Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
METODOLOGIA DO ENSINO DE HISTÓRIA Carla Renata Antunes de Souza Gomes Diulli Adriene Lopes Trindade Márcia Cristina Furtado Eco ten As categorias históricas no processo de ensino-aprendizagem: uma abordagem interdisciplinar Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: � Reconhecer a interdisciplinaridade como uma abordagem neces- sária no ensino-aprendizagem das categorias históricas. � Conhecer alternativas de intervenção interdisciplinar no ensino- -aprendizagem de História. � Identificar as possibilidades e as limitações para o desenvolvi- mento de uma prática interdisciplinar no ensino de História. Introdução Um termo indispensável quando falamos em História é “categoria”. Esse termo se refere à classificação de ideias, que podem ser organi- zadas de diferentes modos de acordo com o tema que se pretende evidenciar, neste caso a História. A categorização é fundamental para a produção de conhecimento e orienta a análise e a interpretação, além de permitir juntar conhecimentos. Neste texto você vai poder compreender que as categorias históricas são necessárias para cons- truirmos o conhecimento histórico. E para uma melhor compreensão da disciplina de História, devemos planejar atividades interdisciplina- res, pois nenhuma disciplina é algo isolado. A interdisciplinaridade é um tema em debate hoje que tem o objetivo de deixar de lado uma docência solitária e fragmentada. É necessário se estabelecerem rela- ções entre as disciplinas que compõem o currículo de nossas escolas. Reconhecimento da interdisciplinaridade como uma abordagem necessária O estudo de História deve ser compreendido em sua dimensão social. Para isso, é necessário analisar e interpretar as ações do homem em sociedade ao longo do tempo. Essas ações influenciam, modificam e transformam o cotidiano, possibilitando novas vivências e experiências. Como um exemplo prático disso, vamos voltar no tempo. No século XVIII, na Europa, tivemos um processo histórico que mexeu com toda a estrutura e situação da sociedade moderna e contemporânea: a Revolução Francesa. Tal acontecimento foi estimulado por filósofos ilumi- nistas, como Voltaire, Rousseau e Montesquieu, que defendiam, entre outros ideais, a valorização da ciência e criticavam o Antigo Regime, sistema po- lítico baseado no poder absoluto do rei (absolutismo). O pensamento desses filósofos se espalhou por toda a Europa, fazendo o movimento ganhar força e resultar no fim do sistema monárquico e na implementação de diferentes sis- temas políticos, como a monarquia constitucional e a república, em diferentes países do continente europeu. Enquanto na Europa a monarquia se dissolvia, no Brasil a coroa portuguesa aumentava seu controle na colônia, o que fez crescer a insatisfação de diferentes setores da sociedade em diversas regiões do Brasil. Tal insatisfação resultou na explosão de revoltas (Inconfidência Mi- neira, Conjuração Baiana, entre outras) inspiradas nos ideais dos iluministas revolucionários franceses. Esses acontecimentos nos fazem refletir e perceber que as ações desses homens, tanto na Europa quanto na colônia portuguesa (Brasil), mudaram o modo de viver e pensar dos habitantes desses locais. Essa é a História: um processo de permanências e mudanças que vão se acumulando e gerando novas aprendizagens. Trouxemos para você, educando, a Revolução Francesa e as revoltas no Brasil como exemplos de mudanças em termos sociais. Mas e as permanên- cias? Como exemplo, podemos citar a questão do machismo na sociedade brasileira. Estamos realizando as Olimpíadas em nosso país, e o futebol feminino surgiu com força total, fazendo os torcedores se encantarem com a garra, ha- bilidade e humildade das “meninas” do Brasil. Mas e por que essa modalidade esportiva não é valorizada em nosso país, já que a frase “O Brasil é o país do futebol” é tão repetida? O Brasil é o país do futebol, sim, mas do futebol Metodologia do ensino de História26 masculino. Esse sim é valorizado e idolatrado! Na visão machista comum em nossa sociedade, futebol não é coisa de mulher! Na sua concepção, a História é uma disciplina isolada ou ela se relaciona diretamente com outras disciplinas? Todo conhecimento mantém um diálogo permanente com outros conhecimentos. Reconhecemos as diferenças entre as áreas do conhecimento, mas precisamos identificar onde se encontram os pontos