS e MARCONI, 2015). No empirismo, a experiência sensorial revela a existência de evidências concretas. A realidade pode ser analisada através de suas partes e princípios, que podem ser observados, para, em seguida, por meio da dedução, postular princípios universais, expressos na forma de juízos, encadeados logicamente entre si. Dessa forma, o modelo aristotélico propõe uma ciência que produz um conhecimento que pretende ser um fiel espelho da realidade, por estar sustentado no observável. Porém, esse modelo deve produzir também uma ciência do discurso, predominantemente qualitativa (que descreve a qualidade/natureza do objeto). O conhecimento verdadeiro deve satisfazer os critérios da justificação lógica, ou seja, deve ser demonstrado com argumentos que sustentam sua veracidade a partir da coerência lógica de suas afirmações com princípios universalmente aceitos (verdade sintática) (LAKATOS e MARCONI, 2015). 17 A esse encadeamento lógico atribuiu-se o nome de silogismo. Consiste em se chegar a uma conclusão a partir da dedução obtida no momento que se apreende a lógica existente na conexão entre as premissas: Premissa 1: Todo homem é mortal. Premisse 2: João é homem. Conclusão: Logo, João é mortal. Assim sendo, de forma geral, o processo de investigação de um determinado fenômeno (método dedutivo) deveria seguir os seguintes passos: A) Primeiro, deve-se observar o fenômeno (a experiência sensorial alimenta a reflexão e revela a existência de evidências/premissas concretas) B) Registrar as partes e princípios constituintes desse fenômeno que foram observados (registrar evidências/premissas). C) Estabelecer por meio da dedução, leis universais que explicam as causas e os efeitos do fenômeno (conclusão). Em outras palavras, para Aristóteles, por meio de observação constante de algo, é possível se chegaràs suas partes componentes (premissas) e, a partir da dedução lógica, chega-se à conclusão de uma lei universal que serve para explicar as causas e os efeitos do fenômeno observado. 1.1.7 Legado grego Mesmo com o domínio do Império Romano, muitos aspectos da cultura grega foram preservados, influenciando o mundo ocidental até a atualidade. É claro que mudanças ocorreram na história que resultaram em alterações na forma de se enxergar o ser humano, o social e o padrão de investigação a ser aplicado. A Idade Média, também conhecida como Idade das Trevas (séculos V a XV d.C), representou uma forte ruptura com o ideal grego da livre reflexão. A forte influência da Igreja em diferentes setores da vida social, controlando inclusive o que era ensinado nas escolas, condicionou também as produções culturais e científicas a seguirem um viés estritamente religioso. 18 A livre reflexão defendida por Sócrates, Platão e Aristóteles, bem como a defesa da centralidade do ser humano ao se pensar no social, perdem espaço para um ensino estritamente religioso. Apenas com o Renascimento, retoma-se o ideal filosófico grego de se pensar o mundo a partir das relações humanas, causando mudanças nos paradigmas educacionais e metodológicos. O preceito sofista de que deve existir o livre debate de ideias é algo ainda em voga na atualidade. Mas esse debate deve estar acompanhado de conteúdo. Fazer ciência é também contrapor ideias. Uma metodologia de pesquisa pode prever o contraponto de argumentos, de conceitos e de técnicas de investigação. A perspectiva defendida por Sócrates de que ser humano é, antes de tudo, um ser do conhecimento, ainda hoje perdura, assim como a observação proposta por Aristóteles ainda hoje é um recurso muito importante para a realização de pesquisas. Mesmo concepções como o silogismo, a verdade sintática, empirismo e o método dedutivo dividindo espaço com outras proposições metodológicas na atualidade, ainda hoje alimentam o debate sobre a adequação do métodos e técnicas de investigação de acordo com diferentes modelos de produções científicas. 