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Coordenação do cuidado na Atenção Primária à Saúde

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO 
INSTITUTO DE ESTUDOS EM SAÚDE COLETIVA 
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SAÚDE COLETIVA 
 
 
 
 
SABINY PEDREIRA RIBEIRO 
 
 
 
 
A ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE NA COORDENAÇÃO DO CUIDADO 
DO USUÁRIO: desafios e possibilidades 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Rio de Janeiro 
2017
 
 
SABINY PEDREIRA RIBEIRO 
 
 
A ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE NA COORDENAÇÃO DO CUIDADO 
DO USUÁRIO: desafios e possibilidades 
 
 
Dissertação de mestrado apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Saúde Coletiva do Instituto de Estudos em 
Saúde Coletiva da Universidade Federal do Rio de Janeiro 
como requisito parcial para obtenção título de Mestre em 
Saúde Coletiva. 
 
 
 
 
 
 
 
Orientadora: Profª. Drª. Maria de Lourdes Tavares Cavalcanti. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Rio de Janeiro 
2017 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
R484 Ribeiro, Sabiny Pedreira. 
 A atenção primária à saúde na coordenação do cuidado do usuário: desafios e 
possibilidades / Sabiny Pedreira Ribeiro. – Rio de Janeiro: UFRJ / Instituto de 
Estudos em Saúde Coletiva, 2017. 
 115 f.; 30 cm. 
 
 Orientador: Maria de Lourdes Tavares Cavalcanti. 
 
 Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal do Rio de Janeiro, Instituto 
de Estudos em Saúde Coletiva, Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva, 
2017. 
 Referências: f. 99-105. 
 1. Atenção primária à saúde. 2. Atenção à saúde. 3. Coordenação do cuidado. 
I. Cavalcanti, Maria de Lourdes Tavares. II. Universidade Federal do Rio de 
Janeiro, Instituto de Estudos em Saúde Coletiva. III. Título. 
 CDD 362.1 
 
 
 
 
 AGRADECIMENTOS 
 
 Agradeço a minha orientadora, Maria de Lourdes Tavares Cavalcanti, por todo 
conhecimento compartilhado, atenção dispensada ao longo de todo o processo de construção 
deste trabalho, com toda sua competência e dedicação, e principalmente pela sua humanidade 
diante das dificuldades que enfrentei na descoberta da minha gestação, compreendendo o 
momento, me tranquilizando e estimulando a continuar no ritmo possível. 
 Agradeço a todos os profissionais das unidades de saúde lócus do meu estudo, que 
colaboraram para a realização desta pesquisa, em especial a enfermeira Maria e ao médico 
Bernardo, que se tornaram também amigos e que hoje acompanham o meu pré-natal. 
Agradeço, ainda, aos gestores do nível central, local e regional que me receberam e 
viabilizaram a realização deste trabalho, bem como aceitaram participar da pesquisa. 
 Agradeço à Pós-graduação do Instituto de Estudos em Saúde Coletiva, nas pessoas de 
Nadja e Fátima da secretaria, por toda colaboração. 
 Agradeço ao Programa de Residência de Enfermagem em Saúde da Família, nas 
pessoas de Alice e Ana Carolina, e a todos os profissionais e residentes que me apoiaram 
nesta reta final do mestrado, em especial a Hevelyn e Aline, nas quais descobri uma linda 
amizade. 
 Agradeço as minhas amigas Lívia, Marília, Bianca, Lizzia, Greicy, Mayara, Thais, 
Pernelle, Renata, Danielle, Fernanda e Nathalia pela paciência e pelo apoio em todos os 
momentos que precisei. 
 Agradeço a minha família, força motriz e sentido da minha vida. Aos meus tios Fátima 
e André, meus primos Matheus, Hanna, Fabrícia e Fabrício, e aos meus sobrinhos Henry, 
Ygor e Ana, por serem meu porto seguro e minha diversão nas horas tristes. Aos meus irmãos 
Abraão, André, Diego, Caito e Catherine, pelo exemplo de união e amor fraterno. 
 Agradeço a meu Pai José Carlos (in memoriam) e, em especial, a minha mãe, Soheide, 
pelos valores e princípios transmitidos, pelo apoio incondicional neste e em todos os desafios 
da minha vida. 
 Agradeço aos meus filhos, hoje ainda em desenvolvimento no meu útero, mas que já 
trazem um novo significado a minha existência e, ao lado do meu cachorro Jimmy, 
representam a família que sempre desejei. 
 
 
 Por fim, e antes de tudo, agradeço a Deus que colocou todos em meu caminho, o que 
possibilitou a realização deste trabalho. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
RESUMO 
 
RIBEIRO, Sabiny Pedreira. A atenção primária à saúde na coordenação do cuidado do 
usuário: desafios e possibilidades. 2017. 115 f. Dissertação (Mestrado) – Programa de Pós- 
Graduação em Saúde Coletiva, Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2017. 
 
 
Um dos grandes desafios do Sistema Único de Saúde tem sido organizar os serviços em redes 
integradas para responder às necessidades de saúde da população. Isso implica no 
desenvolvimento de mecanismos que coordenem a atenção por todo o espectro de serviços, 
com bons sistemas de informação, capazes de garantir a continuidade da atenção. Esta 
dissertação objetivou investigar a coordenação do cuidado do usuário na rede de atenção à 
saúde exercida pela Atenção Primária a Saúde (APS), no território da Área de Planejamento 
em Saúde 2.1 do município do Rio de Janeiro. A pesquisa descritiva, de natureza qualitativa, 
buscou descrever a opinião dos gestores/profissionais de saúde da APS a respeito da 
coordenação do cuidado e o seu papel na coordenação, as estratégias e instrumentos adotados 
pelas equipes de APS para coordenação do cuidado do usuário e, identificar os limites e 
possibilidades no exercício da coordenação do cuidado pelas equipes de APS. Os dados foram 
gerados através da observação participante e entrevista com roteiro semiestruturado. Os 
sujeitos investigados foram gestores e profissionais de saúde de 02 equipes de APS. Para 
análise dos dados foi utilizada a técnica de análise temática que permitiu organizar as falas em 
quatro categorias, para as quais destacam-se os principais resultados: Significado da 
coordenação do cuidado na opinião dos gestores/profissionais de APS - diz respeito às 
diversas atividades que proporcionam a prestação de um cuidado individualizado e integral 
visando a continuidade do cuidado ao longo da rede; Papel do gestor/profissional de APS na 
coordenação do cuidado e estratégias adotadas - trabalho em equipe, o cadastro e vinculação 
da população, o registro em prontuário eletrônico, implantação de protocolos clínicos, 
descentralização da regulação ambulatorial, apoio institucional e educação permanente; 
Ferramentas desenvolvidos e/ou utilizadas por gestores/profissionais de APS na coordenação 
do cuidado - SISREG, sistema de Alta Referenciada, Portal de Gestão do Cuidado, Sistema 
de Vaga Zero, prontuário eletrônico, mecanismos de referência e contra referência; 
Dificuldades e desafios na coordenação do cuidado – fragmentação da rede, baixa oferta de 
vagas aos serviços especializados, frágil comunicação entre os serviços, prontuário eletrônico 
não integrado, baixa qualificação profissional e desconhecimento do papel da APS. Assim, os 
principais resultados desta pesquisa demonstraram que o apoio da gestão no estabelecimento 
de diretrizes e fluxos, os programas de qualificação profissional e maiores investimentos em 
tecnologias de comunicação e integração da rede se mostram essenciais para superação das 
dificuldades e construção das possibilidades da APS na coordenação do cuidado do usuário na 
rede. 
 
Palavras-chave: Atenção primária à saúde. Redes de atenção à saúde. Coordenação do 
cuidado. 
 
 
 
 
 
 
 
ABSTRACT 
 
RIBEIRO, Sabiny Pedreira. Primary health care in the coordination of the care of the 
user: challenges and possibilities. 2017. 115 pp. Master Dissertation – Programa de Pós- 
Graduação em Saúde Coletiva, Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2017. 
 
 
One of the great challenges of the Unified Health System has been to organize the services in 
integrated networks to respond to the health needs of the population. This implies the 
development of mechanisms that coordinate careacross the spectrum of services, with good 
information systems capable of ensuring continuity of care. This dissertation aimed to 
investigate the coordination of the care of the user in the health care network carried out by 
Primary Health Care (PHC) in the territory of the Health Planning Area 2.1 of the city of Rio 
de Janeiro. The qualitative descriptive research sought to describe the opinion of the PHC 
health managers/professionals regarding the coordination of care and its role in the 
coordination, strategies and instruments adopted by PHC teams to coordinate care of the user 
and, Identify limits and possibilities in the exercise of coordination of care by PHC teams. 
Data were generated through participant observation and semi-structured interview. The 
subjects investigated were managers and health professionals from 02 PHC teams. To analyze 
the data, the thematic analysis technique was used to organize the speeches in four categories, 
for which the main results are highlighted: Meaning of the coordination of care in the opinion 
of the managers /professionals of PHC - concerns the various activities that Provide the 
provision of an individualized and integral care aiming at the continuity of care throughout 
the network; The role of the APS manager /professional in the coordination of care and 
strategies adopted - teamwork, registration and linking of the population, registration in 
electronic medical records, implementation of clinical protocols, decentralization of outpatient 
regulation, institutional support and permanent education; Tools developed and/or used by 
APS managers/professionals in the coordination of care - SISREG, High Referenced System, 
Care Management Portal, Zero Wave System, electronic medical record, referral and counter 
mechanisms; Difficulties and challenges in the coordination of care - fragmentation of the 
network, low availability of jobs to specialized services, fragile communication between 
services, non-integrated electronic medical record, low professional qualification and lack of 
knowledge of the role of PHC. Thus, the main results of this research demonstrated that 
management support in the establishment of guidelines and flows, professional qualification 
programs and greater investments in communication and network integration technologies are 
essential for overcoming difficulties and building the possibilities of PHC in Coordination of 
user care in the network. 
 
