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Júlia Figueirêdo – PINESC VIII INFECÇÕES DE PARTES MOLES: SÍNDROME DA PELE ESCALDADA: A síndrome da pele escaldada descreve o descolamento epidérmico mediado por toxinas estafilocócicas (geralmente S. aureus). Observa-se que neonatos e crianças < 6 anos são mais vulneráveis a esse tipo de condição. O acometimento de indivíduos mais velhos é quase sempre limitado a imunossuprimidos e a portadores de insuficiência renal. O quadro se inicia com o aparecimento de uma lesão crostosas, seja no coto umbilical, região das fraldas ou face. Depois de 24h, a pele adjacente torna-se dolorosa e avermelhada, padrão que se dissemina rapidamente a outras áreas. A pele também se torna enrugada, com presença de bolhas flácidas e sensíveis, especialmente em áreas de atrito. O surgimento de erosões é comum, porém não há inflamação. Lactente com síndrome estafilocócicas da pele escaldada (evidente em região genital, coxas e antebraços) O pico de descamação se dá em 36 a 72 horas, após o qual também há desenvolvimento de sintomas sistêmicos (febre, calafrios) e queda do estado geral. A sepse e o desequilíbrio hidroeletrolítico são complicações associadas à essa síndrome, resultantes da ruptura da barreira protetora cutânea. O diagnóstico é produto da associação de sinais clínicos sugestivos e da realização de biópsia da área afetada. A cultura microbiana pode ser um importante artifício para a detecção do foco infeccioso primário. Ressalta-se que não deve ser coletado material das olha, pois seu líquido é estéril. Dentre os diagnósticos diferenciais a serem considerados estão os exantemas virais, reações de hipersensibilidade medicamentosa, queimaduras térmicas, escarlatina e a necrólise epidérmica tóxica (NET). Principais diferenças entre a síndrome estafilocócicas da pele escaldada e a NET Após a confirmação do quadro, o tratamento é iniciado por meio do uso de antibióticos antiestafilocócicos IV penicilinase- rsistentes, à exemplo da oxacilina e cefalosporinas. Com a melhora das lesões, esses fármacos passam a ser administrados por via oral. O uso de corticoides é contraindicado no controle dessa síndrome. Ao exame físico, há sinal de Nikolsky positivo (deslizamento lateral do conteúdo da bolha após leve tração) O alvo dessa toxina é a desmogleína 1, que estabelece a coesão dos desmossomos Júlia Figueirêdo – PINESC VIII Com o manejo adequado, a cura do quadro se dá em até 5-7 dias, período necessário para regeneração epidérmica. O uso de emolientes pode auxiliar a reduzir a perda de água em áreas ulceradas, porém recomenda-se manusear o paciente com a menor frequência possível. Caso ocorra disseminação das lesões, o tratamento passa a seguir os mesmos passos recomendados ao manejo de queimaduras, inclusive incluindo o uso de polímeros hidrolisados em gel para potencializar a recuperação da pele, sem muitas trocas de curativo. IMPETIGO BOLHOSO: O impetigo bolhoso é uma infecção bacteriana superficial causada principalmente pelo Staphylococcus aureus e o Streptococcus beta-hemolítico do grupo A. As crianças são a principal população afetada, A inoculação desses microrganismos é mediada por pequenas quebras da barreira cutânea, como picadas de insetos e escoriações. As manifestações típicas são o aparecimento de vesículas agrupadas que rapidamente se alargam, formando bolhas serosas flácidas que, quando se rompem, dão origem a lesões crostosas amarelo- acastanhadas. Bolhas friáveis comuns no impetigo bolhoso O diagnóstico é clínico, baseado nos achados supracitados, porém, em alguns casos, a bacterioscopia e a cultura podem ser empregadas para elucidar o agente etiológico. No que se refere ao tratamento, duas abordagens distintas podem ser adotadas, a saber: Manejo tópico: conta com a limpeza da pele com água e sabão para retirada das crostas, realizada de 2 a 3 vezes por dia, e com antimicrobianos tópicos, como neomicina, mupirocina e ácido fusídico, usados logo após a higiene local; Abordagem sistêmica: é indicada na presença de lesões disseminadas e alterações do estado geral, utilizando diversos antimicrobianos, como penicilina benzatina (1.200.000 UI em adultos), eritromicina e cefalexina (ambas 250 a 500 mg, 6/6h por 7 dias). FOLICULITE: A foliculite é uma lesão úmida de pele que se inicia no folículo piloso, inicialmente como pústulas que não interferem com o crescimento de pelos. Esse quadro acomete o couro cabeludo, pescoço, tronco e, mais raramente, as nádegas, podendo ser agudo ou crônico. Os principais fatores de risco associados são má higiene, exposição a umidade, roupas justas, O impetigo não bolhoso é marcado por pápulas eritematosas