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Principais doenças sistêmicas QUE CURSAM COM SÍNDORME NEFRÓTICA NEFROPATIA DIABÉTICA O diabetes mellitus constitui uma das causas mais frequentes de doença glomerular, insuficiência renal crônica e necessidade de terapia de substituição renal (diálise, transplante). Nos Estados Unidos, é a principal causa de diálise e, no Brasil, divide o posto das principais causas de diálise com a hipertensão arterial. Os portadores de diabetes apresentam pior prognóstico do que a maioria dos outros com insuficiência renal dialítica, sendo a mortalidade, em algumas séries, de até 50% em 2 anos. Nesses casos, portanto, deve-se considerar transplante renal ou transplante duplo rim-pâncreas. EPIDEMIOLOGIA a epidemiologia da nefropatia diabética é mais conhecida no diabetes tipo 1 do que no tipo 2, porque, no tipo 1, o início da doença é, em geral, conhecido. Cerca de 20 a 30% dos pacientes irão apresentar microalbuminúria após duração média de 15 anos do diabetes. Menos da metade desses pacientes vai evoluir com nefropatia diabética progressiva. A microalbuminúria pode regredir ou permanecer estável em grande parte dos pacientes, provavelmente devido ao adequado controle glicêmico e da Pressão Arterial (PA). No entanto, após o desenvolvimento de macroalbuminúria (> 300 mg/d), a maioria dos pacientes evolui para doença renal em estágio terminal. Mesmo após o desenvolvimento de macroalbuminúria, os controles glicêmico e da PA rigorosos podem reduzir a velocidade de progressão da nefropatia diabética, embora não sejam mais capazes de preveni-la nesse estágio; o diabetes tipo 1 evolui mais frequentemente para doença renal em estágio terminal que o tipo 2. Entretanto, as unidades de diálise têm mais pacientes portadores desse tipo de diabetes do que do tipo 1, devido à prevalência bem maior de diabetes mellitus tipo 2 (> 90% dos casos) e sua associação a fatores de risco adicionais para o desenvolvimento de doença renal crônica. Segundo estatísticas americanas, 10 anos após o diagnóstico, as prevalências de microalbuminúria, macroalbuminúria e doença renal crônica em portadores de diabetes tipo 2 são de, respectivamente, 25, 5 e 0,8%. Adicionalmente, as taxas de progressão anual do diagnóstico de microalbuminúria, de microalbuminúria para macroalbuminúria e de macroalbuminúria para doença renal crônica são de 2, 2,8 e 2,3%, respectivamente. De modo semelhante ao diabetes tipo 1, pacientes com microalbuminúria, principalmente aqueles com controles glicêmico e pressórico adequados, podem evoluir para regressão. As taxas de progressão da nefropatia diabética diminuíram acentuadamente ao longo das últimas décadas, devido aos cuidados médicos ideais para PA, controle glicêmico, controle de lipídios e uso de agentes que bloqueiam o sistema renina-angiotensina. CLASSIFICAÇÃO É muito importante a detecção precoce da microalbuminúria, pois o uso dos IECAs (Inibidores da Enzima Conversora de Angiotensina) pode retardar a evolução da nefropatia, uma vez que promovem vasodilatação da arteríola eferente, com consequente aumento do fluxo plasmático renal e diminuição da pressão glomerular. Além dos IECAs, outros fatores são importantes na prevenção de lesão renal, como rigoroso controle pressórico e rigoroso controle glicêmico. HISTOLOGIA São 4 as alterações histológicas glomerulares mais frequentes na nefropatia diabética: expansão mesangial, espessamento de MBG, lesão podocitária e esclerose glomerular. O achado histopatológico mais frequente é . Todas as estruturas renais são acometidas: interstício, túbulos, vasos e glomérulos. Uma forma muito típica, apesar de pouco frequente, do acometimento renal do diabetes é a glomeruloesclerose nodular intercapilar, conhecida como nódulos de Kimmelstiel-Wilson. Eles se formam nas regiões periféricas do mesângio e podem ser únicos ou múltiplos. PATOGÊNESE Aparentemente, há processos patogênicos diferentes envolvidos na gênese da nefropatia diabética. A glomeruloesclerose, por exemplo, pode ser resultante da hipertensão intraglomerular induzida pela vasodilatação renal ou da lesão isquêmica induzida pela estenose dos vasos que suprem o glomérulo. o papel da hipertensão glomerular e da hiperfiltração na nefropatia diabética é reforçado pelo benefício proporcionado pelo bloqueio do sistema renina-angiotensina. O antagonismo dos efeitos pró-fibróticos da angiotensina II também parece ser um fator significativo para o efeito protetor induzido por IECAs e ARAs-II (Antagonistas dos Receptores de Angiotensina II); pode induzir diretamente à expansão mesangial e à lesão glomerular, talvez, em parte, por aumento da produção de matriz mesangial ou por glicosilação