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Júlia Figueirêdo – EMERGÊNCIAS CRISES HIPERTENSIVAS: A crise hipertensiva (CH) é definida como a elevação significativa, abrupta e sintomática da PA, geralmente com níveis pressóricos > 180 (PAS) e/ou 120 mmHg (PAD). É possível estratificar essa condição conforme a severidade do quadro, a saber: Urgências hipertensivas (UH): descrevem situações clínicas nas quais não há lesão aguda de órgãos-alvo (LOA) e também não ocorre risco iminente de morte; Emergências hipertensivas (EH): apresentam gravidade considerável, com presença de LOA progressiva e potencial evolução para óbito. Diferenças entre os quadros de urgência e emergência hipertensiva Cabe ainda destacar a existência de pseudocrises hipertensivas, quadros em que há elevação pressórica secundária a algum outro sintoma, como ansiedade, dor, tontura ou síndrome do pânico, podendo se desenvolver em hipertensos não tratados ou não controlados. No Brasil, esses eventos representam 0,4 a 0,6% dos atendimentos em serviços de emergência (25% deles por EH), tendo como origens mais comuns o edema agudo de pulmão e o acidente vascular encefálico. Há maior prevalência de CH entre homens, obesos, portadores de doença renal crônica e em indivíduos mal aderentes ao tratamento da HAS. Observa-se também incidência proporcional ao aumento da idade. FISIOPATOLOGIA: A pressão arterial sistêmica é o produto de duas variáveis de grande importância, o débito cardíaco e a resistência vascular periférica. Assim, desequilíbrios em qualquer um desses parâmetros, como o aumento do volume intravascular, a queda na produção de vasodilatadores endógenos ou a ativação de mediadores vasoconstrictores podem causar distúrbios pressóricos. Os principais focos são o cérebro e os rins, tecidos que se tornam mais vulneráveis a isquemias, desencadeando um círculo vicioso de vasoconstricção, lesão endotelial e ativação de mediadores imunológicos/de coagulação. Todo esse processo culmina em necrose arteriolar e redução do suprimento sanguíneo local. O sistema renina-angiotensina- aldosterona pode ser ativado a partir de respostas inflamatórias iniciadas pelos mecanismos acima, promovendo a secreção de vasopressina e, consequentemente, natriurese. Observa-se, no entanto, que essa redução da volemia tem efeito paradoxal, visto que intensifica a constrição vascular compensatória. Indivíduos hipertensos apresentam alterações nos mecanismos autorregulatórios, de forma que o aumento ATENÇÃO: apenas as urgências e emergências hipertensivas são consideradas crises verdadeiras Outra possível causa primária para o estreitamento dos vasos é o excesso de sódio e de catecolaminas Júlia Figueirêdo – EMERGÊNCIAS abrupto da PA e a reação a essa mudança se dão com a vasoconstricção de artérias e arteríolas, mantendo a pressão de perfusão constante para os órgãos, protegendo-os das variações pressóricas. Em função de insultos repetidos, tais indivíduos cursam com microtromboses e focos de oclusão vascular, além da já descrita necrose fibrinoide arterial. Curva de autorregulação pressórica conforme a dilatação vascular (em hipertensos crônicos, a faixa de regulação se desloca para a direita) Classificação das emergências hipertensivas conforme sistema acometido DIAGNÓSTICO: A aferição da pressão arterial em pacientes com CH deve ser feita em ambos os braços, em um ambiente calmo, sendo reavaliada frequentemente (ao menos 3 medidas) até a estabilização do quadro. Durante essa avaliação inicial, a prioridade é excluir a presença de LOA aguda e progressiva. Achados clínicos que devem ser considerados na avaliação de crises hipertensivas Durante a anamnese, é importante