comuns entre elas para, assim, fazermos um trabalho interdisciplinar. Qualquer disciplina escolar é um recorte da área de conhecimento que representa (Disciplina: História; Área de conhecimento: Ciências Humanas). Qualquer área de conhecimento, mesmo que de forma isolada, não consegue dar conta da totalidade dos acontecimentos. Assim, os professores das di- versas disciplinas devem buscar interações entre as áreas, permitindo que os educandos compreendam melhor a realidade. O estudo da História busca sempre contextualizar os fatos dentro da reali- dade onde os educandos estão inseridos. Esse é o elo de ligação da disciplina de História com as demais áreas do conhecimento. A união das disciplinas e a associação dos conteúdos à realidade do aluno faz ele conseguir desenvolver um entendimento crítico dos fatos. Como mencionamos, a Revolução Francesa foi um fato que mudou o andamento da sociedade europeia no século XVIII, influenciando revoltas em outros continentes. Para saber mais sobre esse assunto, recomendamos: COBBAN, A. A interpretação social da Revolução Francesa. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1964. HOBSBAWM, E. J. A Revolução Francesa. São Paulo: Guerra e Paz, 2008. Alternativas de intervenção interdisciplinar Já conseguimos concluir que a História não é uma disciplina isolada. Ela pode, e deve, “conversar” com as demais disciplinas do currículo escolar. Mas e como colocar a interdisciplinaridade em prática dentro das escolas? Como pensar um projeto interdisciplinar? Como envolver os diferentes sujeitos da escola nesse processo? Vejamos a seguir. 27As categorias históricas no processo de ensino-aprendizagem Há uma crítica constante de nossa sociedade, influenciada pela crise edu- cacional atual, sobre o verdadeiro papel da escola. Vivemos um momento de falta de recursos para as escolas (recursos alimentícios, didáticos, de manu- tenção, entre outros), problemas de falta de professores e/ou professores atu- ando fora do seu curso de formação. Além disso, existem problemas dentro das especificidades de cada escola. Como exemplo, podemos mencionar a questão do PPP (Projeto Político Pedagógico) e do Regimento Escolar, que devem estar alinhados com as práticas desenvolvidas na escola, o que nem sempre acontece. O primeiro contato em sociedade de nossos alunos acontecerá dentro da escola, que tem o papel fundamental de inseri-los no espaço público e pre- pará-los para compartilhar suas vivências ao longo da vida em sociedade. Por- tanto, a escola pode ser definida como mediadora na troca de conhecimentos, gerando educandos críticos e capazes de transformarem sua realidade e/ou visão de mundo. Para o professor, além de um espaço de trabalho, a escola deve ser um espaço onde a formação pedagógica seja constante, um espaço de grande re- flexão e compartilhamento de conhecimentos a partir de processos interdisci- plinares, o que só vai ser possível com a parceria entre gestão escolar, corpo docente, comunidade escolar e educandos. O objetivo do planejamento coletivo deve ser considerar os diferentes sa- beres que circulam na escola a partir de trocas de experiências entre profes- sores e disciplinas. Colega professor, imagine-se planejando uma atividade com o tema “feira cultural”, que já ocorre na escola há bastante tempo. Como fazer essa feira se tornar uma atividade interdisciplinar? Podemos iniciar fugindo da lógica de divisões por turmas/anos, fazendo com que haja educandos de diferentes faixas etárias na composição dos grupos de trabalho. Em um mesmo grupo, podem haveralunos dos anos iniciais, do fundamental e também do ensino médio, respeitando seus diferentes saberes e tempos de aprendizagens. Outro passo importante é a construção de um planejamento coletivo com finalidade prática. Esse planejamento não vai ser para uma atividade indivi- dual, com cada professor pensando o tema dentro de sua disciplina, mas uma atividade em conjunto, ouvindo as ideias dos colegas e considerando que os conceitos trabalhados são diferentes para cada área, o que não torna o tema algo limitado. Na prática, sugerimos, por exemplo, que os conteúdos programáticos que fazem parte do currículo escolar sejam adaptados à proposta da feira, que, Metodologia do ensino de História28 nesta edição, terá o tema “gastronomia”. O aluno precisa se enxergar como parte desse processo de construção interdisciplinar junto com o professor. O