Keywords: Primary health care. Health care networks. Coordination of care. 
 
 
 
 
 
 
 
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS 
 
AB - Atenção Básica 
ACS - Agente Comunitário de Saúde 
AIS - Ações Integradas de Saúde 
AP - Área Programática 
APS - Atenção Primária à Saúde 
CAPS - Centro de Atenção Biopsicossocial 
CEO - Centro de Especialidades Odontológicas 
CEP - Comitê de Ética em Pesquisa 
CME - Centro Médico Especializado 
CNES - Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde 
CRAS - Centro de Referência de Assistência Social 
CREAS - Centro de Referência Especializado de Assistência Social 
ESF - Estratégia de Saúde da Família 
EUA - Estados Unidos da América 
GSE - Grupamento de Socorro e Emergência 
HIV/AIDS - Vírus da imunodeficiência humana 
IBEG - Instituto Brasileiro de Estatística e Geografia 
IESC - Instituto de Saúde Coletiva 
INAMPS - Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social 
MS - Ministério da Saúde 
NASF - Núcleo de Apoio à Saúde coletiva 
NOAS - Norma Operacional da Assistência à Saúde 
OMS - Organização Mundial de Saúde 
OPAS - Organização Pan-Americana de Saúde 
OSS - Organizações Sociais em Saúde 
PACS - Programa de Agentes Comunitários de Saúde 
PIASS - Programa de Interiorização das Ações de Saúde e Saneamento do Nordeste 
PMAQ-AB - Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica 
PNAB - Política Nacional de Atenção Básica 
PROVAB - Programa de Valorização do Profissional da Atenção Básica 
PSF - Programa de Saúde da Família 
PTS - Projeto Terapêutico Singular 
RAS - Rede de Atenção à Saúde 
RT - Responsável Técnico 
SAMU - Serviço de Assistência Médica de Urgência 
SISREG - Sistema de Regulação 
SUS - Sistema Único de Saúde 
TCLE - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido 
UBS - Unidade Básica de Saúde 
UPA - Unidades de Pronto Atendimento 
 
 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
1 A COORDENAÇÃO DO CUIDADO DO USUÁRIO NA ATENÇÃO PR IMÁRIA À 
SAÚDE: CONSIDERAÇÕES INICIAIS ............................................................................. 10 
1.1 PERGUNTAS DE PESQUISA ..................................................................................... 12 
1.2 OBJETIVOS .................................................................................................................. 13 
1.2.1 Objetivo geral ................................................................................................................. 13 
1.2.2 Objetivos específicos ...................................................................................................... 13 
2 A COORDENAÇÃO DO CUIDADO DO USUÁRIO NA REDE DE ATEN ÇÃO À 
SAÚDE ..................................................................................................................................... 14 
2.1 DEFINIÇÃO E ATRIBUTOS DAS REDES DE ATENÇÃO À SAÚDE ........................ 14 
2.1.1 Modelagem e componentes das redes de atenção à saúde ......................................... 15 
2.1.2 Benefícios das redes regionalizadas e integradas de atenção à saúde ....................... 17 
2.1.3 Coordenação do cuidado do usuário na RAS ............................................................. 19 
2.2 A ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE: O CENTRO DE COMUNICAÇÃO DAS RAS . 21 
2.2.1 Concepções de APS e seu contexto histórico ............................................................... 21 
2.2.2 O papel da atenção primária na coordenação do cuidado ........................................ 24 
2.2.3 Características da APS no Brasil ................................................................................. 27 
2.2.4 Características da APS no município do Rio de Janeiro ........................................... 30 
2.3 USUÁRIO DA REDE DE ATENÇÃO À SAÚDE ........................................................... 32 
2.4 O CUIDADO ...................................................................................................................... 36 
3 MÉTODO ............................................................................................................................. 38 
3.1 O CAMPO DE ESTUDO ................................................................................................... 38 
3.2 SUJEITOS DA PESQUISA ............................................................................................... 42 
3.3 PROCEDIMENTO DE COLETA DE INFORMAÇÕES .................................................. 43 
3.3.1 A entrevista .................................................................................................................... 44 
3.3.2 A observação .................................................................................................................. 46 
3.4 PROCEDIMENTO DE ANÁLISE DAS INFORMAÇÕES .............................................. 48 
3.5 IMPLICAÇÕES ÉTICAS .................................................................................................. 50 
 
 
4 A OPINIÃO DOS GESTORES A RESPEITO DA COORDENAÇÃO DO CUIDADO
 .................................................................................................................................................. 52 
4.1 SIGNIFICADO DA COORDENAÇÃO DO CUIDADO NA OPINIÃO DOS GESTORES
 .................................................................................................................................................. 52 
4.2 O PAPEL DOS GESTORES NA COORDENAÇÃO DO CUIDADO E AS 
ESTRATÉGIAS ADOTADAS ................................................................................................54 
4.3 FERRAMENTAS DESENVOLVIDAS E/OU UTILIZADAS PELOS GESTORES NA 
COORDENAÇÃO DO CUIDADO ......................................................................................... 62 
4.4 DIFICULDADES E DESAFIOS NA COORDENAÇÃO DO CUIDADO ....................... 64 
5 OPINIÃO DOS PROFISSIONAIS DE EQUIPES DE APS A RESPEITO DA 
COORDENAÇÃO DO CUIDADO ....................................................................................... 67 
5.1 SIGNIFICADO DA COORDENAÇÃO DO CUIDADO NA OPINIÃO DOS 
PROFISSIONAIS DE APS ...................................................................................................... 67 
5.2 PAPEL DOS PROFISSIONAIS DE EQUIPES DE APS NA COORDENAÇÃO DO 
CUIDADO E ESTRATÉGIAS ADOTADAS ......................................................................... 72 
5.3 FERRAMENTAS UTILIZADAS PELOS PROFISSIONAIS NA COORDENAÇÃO DO 
CUIDADO ................................................................................................................................ 80 
5.4 DIFICULDADES E DESAFIOS PARA COORDENAR O CUIDADO NA VISÃO DOS 
PROFISSIONAIS DE SAÚDE ................................................................................................ 83 
6 A COORDENAÇÃO DO CUIDADO EM DIÁLOGO COM PROFISSIO NAIS DE 
SAÚDE E GESTORES .......................................................................................................... 88 
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................................. 97 
REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 99 
APÊNDICE A – ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA GESTORES .. .......................... 106 
APÊNDICE B – ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA PROFISSIONA IS DE APS .... 107 
APÊNDICE C – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARE CIDO ......... 108 
APÊNDICE D – ROTEIRO DE OBSERVAÇÃO PARTICIPANTE ... .......................... 111 
ANEXO 1 – INDICADORES DO ACOUNTABILIT MONITORADOS ATRAVÉS DO 
PRONTUÁRIO ELETRÔNICO ......................................................................................... 112 
 
10 
 
 
1 A COORDENAÇÃO DO CUIDADO DO USUÁRIO NA ATENÇÃO PR IMÁRIA À 
SAÚDE: CONSIDERAÇÕES INICIAIS 
 
Trata-se de uma dissertação sobre o papel da atenção primária à saúde (APS) na 
coordenação do cuidado do usuário, na rede de atenção à saúde (RAS). A atenção primária 
tem sido adotada como a principal estratégia de reorientação do modelo assistencial e 
definida, desde a sua enunciação, como porta de entrada e o primeiro nível de contato da 
população com o sistema de saúde (OMS, 1978). Uma responsabilidade ampliada para APS 
tem sido debatida, no âmbito nacional, a partir da proposta da criação das redes de atenção à 
saúde, nas quais a APS possui um papel central na coordenação do cuidado do usuário 
(ALMEIDA et al., 2011; BRASIL, 2010, 2011). 
A estruturação da rede de atenção à saúde tem sido concebida como estratégia para 
superar a fragmentação da atenção e aperfeiçoar o funcionamento político-institucional do 
Sistema Único de Saúde (SUS). Seu objetivo é promover a integração sistêmica de ações e 
serviços de saúde com provisão de atenção contínua, integral, de qualidade, responsável e 
humanizada, bem como incrementar o desempenho do Sistema, em termos de acesso, 
equidade, eficácia clínica e sanitária e eficiência econômica (BRASIL, 2010). 
Entretanto, um dos grandes desafios do SUS tem sido implementar a organização dos 
serviços em redes com serviços integrados, para responder às necessidades de saúde da 
população, a partir do seu perfil epidemiológico (SILVA, 2011). Tal desafio, vale salientar, 
não é exclusividade do sistema público de saúde brasileiro, várias análises têm demonstrado a 
fragmentação dos sistemas de saúde e suas consequências negativas sobre a eficiência e 
efetividade das ações em saúde em países tais como EUA e Canadá (MENDES, 2007, 2011; 
NORONHA et al., 2014). 
Estudos têm demonstrado que a organização dos sistemas de saúde em rede, tendo a 
APS como coordenadora do cuidado e ordenadora da rede, se apresenta como um mecanismo 
de superação da fragmentação sistêmica. Sistemas organizados dessa forma são mais 
eficientes e eficazes, tanto em termos de organização interna (alocação de recursos, 
coordenação clínica, etc.), quanto em sua capacidade de fazer face aos atuais desafios do 
cenário socioeconômico, demográfico, epidemiológico e sanitário do país (BRASIL, 2010; 
CECILIO et al., 2012; RODRIGUES et al., 2014). 
11 
 