que evoluem para vesículas propensas a ruptura, acometendo a face e as extremidades Na suspeita de infecção estafilocócica, recomenda-se o uso de cefalexina, uma vez que há resistência bacteriana aos demais medicamentos sistêmicos citados Júlia Figueirêdo – PINESC VIII imunossupressão, uso de corticoides tópicos e antibioticoterapia sistêmica. Lesões pustulosas em paciente com foliculite (não há comprometimento do crescimento dos pelos) Ainda que vários outros patógenos, inclusive não bacterianos, possam favorecer o desenvolvimento de foliculite, o mais comum é o Staphylococcus sp. coagulase positivo. O período de incubação é variável, geralmente de quatro a dez dias, ao passo que a transmissibilidade (incomum de pessoa a pessoa) se mantém enquanto houver lesão. O diagnóstico é clínico, porém a bacterioscopia pode ser indicada a pacientes refratários ao tratamento. As complicações mais frequentes são celulite, erisipela e alterações pigmentares, especialmente em pacientes com pele retinta. O manejo do quadro é realizado com antimicrobianos em pomada, à exemplo de neomicina, mupirocina e gentamicina, ou antibióticos sistêmicos, como eritromicina (40 mg/kg/dia, a cada 6h), tetraciclina (2 g/dia) e cefalexina (30 a 50 mg/kg/dia de 6/6h). As principais medidas profiláticas para a foliculite são a higiene com sabonetes antibacterianos, o não compartilhamento de objetos de uso pessoal e o uso de roupas folgadas. FLEBITE: A flebite é definida como a inflamação dos vasos, associada a dor, edema, calor local e eritema, podendo levar à formação de um cordão fibroso na área. Quando infecciosa, essa condição ainda é acompanhada por secreção purulenta. Principais sinais e sintomas observados no quadro de flebite O quadro inflamatório pode ser classificado conforme sua etiologia, a saber: Mecânica: consiste em traumas no interior da veia causados por problemas como punção inadequada, deslocamento do catéter ou uso de dispositivos de calibre excessivo; Química: relaciona-se à infusão de medicações irritantes ou vesicantes, podendo ser observada também em administração rápida de determinado fármaco; Quando a foliculite acomete os cílios e as glândulas de Meibomius, o quadro é denominado hordéolo, marcado por edema palpebral intenso. A sicose da barba, por sua vez, descreve pústulas foliculares centrada no pelo Júlia Figueirêdo – PINESC VIII Infecciosa: associada a contaminação bacteriana, normalmente causada por técnicas de punção não-assépticas; Pós-infusão: pode ocorrer em 48 a 96 horas depois da retirada do catéter, sendo resultado de reações ao material do dispositivo e a seu tempo de permanência no vaso. Ressalta-se também que existe outra estratificação para quadros de flebite, desta vez associada aos aspectos clínicos típicos descritos acima. Classificação dos tipos de flebite de acordo com parâmetros clínicos O diagnóstico é feito por meio de achadosclínicos coletados durante o exame e a anamnese, porém a ultrassonografia também pode ser de grande utilidade ao detectar coágulos que restringem o fluxo sanguíneo local, indícios de tromboflebite. O manejo desses pacientes requer elevação do membro afetado, o uso de meias de compressão e administração de analgésicos para o controle da dor, como AINES (se há baixo risco de TEV). Pacientes com maior propensão ao desenvolvimento de fenômenos tromboembólicos devem fazer uso de anticoagulantes (HBPM ou HNF) por 45 dias. ABSCESSO: Um abscesso é definido como uma coleção confinada de pus, apresentando como principal causa infecções bacterianas (comumente por S. aureus). Ressalta-se que a penetração do patógeno no tecido afetado pode ser por implantação direta (trauma) ou por disseminação bacteriana, contígua ou distante. Como fatores predisponentes para essa condição, destacam-se a presença de corpos estranhos, obstrução de vias de drenagem, isquemia ou necrose, hematomas e quadros de imunossupressão. Os sinais e sintomas observados nos abscessos cutâneos e subcutâneos são dor, calor, edema, sensibilidade e hiperemia. Pode ocorrer também febre, especialmente quando o quadro é uma complicação da celulite. Nos abscessos profundos, além dos sinais flogísticos, há típico comprometimento sistêmico, com perda de peso, fadiga e anorexia. Abcesso extenso com hiperemia circundante e ponto de flutuação central (área esbranquiçada) O diagnóstico dessas manifestações é feito por meio do exame físico do local Como principais complicações, destacam- se a disseminação bacteriana para tecidos adjacentes, sangramentos, déficit funcional de órgãos e inanição Júlia Figueirêdo – PINESC VIII acometido, sendo que em formas profundas, torna-se necessário o uso de exames