1.2 CIÊNCIA E MÉTODO Os caminhos apontados pelos filósofos gregos influenciaram o mundo por mais de 2000 anos. Como dito na aula anterior, ainda hoje essa influência se faz presente no “fazer científico”. No entanto, a partir do século XV, muitos elementos constitutivos desses caminhos passaram a ser duramente atacados, frente a uma verdadeira revolução científica que introduziu a experimentação como nova fonte para a produção do conhecimento, modificando radicalmente a compreensão e concepção teórica de mundo, de verdade e de método (RAMOS, 2009). Aos poucos, a observação deixou de ser a principal fonte de produção do conhecimento e passou a ser um dos vários recursos para se chegar à verdade das coisas. A reprodução do fenômeno estudado por meio de experimentos passou a ser a fonte de validação do conhecimento. Se algo não pode ser reproduzido em condições ideais, então este algo não pode ser corroborado. O mesmo aconteceu com o método dedutivo proposto por Aristóteles. Nessa nova perspectiva, algo não pode ser tomado como verdade baseado apenas na 19 dedução lógica. Deve existir uma verificação constante do fenômeno analisado e uma lógica maior do que a mera dedução como resposta para os problemas levantados pela ciência. Instituiu-se a necessidade de existir um rigor metodológico para a realização da pesquisa. Tal rigor ainda hoje se faz presente, pois sem controle, sem a vigência de um método de investigação previamente estabelecido, o conhecimento deixa de ser científico e passa a ser meramente o resultado do senso comum, ou seja, passa a ser resultado da subjetividade de cada pesquisador (LAKATOS e MARCONI, 2010). Tornou-se necessária a uniformidade metodológica dos procedimentos científicos. No entanto, quais critérios deveriam ser adotados para se estabelecer essa uniformidade? Para Francis Bacon, o principal critério deveria ser a experimentação. 1.2.1 A abordagem da ciência moderna Francis Bacon (1561-1626) Opondo-se à ciência grega e ao dogmatismo religioso que imperou durante toda a Idade Média, o filósofo e cientista Francis Bacon propôs que os preconceitos de ordem religiosa, filosófica e decorrentes das crenças culturais, fossem abandonados, pois distorciam a impediam a verdadeira visão do mundo, que deveria ser resultado da interpretação da natureza. Segundo Bacon, o empirismo proposto por Aristóteles, que até então consistia no modelo vigente, era muito leviano, pois ao estudar um determinado fenômeno, os observadores se deixavam levar pelas impressões dos sentidos, concluindo 20 generalizações utilizando indevidamente a dedução, conduzindo a enganos que não podiam ser classificados como “fazer ciência”. Defendia que era necessário inventar um novo instrumento, um novo método de estudo que desse maior eficácia à investigação. A esse novo método, Bacon atribuiu o nome de interpretação da natureza, partindo do pressuposto de que a natureza é a mestra do homem, sendo necessário obedecê-la para dominá-la. Acreditava que para se fazer ciência era importante primeiramente abandonar os pré-conceitos (ídolos), pois impediam a correta visão das formas (leis) que organizavam a natureza. Segundo Bacon, a ciência fica comprometida quando o pesquisador parte para a análise dos dados com os olhos encobertos pelos Ídolos da Tribo (tendência humana de considerar apenas os casos favoráveis, desconsiderando aquilo que é desfavorável), Ídolos da Caverna (levar em consideração a sua verdade particular e generalizá-la como sendo uma verdade absoluta), Ídolos do Foro (considerar que o que já está dito é uma verdade absoluta) e os Ídolos do Teatro (fazer ciência baseado previamente em ideologias, mantendo a mente fechada para novas ideias) (LAKATOS e MARCONI, 2010). Após eliminar a influência dos ídolos, o caminho a ser percorrido pelo pesquisador, em seguida, deveria ser o da indução experimental, ao invés da dedução lógica proposta por Aristóteles. Nesse caminho, não se poderia simples enumerar alguns casos observados, e sim deveria levar em consideração uma grande gama de elementos envolvidos nos casos analisados e reproduzidos em condições ideais. Em outras palavras, o fazer científico passaria pela observação e pela reprodução do que foi observado por meio de experiências cientificas com a finalidade de analisar o maior número possível de informações. De forma geral, o método da interpretação da natureza, também conhecido como método científico, possuía as seguintes etapas: A) Experimentação: fase na qual são realizados os experimentos sobre o problema investigado, para poder observar e registrar metódica e sistematicamente todas as informações possíveis de se coletar. 