 
A coordenação do cuidado realizada pela APS é definida como a capacidade de 
promover a continuidade da atenção, na medida em que os profissionais de saúde devem 
realizar monitoramento constante das distintas condições, articulando-se com os diversos 
pontos de atenção do sistema. Requer o exercício de práticas gerenciais e sanitárias 
democráticas e participativas, sob forma de trabalho em equipe, dirigidas a populações de 
territórios bem delimitados, pelas quais a APS assume a responsabilidade sanitária (BRASIL, 
2010). Para o exercício da coordenação são necessários: tecnologias de gestão clínica, 
mecanismos adequados de comunicação entre profissionais e registro adequado de 
informações (GIOVANELLA e MENDONÇA, 2012). 
Entretanto, a APS encontra diversos desafios no exercício da coordenação do cuidado, 
a exemplo da fragmentação do sistema de saúde, com frágeis mecanismos de integração e 
comunicação dos serviços; configuração inadequada dos modelos de atenção, marcada pela 
incoerência entre a oferta de serviços e às necessidades de saúde, não conseguindo 
acompanhar a tendência de declínio dos problemas agudos e ascensão das condições crônicas; 
fragilidade na gestão do trabalho, com problemas de precarização e carência de profissionais, 
em número e alinhamento com a política pública; financiamento público insuficiente; dentre 
outros (BRASIL, 2010; CECILIO et al., 2012; RODRIGUES et al., 2014). 
A motivação e o desejo por este estudo surgiram a partir da minha vivência como 
coordenadora da Atenção Básica em um município de pequeno porte no estado da Bahia. No 
exercício desta função, pude observar que a coordenação do cuidado do usuário na esfera da 
APS era incipiente. Percebi, durante essa experiência, que diversos entraves dificultavam a 
coordenação do cuidado pelas equipes de APS relacionados, principalmente, ao pouco 
reconhecimento político do papel da APS na organização da rede; a sua pouca legitimidade 
social; a precariedade logística, organizacional e operacional da rede de atenção à saúde; ao 
pouco comprometimento e qualificação de alguns gestores e profissionais para implementar a 
coordenação do cuidado. Exemplo desses entraves eram a ausência de prontuário eletrônico, o 
pouco uso das fichas de referência e contra referência, o desconhecimento dos profissionais 
acerca dos serviços de referência e cuidado especializados da rede, falhas no sistema de 
regulação, a ausência de gestão da rede de saúde com vistas à integração dos serviços 
existentes, limitações de acesso, dentre outros. 
Observei, ainda, que a APS era pouco resolutiva frente aos problemas de saúde agudos 
que demandavam uma resposta rápida. Essa pouca resolutividade evidenciada contribuía para 
12 
 
 
a desvalorização da APS e para reforçar a não legitimidade social da mesma. Estava presente, 
na visão da população, de alguns gestores e de profissionais de saúde que atuavam em outros 
níveis de atenção, a ideia de uma APS voltada à oferta de um pacote de serviços fechados e 
para pobres, não sendo reconhecida, portanto, a necessidade de integrar a APS aos outros 
níveis de atenção, tampouco, a necessidade de ter a APS coordenando o cuidado na rede. 
 
1.1 PERGUNTAS DE PESQUISA 
 
Pensando nos desafios apresentados, foi estabelecido como objeto de investigação 
neste estudo a atenção primária à saúde na coordenação do cuidado do usuáriona rede de 
atenção à saúde. Entendo que a coordenação do cuidado do usuário é uma das atribuições da 
atenção primária e que os serviços de APS são os mais adequados para assumir essa função. 
Entretanto, somente uma APS “forte”, capaz de mobilizar apoio, recursos políticos, 
econômicos, financeiros e humanos, poderia assumir a coordenação do cuidado de forma 
efetiva, conforme preconizado. Portanto, é preciso conhecer e compreender os fatores que 
interferem no exercício da coordenação do cuidado pela APS. Para tanto, algumas questões 
foram levantadas: 
• Qual o entendimento dos gestores e equipes de APS a respeito da coordenação do 
cuidado e do seu papel nessa coordenação? 
• Quais as estratégias e instrumentos adotados na APS para a coordenação do cuidado? 
• Quais os limites e as possibilidades para o exercício de coordenação do cuidado pelas 
equipes de APS? 
 
Em que pese a existência de diversos estudos relacionados ao funcionamento da RAS 
e da APS, ainda são poucos os que visam conhecer e analisar a APS na coordenação do 
cuidado do usuário na rede, com vistas à integração dos serviços e à integralidade no cuidado. 
Dessa forma, este estudo levanta questões que podem incentivar a comunidade científica a 
buscar novas respostas e soluções, visando o fortalecimento da APS como coordenadora do 
cuidado e contribuir na ampliação do conhecimento da Saúde Coletiva acerca dessa 
problemática. 
 
13 
 
 
1.2 OBJETIVOS 
 
1.2.1 Objetivo geral 
 
Investigar a coordenação do cuidado do usuário na rede de atenção à saúde exercida 
pela atenção primária, no território da Área de Planejamento em Saúde 2.1 (AP 2.1) do 
município do Rio de Janeiro. 
 
1.2.2 Objetivos específicos 
 
1. Descrever a opinião dos gestores e profissionais de saúde da esfera da APS a respeito 
da coordenação do cuidado e o seu papel nessa coordenação. 
2. Descrever as estratégias e ferramentas adotadas e/ou desenvolvidos pelas equipes de 
APS para coordenação do cuidado do usuário na rede de atenção à saúde do município 
do Rio de Janeiro. 
3. Identificar os limites e possibilidades no exercício da coordenação do cuidado pelas 
equipes de APS, na visão desses profissionais e gestores. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
14 
 
 
2 A COORDENAÇÃO DO CUIDADO DO USUÁRIO NA REDE DE ATEN ÇÃO À 
SAÚDE 
 
2.1 DEFINIÇÃO E ATRIBUTOS DAS REDES DE ATENÇÃO À SAÚDE 
 
 O conceito de rede existe na sociedade com diferentes conotações, a saber: Rede das 
aranhas para captura das suas presas; rede como equipamento de descanso do corpo; as redes 
sociais, a exemplo das redes de relacionamentos online (Facebook, Twitter, Instagram etc) 
capazes de, em pouco tempo, movimentar milhões de pessoas em torno de objetivos comuns; 
redes de comunicação com diferentes formas de expressão para levar aos cidadãos a 
oportunidade de manifestar-se sobre determinados assuntos, muitos buscando o 
desenvolvimento do sentimento de pertencimento, de fazer parte dos “nós” das tramas. Em 
todos os casos, as redes unem e dão suporte a algo e, por essas características, conferem novas 
possibilidades a seus usuários (ARAÚJO, 2013). 
A proposta de redes, no suporte às políticas públicas, tem sido adotada a partir da 
década de 90 como forma de superação do modelo burocrático e hierárquico hegemônico, 
baseados no taylorismo e no fordismo e caracterizados por pirâmides. Em um contexto de 
complexificação das questões sociais, de processos de privatização, de descentralização 
acelerada, de globalização, de proliferação de organizações não governamentais e de 
fortalecimento do controle público, as organizações hierárquicas rígidas tendem a serem 
substituídas por redes estruturadas em tessituras flexíveis e abertas de compartilhamentos e 
interdependências em objetivos, informações, compromissos e resultados (MENDES, 2011). 
Na saúde, rede é uma ferramenta que vem sendo trabalhada com a finalidade de 
possibilitar, por meio dos “nós”, o suporte para o caminhar do cidadão dentro dos diferentes 
serviços ofertados pelo sistema de saúde. Na rede de atenção à saúde, as tramas são 
organizadas por meio de políticas de governo, ofertando serviços de diferentes níveis de 
complexidade (ARAÚJO, 2013). Uma definição da RAS bastante utilizada a coloca como 
 
[…] organização poliárquica de conjuntos de serviços de saúde, vinculados entre si 
por uma missão única, por objetivos comuns e por uma ação cooperativa e 
interdependente, que permitem ofertar uma atenção contínua e integral a 
determinada população, coordenada pela atenção primária à saúde – prestada no 
tempo certo, no lugar certo, com o custo certo, com a qualidade certa, de forma 
humanizada e com equidade – e com responsabilidades sanitária e econômica e 
gerando valor para a população (MENDES, 2011, p.82). 
 
15 
 
 
A Organização Mundial da Saúde considera que a RAS contém seis modalidades de 
integração: um conjunto amplo de intervenções preventivas e curativas para uma população; 
os espaços de integração de vários serviços; a atenção à saúde contínua, ao longo do tempo; a 
integração vertical de diferentes níveis de atenção; a vinculação entre a formulação da política 
de saúde e a gestão; e o trabalho intersetorial. A partir dessas modalidades, se produz uma 
conceituação de serviços integrados de saúde como a gestão e a oferta de serviços de saúde de 
forma a que as pessoas recebam um contínuo de serviços preventivos e curativos, de acordo 
com as suas necessidades, ao longo do tempo e por meio de diferentes níveis de atenção à 
saúde (WHO, 2008). 
O Ministério da Saúde (MS) define as RAS como arranjos organizativos de ações e 
serviços de saúde, de diferentes densidades tecnológicas que, integradas por meio de sistemas 
de apoio técnico, logístico e de gestão, buscam garantir a integralidade do cuidado. Alguns 
dos atributos de uma RAS explicitados são: população e território definidos com amplo 
conhecimento de suas necessidades; extensa gama de estabelecimentos de saúde; APS 
estruturada como primeiro nível de atenção e porta de entrada do sistema, integrando e 
coordenando o cuidado na RAS; prestação de serviços especializados em lugar adequado; 
atenção à saúde centrada no indivíduo, na família e na comunidade; capacidade de gestão para 
planejar, monitorar e avaliar o desempenho das organizações; participação social; recursos 
humanos suficientes, competentes e comprometidos; sistema de informação que integre toda a 
rede; financiamento tripartite, garantido e suficiente; ação intersetorial e abordagem dos 
determinantes da saúde, dentre outros (BRASIL, 2010). 
 