projeto pensado (teoria) alcançará seu objetivo interdisciplinar, nesse caso, somente se for desenvolvido coletivamente. Isso acontecerá em aulas diferen- ciadas, onde, em uma mesma sala, as aulas serão dadas por professores das diferentes disciplinas curriculares. O professor de Biologia poderá falar sobre as doenças pela má alimen- tação, como diabetes, obesidade e subnutrição. Já o professor de Geografia poderá explicar para seus alunos como ocorreu o processo de industrialização no Brasil em suas diferentes regiões, relacionando isso com a questão da fome no mundo. A importância de uma dieta alimentar para uma vida saudável pode ser debatida nas aulas de Educação Física pelo estudo dos nutrientes da pirâmide alimentar. Os cálculos de calorias e IMC (Índice de Massa Corporal) e a construção de gráficos sobre o tema podem ser tratados nas aulas do pro- fessor de Matemática. É importante destacar que os temas dessas atividades devem ter sempre uma importância social e que não devem ser tratados ou elaborados a partir de um único componente curricular. É importante procurar solucionar os pro- blemas predefinidos de forma interdisciplinar. Tenha sempre em mente que a interdisciplinaridade deve se transformar em uma prá- tica constante na escola — mesmo com possíveis resistências de alguns colegas seus. Não desista! Possibilidades e limitações para o desenvolvimento de uma prática interdisciplinar Sabendo a importância do componente curricular História para as demais disciplinas, e as possíveis dificuldades e limitações em executar projetos in- terdisciplinares, torna-se necessário avaliar as alternativas viáveis para que esse processo se realize na prática. O professor deve dar as condições para 29As categorias históricas no processo de ensino-aprendizagem seu educando participar do processo de fazer história e para ele se reconhecer como um ser histórico parte do processo de desenvolvimento da história. Durante muito tempo, o objetivo da História trabalhada em sala de aula era o estudo e a memorização de fatos pontuais, suas datas e seus “heróis”, os personagens principais. Essa concepção tradicional da História foi, aos poucos, sendo substituída e mudando de foco. Sai de cena a história dos grandes heróis, e entra em cena a história de pessoas comuns. Nesse con- texto, a disciplina passa a oferecer aos educandos o protagonismo de construir novos conhecimentos a partir de suas experiências. Com isso, torna-se necessário desenvolver uma metodologia que seja o contrário da tradicional para o aluno perceber a dimensão da História e se identificar como objeto de pesquisa de sua própria trajetória. Nas aulas, de- vemos conquistar esse aluno usando sua linguagem e seu modo de vida e não fazer o ensino se apresentar de uma forma tradicional, onde o aluno não reflete sobre sua realidade. A pergunta que se faz é: como fazer nossos alunos serem ativos na construção e concepção do conhecimento? Essa metodologia não tradicional deve orientar a análise, a seleção e a escolha dos livros didáticos, que serão utilizados como ferramenta de apoio e não como detentores de todo o conhecimento. Essas etapas são fundamentais para tornar mais clara a prática de uma história tradicional. Muitos de nossos educandos resistem a novos métodos de ensino-aprendi- zagem que os tornem reflexivos, pois se acostumaram a repetir e reproduzir informações. Por isso, demonstram pouca consideração pela História, o que justifica o seu desinteresse em estudar. Morin (2003) diz que o mundo está marcado pelo excesso de informação. Ele aponta, ainda, que é necessário que a informação se torne conhecimento pertinente, e isso somente acontecerá pelo que ele chama de “poder clarificador”. O professor deve ser apenas o mediador. Tanto a escola quanto o educador não detêm mais o saber a partir do momento em que produzem alunos colaborativos, conscientes e com maior determinação. Para resumir, o aluno deve ser um eterno questionador do seu aprendizado. Nós, como educadores, não devemos fugir da realidade onde esses alunos vivem, dos seus problemas locais. Por exemplo, um aluno não terá interesse em saber sobre as secas e cheias do Rio Nilo no Egito Antigo, mas, se traba- lharmos com eles sobre alagamentos e secas em seus próprios bairros e as políticas públicas municipais para resolução desse problema, vamos poder associar isso às técnicas hidráulicas no oriente. Foram