de imagem, como ultrassonografia (útil na investigação de partes moles), tomografia (maior acurácia) e ressonância magnética (mais sensível). O tratamento de abscessos cutâneos pequenos geralmente precisa apenas de drenagem, com remoção de toda a secreção e tecido necrótico. Em formações > 5 cm, por outro lado, pode ser necessária a colocação de drenos ou a sutura da lesão como forma de prevenir recidivas. O uso adjuvante de antimicrobianos sistêmicos pode ser indicado em abscessos grandes, profundos ou múltiplos, ou na presença de celulite importante ao redor da lesão. ERISIPELA: A erisipela é um quadro de celulite superficial dos membros inferiores frequentemente associado à população idosa. Seu principal agente etiológico é o Streptococcus beta-hemolítico do grupo A, que penetra a pele por meio de pequenos traumas ou micoses interdigitais. Como fatores predisponentes para o surgimento desse quadro, consideram-se a linfangite crônica, a insuficiência venosa, obesidade, diabetes, tabagismo, etilismo e hipertensão. O diagnóstico é clínico, baseado na identificação de lesões com instalação rápida e posterior evolução com eritema e edema bem definidos, além de dor e calor local. A pele afetada tem aspecto de casca de laranja, e o comprometimento linfático não é incomum. Para a erisipela, a biópsia da lesão somente identifica o agente etiológico em < 30% dos casos. Lesão típica de acometimento por erisipela A conduta terapêutica consiste no uso de antibióticos orais (ou intramusculares) e, se necessário, analgésicos. Ressalta-se, no entanto, que na presença de queda do estado geral ou de comorbidades graves, pode ser indicada hospitalização. Os principais medicamentos utilizados são: Penicilina G procaína (400.000U IM, 12/12h, por 10 dias); Penicilina benzatina (1.200.000U IM); Eritromicina (250 a 500 mg, 6/6h, por 10 dias); Cefalexina (250 a 500 mg, 6/6h, por 7 dias). Os pacientes ainda devem ser orientados a realizar repouso com elevação dos membros, além de tratar comorbidades e tratar áreas de maceração interdigitais, para prevenir recorrências. CELULITE: A celulite é um tipo de infecção de pele infiltrativa, se estendendo até o tecido subcutâneo, que é causada predominantemente por estafilococos e pelo Streptococcus pyogenes. São mais propensos a desenvolver essa condição indivíduos A cefalexina deve ser preferida na suspeita de infecção estafilocócicas, pois essa bactéria é resistente às penicilinas e eritromicina Júlia Figueirêdo – PINESC VIII imunossuprimidos, obesos, portadores de insuficiência venosa/arterial, que tenham sofrido trauma local ou outras dermatites de repetição. O quadro clínico é caracterizado pela presença de dor, hiperemia, edema e calor local, sendo que não há distinção entre a pele saudável e a afetada (limites mal definidos). Em casos de maior gravidade, há linfangite e linfonodomegalia associadas. Quando há disseminação da infecção, sinais sistêmicos de sepse (febre, leucocitose, confusão mental) podem estar presentes. Celulite infecciosa com área de bolhas e foco necrótico A infecção pode dar origem a abscessos dérmicos/subdérmico ou fasciíte necrotizante, além de linfadenopatia regional no acometimento de extremidades. O diagnóstico é clínico, porém é preciso diferenciar o quadro de celulite, que tem margens mal definidas, da erisipela, que apresenta limites bem delimitados. A realização de exames complementares (biópsia, hemocultura) normalmente não traz benefícios em infecções leves, porém são de grande ajuda na presença de alterações sistêmicas. Principais diagnósticos diferenciais para a celulite O tratamento da celulite é realizado pela associação de medidas não farmacológicas, como repouso e elevação do segmento afetado (drenar o edema) e hidratação do local, com antibioticoterapia (depende da presença ou não de pus). Opções para a terapia farmacológica em pacientes com celulite Espera-se melhora do quadro em até 48 horas do início do antibiótico. Caso ocorra aumento da extensão do edema ou piora sistêmica, é importante considerar a possibilidade de resistência bacteriana ou de outro diagnóstico. As áreas mais acometidas são os membros inferiores e a face, na qual há edema importante, especialmente próximo aos olhos. Bolhas e equimoses são achados comuns Júlia Figueirêdo – PINESC VIII Fluxograma diagnóstico e terapêutico para a celulite e erisipela ECTIMA GANGRENOSO: O ectima gangrenoso é uma infecção bacteriana comum em ambientes quentes, causada por Staphylococcus aureus ou estreptococcus beta-hemolíticos do grupo A, acometendo preferencialmente os membros inferiores. Há transmissão interpessoal enquanto as lesões estiverem ativas, com período