2.1.1 Modelagem e componentes das redes de atenção à saúde 
 
 A organização de um sistema de saúde em redes pressupõe a superação do modelo 
piramidal, o qual, habitualmente, situa os serviços de atenção primária na base da pirâmide e 
os demais, em complexidade crescente, da base para o topo, com limitação das conexões entre 
seus diversos pontos (SILVA, 2011; OLIVEIRA et al., 2004; MENDES, 2011). Neste modelo 
de pirâmide, os instrumentos de referência e contrarreferência entre níveis de atenção não se 
mostram adequados, já que os serviços de saúde interagem entre si em diferentes fluxos, com 
relação horizontalizada e elevado grau de interdependência (SILVA, 2011). 
16 
 
 
Um modo adequado de organizar as RAS é estruturando os serviços de saúde em rede 
de pontos de atenção, composta por equipamentos de diferentes densidades tecnológicas, 
distribuídos espacialmente de forma ótima. Em geral, os serviços de menor densidade 
tecnológica como os de atenção primária à saúde devem ser dispersos; ao contrário, os 
serviços de maior densidade tecnológica como hospitais, unidades de processamento de 
exames de patologia clínica, equipamentos de imagem etc, tendem a ser concentrados, 
buscando a economia de escala (MENDES, 2011). Assim, a concepção de hierarquia é 
substituída pela de poliarquia e o sistema de saúdeorganiza-se sob a forma de uma rede 
horizontal em que cada nó se liga a vários outros, sem ordem ou grau de importância entre 
eles (OLIVEIRA et al., 2004). 
Os principais componentes das redes integradas e regionalizadas de atenção à saúde, 
segundo Mendes (2011), são três: (1) a população; (2) a estrutura operacional, a qual engloba 
o centro de comunicação - a APS, os pontos de atenção secundários e terciários, os sistemas 
de apoio, os sistemas logísticos e o sistema de governança; e (3) o modelo de atenção à saúde 
(o Modelo de Atenção às Condições Agudas e o Modelo de Atenção às Condições Crônicas). 
Para se organizar de forma efetiva, eficiente e com qualidade, a RAS deve estruturar-se com 
base em alguns fundamentos, dentre eles o de economia de escala, disponibilidade de 
recursos, qualidade, acesso, níveis de atenção e integração dos serviços (MENDES, 2011; 
SILVA, 2011). Um princípio importante a ser adotado é o do sistema em redes usuário-
centrado, no qual devem estar instituídas linhas de cuidado, levando em conta a singularidade 
de suas demandas e necessidades (SILVA, 2011). 
Assim, a RAS estrutura-se por regiões e em redes temáticas ou linhas de cuidado, a 
exemplo no Brasil, a Rede Cegonha, a Rede de Atenção Biopsicossocial, a Rede de atenção 
ao Idoso, dentre outras, que buscam conformar linhas de cuidados a grupos específicos. A 
linha de cuidado pode funcionar, antes de tudo, como estratégia de aproximação da 
integralidade do cuidado, na medida em que são articulados profissionais e unidades de saúde 
com diferentes papéis e aportes tecnológicos, organizada em função de trajetórias, pensada 
em corte horizontal, mas sem a rigidez de uma rede hierarquizada (WHO, 2008). Portanto, 
não se trata de programas verticais de atenção focalizada em doenças específicas, como se 
observou em momentos na história do Brasil e em países com sistema de saúde pouco 
desenvolvido (OPAS, 2008b; GIOVANELLA E MENDONÇA, 2012), já que, nas linhas de 
cuidado, somente os pontos de atenção à saúde secundários e terciários são verdadeiramente 
17 
 
 
temáticos. A APS, os sistemas de apoio, os sistemas logísticos e o sistema de governança são 
comuns a todas as redes e organizam-se de forma transversal (MENDES, 2011). 
Nessa proposta, o centro de comunicação das redes de atenção à saúde e o nó 
intercambiador no qual se coordenam os fluxos e os contrafluxos do sistema é constituído 
pela APS. Na concepção de RAS, cabe à APS a responsabilidade de articular-se, intimamente, 
com a população, o que implica não ser possível falar de uma função coordenadora dessas 
redes se não se der, nesse nível micro do sistema, um processo de conhecimento e 
relacionamento íntimo da equipe de APS com a população adscrita, estratificada em 
subpopulações e organizada, socialmente, em famílias. Portanto, não é possível falar de rede e 
seu trinômio espaço territorial/população/serviços de saúde sem enfatizar a importância 
primordial da APS como coordenadora do cuidado e ordenadora da rede (MENDES, 2011; 
ARAÚJO, 2013). 
 
2.1.2 Benefícios das redes regionalizadas e integradas de atenção à saúde 
 
As RAS, regionalizadas e integradas, oferecem condição estruturalmente adequada 
para efetivação da integralidade da atenção e reduzem os custos dos serviços por imprimir 
uma maior racionalidade sistêmica na utilização dos recursos e melhor aproveitamento da 
oferta assistencial disponível (SILVA, 2011). Ainda, a organização do sistema em redes 
possibilita a construção de vínculos de solidariedade e cooperação entre trabalhadores, 
serviços e comunidade, bem como reduz a fragmentação da atenção à saúde (BRASIL, 2010). 
A preocupação com a fragmentação na atenção à saúde não é recente. Iniciativas de 
expansão no acesso e na redução da segmentação entre serviços assistenciais e da 
fragmentação no cuidado podem ser identificadas, por exemplo, no Relatório Dawson, 
publicado na Inglaterra em 1920. Entre seus objetivos, esse relatório propunha disponibilizar 
os serviços de saúde segundo as necessidades da população, associando a ideia de 
regionalização e integração das ações curativas com as preventivas (DAWSON, 1964; 
CONILL, 2008). 
Autores assinalam a intensidade da fragmentação dos sistemas de saúde observada em 
diferentes países na época atual (SILVA, 2011; CONILL et al., 2010), com algumas possíveis 
causas apontadas pela Organização Pan Americana de Saúde (OPAS): a segmentação dos 
sistemas de saúde; o predomínio de programas focalizados; a separação dos serviços de saúde 
18 
 
 
pública dos serviços de atenção às pessoas; o modelo de atenção centrado na enfermidade, nos 
casos agudos e no hospital; as debilidades na coordenação pela autoridade sanitária; 
insuficiência e má distribuição dos recursos e culturas organizacionais contrárias à integração 
(OPAS, 2008a). 
No Brasil, a implantação do SUS buscou reduzir a segmentação na saúde ao unir os 
serviços da União (Ministério da Saúde e assistência médica previdenciária do antigo 
INAMPS), estados e municípios em um único sistema de saúde. A criação do SUS na 
Constituição Federal de 1988, além de estabelecer a universalização do acesso, promoveu a 
descentralização/regionalização e integração com formação de redes como diretrizes 
fundamentais. Todavia, a implementação do SUS contribuiu pouco para a integração da saúde 
nas regiões, possivelmente pela maior ênfase dada à municipalização em detrimento da 
regionalização na primeira década da sua construção (anos 1990) (SILVA, 2011). 
Assim, em 2001, o MS publica a Norma Operacional da Assistência à Saúde (Norma 
Operacional da Assistência à Saúde-NOAS/2001), dando proeminência à necessidade de 
formação de redes integradas, apesar de não conseguir avançar na sua implementação pelas 
regras rígidas e não consolidação de uma governança regional e intermunicipal (SILVA, 
2011). Em 2006, é publicado o Pacto pela Saúde, se propondo a substituir o formato rígido da 
NOAS por pactuação mais flexível (SILVA, 2011). Brasil (2008), é divulga um documento 
estimulando o debate sobre a importância das redes e, em 2010, o MS publica a Portaria GM 
4.279 de 30 de dezembro, a qual estabelece as diretrizes para a organização da RAS no 
âmbito do SUS. Em 2011, o Decreto Presidencial Nº 7.508 reafirma a importância da 
organização do SUS em rede. Esta série de publicações normativas evidencia a preocupação 
do governo brasileiro com a consolidação das RAS, frente às dificuldades inerentes ao 
processo de regionalização e formação de redes no atual contexto do sistema de saúde 
brasileiro. 
A proposição de sistemas integrados de saúde ou organizados em rede tem sido uma 
resposta à fragmentação observada, bem como uma resposta social às mudanças do perfil 
demográfico e epidemiológico das populações. Em vista do processo de envelhecimento da 
população, em que há um crescente incremento das condições crônicas, já que estas afetam 
mais os segmentos de maior idade, torna-se ainda mais relevante pensar em um sistema de 
saúde organizado em rede, tendo em vista que os usuários com condições crônicas utilizam 
simultaneamente serviços de diversas complexidades, resultando em interdependência entre 
19 
 
 
os pontos de atenção. Cabe destacar que as condições crônicas envolvem todas as doenças 
crônicas, mais as doenças transmissíveis de curso longo (tuberculose, HIV/Aids e outras), as 
condições maternas e infantis, os acompanhamentos por ciclos de vida, as deficiências físicas 
e os distúrbios mentais de longo prazo (OMS, 2003). 
Nesse sentido, é fundamental que os sistemas de atenção em saúde trabalhem de forma 
integrada, em rede, desenvolvendo mecanismos que coordenem a atenção por todo o espectro 
de serviços, incluindo o desenvolvimento de sistemas de referência e contrarreferência, com 
bons sistemas de informação e uma APS coordenando os fluxos e os contrafluxos do sistema 
de atenção à saúde (OPAS, 2008a). Estudosreforçam que a integração em sistemas de 
serviços de saúde depende da qualidade dos processos de coordenação e estes, por sua vez, 
dependem da eficácia da comunicação instituída entre as pessoas no interior do sistema 
(RODRIGUES et al., 2014). 
 