de proteínas da matriz; ativação de citocinas, agentes pró-fibróticos, inflamação e fator de crescimento endotelial vascular parecem estar envolvidos na deposição de matriz mesangial na nefropatia diabética. FATORES DE RISCO parece ter papel importante tanto na incidência quanto na gravidade da nefropatia diabética, cujo risco de desenvolvimento aumenta significativamente em pacientes com história familiar positiva para a doença; a relação da idade com o início e a progressão da nefropatia diabética é incerta; há correlação entre a hipertensão e o desenvolvimento de nefropatia diabética; metade dos portadores de diabetes mellitus tipo 1 nos primeiros 5 anos apresenta ritmo de filtração glomerular 25 a 50% acima do normal e parece ter risco aumentado para o desenvolvimento de nefropatia diabética. A hiperfiltração glomerular no diabetes tipo 1 é tipicamente associada à hipertrofia glomerular e ao aumento do tamanho renal. A associação entre esses fatores hemodinâmicos e estruturais e o desenvolvimento da nefropatia diabética pode estar relacionada tanto à hipertensão intraglomerular (a qual é secundária à hiperfiltração) quanto à hipertrofia glomerular (que aumenta o estresse das paredes capilares glomerulares). A terapia com o objetivo de reverter essas mudanças, com controle adequado e precoce da glicemia e dos níveis pressóricos, pode retardar a progressão da nefropatia diabética. No diabetes tipo 2, cerca de 45% apresentam aumento do ritmo de filtração glomerular ao diagnóstico, porém o grau de hiperfiltração é menor que no diabetes tipo 1 (de 20 a 40%, em média). Os portadores de diabetes tipo 2 são, em geral, mais velhos do que os com diabetes tipo 1 e têm com maior frequência doença arteriosclerótica associada, o que limita o aumento da filtração glomerular e do tamanho do rim na fase de hiperfiltração da nefropatia diabética. A importância da hipertensão intraglomerular na patogênese da nefropatia diabética pode explicar por que a HAS é um importante fator de risco para o desenvolvimento dessa nefropatia; o risco de nefropatia diabética é maior em pacientes com mau controle glicêmico; a incidência e a gravidade da nefropatia diabética são de 3 a 6 vezes maiores em negros do que em brancos. Ascendência mexicano-americana ou indígena Pima também estão relacionadas; associa-se ao maior risco de doença renal crônica em diabéticos. Entretanto, perda de peso pode reduzir a proteinúria e melhorar a função renal nesses pacientes; 8. Tabagismo: pode aumentar a albuminúria e o risco de doença renal crônica em estágio terminal em diabéticos. Adicionalmente, pode reduzir a sobrevida desses pacientes, após o início da diálise; estão sendo estudados. CORRELAÇÃO ENTRE NEFROPATIA E RETINOPATIA DIABÉTICA Portadores de diabetes tipo 1 associado à nefropatia diabética frequentemente apresentam outros sinais de doença diabética microvascular, como retinopatia e neuropatia diabéticas. A retinopatia é facilmente detectada clinicamente pelo exame de fundo de olho e, tipicamente, precede o surgimento da nefropatia. No entanto, o pacientepode apresentar retinopatia avançada e não apresentar nefropatia diabética. Com base na frequente associação entre retinopatia e nefropatia diabéticas, sugere-se que a causa da doença renal crônica seja atribuída ao diabetes na maior parte dos pacientes que apresentam tanto microalbuminúria quanto retinopatia diabética. Porém, devem ser consideradas outras causas de doença renal crônica em pacientes nos quais a retinopatia diabética esteja ausente. TRATAMENTO DA NEFROPATIA DIABÉTICA As medidas terapêuticas com maior eficácia na prevenção e na desaceleração da progressão da nefropatia diabética são o adequado controle glicêmico e da PA, com ênfase para o uso de IECA e ARA-II. O controle glicêmico adequado pode reverter parcialmente a hipertrofia e a hiperfiltração glomerulares, que são fatores de risco importantes para o desenvolvimento da nefropatia diabética. Adicionalmente, o controle glicêmico é capaz de reduzir o desenvolvimento e a progressão da nefropatia diabética, além de estabilizar ou reduzir a proteinúria em pacientes com macroalbuminúria. O uso de IECA ou ARA-II como parte da terapêutica anti-hipertensiva em diabéticos não só reduz a proteinúria, mas também diminui a taxa de progressão da doença renal crônica, mesmo na ausência de controle glicêmico adequado. Todavia, o controle pressórico rigoroso é mais importante para a prevenção e a redução da taxa de progressão da nefropatia diabética do que o uso isolado de IECA ou ARA-II. Portanto, na maior parte dos casos, é necessária associação a outros anti-hipertensivos a fim de manter adequado controle pressórico. Resumindo, a PA de diabéticos