de incubação de cerca de 4 a 10 dias. A primeira lesão é uma vesícula (ou pústula) que evolui para ulceração superficial recoberta por uma crosta seca e aderente. A resolução tende a levar semanas ou meses, podendo ou não haver formação de cicatriz. Lesões circunscritas ulceradas no extima O diagnóstico é clinico-epidemiológico, realizado após o descarte de hipóteses como úlceras de perna, leishmaniose tegumentar e herpes simples. A principal complicação associada ao ectima é a sepse. Para o tratamento, recomenda-se a remoção de crostas e limpeza da ferida de 2 a 3 vezes por dia, com uso de água e sabão, permanganato de potássio (1:40.000) ou água boricada a 2%. Esse processo deve ser seguido pela aplicação de antibióticos tópicos, como neomicina, mupirocina e gentamicina. Caso seja necessário o uso de antimicrobianos sistêmicos, as principais escolhas são a eritromicina (30 a 50 mg/kg/dia divididas em 4 administrações), cefalexina (mesma posologia do fármaco anterior) e a penicilina benzatina (1.200.000U IM). PIODERMA GANGRENOSO: O pioderma gangrenoso é uma formarara de dermatose neutrofílica, que tem curso crônico e, por vezes, recorrente. A etiologia é ainda desconhecida, porém observam-se associações com a doença inflamatória intestinal, neoplasias, artrite e doenças hematológicas. Apesar de poder se manifestar em todos os grupos etários, há maior incidência em adultos (25 a 54 anos), com predominância em mulheres. A apresentação inicial pode tanto ser um nódulo doloroso profundo quanto uma pústula superficial hemorrágica, por vezes secundária a traumas cutâneos. Em seguida, surge uma lesão inflamatória ulcerada com margens irregulares e elevadas, com coloração vermelho-escura e uma base necrótica granular, repleta de pequenos abscessos. Há presença de exsudato hemorrágico e purulento no interior Júlia Figueirêdo – PINESC VIII da lesão, e se crescimento assume padrão serpiginoso em função do aparecimento de novas pústulas. Lesão ulcerada em MI afetado por pioderma gangrenoso (presença de exsudato e bordas necróticas) As úlceras, de caráter solitário, podem se restringir a porção superficial da pele, mas, no geral, tendem a se disseminar para o panículo adiposo e a fáscia muscular subjacentes. Os locais mais afetados são os membros inferiores, náfegas e o abdome. Normalmente as mucosas são poupadas, porém alguns quadros podem contar com envolvimento macio da cavidade oral, além de laringe e faringe. No que se refere às formas clinicas e histopatológicas, o pioderma gangrenoso pode ser dividido em quatro grupos, a saber: Forma vegetativa (pioderma granulomatoso superficial): mais localizada e não agressiva, cursa com lesões verrucosas superficiais de base não purulenta. Há predileção pelo tronco, cabeça e pescoço; Lesão típica do pioderma gangrenoso vegetativo Forma bolhosa: frequentemente associada à leucemia, apresenta início agudo, com pápulas, pústulas e lesões bolhosas hemorrágicas de pouca profundidade. Pode ser confundida com picadas de aranha; Pioderma gangrenoso em forma bolhosa no membro inferior Forma ulcerativa: surge como uma pústula com halo inflamatório doloroso, mas evolui rapidamente, deixando uma cicatriz atrófica (pele em “papel de fumo”) após a resolução; Forma pulstular: mais rara, é relacionada a quadros alérgicos ou autoimunes. As pústulas podem ou não ulcerar, e acometem principalmente a face extensora dos membros. A evolução clínica do pioderma gangrenoso pode apresentar dois padrões distintos, com início súbito e “explosivo” de lesões e sintomas sistêmicos, e manifestações lentas e indolentes, com regressão espontânea O pioderma maligno é uma variante mais agressiva e letal do pioderma ulcerativo, ocorrendo em associação a vasculites sistêmicas, especialmente na cabeça e pescoço Júlia Figueirêdo – PINESC VIII Face extensora do membro superior em quadro de pioderma gangrenoso pulstular O diagnóstico do pioderma é exclusivamente clínico, por meio da identificação de sinais sugestivos, como a dor e rápida progressão das úlceras. O exame histológico pós-biópsia pode detectar a presença de neutrofilia estéril e quadros de vasculite, excluindo outras etiologias. Dentre os exames laboratoriais, não há achados específicos, ainda que o aumento da velocidade de hemossedimentação, PCR elevada e a leucocitose sejam comumente observados nesses pacientes. O manejo dessa condição tem como principais objetivos minimizar a destruição de tecidos e favorecer a cura das lesões, idealmente com bom resultado estético. A limpeza simples e os curativos assépticos são sempre indicados, e medicamentos como corticoides (tópicos, intralesionais) e antimicrobianos (clofazimina e