21 B) Formulação de hipóteses: após os experimentos, formulam-se hipóteses, na tentativa de explicar a relação causal dos fatos entre si. C) Repetição da experimentação por outros cientistas: ao se repetir os experimentos em outros lugares, acumula-se mais dados que também podem servir para a formulação de hipóteses. D) Repetição do experimento para a testagem das hipóteses: para se obter ainda mais dados e evidências. E) Formulação das generalizações e leis: por fim, ao se realizar todas as etapas anteriores, o cientista formula as leis que descobrir, generalizando suas explicações para todos os fenômenos da mesma espécie. Esse método, no entanto, não teve o mérito de atingir os objetivos a que Bacon se propunha. O que chamou de experimentos, destituídos de mensuração e controle quantitativos, não passaram de meras experiências. A Bacon deve ser creditado o salto de qualidade do pensamento científico moderno instituindo um método empirista baseado na indução experimental, mas foi Galileu Galileique revolucionou a ciência de sua época. Galileu Galilei (1564 a 1642) Diferentemente do que propunha Aristóteles, que considerava ser possível validar a explicação de algo através da utilização de argumentos lógicos, Galileu acreditava que só seria possível tal validação por meio de provas construídas e elaboradas de forma matemática. 22 O critério da verdade não mais deveria ser o da verdade sintática, e sim o da verdade semântica, que consiste na procura da correspondência entre o conteúdo dos enunciados e a evidência dos fatos por meio do método científico-experimental. Apesar de se basear nessa ideia de que era necessária a realização do experimento para a validação científica de algo, como propunha Bacon, Galileu propunha a matemática e a geometria como linguagens da ciência e o teste quantitativo-experimental das suposições teóricas como mecanismos necessários para avaliar a veracidade das hipóteses e estipular a verdade científica, mudando radicalmente a forma de produzir e justificar o conhecimento científico. Esse método foi também chamado de método quantitativo experimental. A realidade passou a ser vista como algo geométrico e os fenômenos que estavam presentes nessa realidade se comportavam de acordo com relações e princípios quantitativos (que pode ser quantificado). Assim sendo, ao ser humano competiria utilizar a sua razão para teorizar e construir a interpretação matemática do real. Da proposição de ciência qualitativa de Aristóteles, passou-se a valorizar a ciência quantitativa de Galileu. Síntese da Unidade Tanto o senso comum quanto o conhecimento científico caracterizam-se por serem formados de conhecimento que apresentam especificidades que os diferenciam. Enquanto o senso comum se apoia na força da maioria, no sentimento, nos instintos, nas emoções, no dito popular, o conhecimento científico, por sua vez, se baseia na verdade contextualizada que é constantemente questionada. A ciência exige que as investigações tenham um certo rigor metodológico para que a verdade seja constantemente questionada, pois hoje trabalha-se com a noção de falibilidade da própria ciência. Sócrates, já por volta do século V a.C., defendia a necessidade de sempre se questionar aquilo que é tomado pela maioria como certo para mostrar as contradições do pensamento dessa maioria. Aristóteles propôs como método de investigação, o chamado método dedutivo, em que considerava ser possível, por meio da observação constante, se chegar à verdade das coisas a partir de uma lógica dedutiva. Tal proposta de investigaçãoo perdurou durante vários séculos, até momento em que Fracis Bacon afirmou que a ciência não poderia ser baseada meramente na observação e na dedução das coisas. 