indagar sobre os níveis pressóricos basais do paciente, bem como sobre possíveis situações predisponentes desse aumento (consumo de sal, uso de medicações, álcool ou drogas ilícitas, estresse emocional). A identificação de assimetria de pulsos ou da pressão arterial, assim como novos sopros aórticos e abdominais, são indicativas de dissecção de aorta. Tosse com expectoração rósea, dispneia e sinais de congestão pulmonar ao exame físico sugerem a presença de edema agudo de pulmão. No exame neurológico, por sua vez, cabe investigar a presença de déficits focais, como alterações no nível de consciência e déficits de força ou sensibilidade, e de sinais sugestivos de hemorragia (ex.: rigidez nucal). Pacientes com emergências hipertensivas normalmente cursam com HAS secundária, tendo como etiologias mais comuns a hipertensão renovascular, hiperaldosteronismo primário, doença renal crônica e feocromocitoma Júlia Figueirêdo – EMERGÊNCIAS Gestantes e puérperas devem ainda ser submetida a testes de reflexos superficiais e profundos, uma vez que a hiperreflexia se mostra como um importante sinal de eclâmpsia. A fundoscopia (ou a ultrassonografia de nervo óptico) é um exame essencial, permitindo não apenas a identificação da retinopatia hipertensiva, mas também sua estratificação conforme a classificação de Keith-Wagener-Barker, a saber Grau 0 (normal); Grau 1 (estreitamento arterial mínimo); Grau 2 (estreitamento arterial óbvio com irregularidades focais); Grau 3 (estreitamento arterial com hemorragias retinianas e/ou exsudato); Grau 4 (grau 3 + papiledema). Características das apresentações de retinopatia hipertensiva A retinopatia hipetensiva aguda, por sua vez, tem como principais achados os transudatos periarteriolares, o edema macular (e do disco óptico), exsudatos algodonosos (lesões brancas formadas por axônios isquemiados) e exsudatos duros (depósitos lipídicos). Quadros crônicos tendem a cursar com estreitamento arteriovenoso, fios de cobre/prata (aumento da reflexão da luz devido à esclerose e espessamento arteriais) e hemorragias intrarretinianas. Anormalidades na retinopatia hipertensiva Os exames complementares devem ser solicitados de acordo com a suspeita diagnóstica, porém, no caso de UH, tais avaliações costumam não ser indicadas, pois não alteram a conduta e aumentam o tempo de permanência intra-hospitalar. Para as EH, por sua vez, são solicitados: Hemograma; Ureia e creatinina; Eletrólitos e sedimento urinário (avaliação de proteinúria, hematúria e leucocitúria); Bilirrubina e hepatoglobina (marcadores de hemólise); Marcadores de necrose miocárdica – troponina, mioglobina, CK-MB (na suspeita de síndrome coronariana aguda); BNP ou nT-pró-BNP (investigação de edema agudo de pulmão); Dosagem de D-dímero (para dissecção aguda de aorta). Alguns exames de imagem também se mostram úteis, como o eletrocardiograma (comumente apresenta sinais de sobrecarga ventricular), a radiografia de tórax, angiotomografia de aorta (investigação de lesões arteriais), ecocardiograma transesofágico, e a tomografia computadorizada, essa última reservada para possíveis casos de AVE. Júlia Figueirêdo – EMERGÊNCIAS Exames complementares a serem solicitados na investigação de lesões de órgãos-alvo Como mencionado anteriormente, o principal diagnóstico diferencial a ser descartado para as urgências e emergências hipertensivas é a pseudocrise hipertensiva, na qual o aumento da PA é consequência (e não causa) de alguma disfunção, como dor e estresse. TRATAMENTO DAS CRISES HIPERTENSIVAS: O tratamento das urgências hipertensicas deve ser iniciado após a observação do paciente em um local calmo, de forma a afastar quadros de pseudocrises, que são