ciclosporinas) devem ser considerados. Observa-se, no entanto, que o debridamento cirúrgico e o uso de enxerto de pele devem ser evitados, sob o risco de provocar reações de hipersensibilidade. Os corticoides sistêmicos (prednisona, prednisolona), no entanto, se mostram como o método mais efetivo para o controle do pioderma, geralmente com doses altas. Em pacientes refratários a medicamentos sistêmicos, a oxigenoterapia hiperbárica pode ser uma boa alternativa. Abordagens cirúrgicas (colectomia) também devem ser apresentadas como possível opção terapêutica no pioderma gangrenoso secundário à doença inflamatória intestinal naqueles pacientes que não respondem ao uso de corticoides, porém há risco de permanência das lesões mesmo após o procedimento. ÚLCERAS VARICOSAS: A insuficiência venosa crônica (IVC) é a causa de úlceras de perna mais comum no adulto, com incidência proporcional ao aumento da idade do paciente. Como principais fatores de risco associados, destacam-se obesidade, TVP, flebite ou fraturas do membro inferior. As úlceras venosas são encontradas principalmente no maléolo medial, região suprida por veias comunicantes incompetentes, porém também podem afetar toda a circunferência da perna. São dolorosas e apresentam limites bem demarcados, com borda em declive e formato irregular. Sua base é coberta por fibrina e exsudato amarelado, revelando colonização secundária por bactérias. O pulso arterial do membro acometido é normal, com exceção de casos nos quais há presença simultânea de lesões arteriais e venosas. Júlia Figueirêdo – PINESC VIII Úlcera venosa em maléolo medial, destacando sua base granulosa Outros achados clínicos sugestivos de úlcera por IVC são: Telangiectasia em pés e tornozelos; Edema periférico; Veias varicosas; Classificação CEAP (clínica, etiologia, anatomia, fisiopatologia) para varizes Dermatite ocre (coloração amarronzada da pele em função do depósito de hemossiderina em macrófagos); Dermatite de estase (eritema resultante do “represamento” local de sangue). Úlcera venosa extensa acompanhada por dermatite de estase, dermatite ocre e telangiectasia O diagnóstico dessa condição é clínico, porém sua confirmação pode ser feita por dois exames complementares, a saber: Índice Tornozelo-Braquial (ITB): consiste na aferição comparada da pressão sistólica entre os membros superior e inferior, importante para a identificação de etiologias arteriais (ITB < 0,9); Pacientes diabéticos ou que apresentem ITB > 1,2 (calcificação) devem realizar análise do índice hálux-braquial. Parâmetros e interpretações do índice tornozelo- braquial Mapeamento com Doppler venoso: é o exame de escolha para investigação de vasos superficiais, profundos e perfurantes, possibilitando sua avaliação funcional (presença de obstruções e/ou refluxo). A realização de procedimentos mais invasivos, como flebografia ou angiotomografia venosa, é indicada em casos específicos nos quais o mapeamento com USG é inconclusivo. O tratamento dessas lesões contempla medidas para cessar ou diminuir os efeitos da hipertensão venosa, além do controle da evolução da úlcera. As estratégias mais usadas são: Terapias compressivas: primeira linha terapêutica, baseiam-se na aplicação de Júlia Figueirêdo – PINESC VIII pressão externa ao membro, o que estimula o retorno venoso, especialmente ao deambular. Os métodos mais usados são as bandagens compressivas (bota de Unna) e as meias elásticas de alta compressão, estas últimas em caso de lesões pequenas. Mesmo após a cicatrização da ferida, recomenda-se o uso de meias menos compressivas para prevenção de recidivas. Aplicação da bota de Unna para o manejo de úlceras venosas Limpeza e debridamento da lesão; Correção cirúrgica de anomalias venosas; Medicamentos sistêmicos: o uso de diosmina (reduz a dilatação do vaso) e pentoxifilina (hemorreológico, diminui a viscosidade sanguínea) é visto como adjuvante terapêutico; Repouso e elevação do membro afetado. Critérios para o diagnóstico diferencial entre as principais causas de úlceras de perna SÍNDROME DE FOURNIER: A síndrome (ou gangrena) de Fournier é uma infecção polimicrobiana causada pela ação sinérgica de organismos aeróbios e anaeróbios, produzindo quadro de fasciíte necrotizante em área perineal, genital e perianal. A necrose tecidual associada resulta de trombose dos vasos cutâneos e subcutâneos. Principais etiologias por local de ocorrência da gangrena de Fournier As manifestações clínicas mais comuns são dor, eritema, edema e necrose dos tecidos perineais ou perianais, associadas a sintomas sistêmicos, como febre e calafrios. Observa-se também que o quadro pode ser insidioso ou já iniciar sob a forma de