23 Para Bacon, ao se estudar um determinado fenômeno, tornava-se necessário abandonar primeiramente os ídolos (“pré-conceitos”) e reproduzir tal fenômeno inúmeras vezes a fim de apreender sobre suas características, causas e consequências. Galileu concordava com tal proposta, mas acrescentou ainda a necessidade de traduzir os resultados dessas reproduções em fórmulas matemáticas. Atividade 1: marque o que se pede nos enunciados das questões Questão 1- Por ser um animal racional, o ser humano produz e reproduz determinadas formas de conhecimento que orientam e reorientam as relações sociais. Sobre essa relação entre o ser humano e o conhecimento, é incorreto afirmar que: A) Por ser existencial, o ser humano tem que interpretar a si e ao mundo em que vive, atribuindo-lhes significações. Cria intelectualmente representações significativas da realidade, que são chamadas de conhecimento. B) Dependendo da forma pela qual se chega a uma determinada representação significativa, o conhecimento pode ser, em linhas gerais, classificado em diversos tipos: mítico, ordinário, artístico, filosófico, religioso, dentre outros. C) As duas formas que estão mais presentes e que mais interferem nas decisões da vida diária do homem são o conhecimento do senso comum e o científico. D) Tanto o senso comum quanto o conhecimento científico partem da necessidade de se compreender o mundo, mas os caminhos que percorrem são diferentes. Não só os caminhos são diferentes, como os instrumentos utilizados para a produção de significados também são. E) Quando as representações dos significados são os mesmos para o senso comum e para o conhecimento científico, o processo de validação e propagação de tais representações apresentam características semelhantes para ambas as formas do conhecimento. Questão 2- De acordo com Bacon, o método utilizado para a construção do conhecimento científico deveria seguir uma série de passos. Não faz parte dessa sequência de passos a informação presente na alternativa: 24 A) O primeiro passo é o da experimentação, no qual o cientista realiza experimentos sobre o problema investigado para poder observar e registrar metódica e sistematicamente todas as informações que for possível coletar. B) O primeiro passo é o da formulação de hipóteses para tentar explicar a relação causal dos fatos entre si. C) O terceiro passo é o da repetição da experimentação por outros cientistas. Após as experimentações iniciais e a formulação de hipóteses, é necessário fornecer os dados para outros cientistas para que eles possam reproduzir os experimentos, ajudando na acumulação de dados que, por sua vez, podem ajudar na formulação de mais hipóteses. D) O quarto passo é o da repetição dos experimentos para a testagem das hipóteses. Após as experimentações iniciais, a formulação de hipóteses e os experimentos realizados por outros cientistas, o investigador, munido de todas as informações possíveis, deve realizar novamente ainda mais experimentos para testar as hipóteses com o objetivo de encontrar novos dados e novas evidências que as corroborem ou as refutem, possibilitando a construção de leis gerais. E) O último passo é o da formulação das generalizações e leis. Ao se realizar todas as etapas anteriores, o cientista formula as leis que descobrir, generalizando suas explicações para todos os fenômenos da mesma espécie. Para responder esses questões é necessária a leitura da Unidade 1 BIBLIOGRAFIA BÁSICA GIL, Antônio Carlos. Como Elaborar Projetos de Pesquisa. São Paulo: Editora Atlas, 2002. LAKATOS, Eva Maria; MARCONI, Marina de Andrade. Metodologia do Trabalho Científico. São Paulo: Atlas, 2015. BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR 25 LAKATOS, Eva Maria; MARCONI, Marina de Andrade. Fundamentos de Metodologia Científica. São Paulo: Atlas, 2010. MARCONI, Marina De Andrade. Técnicas de Pesquisa: Planejamento e Execução de Pesquisas: São Paulo. Atlas. 2013. MINAYO, Maria Cecília de Souza (org.) Pesquisa Social: teoria, método e criatividade. 22ª edição. Petrópolis: Vozes, 2004. RAMOS, Albenides. Metodologia da Pesquisa Científica. São Paulo: Atlas, 2009.
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