manejadas com repouso e sintomáticos (analgésicos, ansiolíticos). O captopril (25 a 50 mg) e a clonidina (0,1 a 0,2 mg) são indicados para o controle agudo da pressão arterial, apresentandopico máximo de ação em 60-90 e 30-60 minutos, respectivamente. O nifedipino de liberação rápida é proscrito para as UH, pois provoca queda acentuada e brusca da PA, o que pode causar isquemias. Para o tratamento das emergências hipertensivas, por sua vez, o objetivo é a redução precoce da PA para limitar a progressão das LOA. Esses pacientes devem ser admitidos em UTI, onde receberão anti-hipertensivos intravenosos, representados por: Nitroprussiato de sódio: é mais potente em função de sua ação vasodilatadora arteriovenosa, porém pode causar aumento da pressão intracraniana, intoxicação por cianureto e deve ser evitado na SCA e na eclâmpsia, devido ao risco de roubo de fluxo; Nitroglicerina: droga de escolha na SCA, age predominantemente sobre a circulação venosa, tendo como efeitos adversosa cefaleia, tontura e metaemoglobinemia. As recomendações de redução pressórica nas EH devem ser obedecidas, tendo como metas: Queda da PA ≤ 25% na 1ª hora; Esse alvo é mais agressivo em pacientes com dissecção aguda de Aorta, devendo haver PA < 120/80 mmHg em até 30 minutos. PA 160/100-110 mmHg nas 2 a 6 horas seguintes; Atingir PA de 135/85 mmHg em 24 a 48 horas. A ultrassom point-of-care tem sido cada vez mais utilizada nos serviços de emergência para o diagnóstico de hipertensão intracraniana e dissecção de aorta, além de promover avaliação da função cardíaca e da congestão pulmonar O objetivo terapêutico na UH é reduzir a pressão arterial para valores ≤ 140/90 em até 72 horas, o que justifica a possibilidade de usar drogas por via oral Júlia Figueirêdo – EMERGÊNCIAS Fluxograma geral de atendimento e manejo das crises hipertensivas APRESENTAÇÕES CLÍNICAS E ABORDAGENS ESPECÍFICAS NA CRISE HIPERTENSIVA: ENCEFALOPATIA HIPERTENSIVA: A encefalopatia hipertensiva é descrita como a presença de sintomas neurológicos associada ao aumento súbito da PA, havendo melhora do quadro tão logo se instalar o controle pressórico. A origem desse quadro é o hiperfluxo cerebral decorrente do desequilíbrio da curva de autorregulação da perfusão sanguínea. Assim, a hipertensão promove dilatação dos microvasos e, consequentemente, edema difuso. Em pacientes com HAS, a ocorrência desse quadro somente é vista com PA > 240/120 mmHg, porém indivíduos normotensos não necessitam de variações tão intensas. O primeiro sintoma é a cefaleia, com aspecto predominantemente frontoccipital ou holocraniano, que costuma ser mais acentuada durante a manhã. Ao longo dos próximos dias outras manifestações se instalam de forma insidiosa, como alterações do nível de consciência, náuseas, vômitos e crises convulsivas. Ao exame físico, observa-se sinal de Babinski bilateral, além de mioclonia. O manejo deve ser feito após internação imediata, com uso de anti-hipertensivos intravenosos capazes de controlar rapidamente a PA. Nesse sentido, as drogas de 1ª escolha são o nitroprussiato de sódio, a nicardipina ou o labetalol. A meta terapêutica é a redução da PAM em 10 a 15% após a primeira hora, seguida por queda de 25% ao longo de 24h. O controle mais rigoroso não é recomendado, pois pode causar isquemia cerebral. Após a estabilização do paciente, é possível (re)iniciar a terapia anti-hipertensiva oral, ao mesmo tempo em que é feito o “desmame” das drogas venosas. ACIDENTE VASCULAR ENCEFÁLICO (AVE): Os indivíduos hipertensos são mais vulneráveis à ocorrência de AVE hemorrágicos, tanto intraparenquimatoso quanto por hemorragia subaracnoide (HSA) secundária à ruptura de aneurismas. A elevação