sepse. Observa-se maior predisposição para o desenvolvimento dessa condição em diabéticos, etilistas e imunossuprimidos, podendo inclusive ser um dos primeiros sintomas na infecção por HIV Júlia Figueirêdo – PINESC VIII Outros achados comuns são a secreção com odor fétido repulsivo, cianose e crepitações nas áreas afetadas. Quadro extenso de gangrena de Fournier, com acometimento da região abdominal O diagnóstico, estabelecido pela detecção dos sintomas descritos anteriormente, também pode ser amparado pela tomografia, que auxilia a detectar o foco e a extensão do processo infeccioso. Os diagnósticos diferenciais que devem ser considerados são celulite, abcesso escrotal, pioderma gangrenoso e hérnias estranguladas. O tratamento intensivo precoce é essencial para a sobrevivência do paciente, pois a gangrena de Fournier pode causar falência de órgãos e sistemas, culminando em morte quando não tratada. Assim, a estratégia clássica de abordagem conta com a correção de distúrbios metabólicos e hemodinâmicos, antibioticoterapia de largo espectro e desbridamento da área comprometida. O objetivo da intervenção cirúrgica é a revitalização do tecido lesado, removendo áreas de necrose para facilitar a cicatrização. Sistemicamente, isso é refletido pelo controle da progressão do quadro e por menor incidência de apresentações sistêmicas. Destaca-se que em alguns casos, outros procedimentos devem ser realizados após a limpeza do local, como a colostomia (reduz contaminação fecal) e a sondagem vesical ou cistostomia, se há risco de extravasamento urinário sobre a ferida. PÉ DIABÉTICO: O pé diabético é definido pela OMS como um grupo de síndromes decorrentes de lesões associadas a neuropatia, isquemia ou infecções abaixo do maléolo, potencialmente evoluindo para gangrena diabética e amputação. Algumas das condições comumente encontradas em pacientes acometidos são artropatia de Charcot, doença arterial periférica e osteomielite. Os fatores de risco relacionados a essa complicação são a presença de deformidades nos pés, quebra na integridade da pele (feridas ou fissuras), calosidades, descoloração, redução do pulso tibial e uso de calçados inadequados. Apesar de o acometimento cutâneo ser a apresentação mais chamativa dessa síndrome, é necessário lembrar que há rápida disseminação da infecção para planos profundos, justificando a necessidade de intervenções imediatas Júlia Figueirêdo – PINESC VIII Características do pé de Charcot, comum em pacientes diabéticos A investigação diagnóstica deve ser baseada na coleta de história clínica detalhada, na determinação do índice tornozelo-braquial e no exame físico dos pés, realizado de modo rotineiro para identificação do “pé de risco”. Esse grupo requer reavaliação intensiva, com intervalo de 1 a 6 meses. Durante a inspeção, é necessário avaliar a presença de deformidades, sinais de perda de sensibilidade, padrão de deambulação, sinais de hemorragia subcutânea e fissuras plantares. Na palpação, é importante aferir os pulsos periféricos, de modo a diferenciar neuropatia (proeminência) e doença arterial periférica (redução ou abolição). Classificações das feridas diabéticas O exame de sensibilidade é realizado a partir de provas com monofilamentos e diapasão, detectando assim distúrbios táteis e vibratórios, devendo ser seguido pela pesquisa de reflexos profundos. Sítios para teste da sensibilidade dos pés Cabe destacar que indivíduos com déficit de sensibilidade apresentam risco elevado para lesões nos membros inferiores. A perda da sensibilidade provoca desestabilização da musculatura plantar, o que afeta a distribuição do peso corporal, sobrecarregando a região tenar, alvo frequente de úlceras Júlia Figueirêdo – PINESC VIII Tabela de estratificação de risco e frequência de avaliações para o pé diabético Os exames complementares que podem ser empregados para a investigação do pé diabético são as biópsias cutânea e de nervos, usadas para diagnosticar lesões de fibras finas, e a eletroneuromiografia. Assim como nas demais complicações vistas anteriormente, o tratamento do pé diabético deve ser individualizado, partindo de uma perspectiva que contemple o contexto socioeconômico e familiar do paciente, respeitando suas demandas de trabalho e lazer. Nesse sentido, o plano terapêutico pode ser composto por: Orientações para uso de calçados de tamanho adequado; Áreas susceptíveis a ulcerações nos pés Incentivo ao autocuidado dos pés (inspeção diária e corte das unhas); Estratégias profiláticas para o desenvolvimento de pé diabético Otimização do controle glicêmico; Tratamento das úlceras (curativos); Antibioticoterapia: é indicada na presença de lesões purulentas de