deve ser mantida abaixo de 130 x 80 mmHg ou de 120 x 75 mmHg se a proteinúria for > 1 g/24 horas, e os agentes de escolha inicial são IECAs ou ARAs. Quando é necessária a associação a outros agentes para controle pressórico adequado, podem-se associar antagonistas dos canais de cálcio, como o verapamil ou o diltiazem, que apresentam efeito protetor adicional contra progressão da nefropatia diabética. O bloqueio duplo do sistema renina- angiotensina com IECA associado a ARA-II não está indicado no momento, pois nenhum estudo demonstrou benefício em longo prazo dessa associação na preservação da função renal e há aumento de efeitos adversos. Duas complicações potenciais da terapia com inibidores da IECA ou BRA em pacientes com doença renal crônica são a queda inicial na TFG e o desenvolvimento de hipercalemia. Uma queda inicial na TFG resultando em elevação na creatinina sérica é devido à redução associada na pressão capilar glomerular. O aumento da creatinina sérica acontece tipicamente cedo, durante o ajuste da dose. Aumentos agudos tardios da creatinina sérica (em oposição aos aumentos graduais devido à progressão da doença) podem ocorrer se os diuréticos forem iniciados ou se a dose for aumentada ou, ainda, se algum outro insulto renal for sobreposto, como o uso de AINH. Uma elevação na creatinina sérica de 30 até 35% acima da linha basal que se estabiliza nos primeiros 2 a 4 meses de terapia é considerada aceitável e não é uma razão para descontinuar a terapia com essas drogas. Já a hipercalemia devido à remoção do estímulo mediado pela angiotensina II para a liberação de aldosterona é mais provável de ocorrer em pacientes nos quais a concentração plasmática de potássio é elevada. Pacientes com nefropatia manifestada com macroalbuminúria devem ser tratados com IECAs ou ARAs, mesmo se os níveis pressóricos estiverem abaixo do alvo de 130 x 80 mmHg. A proteinúria deve ser reduzida para menos de 0,5 a 1 g/d, ou, se esse alvo não for possível, para menos de 60% da proteinúria basal. O tratamento da dislipidemia parece ser capaz de retardar a progressão da nefropatia diabética. O tratamento da nefropatia diabética é feito com base nos controles glicêmico, pressórico e de proteinúria (uso de inibidores da enzima conversora de angiotensina e antagonistas dos receptores de angiotensina II), além do controle lipídico. O papel da restrição proteica dietética é incerto em diabéticos, particularmente em vista de problemas com a complacência em pacientes que já estão sendo tratados com restrição de carboidratos e gordura simples. Além disso, é incerto se uma dieta pobre em proteínas é significativamente aditiva a outras medidas destinadas a preservar a função renal, tais como IECAs e controle agressivo da PA e glicemia AMILOIDOSE Amiloidose é o termo geral usado para se referir à deposição tecidual extracelular de fibrilas compostas de subunidades de baixo peso molecular de uma variedade de proteínas, muitas das quais circulam como constituintes do plasma. Esses depósitos podem resultar em uma ampla gama de manifestações clínicas, dependendo de seu tipo, localização e quantidade de deposição. O amiloide é composto por esses precursores e por glicosaminoglicanos, proteoglicanos e amyloid P component (SAP). No rim, nota-se depósito em matriz mesangial, membrana basal e até mesmo em vasos. Com a progressão da doença, o glomérulo assume aspecto lobulado, evoluindo para esclerose. A coloração de vermelho-congo permite a confirmação diagnóstica, diferenciando a amiloidose renal de outras doenças de depósito. As doenças por amiloide são classificadas de acordo com a composição bioquímica das proteínas precursoras séricas, que formam as fibrilas de amiloide e depósitos. As fibrilas amiloides são identificadas tanto por sua aparência característica à microscopia eletrônica quanto por sua capacidade de se ligar ao vermelho-congo na microscopia por luz polarizada. As formas mais comuns de amiloidose são AL (primária) e AA (secundária). Outras formas importantes vistas clinicamente incluem amiloidose relacionada à diálise, amiloidose hereditária, amiloidose sistêmica relacionada à idade e amiloidose órgão-específica. A biópsia de tecido deve ser usada para confirmar o diagnóstico em todos os casos de amiloidose, embora o diagnóstico possa ser suspeitado com base na história e nas manifestações clínicas. A imunofluorescência pode confirmar a presença de cadeia leve (em casos de amiloidose AL), assim como a natureza imuno�histoquímica do amiloide. Figura 15.1 - Depósitos de amiloides invadindo a membrana basal glomerular. Em razão da deposição de proteínas derivadas de fragmentos de cadeia leve de imunoglobulina, a amiloidose AL é