da PA, além de ser gatilho para o sangramento, também pode ser causada pelo reflexo de Cushing, que ocorre com o edema cerebral e a hipertensão intracraniana. Apesar de contraintuitivo, o controle pressórico estrito é deletério, pois pode induzir a formação de focos isquêmicos em áreas de vasoespasmo. Os sinais e sintomas que devem levantar suspeição para um AVEh são cefaleia intensa e súbita (especialmente no O principal diagnóstico diferencial a ser descartado é o AVE hemorrágico, que se destaca por apresentar evolução súbita. No entanto, é importante realizar tomografia sempre que houver dúvida Júlia Figueirêdo – EMERGÊNCIAS acometimento subaracnoide), que pode ou não estar associada a crises convulsivas, queda do nível de consciência ou déficits neurológicos focais. O diagnóstico é confirmado, como mencionado acima, por meio de uma tomografia de crânio, revelando focos de hiperdensidade. Esses pacientes devem ser admitidos em UTI, ambiente onde a PAM e a pressão intracraniana podem ser monitorizados por acessos invasivos. A hiperventilação temporária deve ser iniciada para aumentar a perfusão local. Os anti-hipertensivos de escolha são os mesmos da encefalopatia hepática, sendo que, em quadros de HSA, recomenda-se o uso de nimodipina (60 mg a cada 4 horas), visto que apresenta efeito neuroprotetor. O menitol também pode ser utilizado como forma de terapia adjuvante para o edema cerebral. Assim, o objetivo do tratamento é manter a pressão arterial entre 150/90 e 180-105 mmHg, na presença de hemorragia intraparenquimatosa, e entre 130/95 e 160/105 mmHg em quadros de hemorragia subaracnoide. EDEMA AGUDO DE PULMÃO HIPERTENSIVO: A elevação excessiva da PA provoca aumento na carga ventricular e na demanda do miocárdio por O2, impactando negativamente sobre a função sistólica e/ou diastólica. No edema de pulmão cardiogênico associado à hipertensão, há predomínio de comprometimento diastólico, com a queda no débito cardíaco sendo causada por redução da complacência dos ventrículos. Fisiopatologia do acúmulo de líquidos nos alvéolos O quadro é caracterizado pelo início agudo e progressivo de dispneia, ansiedade, sudorese intensa, cianose e má perfusão periférica. O manejo desse quadro deve ser realizado em UTI, com uso de nitroglicerina/nitroprussiato de sódio, de modo a reduzir a pré e pós-carga cardíaca. O uso de furosemida, um diurético de alça, também é útil, pois diminui a sobrecarga de volume e, posteriormente, a pressão arterial. A pressão positiva contínua não invasiva (CIPAP) também é recomendada como forma de suplementação de oxigênio, aumentando a pressão torácica e diminuindo o retorno venoso. SÍNDROME CORONARIANA AGUDA: A isquemia miocárdica aguda estimula o sistema nervoso simpático a aumentar a frequência cardíaca e a pressão arterial, o que aumenta o consumo de O2 e favorece a extensão do infarto. Caso o AVE tenha origem isquêmica, o controle da PA é imprescindível para a terapia trombolítica, de modo que o alvo passa a ser de PAS ≤ 185/110 mmHg. Caso a PAD seja > 140 mmHg, o nitroprussiato de sódio deve ser usado, ao passo que o labetalol é suficiente para os demais casos Júlia Figueirêdo – EMERGÊNCIAS Essa resposta neurometabólica justifica o uso de anti-hipertensivos intravenosos em pacientes com IAM ou angina estável associados à hipertensão arterial grave (> 180 x 110), com preferência para a nitroglicerina. O nitroprussiato deve ser reservado a quadros refratários, pois é associado ao roubo de fluxo coronariano. Os betabloqueadores parenterais (esmolol, labetalol e metoprolol) devem ser associados em todos os casos, mesmo em pacientes normotensos, exceto se houverem contraindicações, como