odor forte, baseando-se em tratamento empírico com cefalosposrinas de 1ª/2ª geração para Gram-positivos (estrepto e estafilococos) em quadros leves. Em infecções profundas, com potencial ameaça ao membro, recomenda-se o uso de antibióticos de amplo espectro (ampicilina + sulbactam, ceftriaxone + clindamicina, entre outros) associados ao desbridamento cirúrgico dos tecidos. Intervenção cirúrgica: a amputação de dedos ou de todo o pé é sempre necessária na presença de gangrena localizada ou difusa. INFECÇÃO POR HERPES-VÍRUS: A herpes simples é causada por dois tipos de vírus, o HSV-1, responsável por infecções de face e tronco, e o HSV-2, associado a herpes genital. A transmissão se dá por meio de contato direto com indivíduos portadores, havendo penetração viral por mucosas ou áreas de solução de continuidade da pele. No caso do HSV-2, isso ocorre por meio de relações sexuais. Como diagnósticos diferenciais, é necessário considerar outras causas de neuropatia, como deficiência de vitamina B12, seja ela decorrente do uso de medicações (ex.: metformina) ou de distúrbios autoimunes Júlia Figueirêdo – PINESC VIII Após a interação inicial, há um período de incubação de 10 dias até o desenvolvimento da primoinfecção, que pode ser tanto assintomática, como grave, com evolução arrastada. O herpes vírus então torna-se latente em gânglios de nervos cranianos ou espinhais, causando a herpes recidivante ao migrar novamente em direção à pele ou mucosas. HERPES SIMPLES NÃO GENITAL: A infecção primária por HSV-1 em crianças se dá predominantemente sobre a forma de gengivoestomatite herpética, iniciada após 3 a 10 dias da exposição. O quadro clínico pode ser discreto ou contar com erupções vesicobolhosas com febre alta, adenopatia e queda do estado geral. Após o rompimento das bolhas, surgem lesões ulceradas recobertas por placas brancas, que causam edema das gengivas. A alimentação torna-se difícil. Lesões agudas causadas por gengivoestomatite herpética Destaca-se também a queratoconjuntivite herpética como manifestação inicial, levandoà formação de erosões na conjuntiva e córnea, capazes de causar cegueira quando recorrente. Infecção ocular por HSV De modo geral, a primoinfecção se estende por 2 a 6 semanas, regredindo espontaneamente sem tendência a sequelas. O diagnóstico requer diferenciação entre manifestações como infecções bacterianas, candidose e Síndrome de Stevens-Johnson. Indivíduos adultos são mais propensos à ocorrência de herpes não genital recidivante, podendo surgir em qualquer área de pele ou mucosa. O quadro se inicia com ardor discreto no local, seguido pelo aparecimento de vesículas agrupadas em base eritematosa, principalmente nos lábios. Os principais fatores desencadeantes dessa manifestação são a exposição solar, traumas, tensão emocional, período menstrual e infecções respiratórias. Lesões vesiculares por herpes simples em lábio superior A transmissão pode ocorrer mesmo na ausência de lesões clínica características, o que é comum na herpes genital Júlia Figueirêdo – PINESC VIII HERPES SIMPLES GENITAL: A primoinfecção por HSV-2 em adultos normalmente ocorre de 5 a 10 dias após o contato com o vírus, sendo marcada por agrupamentos de vesículas dolorosas, que podem formar úlceras, nas genitais e no ânus. Em homens, as lesões se disseminam em todo o pênis, acompanhadas por febre, cefaleia e linfadenopatia, ao passo que mulheres sofrem com quadro de vulvovaginite, podendo afetar o colo uterino. A forma recidivante normalmente se apresenta de modo semelhante, com pequenas vesículas que se rompem facilmente, perdurando por 5 a 10 dias. Não costumam haver sintomas sistêmicos. Lesões por herpes genital O HSV-2 pode ainda causar infecção intrauterina, levando a complicações gestacionais ou malformações congênitas, mesmo na ausência de sintomas na mãe. Quando a contaminação ocorre durante o parto, o neonato apresenta vesículas e bolhas erosadas cobertas por crostas, predominante na cabeça ou nádegas, podendo ser fatal. DIAGNÓSTICO: O diagnóstico de infecções por herpes simples normalmente é confirmado por achados da anamnese e exame físico, porém pode ser amparado por exames complementares, tais como o teste citológico de Tzanck, que busca identificar células virais gigantes multinucleadas. Apesar de sua fácil execução, esse exame não consegue diferenciar os subtipos virais HSV-1 e HSV-2. Célula multinucleada de Tzanck, comum à múltiplas infecções por herpes-vírus Os diagnósticos diferenciais a serem considerados são a candidose (especialmente na infância), o cancro duro e o eritema medicamentoso. TRATAMENTO: Os medicamentos de escolha para o tratamento de infecções pelo HSV são