uma discrasia plasmática na qual uma imunoglobulina monoclonal é detectável no soro ou na urina da maior parte dos casos. Usualmente, afeta indivíduos com mais de 40 anos, é mais frequente em homens (65%) e os sintomas e sinais são frequentemente inespecíficos, como fraqueza, fadiga e perda ponderal. As principais repercussões clínicas, que alertam para o diagnóstico, comprometem rins, pulmões e coração, e são reconhecidas tardiamente, por isso apresentam pior evolução. A gravidade está relacionada ao aumento dos órgãos secundários ao depósito de amiloide. Nos rins, a proteinúria, por vezes nefrótica, é encontrada em 1 terço dos pacientes e frequentemente leva à insuficiência renal. Em aproximadamente 1 quarto dos casos, identificam-se insuficiência cardíaca congestiva, miocardiopatia restritiva, baixa voltagem ao eletrocardiograma e hipersensibilidade digitálica, responsáveis por 50% dos óbitos nessa forma de amiloidose. Um sinal fácil de observação e que apresenta um importante valor preditivo na doença é a presença de macroglossia; ocorre na amiloidose AL, não estando presente nos outros tipos de amiloidose. Pode ocorrer de forma isolada ou associada ao mieloma múltiplo ou, mais raramente, à macroglobulinemia de Waldenström. A amiloidose AA pode complicar diversas doenças crônicas, nas quais há inflamação persistente ou recorrente, como artrite reumatoide e infecções crônicas. As fibrilas amiloides são constituídaspor fragmentos de amiloide A sérico, que é reator de fase aguda. A forma reativa a processos inflamatórios crônicos tem sido relacionada principalmente às doenças reumatológicas, particularmente a artrite reumatoide (do adulto e juvenil), a espondilite anquilosante, a síndrome de Reiter e a artrite psoriática. O envolvimento renal geralmente se manifesta como proteinúria assintomática ou síndrome nefrótica. A microscopia óptica da amiloidose renal revela deposição difusa glomerular de material amorfo hialino, inicialmente no mesângio e, depois, nas alças capilares. A microscopia com luz polarizada mostra birrefringência esverdeada nas amostras teciduais coradas pelo vermelho-congo. Devido ao depósito renal de material amiloide, os rins costumam cursar com tamanho normal ou aumentado na amiloidose, mesmo nos casos de insuficiência renal crônica avançada. Clinicamente, a doença pode ser exclusivamente renal ou, mais comumente, vir acometida por outros sistemas. Assim, a amiloidose pode gerar insuficiência cardíaca, neuropatia periférica e autonômica (é bastante característica a hipotensão postural), perda ponderal, macroglossia, alterações dermatológicas, púrpura, hepatoesplenomegalia, linfadenopatia, anemia, hipotireoidismo, degeneração articular e miopatia. Além de síndrome nefrótica, a doença pode manifestar-se apenas como proteinúria não nefrótica, acompanhada de perda variável de função renal. A suspeita diagnóstica é levantada quando o paciente apresenta proteinúria, que pode variar de subnefrótica a mais de 20 g/d. Muitos exibem os aspectos típicos da síndrome nefrótica com ou sem disfunção renal. Os pacientes também podem ter síndrome de Fanconi ou diabetes insipidus nefrogênico atribuível aos depósitos tubulares de fibrilas amiloides. Os rins, infiltrados por proteínas amiloides, muitas vezes são de tamanho aumentado ao serem vistos no exame de ultrassonografia. A amiloidose renal pode ser a forma de manifestação da doença amiloide ou ocorrer em pacientes com evidências clínicas de deposição amiloide em outros órgãos. Utilizando um ensaio específico e sensível, é possível detectar níveis séricos elevados de cadeias leves kappa ou lambda. O prognóstico renal é reservado, e a mortalidade chega a 40% em 3 anos. O quadro clínico da amiloidose é composto de acometimento renal exclusivo (síndrome nefrótica) ou associado a: insuficiência cardíaca, neuropatia periférica, perda ponderal, macroglossia, hepatoesplenomegalia, anemia, hipotireoidismo e miopatia. A meta da terapia da amiloidose AL consiste em erradicar o clone de plasmócitos produtores de cadeia leve amiloidogênica, por meio da utilização de altas doses de agentes quimioterápicos e transplante autólogo da medula óssea. O tratamento deve ser realizado em um centro especializado, por uma equipe multidisciplinar de nefrologistas, oncologistas e cardiologistas. Os regimes menos tóxicos, como a combinação de melfalana a altas doses de dexametasona, bortezomibe ou lenalidomida, são utilizados em casos de doença cardíaca severa, que não apresentam boa tolerância ao transplante de células-tronco. A abordagem da amiloidose AA consiste em erradicar a fonte de inflamação crônica, sempre que possível.
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