bradiarritmias, broncoespasmo ou classificação de Killip ≥ II. DISSECÇÃO AGUDA DE AORTA: A dissecção aguda de aorta descreve o fenômeno de ruptura da camada íntima arterial, permitindo que o sangue se infiltre entre as túnicas íntima e média, num espaço denominado “falsa luz”. Esse quadro é precipitado pela fraqueza da parede aórtica e pela presençade forças de cisalhamento, mediada pela contração do miocárdio. Progressão de lesões dissecantes arteriais A consequência mais grave da dissecção de aorta é a lesão das túnicas média e adventícia, que pode causar hemorragias potencialmente fatais. O local desses sangramentos depende do ponto de rompimento aórtico, a saber: Aorta ascendente: provoca hemopericárdio e tamponamento cardíaco, quase sempre levando o paciente a óbito; Aorta torácica: causa hemotórax ou hemomediastino, que, por comprimirem a veia cava, levam a choque obstrutivo; Aorta abdominal: a hemorragia digestiva franca é a principal apresentação, porém também ocorre hemoperitônio, ambos associados ao choque hemorrágico. É possível também estratificar essa condição, de acordo com seus limites anatômicos, na classificação de De Bakey: Tipo I: presente em 70% dos casos, nos quais a lesão inicial é na aorta ascendente, porém a dissecção se estende para além dela, pelo arco aórtico e também por sua porção descendente; Tipo II: mais raro, se dá na presença de acometimento limitado à aorta ascendente; Tipo III: o rompimento ocorre na aorta descendente, com dissecção restrita à aorta descendente, seja torácica (tipo IIIa) ou abdominal (IIIb). A classificação de Stanford sintetiza essas divisões em dois grupos, um com comprometimento da aorta ascendente (A, correspondente aos tipos I e II de De Bakey), e outro com “não comprometimento” da aorta ascendente (tipo III de De Bakey) Júlia Figueirêdo – EMERGÊNCIAS Representação esquemáticas dos focos de acometimento da dissecção aguda de aorta A apresentação típica dos tipos I e II é marcada por dor torácica retroesternal súbita e intensa, geralmente classificada como “cortante”, associada a sudorese e náuseas. Com o passar do tempo, a dor se converte a incômodo dorsal (que pode atingir a lombar), produto da extensão da dissecção. O tipo III, por sua vez, se manifesta por meio de dor de início abrupto em região dorsal ou toracolombar. Um importante sinal sugestivo desse quadro é a diferença de PA > 20 mmHg entre os membros superiores, que pode ocorrer junto a sopro carotídeo ou déficits neurológicos focais. É possível que ocorra hipertensão renovascular caso as artérias renais sejam afetadas. No processo de investigação diagnóstica da dissecção, os principais exames utilizados são a radiografia de tórax, o ecocardiograma (transesofágico ou transtorácico, mais sensíveis para os tipos I e II), tomografia (maior sensibilidade no tipo III), arteriografia e a ressonância magnética. O tratamento medicamentoso, realizado em UTI, deve ser iniciado imediatamente, tendo como principais objetivos diminuir a PA (a pressão sistólica deve atingir 100 a 120 mmHg em 20 min) e a força contrátil do miocárdio (manter a FC < 30 mg), minimizando o risco de propagação da lesão. Os medicamentos de escolha são os betabloqueadores, especialmente o labetalol, que pode ser usado em monoterapia. Outras opções são o esmolol e a associação entre nitroprussiato de sódio e propranolol/metoprolol. Na presença de contraindicações a essa classe de medicamentos, recomenda-se a administração de verapramil ou dilatiazem venosos. Os vasodilatadores de ação direta e a nifedipina via oral são absolutamente contraindicados, pois provocam aumento reflexo da contração cardíaca. Mesmo com as intervenções farmacológicas, intervenções