2.1.3 Coordenação do cuidado do usuário na RAS 
 
Discussões e problemas vinculados à coordenação dos cuidados do usuário e à 
fragmentação da rede assistencial não constituem temas novos nas discussões sobre a 
organização dos sistemas de saúde (ALMEIDA et al., 2010). As mudanças do perfil 
demográfico e epidemiológico das populações, como referido anteriormente, reforçam a 
importância da coordenação entre serviços, função que deve ser exercida principalmente pela 
equipe de APS. 
A coordenação do cuidado pode ser definida como a articulação entre os diversos 
serviços e ações relacionados à atenção em saúde de forma que, independentemente do local 
onde sejam prestados, estejam sincronizados e voltados ao alcance de um objetivo comum 
(STARFIELD, 2002; HOFMARCHER et al., 2007; NÚÑEZ et al., 2006). O mecanismo de 
coordenação do cuidado envolve o conhecimento das ações e serviços prestados em outros 
pontos da rede e a integração destes, de modo que distintas intervenções sejam percebidas e 
experienciadas pelo usuário de forma contínua, adequadas as suas necessidades de saúde e 
compatível as suas expectativas pessoais (STARFIELD, 2002; ALMEIDA et al., 2010). 
A coordenação do cuidado sustenta-se na existência de uma rede integrada de 
prestadores de serviços de saúde que disponha de canais de comunicação entre si, permitindo 
que as informações a respeito dos pacientes sejam transmitidas entre os profissionais de saúde 
20 
 
 
dos diversos serviços da rede (STARFIELD, 2002; ALMEIDA et al., 2010). Starfield (2002) 
destaca que a essência da coordenação é a disponibilidade de informações a respeito de 
problemas e serviços anteriores e o reconhecimento de que estas informações poderão estar 
relacionadas às necessidades para o presente atendimento. Portanto, o apoio da função de 
coordenação depende do desenvolvimento de melhores meios de transferência de informação 
a respeito do usuário, especialmente quando recebe atenção das várias fontes para as quais foi 
encaminhado. 
Na definição da OPAS, a coordenação conota a capacidade de garantir a continuidade 
da atenção, por meio da equipe de saúde, com o reconhecimento dos problemas que requerem 
seguimento constante e se articula com a função de centro de comunicação das redes de 
atenção à saúde (OPAS, 2011). Nessa mesma linha, a concepção adotada pelo MS traz que a 
coordenação do cuidado é definida como a capacidade de promover a continuidade da 
atenção, na medida em que os profissionais de saúde devem realizar monitoramento constante 
das distintas condições, articulando-se com os diversos pontos de atenção do sistema 
(BRASIL, 2010). Desse modo, o ato de coordenar o cuidado deve responder à elaboração, 
acompanhamento e à gestão de projetos terapêuticos, à organização de fluxo dos usuários 
entre os pontos de atenção, à gestão de lista de espera, à organização de protocolos de 
cuidado, além de realizar a discussão e análise dos casos (BRASIL, 2006, 2011). 
Apesar da existência de diversos estudos, nacionais e internacionais, sobre a 
coordenação do cuidado, sua definição parece ainda não apresentar consenso, sendo possível 
observar na literatura certa confusão teórica e a utilização indiscriminada dos termos 
continuidade assistencial, coordenação, integração de serviços, colaboração, trabalho em 
equipe, gestão da doença, gestão de casos, gestão do cuidado e o chamado modelo de atenção 
às condições crônicas. É difícil interpretar a relação entre esses conceitos e chegar a um 
denominador comum sobre o que seria, de fato, a coordenação do cuidado (ALMEIDA et al., 
2010; BROWN et al., 2004; MCDONALD et al., 2007). 
Para fins deste estudo, será assumida a coordenação do cuidado como a capacidade de 
garantir a continuidade da atenção em saúde de um modo integrado com os diferentes pontos 
de atenção e compreendida nas dimensões vertical, entre a APS e os demais níveis do sistema, 
e horizontal, que envolveria a articulação entre a própria equipe de APS, serviços de saúde e 
equipamentos sociais (RODRIGUES et al., 2014). 
21 
 
 
Alguns autores apresentam a coordenação não apenas como um atributo da APS, mas 
como fazendo parte de uma estratégia de todo o sistema de saúde para melhorar a integração 
entre seus níveis assistenciais, embora reconheçam a APS, fortalecida em seus atributos, 
como mais adequada para assumir a função de coordenação dos cuidados no interior dos 
serviços de saúde. Assim, coordenação seria um atributo organizacional dos serviços de saúde 
que se traduz na percepção de continuidade dos cuidados na perspectiva do usuário 
(ALMEIDA et al., 2010). 
 
2.2 A ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE: O CENTRO DE COMUNICAÇÃO DAS RAS 
 
2.2.1 Concepções de APS e seu contexto histórico 
 
A estrutura operacional das redes de atenção à saúde tem sua base na APS. Sem uma 
APS muito bem estruturada não se pode pensar em redes de atenção à saúde efetivas, 
eficientes e de qualidade (OPAS, 2011). A proposta da APS foi cunhada originalmente em 
1920 pelo Relatório Dawson, que a mencionava como o foco central do processo de 
regionalização e o primeiro nível de atenção responsável pelo acesso da população aos meios 
diagnósticos e aos serviços especializados (CONILL, 2008; MENDES, 2011). Entretanto, sua 
institucionalização nos sistemas de saúde foi feita após a reunião de Alma-Ata, realizada em 
1978, a qual propôs uma APS abrangente e assumida como responsabilidade dos governos, 
reiterando a saúde como um direito humano fundamental (OPAS, 1978). 
Três pensamentos fundamentais permeiam a declaração de Alma Ata: tecnologia 
apropriada, oposição ao centralismo médico e o conceito de saúde como uma ferramenta para 
o desenvolvimento socioeconômico. Assim, a APS é concebida como a atenção baseada em 
métodos e tecnologias apropriadas, cientificamente comprovadas e socialmente aceitáveis, 
cujo acesso deve ser garantido a todos. Implica em participação comunitária e democratização 
dos conhecimentos, incluindo ‘práticas tradicionais’ (curandeiros, parteiras) e agentes de 
saúde na comunidade. Ainda, é expressa como função central do sistema nacional de saúde e 
como parte do processo mais geral de desenvolvimento social e econômico, o que envolve a 
cooperação com outros setores. Nessa concepção, a APS representa o primeiro nível de 
contato com o sistema de saúde, levando a atenção ao mais próximo possível de onde as 
22 
 
 
pessoas residem e trabalham, dispondo de assistência sanitária que inclui prevenção, 
promoção, cura e reabilitação (OMS, 1978; CUETO, 2004). 
Desde Alma Ata, diferentes interpretações de APS surgiram na prática social dos 
sistemas de saúde, identificando quatro linhas principais de interpretação (OPAS, 2008b; 
GIOVANELLA & MENDONÇA, 2012): 
1) Programa focalizado e seletivo, de baixa resolutividade, voltados à população 
pobre, com cesta restrita de serviços para enfrentar limitado número de problemas de saúde 
nos países em desenvolvimento; 
2) Um dos níveis de atenção, porta de entrada no sistema de saúde e local de 
cuidados contínuos, correspondendo aos serviços ambulatoriais médicos de primeiro contato 
não especializados. Trata-se da concepção mais comum em países da Europa com sistemas 
universais públicos; 
3) Abrangente e integral, como uma concepção de modelo assistencial e de 
organização do sistema de saúde, conforme proposto em Alma Ata, para enfrentar os 
determinantes sociais de saúde, com base em tecnologias apropriadas, uso eficiente dos 
recursos e participação comunitária; 
4) Filosofia que orienta processos emancipatórios pelo direito universal à saúde, 
enfatiza a abordagem dos determinantes sociais e políticos mais amplos da saúde.Nos países em desenvolvimento, após Alma Ata, observou-se a difusão da proposta da 
APS seletiva com práticas racionalizadas, restrita à cesta de serviços, obtendo especial suporte 
da Unicef e do Banco Mundial (RODRIGUES et al., 2014). Esse formato passou a ser 
fortemente criticado por orientar-se estritamente por critérios de custo-efetividade e por 
ignorar o contexto maior do desenvolvimento social e econômico (OPAS, 2008b; 
MAESENEER, 2007). Em resposta, a OPAS e a Organização Mundial de Saúde (OMS) 
impulsionaram um movimento de renovação da APS, uma espécie de atualização da 
concepção abrangente de Alma Ata, divulgando o documento “Renovação da Atenção 
Primária em Saúde nas Américas” (OPAS/OMS, 2008) e, em 2008, o Relatório Mundial de 
Saúde, intitulado “Atenção Primária à Saúde: agora mais do que nunca” (OMS, 2008). Esses 
documentos defendem a necessidade de alcançar atenção universal e abrangente por meio de 
uma abordagem integrada e horizontal no desenvolvimento dos sistemas de saúde, bem como 
uma APS como coordenadora de uma resposta integral em todos os níveis de atenção, 
23 
 
 
reconhecendo que a APS abrangente requer mais investimento, pois representa o modo mais 
eficiente de aplicação de recursos. 
Para compreensão de uma APS abrangente, tem sido utilizada, por especialistas da 
área, a referência teórico-conceitual da médica e pesquisadora Bárbara Starfield (2002) que 
destaca o papel da atenção primária como foco de organização dos sistemas de saúde para 
responder adequadamente às crescentes ameaças a qualidade da atenção e às crescentes 
iniquidades sociais que ameaçam piorar ainda mais as disparidades entre as populações. 
Starfield (2002) desenvolveu uma abordagem para caracterizar a APS abrangente, 
apesar de centrar sua análise numa atenção individual. Em sua abordagem, considera como 
características específicas da APS: a prestação de serviços de primeiro contato; a assunção de 
responsabilidade longitudinal pelo usuário com continuidade da relação clínico-paciente ao 
longo da vida; a garantia de cuidado integral considerando-se os âmbitos físicos, psíquicos e 
sociais da saúde dentro dos limites de atuação do pessoal de saúde; e a coordenação das 
diversas ações e serviços indispensáveis para resolver necessidades menos frequentes e mais 
complexas. 
O primeiro atributo da APS é se constituir como primeiro contato, porta de entrada do 
sistema de saúde, de fácil acesso, buscado pelo usuário a cada vez que um novo problema ou 
necessidade forem observados ou para o seu acompanhamento continuado. Para tanto, é 
necessária a eliminação de barreiras financeiras, geográficas, organizacionais e culturais, 
tornando o local de atendimento facilmente acessível e disponível (STARFIELD, 2002). 
Outro requisito na configuração de porta de entrada é a exigência de encaminhamento por 
profissionais de atenção primária para acesso à atenção especializada (GIOVANELLA; 
MENDONÇA, 2012). 
A longitudinalidade, segundo atributo, consiste na existência de uma fonte habitual de 
atenção na qual se estabelece uma relação pessoal de longa duração entre profissionais e 
usuários, com prestação de atenção independente da ocorrência de um problema de saúde. 
Trata-se, portanto, de uma atenção orientada para a pessoa ao longo de sua vida (da gestação 
até idades avançadas), considerando as necessidades e especificidade de cada ciclo da vida 
(STARFIELD, 2002). Para sua efetivação é necessário que a APS seja capaz de identificar 
sua população de referência, por meio da adscrição territorial e registro dos usuários 
(GIOVANELLA; MENDONÇA, 2012). 
24 
 