essas técnicas que per- mitiram que os egípcios construíssem reservatórios de água e canais de dre- Metodologia do ensino de História30 nagem e irrigação. Trabalhando esses assuntos, poderemos fazer uma compa- ração entre fatos do passado e a própria vivência deles. Sabemos que lidar com a realidade de cada estudante é uma tarefa tra- balhosa. As desigualdades sociais comprometem o sistema educacional bra- sileiro, pois más condições de alimentação, moradia, educação e saúde difi- cultam o cumprimento daquilo que está previsto em lei: ensino de qualidade, gratuito e obrigatório. Esses problemas, muitas vezes, atrapalham não só o acesso à escola, mas também a permanência desses alunos no espaço escolar e seu rendimento. Figura 1. Planejamento escolar coletivo. Fonte: Pressmaster/Shutterstock.com. 31As categorias históricas no processo de ensino-aprendizagem 1. O termo “categorias” se re- fere: a) À classificação das transforma- ções ao longo de sua existência biológica. b) Às permanências biológicas ao longo do tempo. c) À classificação de ideias, que podem ser organizadas de dife- rentes modos de acordo com o tema que se pretende evidenciar. d) À classificação das diferentes ações realizadas apenas pelo homem atual. e) À classificação de ideias e ações de personagens históricos apenas na atualidade. 2. Para o desenvolvimento de um trabalho interdisciplinar, é neces- sário: a) Reconhecer a superioridade da disciplina de História perante as outras disciplinas. b) Reconhecer as diferenças entre as áreas de conhecimento. c) Reconhecer apenas as seme- lhanças que existem entre as dife- rentes áreas do conhecimento. d) Reconhecer que a interdiscipli- naridade não deve ocorrer no espaço escolar. e) Reconhecer as diferenças e semelhanças entre as áreas de conhecimento. 3. A escola, para o professor, além de um espaço de trabalho, deve ser: a) Um espaço de reprodução e repetição de conhecimentos. b) Um espaço onde a interdisci- plinaridade seja praticada em disciplinas da mesma área de conhecimento. c) Um espaço onde a formação pedagógica seja constante. d) Um espaço onde os conteúdos não sejam adaptados às reali- dades da escola. e) Um espaço de formação pedagó- gica isolada. 4. O planejamento coletivo deve ter como objetivo: a) Não permitir uma troca de expe- riências nos planejamentos dos professores para evitar “colas”. b) Identificar e contextualizar o aprendizado que circula na escola a partir de trocas de experiências entre os educandos e professores. c) Compreender os diferentes aprendizados que circulam na escola a partir de trocas de expe- riências entre os professores. d) Contemplar os diferentes saberesque circulam na escola a partir de trocas de experiências entre professores e disciplinas. e) Contemplar os diferentes apren- dizados que circulam na escola a Metodologia do ensino de História32 MORIN, E. A cabeça bem-feita: repensar a reforma, reformar o pensamento. 8. ed. Rio de Janeiro: Bertrand, 2003. Leituras recomendadas BARROSO, V. L. M. et. al. (Org.). Ensino de História: desafios contemporâneos. Porto Ale- gre: EST, 2010. BRODBECK, M. de S. L. Vivenciando a História: metodologia do Ensino de História. Curi- tiba: Base Editorial, 2012. GONZÁLEZ, J. A. T. Educação e diversidade: bases didáticas e organizativas. Porto Alegre: Artmed, 2002. p. 52-58. STRECK, D. R.; REDIN, E.; ZITKOSKI, J. J. (Org.). Dicionário Paulo Freire. Belo Horizonte: Au- têntica, 2008. SUDBRACK, E.; GROTTO, E. M. B. (Org.). Políticas de formação docente: vivência emancipa- tória. Frederico Westphalen: URI, 2009. THIESEN, J. da S. A interdisciplinaridade como um movimento articulador no proces- so ensino-aprendizagem. Revista Brasileira de Educação, v.13, n. 39, p. 545-554, set./dez. 2008. Disponível em: <http://dx.doi.org/10.1590/S1413-24782008000300010>. Acesso em: 13 set. 2016. Referência partir de trocas de experiências entre as disciplinas e educandos. 5. Muitos de nossos educandos apresentam resistência a novos métodos de ensino-aprendizagem, pois: a) Acostumaram-se a inovar, afinal são alunos mais críticos. b) Acostumaram-se a repetir e reproduzir informações. c) Acostumaram-se a não realizar as tarefas solicitadas em sala de aula. d) Acostumaram-se a aceitar os novos métodos de ensino-apren- dizagem. e) Acostumara-se a inovar e repro- duzir informações. 33As categorias históricas no processo de ensino-aprendizagem Conteúdo:
Compartilhar