cirúrgicas reparadoras (idealmente após a estabilização clínica do paciente) são necessárias para diminuir o risco de complicações. O procedimento consiste na ressecção do segmento aórtico mais comprometido, especialmente do foco de ruptura, instalando uma prótese de aorta ou um reforço de teflon. Nos casos de dissecção tipo II, a cirurgia costuma apresentar mesma eficácia quando comparada ao tratamento conservador, porém algumas condições tornam imperativa a realização da cirurgia, como obstrução vascular, hipertensão renovascular, e expansão de aneurismas. O padrão migratório da dor auxilia a diferenciar a dissecção aguda de aorta do infarto agudo do miocárdio, porém o ECG e a dosagem de marcadores de lesão miocárdica podem ser usados para confirmação, em caso de dúvida Júlia Figueirêdo – EMERGÊNCIAS NEFROESCLEROSE HIPERTENSIVA AGUDA: A nefroesclerose hipertensiva aguda descreve uma forma de CH com níveis pressóricos > 220/10 mmHg associados a lesões vasculares progressivas nos rins e na retina, sendo diagnosticada pela presença de hemorragias, exsudatos ou papiledema no exame de fundo de olho. Mesmo em indivíduos assintomáticos, o prognóstico associado à presença desses achados é ruim, visto que eles podem evoluir para crises hipertensivas mais graves ou insuficiência renal aguda. Quando presentes, as manifestações clínicas mais comuns são alterações encefaopáticas, náuseas e vômitos, enquanto os exames laboratoriais revelam elevação da ureia e creatinina, além de proteinúria, hematúria e cilindrúria. A anemia hemolítica microangiopática pode se instalar em função da degradação de hemácias nos vasos periféricos. O tratamento desse quadro é realizado de modo semelhante à encefalopatia hipertensiva, com uso de anti-hipertensivos parenterais, visando redução de 10 a 15% da PAM durante a 1ª hora. A insuficiência renal pode piorar nos estágios iniciais do tratamento, devido à queda da perfusão renal, porém espera-se que a TFG retorne ao valor basal anterior à crise. FEOCROMOCITOMA: O feocromocitoma é um tumor que provoca a hipersecreção de catecolaminas, podendo induzir hipertensão severa, acompanhada por taquicardia, fadiga e sudorese. Em decorrência do aumento súbito de PA, o desenvolvimento de edema agudo de pulmão ou encefalopatia também são desfechos comuns. O diagnóstico é feito a partir da dosagem de catecolaminas no plasma e na urina, sendo que valores aumentados em mais de 5 vezes definem o quadro. O tratamento da CH por feocromocitoma se dá pelo uso de fentolamina (2 a 5 mg IV a cada 5 minutos, até o controle da PA), um α- bloqueador (pode ser substituído por prazosin VO ou pelo labetalol). O uso de betabloqueadores se modo isolado é contraindicado não somente nessa condição, como também em outras emergências hipertensivas hiperadrenérgicas, pois podem levar a hiperatividade de receptores alfa-1, piorando a crise. Diuréticos também não devem ser administrados indiscriminadamente, visto que podem levar a choque hipovolêmico. ECLÂMPSIA: A pré-eclâmpsia descreve a ocorrência de hipertensão, proteinúria ou lesão de órgãos-alvo em gestantes com IG > 20 semanas. A eclâmpsia, por sua vez, é uma complicação do estado anterior, com presença de convulsões sem causa predisponente. Esse primeiro quadro tem como “ponto de corte” PA > 160/110 mmHg, porém ele é reduzido para 140/90 mmHg em pacientes sintomáticas ou com alteração do nível de consciência. O tratamento deve ser grave e agressivo, com uso de labetalol ou hidralazina. Além disso, recomenda-se a realização do parto com urgência. A prevenção de crises convulsivas, assim como o manejo da eclâmpsia, é realizada por meio do uso de Júlia Figueirêdo – EMERGÊNCIAS sulfato de magnésio 10% intravenoso, em dose de 6 g de solução em 15 a 20 minutos, seguido de infusão contínua de 2 g/hora. OUTRAS ETILOGIAS: Em caso de CH decorrente do uso de cocaína, o tratamento deve ser feito por meio do uso de grandes doses de diazepam venoso e anti-hipertensivos (à exceção dos betabloqueadores). A suspensão da clonidina pode causar síndrome do rebote em decorrência da elevação dos níveis de noradrenalina nas fendas sinápticas, ativando descontroladamente receptores alfa e beta- adrenérgicos.O manejo é feito com a readministração do medicamento, que deve ser substituído prontamente por outra classe após a estabilização do quadro. Algoritmo de intervenções e metas pressóricas conforme a causa das emergências hipertensivas FARMACOLOGIA DOS MEDICAMENTOS USADOS NO MANEJO DAS CRISES HIPERTENSIVOS: ANTI-HIPERTENSIVOS PARENTERAIS: Como descrito anteriormente, medicações intravenosas devem ser utilizadas como primeira escolha nas emergências hipertensivas, visto que apresentam rápido início de ação e potência elevada. Nesse contexto, destacam-se: Nitroprussiato de potássio: apresenta efeito direto vasodilatador arterial e venoso, podendo causar roubo de fluxo coronariano, o que amplia possíveis áreas isquêmicas no miocárdio. Sua meia-vida é de 1 a 2 minutos, o que favorece o controle da velocidade e a reversão da queda da PA. O nitroprussiato deve ser administrado em infusão contínua (0,25 a 10 µg/kg/min), em equipos protegidos da luz (droga fotossensível). Mecanismo de ação do nitroprussiato de sódio sobre células da musculatura lisa dos vasos O seguimento ambulatorial deve ser realizado rapidamente em todo paciente com CH, pois há grande risco de complicações a curto, médio e longo prazo Júlia Figueirêdo – EMERGÊNCIAS O principal efeito adverso associado ao uso desse medicamento é a intoxicação por tiocianato (metabólito de origem hepática), que se manifesta por agitação, fadiga, confusão mental, vômitos e coma. Esse desfecho ocorre mais comumente em tratamentos > 4 dias e em pacientes com doenças renais. Etapas do metabolismo do nitroprussiato de sódio Também pode haver intoxicação por cianeto (produzido nas hemácias) em indivíduos com heatopatias, cursando com acidose metabólica, midríase, arreflexia, convulsões, pele rosada e hálito com odor típico (“amêndoas amargas”). Nitroglicerina: esse nitrato orgânico possui ação vasodilatadora em veias e coronárias, reduzindo áreas de isquemia além de diminuir a pré e pós-carga do coração. Em doses altas, também pode levar à dilatação arterial. Representa a droga de escolha para CH motivadas por IAM e angina instável, sendo administrada em infusão contínua de 5-100 µg/min. Seus efeitos adversos são exemplificados por cefaleia, hipotensão postural, taquicardia e pela formação de metemoglobina, evento raro que cria hemácias ineficazes para o transporte de O2. Observa-se também desenvolvimento de tolerância a seu efeito após 12 a 24 horas de uso da medicação. Enalaprilato: é o princípio ativo do enalapril, um IECA adequado à maioria das emergências hipertensivas, exceto na eclâmpsia, devido a sua ação teratogênica. O início de ação se dá em 15 minutos, ao passo que a duração do efeito anti- hipertensivo se mantém por 6 horas. A dose é de 1,25 a 5 mg, administradas a cada 6 horas. Hidralazina: apresenta-se como um vasodilatador arterial direto cujo efeito é especialmente importante sobre as artérias placentárias, sendo empregado como primeira escolha na eclâmpsia, em dose de 10 a 20 mg a cada 6 horas (ou 10 a 50 mg, 2x/dia, caso seja administrado por via intramuscular). O início de ação se dá em 10 a 30 minutos. Os principais efeitos adversos são