 
A integralidade, o terceiro atributo, diz respeito ao reconhecimento da variedade de 
necessidades relacionadas à saúde do usuário e disponibilização dos serviços e recursos para 
abordá-las. Essas necessidades podem ser tanto sintomas, disfunções ou enfermidades, como 
também intervenções preventivas ou promoção da saúde. Nas situações em que a APS não 
dispõe de recursos ou serviços para adequada intervenção, deve assegurar que seja feito o 
encaminhamento para garantia da atenção integral. Ou seja, a equipe de APS tem a 
responsabilidade de reconhecer essas necessidades e providenciar ou coordenar a prestação de 
serviços em outros locais (STARFIELD, 2002). 
Portanto, para que uma atenção integral seja garantida, os serviços de atenção primária 
devem assumir a responsabilidade pela ‘coordenação’ das diversas ações e serviços 
necessários e garantir a continuidade do cuidado (GIOVANELLA; MENDONÇA, 2012). A 
coordenação, o quarto componente, é essencial para a obtenção dos outros aspectos. Sem ela, 
a longitudinalidade perderia muito de seu potencial, a integralidade seria dificultada e a 
função de primeiro contato tornar-se-ia uma função puramente administrativa (STARFIELD, 
2002). 
A OPAS (2011), além de reconhecer os quatro atributos trazidos pela Bárbara 
Starfield, apresenta outros atributos e funções da APS na organização dos sistemas de saúde, 
quais sejam: focalização na família como o sujeito da atenção; orientação comunitária, com 
reconhecimento das suas necessidades em função do contexto físico, econômico, social; 
competência cultural, com relação horizontal entre equipe e população que respeite as 
singularidades culturais e as preferências das pessoas e das famílias. 
 
2.2.2 O papel da atenção primária na coordenação do cuidado 
 
Um importante papel desempenhado pela atenção primária diz respeito à coordenação 
da continuidade da atenção e do fluxo de informações por todo o sistema de saúde. Tendo em 
vista que os serviços de atenção primária, por si, não são suficientes para atender as 
necessidades mais complexas de cuidados em saúde, torna-se necessário a busca por apoio e 
complemento aos cuidados nos diferentes níveis de atenção, tanto ambulatoriais como 
hospitalares, assim como no restante da rede de proteção social. Isso implica no 
desenvolvimento de mecanismos de coordenação do cuidado ao longo da rede de serviços de 
modo a garantir a continuidade e a qualidade dos serviços prestados. 
25 
 
 
A inserção da APS em redes de atenção à saúde requer, necessariamente, sua 
interpretação como estratégia de reordenamento do sistema de saúde, orientando o cuidado ao 
longo de todos os pontos de atenção. Isso significa, na prática, superar as visões de atenção 
seletiva e de mero nível de atenção. Nessa perspectiva, é comum encontrar na literatura 
expressões que destacam a APS na condução do sistema de saúde, tais como “sistemas de 
saúde baseados na APS” ou em “redes integradas de serviços de saúde baseadas na APS” 
(OPAS, 2011; RODRIGUES et al., 2014). 
No âmbito internacional, observa-se um movimento crescente de discussão e 
implementação de reformas institucionais e políticas na organização dos sistemas de saúde 
para o fortalecimento da APS em prol da coordenação do cuidado e integração da rede 
assistencial. Estas reformas têm sido impulsionadas, principalmente, por contextos 
econômicos restritivos, com políticas de austeridades fiscais e contenção de gastos em saúde 
(GIOVANELLA, 2006; GIOVANELLA;e STEGMÜLLER, 2014). 
No Brasil, estudos abordando a APS na coordenação do cuidado aparecem a partir de 
2006, os quais têm cumprido um importante papel de descrever novas realidades e difundir 
boas práticas de gestão no SUS (RODRIGUES et al., 2014). A necessidade de melhor 
organização do SUS com a constituição de redes integradas, nas quais a coordenação do 
cuidado é assumida como uma responsabilidade ampliada da APS, tem sido objeto de debate 
político e acadêmico no país e aparece presente em diversos documentos normativos do MS 
(BRASIL, 2010; ALMEIDA et al., 2011; BRASIL; 2011). 
Ao coordenar a RAS, estudos evidenciam que a APS eleva sua capacidade de resolver 
os problemas de saúde dos usuários, tornando os sistemas mais custo-efetivos, como também 
pela possibilidade de se ajustar, de acordocom a conjuntura socioeconômica, demográfica e 
epidemiológica (BRASIL, 2010; KRINGOS et al., 2010). Assim, os sistemas de saúde, 
baseados numa forte orientação para a APS, apresentam resultados melhores e mais 
equitativos, são mais eficientes e produzem mais satisfação para os usuários quando 
comparados com sistemas de fraca orientação para a APS (OPAS, 2011). 
Para o exercício da coordenação do cuidado pela equipe de APS são necessários 
mecanismos tais como: tecnologias de gestão clínica; mecanismos adequados de comunicação 
entre profissionais dos diversos pontos de atenção e articulação intersetorial; registro 
adequado de informações e seu uso pelos profissionais dos diversos serviços; existência de 
prontuário de acompanhamento longitudinal e prontuário eletrônico em rede; gestão das listas 
26 
 
 
de espera (encaminhamentos para consultas especializadas, procedimentos e exames); 
protocolos de atenção organizados sob a lógica de linhas de cuidado; discussão e análise de 
casos, de eventos-sentinela e de incidentes críticos (GIOVANELLA; MENDONÇA, 2012; 
STARFIELD, 2002; BRASIL, 2015a, 2016). 
Cecílio et al. (2012) destacam dois movimentos que devem ser implementados na APS 
para constituição da coordenação do cuidado. O primeiro é que a coordenação das redes deve 
assumir múltiplas configurações, incluindo graus diferentes de participação e 
responsabilidade da APS, a depender dos diferentes contextos locorregionais do SUS. O 
segundo movimento vai no sentido de investimentos na APS para que ela possa, 
progressivamente, ampliar sua capacidade de intervir ativamente nos processos regulatórios, 
consolidando gradualmente sua legitimidade perante os usuários. Algumas medidas factíveis, 
e que já têm sido experimentadas em alguns municípios brasileiros, são o acesso direto das 
equipes locais para marcação de consulta, a criação de mecanismos formais de comunicação 
entre profissionais da APS e as centrais reguladoras e qualificação dos processos 
microregulatórios nas unidades (CECILIO et al., 2012). A OPAS (2011) ressalta ainda a 
importância de construir sistemas de educação permanente dos profissionais de saúde, de 
modo a fortalecer a APS na coordenação das redes de atenção à saúde. 
Entretanto, são grandes os desafios para que a APS assuma o papel de coordenadora 
da RAS. Dentre os nós críticos apontados pela literatura destacam-se a falta de política 
institucional direcionada ao fortalecimento da APS; a representação social das comunidades 
sobre esse nível de atenção; a falta de legitimidade social da APS; e a visão restrita de 
gestores que tendem a compreendê-la, por vezes, como seletiva. Ainda, a APS encontra 
desafios, sobretudo, pela dificuldade de se implantar uma rede que permita a integração entre 
os níveis de atenção na sua dimensão vertical e horizontal, bem como pelas fragilidades nos 
sistemas de apoio e logística que sustentem os fluxos de comunicação (RODRIGUES et al., 
2014). 
Um estudo de revisão de literatura encontrou diversas fragilidades relacionadas à APS 
como coordenadora da RAS, tais como: desconhecimento dos vários pontos de atenção pelos 
profissionais de APS; precário funcionamento do mecanismo de referência e contra 
referência; acolhimento incipiente na unidade de saúde; carência de mecanismos e estratégias 
de integração e comunicação e de regulação do acesso pelos diferentes níveis; ausência de 
sistemas informatizados que possibilitem a gestão destes processos e fluxos; descompromisso 
27 
 
 
dos trabalhadores com os resultados organizacionais; dentre outros. Essas fragilidades 
resultam numa notável carência de dispositivos que favoreçam a inovação das práticas, o 
acolhimento dos usuários e a vinculação dos mesmos na APS (RODRIGUES et al., 2014). 
Portanto, para que a equipe de APS consiga coordenar o cuidado nas redes de atenção 
à saúde com efetividade é necessário vontade política dos gestores para maiores investimentos 
na APS (investimento em estrutura física, em tecnologias de comunicação, qualificação dos 
sistemas logísticos e de apoio, capacitação de pessoal, fluxo e processo de trabalho, etc.); 
profissionais comprometidos com o cuidado integral, horizontal e interdisciplinar, baseado no 
agir comunicativo; usuários engajados em prol de novos modelos organizacionais; e 
realização de estudos voltados à APS e RAS. 
 