fármacos que inibem a replicação viral, como o aciclovir (VO 200 mg, 4/4h, podendo se omitir a dose noturna), mantidos por 5 dias. Em pacientes imunocomprometidos ou nas apresentações graves, a dosagem deve ser duplicada. O panarício herpético é uma manifestação do HSV observada em profissionais da saúde que trabalham sem EPI. Nesses indivíduos, a inoculação viral ocorre nos dedos e mãos, levando ao desenvolvimento de vesículas coalescentes e adenopatia Júlia Figueirêdo – PINESC VIII Caso ocorram recidivas frequentes, pode ser feita a administração profilática desse antiviral (400 mg 1-2x/dia) por pelo menos 6 meses. Os efeitos adversos associados a esses fármacos são raros, representados principalmente por náuseas, desconforto abdominal e diarreia. Como tratamento tópico, recomenda-se apenas a limpeza das lesões, seguida por uso de antissépticos. HÉRPES-ZÓSTER: O vírus varicela herpes-zóster (VZV ou HHV-3), provoca duas doenças distintas, a varicela, durante o primeiro contato (frequentemente na infância), e o herpes- zóster, quando reativado em indivíduos adultos. Essa particularidade se deve à capacidade do VZV de se manter em latência em gânglios nervosos sensitivos, onde chega por disseminação hematogênica. Padrões de apresentação clínica da infecção pelo vírus varicela herpes-zóster Durante a infecção, o DNA do vírus é integrado ao material genético humano, desencadeando uma série de processos que promovem a inativação de “barreiras de replicação” celular e transformam os neurônios afetados em polos de síntese e liberação viral. Esse processo se deve a uma mudança no equilíbrio entre as proteínas Oct-1, que estimulam a transcrição viral, e Oct-2, que restringe esse mecanismo. Representação de mecanismos celulares que possibilitam a reativação viral do VZV A reativação viral do VVZ apresenta, na grande maioria dos casos, quadro clínico típico, marcado por dor neuropática que precede o aparecimento de achados cutâneos. Esse período prodrômico pode também apresentar sintomas constitucionais semelhantes à gripe. As lesões elementares dessa condição são descritas como vesículas transparentes (hemorrágicas em idosos) sobre base eritematosa de erupção unilateral, segundo o trajeto de um dermátomo, mas que pode afetar nervos contíguos. O desenvolvimento do quadro é gradual (2 a 4 dias), com a regressão das crostas sendo observada em até 4 semanas, criando cicatrizes ou manchas pigmentares. No herpes genital, o manejo pode ser feito com fanciclovir (250 mg 2-3x/dia na primoinfecção, e 125 mg 12/12h nas recidivas Manifestações generalizadas de herpes- zóster na vida adulta (“varicela símile” com lesões em vísceras) são observadas em pacientes imunossuprimidos Júlia Figueirêdo – PINESC VIII Lesões por herpes zóster acometendo um dermátomo torácico As áreas de acometimento preferencial são o tronco (maioria dos casos), face (no território do nervo trigeminal), região lombossacra e cervical. A depender do dermátomo afetado, podem haver erosões e vesículas em mucosas oral, vesical e genital. O zoster oftálmico resulta da infestação viral sobre o ramo nasociliar do nervo oftálmico, havendo surgimento de vesículas no lado e ponta do nariz, bem como conjuntivite, proptose e paralisia dos músculos extraoculares. Distribuição e achados comuns no zóster oftálmico Assim como na primoinfecção, o diagnóstico é clínico, podendo se valer de técnicas como histopatologia e citodiagnose de Zanck, com achados já descritos anteriormente. A sorologia não é utilizada para a confirmação de casos de herpes zóster, uma vez que não há mudança no perfil de anticorpos prévio. O tratamento principal é realizado com aciclovir (800 mg, VO, 5x/dia por 7 dias), iniciado precocemente, de modo a prevenir a neuralgia pós-herpética. O medicamento pode ser substituído por fanciclovir (1g, 12/12h, também por 7 dias), caso necessário. Nas formas graves da doença, indica-se infusão intravenosa de aciclovir (10 mg/kg, em no mínimo 1h de infusão, a cada 8h). Analgésicos podem ser indicados de acordo com a intensidade da dor, sempre respeitando a escada analgésica da OMS. O herpes zóster pode ainda apresentar manifestações específicas com comprometimento dos nervos facial e/ou auditivo, denominadas respectivamente como paralisia de Bell (distorção da face) e síndrome de Ramsey-Hunt (paralisia facial associada a zumbido, vertigem e déficit auditivo) A limpeza das lesões segue o mesmo protocolo aplicado à varicela (infecção primária), com uso de água boricada Júlia Figueirêdo – PINESC VIII Fluxograma de atendimento a lesões de pele na Atenção Básica Júlia Figueirêdo – PINESC VIII
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