palpitações, taquicardia, cefaleia, rubor, congestão nasal e sintomas gastrointestinais. Furosemida: esse diurético de alça com atividade venodilatadora de início rápido é indicado no edema agudo de pulmão ou, em outras causas de EH, como potencializador do efeito de outras medicações, exceto em situações de hipovolemia acentuada e em gestantes. A dose administrada na primeira aplicação é de 20 a 40 mg, ajustando- a conforme a resposta do paciente. A suspensão da droga, associada à administração de nitrito de sódio 3% e tiossulfato de sódio 25% em caso de toxicidade por cianeto (promovem a formação de tiocianato, menos nocivo), são suficientes para conter tais desfechos Júlia Figueirêdo – EMERGÊNCIAS Mecanismo de ação dos diuréticos de alça As reações adversas mais relatadas são desidratação, distúrbios eletrolíticos, elevação de creatinina, triglicérides e colesterol, além de crises de gota. A furosemida pode também provocar aumento da PA devido ao aumento da atividade de catecolaminas e do hiperfuncionamento do SRAA. Nicardipina: pertencente à classe dos bloqueadores de cálcio di- hidropiridínicos, altera a contração da musculatura lia vascular, apresentando eficácia similar ao nitroprussiato de sódio. Deve ser administrado em infusão contínua de 5 a 15 mg/h, havendo manutenção do efeito por 1 a 4 horas após sua suspensão. Destacam-se como efeitos adversos a cefaleia, sensação de fadiga e edema periférico. Labetalol: é um alfa e betabloqueador, apresentando, portanto, efeito cardioinibitória e vasodilatador arterial e venoso. Aplicável a todos os tipos de EH, pode ser o fármaco de escolha na dissecção aórtica aguda e no AVE em pacientes com PAD entre 120 e 140 mmHg. Sua administração se inicia com um bolus de 20 a 80 mg, seguido por infusão contínua de 2 mg/min. ANTI-HIPERTENSIVOS ORAIS: Os anti-hipertensivos orais são utilizados majoritariamente nas urgências hipertensivas, sendo seu emprego nas EH direcionado a quadros estabilizados, sem risco iminente de vida. Independentemente da etiologia, no entanto, recomenda-se o uso de medicamentos de ação rápida (meia-vida curta). Seus principais representantes são: Captopril: é a primeira escolha para o manejo da maioria das urgências hipertensivas, visto que é o IECA que apresenta menor meia-vida, com início de ação em apenas 15 minutos e duração de 4 a 6 horas. A dose recomendada é de 6,25 a 50 mg. O uso do captopril é contraindicado em gestantes. Outra importante vantagem desse medicamento é a capacidade de reajustar a autorregulação do fluxo cerebral, diminuindo a ocorrência de hipoperfusão encefálica. Furosemida (já descrita anteriormente); Clonidina: é um alfa-2- agonista de ação central cujo início de ação se dá em 30 minutos, estendendo-se por até 8 horas. Apesar de sua grande eficácia, pode provocar efeito sedativo, sendo Ressalta-se que todos os possíveis contribuintes para o aumento da PA, como dor, ansiedade, hipoxemia, alterações da volemia e retenção urinária, devem ser corrigidos A nifedipina, apesar de não ser recomendada no manejo primário das CH, pode ser usada em quadros refratários ou em pacientes com insuficiência renal aguda precipitada pelo uso de captopril Júlia Figueirêdo – EMERGÊNCIAS contraindicada na presença de déficit neurológico grave. Sua administração é feita com 0,2 mg, seguida por 0,1 mg a cada hora, não ultrapassando a dose total de 0,8 mg. Propranolol: esse betabloqueador com importante função cardioprotetora também pode ser usado nas UH, com efeito por até 12h após dose de 10 a 40 mg. Fármacos parenterais usados no tratamento das emergências hipertensiva Júlia Figueirêdo – EMERGÊNCIAS
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