2.2.3 Características da APS no Brasil 
 
No Brasil, experiências de APS aparecem de forma incipiente na década de 1920, com 
os centros de saúde que, apesar da divisão entre ações curativas e preventivas, organizavam-se 
a partir de uma base populacional e trabalhavam com educação sanitária. A partir da década 
de 1940, foi criado o Serviço Especial de Saúde Pública que realizou ações curativas e 
preventivas, restritas às doenças infecciosas e carenciais e limitada às áreas de relevância 
econômica. Só então na década de 1970 que se dá uma forte expansão da APS no país, através 
do Programa de Interiorização das Ações de Saúde e Saneamento do Nordeste (PIASS), cujo 
objetivo era fazer chegar à população historicamente excluída de acesso à saúde um conjunto 
de ações médicas simplificadas, caracterizando-se como política focalizada de baixa 
resolutividade e referida como APS seletiva. A expansão da APS no país se mantém intensa 
na década de 1980, com a crise da Previdência Social que levou para dentro das unidades de 
APS parte da atenção médica do INAMPS, instituindo as Ações Integradas de Saúde (AIS) 
(LAVRAS, 2011; MENDES, 2012; RIBEIRO,2007). 
Essas experiências somadas aos debates sobre cuidados primários nas VII, VIII e XIX 
Conferência Nacional de Saúde e à constituição do SUS possibilitaram a construção, no país, 
das primeiras políticas de APS ou de Atenção Básica (AB) como tem sido também 
denominada no Brasil (RIBEIRO, 2007; ESCOREL et al., 2007). A implantação do Programa 
de Saúde da Família (PSF), em 1993, o qual também incorporou os preceitos de Alma Ata, é 
um marco da incorporação da APS na política de saúde brasileira. Voltado inicialmente para 
28 
 
 
estender a cobertura assistencial em áreas de maior risco social, aos poucos o PSF foi 
adquirindo centralidade, alçado à condição de estratégia de organização do SUS e 
reorientação do modelo de atenção. Passou então a ser entendido como Estratégia de Saúde da 
Família (ESF), buscando superar a visão da APS seletiva ou de mero nível de cuidados 
primários rumo à abordagem integral (MENDES, 2012; ESCOREL et al., 2007; SILVA et al., 
2010). 
A criação do PSF, agora designado ESF, sofreu influências internas, dos modelos 
brasileiros de APS referidos anteriormente, e externas, em especial, dos modelos de medicina 
familiar canadense, cubano e inglês. Contudo, suas origens mais significativas estão no 
Programa de Agentes de Saúde, do estado do Ceará, em 1987, o qual teve larga repercussão 
política pelos seus resultados positivos, especialmente na redução da mortalidade infantil, 
razão pela qual foi estendido a todo o País, pelo MS, em 1991, com a denominação de 
Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS). 
Em 2006, o MS, levando em consideração essas evidências, edita a Política Nacional 
de Atenção Básica (PNAB) pela Portaria GM n. 648/GM, de 28 de março, ampliando o 
escopo e a concepção da AB ao incorporar os atributos da atenção primária abrangente, 
colocando-a como porta de entrada preferencial do SUS e ponto de partida para reestruturação 
do sistema. Em 2011, a PNAB foi atualizada, modificando conceitos e introduzindo 
elementos ligados ao papel desejado da AB na ordenação das redes de atenção à saúde e 
avançou no reconhecimento de um leque maior de modelagens de equipes para as diferentes 
populações e realidades do Brasil (consultórios na Rua e unidades Fluviais e Ribeirinhas) 
(BRASIL, 2011). Entretanto, o país convive não apenas com unidades de saúde funcionando 
no modelo da ESF, mas também no modelo do PACS (unidades detransição) e no modelo 
tradicional, as quais não implantaram, até momento, o modelo de saúde da família. 
A concepção de atenção primária na ESF preconiza equipe de caráter multiprofissional 
(médico generalista, enfermeiro generalista, auxiliar de enfermagem e agente comunitário de 
saúde) com ou sem equipe de saúde bucal (cirurgião-dentista e auxiliar ou técnico de saúde 
bucal), que trabalha com definição de território de abrangência, adscrição de clientela, 
cadastramento e acompanhamento da população. Pretende-se que a unidade de saúde 
constitua a porta de entrada ao sistema local e o primeiro nível de atenção, o que pressupõe a 
integração à rede. Recomenda-se que cada equipe fique responsável por, no máximo, 4.000 
pessoas, sendo a média recomendada de 3.000, respeitando critérios de equidade. Deve 
29 
 
 
conhecer as famílias do seu território de abrangência, identificar os problemas de saúde e as 
situações de risco, elaborar um programa de atividades para enfrentar os determinantes do 
processo saúde/doença, desenvolver ações educativas e intersetoriais, prestar assistência 
integral às famílias sob sua responsabilidade e coordenar o cuidado na RAS (BRASIL, 2011). 
Nos últimos anos, com a consolidação da APS no Brasil, houve aumento da oferta de 
ações de saúde essenciais à população. O País alcançou uma cobertura estimada de mais da 
metade da população brasileira pela ESF e uma cobertura populacional por outros modelos de 
atenção básica que pode variar entre 20% e 40% (BRASIL, 2014). Atualmente, o Brasil conta 
com 39.943 equipes de saúde da família implantadas em 5.459 municípios, o que representa 
um percentual de 98% dos municípios e uma cobertura de 60,69% de brasileiros atendidos por 
alguma equipe de saúde da família (BRASIL, 2016). 
Diversas iniciativas institucionais têm sido fomentadas pelo governo brasileiro com o 
intuito de fortalecimento da APS no país. Dentre os mais recentes estão a criação dos Núcleos 
de Apoios à Saúde da Família (NASF), em 2008, compostos por profissionais de diferentes 
áreas com o objetivo de ampliar a abrangência e o escopo das ações das equipes de APS; o 
Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica (PMAQ-AB), 
em 2011, visando induzir a ampliação do acesso e a melhoria da qualidade da APS; O 
Programa de Valorização do Profissional da Atenção Básica (PROVAB), em 2011, visando 
estimular a atuação dos profissionais de saúde em localidades com maior carência de serviços 
de APS e a qualificação da formação; e o Programa Mais Médicos, em 2013, com o intuito de 
melhorar a atenção, levando médicos para regiões onde há escassez ou ausência desses 
profissionais, bem como provendo investimentos para construção, reforma e ampliação de 
UBS e criação de novas vagas de graduação e residência médica em diversos estados. 
Quanto à coordenação do cuidado, tem tido destaque na PNAB e em diversos 
documentos normativos do MS o papel protagonista da APS na produção e gestão do cuidado 
integral em rede (BRASIL, 2011, 2015a, 2015b). Esses documentos trazem subsídios teórico 
e prático para a operacionalização da coordenação do cuidado, como se observa na publicação 
do primeiro volume da série “Protocolos de encaminhamentos da atenção básica para a 
atenção especializada”, que visam aumentar a capacidade clínica e de cuidado das equipes de 
APS e a articulação destas com outros pontos da rede, com pactuação de fluxos e protocolos 
(BRASIL, 2015a). Outra importante inciativa é o Programa Nacional Telessaúde Brasil 
Redes, que objetiva ampliar a resolubilidade das equipes e promover sua integração com o 
30 
 
 
conjunto da RAS. O Telessaúde pode ser caracterizado como um serviço de apoio diagnóstico 
e terapêutico, com ênfase no apoio assistencial, por meio das teleconsultorias, possibilitando 
que as equipes intervenham com maior efetividade sobre as práticas de saúde, incluindo ações 
de regulação do fluxo dos pacientes (BRASIL, 2012). 
 
2.2.4 Características da APS no município do Rio de Janeiro 
 
O município do Rio de janeiro, capital do estado do Rio de Janeiro, é a segunda maior 
metrópole do Brasil com 6.320.446 habitantes, sendo 46,83% homens e 53,17% mulheres, e 
uma área de 1.199,828 km2 (IBEG, 2010). É um dos principais centros econômicos, culturais 
e financeiros do país, sendo conhecido mundialmente como uma importante rota de turismo. 
Possui um PIB estimado em aproximadamente 221 bilhões de reais, o segundo maior do país 
(IBGE, 2012). 
Na esfera da saúde, o território do município se divide em Áreas de Planejamento, um 
total de 10, as quais são geridas de forma terceirizadas por Organizações Sociais em Saúde 
(OSS), entidades de direito privado, sem fins lucrativos. As AP têm competências 
administrativas e orçamentárias, tais como controlar os serviços e executar as ações de saúde 
em seu território. 
O sistema de saúde do município do Rio de Janeiro conta com serviços públicos 
municipais, estaduais e federais, serviços privados conveniados (filantrópicos) e serviços 
privados contratados ou não pelo SUS. A rede de atenção à saúde localizada no município é 
composta pela atenção básica e especializada de média e alta complexidade. Dentre os 
serviços que dispõem, estão os hospitais de grande e médio porte, com atendimento 
especializado e de urgência e emergência, maternidades e centros de parto normal, unidades 
de pronto atendimento (UPA), centros de atenção psicossocial (CAPS), os serviços 
residenciais terapêuticos, clínicas/centros de especialidades e policlínicas, centro de atenção 
de hemoterapia e ou hematológica, serviço de atenção domiciliar e serviços de apoio 
diagnóstico e terapêutico. Os serviços de urgência e emergência municipais se configuram 
como portas de entrada integradas com a Defesa Civil, o Serviço de Assistência Médica de 
Urgência (SAMU) e o Grupamento de Socorro e Emergência (GSE). O município conta ainda 
com assistência farmacêutica, serviços de vigilância à saúde, Telessaúde, sistema de 
31 
 
 
regulação e rede informatizada (prontuários eletrônicos) (DATASUS, 2016; RIO DE 
JANEIRO, 2013). 
De acordo com o Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES), o 
município do Rio de Janeiro conta com 1.039 equipes de saúde da família, o que representa 
uma cobertura populacional de mais de 50% (DATASUS, 2016). Informações do Plano 
Estratégico da Prefeitura do Rio de Janeiro 2013-2016 mostram que em 2008 havia 63 
equipes da ESF, representando uma cobertura de 3,5%, tendo aumentado para 27% de 
cobertura em 2011, sendo que alguns bairros como Rocinha, Manguinhos, Mangueira, Acari, 
Rocha, Santa Cruz, e Gardênia alcançaram 100% de cobertura de Saúde da Família. A meta 
divulgada é alcançar, até o fim de 2016, uma cobertura de 70% da população assistida pela 
ESF. 
A APS do município é composta por unidades de saúde da família, postos de saúde 
tradicionais, unidades mistas (ESF e modelo tradicional), consultório de rua e conta com os 
Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASF). Aderiu ao Programa Mais Médicos do 
Governo Federal, recebendo profissionais que ajudam a compor o quadro de médicos das 
equipes de APS do município. 
Em relação à coordenação do cuidado, aparece em diversos documentos publicados 
pelo município o destaque ao papel da APS na coordenação do cuidado na rede. Estes 
documentos se configuram como normatização técnica e subsídios teórico e operacional para 
a coordenação do cuidado realizada pelas equipes de APS no município. 
Como exemplo, está o Protocolo para o Regulador do Sistema de Regulação 
(SISREG), atualizado em março de 2015, no qual constam os critérios para regulação de 
vagas ambulatoriais no município. Esse protocolo orienta os profissionais sobre como deve se 
dar o acesso ao sistema e a solicitação de vagas para consultas especializadas e exames 
complementares, discriminando os quais devem ser regulados, bem como os critériospara 
classificação de prioridade dos encaminhamentos. Cabe ao profissional regulador (médico 
Responsável Técnico (RT) da própria unidade) negar, devolver, deixar como pendente ou 
autorizar a marcação. O protocolo diz que todo caso negado ou devolvido deve ser discutido 
com o profissional solicitante ou em equipe, como proposta de educação permanente. Ainda, 
o protocolo ressalta a importância da APS na coordenação do cuidado dos usuários assistidos, 
sem perder de foco a resolutividade das ações em saúde, devendo solicitar e regular as 
32 
 
 
solicitações de exames/consultas nos casos em que sejam fundamentais para o diagnóstico ou 
acompanhamento (RIO DE JANEIRO, 2015). 
Outros exemplos são os Guias de Referência Rápida para hipertensão, diabetes, 
prevenção cardiovascular, depressão, atenção ao pré-natal, doenças sexualmente transmitidas, 
entre outros, disponíveis no site da Secretaria de Saúde do município, voltados aos 
profissionais de APS de forma a orientá-los na assistência clínica em cada linha de cuidado 
abordada nos guias. Portanto, se configuram em guias que buscam subsidiar o trabalho na 
APS visando à integralidade e à coordenação do cuidado. Como destaque para a coordenação 
do cuidado, podem ser observadas orientações a respeito da realização de plano de cuidado 
compartilhado entre equipe multiprofissional, familiares, usuário, NASF, atenção secundária, 
atenção terciária e outras fontes de matriciamento1; estratificação de riscos; monitoramento do 
manejo terapêutico; e registro em prontuário. 
Outros documentos encontram-se presentes nas publicações técnicas também no site 
da Secretaria de Saúde para subsidiar a coordenação do cuidado do usuário ao longo da rede 
de atenção à saúde, tais como: “Guia de referência e contrarreferência”, preenchida pela APS 
quando do referenciamento do usuário a outros serviços, recebendo de volta com as devidas 
informações da atenção prestada; “Guia Pós Alta Hospitalar”, em que consta as informações 
resumidas sobre a internação hospitalar para ser apresentado à APS quando da alta do usuário; 
a “Ficha de Encaminhamento da Atenção Secundária para a Atenção Primária-Solicitação de 
consulta”, no qual o usuário deve apresentar à APS para continuidade da atenção neste nível, 
dentre outros. 
 
2.3 USUÁRIO DA REDE DE ATENÇÃO À SAÚDE 
 
Os termos usuário, cliente ou paciente são, usualmente, utilizados para designar as 
pessoas que acorrem aos serviços de saúde. Embora muitas vezes utilizados como sinônimos, 
cada um deles possui suas raízes e especificidades que não se trata apenas de questão 
 
1 Matriciamento: Constitui-se na prática de cooperação entre equipes de ESF e suas referências de apoio – 
setoriais e intersetoriais – e como modo de potencializar o trabalho com os cuidados primários em saúde em toda 
sua complexidade. Seria, então, o arranjo entre recursos ofertados para o cuidado em saúde que ocorrem em 
serviços distintos para enriquecer as possibilidades de composição dos projetos terapêuticos individuais 
(CAMPOS, 1999). 
33 
 
 
semântica, visto que propiciam e induzem diferentes maneiras de olhar e compreender os 
objetos nomeados, ou como construímos a realidade (TAKAUTI et al., 2013). 
O termo paciente, segundo Foucault (1998), é um invento do hospital terapêutico do 
século XVIII e hoje é universalmente utilizado e está relacionado com a pessoa que tem 
paciência, sereno, conformado (FERREIRA, 1999), que apesar de sugerir relação mais íntima 
com o profissional que cuida, sua utilização pode sugerir, implicitamente, uma posição 
passiva e hierarquicamente inferior em relação ao profissional. O termo cliente procede do 
vocabulário próprio da economia liberal de mercado, marca o “exercício liberal” e/ou privado 
da atenção à saúde, sugerindo à pessoa que acorre aos serviços de saúde o caráter de 
consumidor e à saúde, a característica de um bem de consumo, não de direito social. Já o 
termo usuário designa cada um daqueles que usa ou desfruta de alguma coisa coletiva, ligada 
a um serviço público ou particular - “usuário do sistema de saúde”, podendo ser 
compreendido como termo mais amplo, capaz de ultrapassar o ideário passivo ou liberal e 
avançando para uma concepção de saúde enquanto direito humano e social, regulado pelas 
relações de cidadania (TAKAUTI et al., 2013). 
A utilização de um desses termos não elimina o uso dos demais, observando-se o uso 
mesclado dos mesmos diariamente nos serviços de saúde, sem que haja uma preocupação no 
que representam (TAKAUTI et al., 2013). Portanto, é preciso atenção no uso das expressões, 
sendo adotado neste trabalho o termo usuário, assim como é adotado pelos documentos 
normativos do governo brasileiro, por acreditar que essa denominação é mais adequada ao 
objeto foco das ações de saúde - o indivíduo portador de direitos e deveres. Assim, o termo 
usuário expressa o indivíduo em sua dinâmica e suas múltiplas e singulares necessidades, 
devendo ser o foco, o objeto, a razão de ser das ações e serviço de saúde e de toda a rede de 
atenção à saúde. 
Cada usuário que busca os cuidados de saúde o faz por possuir necessidades em saúde, 
as quais são social e historicamente determinadas e, portanto, possuem um componente de 
natureza subjetiva e individual, o que significa admitir, explicitamente, o valor e as 
implicações decorrentes deste valor: o individual. Embora a saúde seja um bem coletivo, que 
diz respeito a toda a sociedade, a doença tem características individuais. Assim, a dimensão 
social dos fenômenos da saúde é a síntese das exigências, das condições particulares de cada 
homem ou mulher (STOTZ, 1991). Nesse sentido, falar de necessidades de saúde do usuário 
34 
 
 
requer compreender, além da dimensão social, o contexto mais íntimo e profundo das 
necessidades de cada indivíduo. 
Cecílio (2001), embasado em Stotz (1991), apresenta uma reconceitualização da 
taxonomia das necessidades de saúde. Para ele, estas necessidades podem ser (1) a busca de 
algum tipo de resposta para as más condições de vida que a pessoa viveu ou está vivendo (do 
desemprego à violência no lar); (2) a procura de um vínculo (a)efetivo com algum 
profissional; e (3) a necessidade de ter maior autonomia no modo de andar a vida ou, mesmo, 
de ter acesso a alguma tecnologia de saúde disponível, capaz de melhorar e prolongar sua 
vida. Esta “cestinha de necessidades” precisa ser, de alguma forma, escutada e traduzida pelas 
equipes e serviços de saúde, captada em sua expressão individual, de tal forma que se possa 
efetivar a integralidade na atenção, tanto em nível de um mesmo serviço (“integralidade 
focalizada”) como em nível de rede de atenção à saúde (“integralidade pensada no macro”) 
(CECILIO, 2001). 
A integralidade da atenção pensada em rede, como objeto de reflexão e de (novas) 
práticas da equipe de saúde e sua gerência, passa pela compreensão de que ela não se dá, 
nunca, num lugar só, seja porque as várias tecnologias em saúde para melhorar e prolongar a 
vida estão distribuídas numa ampla gama de serviços, seja porque a melhoria das condições 
de vida é tarefa para um esforço intersetorial (CECILIO, 2001). Nesse sentido, garantir ao 
usuário o acesso e continuidade da atenção no interior da rede de serviços, com integralidade 
na atenção, é fundamental e deve ser tomado como responsabilidade de todos (Estado, 
sociedade e famílias), considerando que o acesso e a qualidade dos cuidados em saúde são 
direitos sociais e humanos fundamentais, como consta na Declaração Universal dos Direitos 
Humanos e escrito na Constituição Federal. 
Desse modo, uma rede de atenção à saúde estruturada e integrada possibilita aos seus 
usuários um atendimento às suas necessidades em saúde, que leve em conta as especificidades 
culturais, ambientais e socioeconômicas de forma individual dentro do coletivo em que se 
insere. Logo, a coordenação do cuidado ao usuário no interior da rede é um atributo

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