Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
ESTUDO DAS RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS PARA O ENSINO DE HISTÓRIA E CULTURA AFRO-BRASILEIRA, AFRICANA E INDÍGENA AULA 5 Prof. Elston Americo Jr./Prof. Iziquiel Antônio Radvanskei 2 CONVERSA INICIAL Nesta aula, nos debruçaremos sobre a materialização dos pensamentos contemporâneos sobre a questão étnico-racial no sistema educacional. Como vimos anteriormente, a virada dos anos 1990 para os anos 2000 trouxe para o Brasil um debate internacional de reconhecimento das desigualdades sociais ocasionadas por discriminações étnicas. Conforme estabeleceu nossa Constituição em 1988, o Brasil, do ponto de vista jurídico, entendeu que a situação racial possui interferência nas relações sociais, reforçando a necessidade do Estado em criar políticas públicas que combatam tal situação. Neste momento, aprofundaremos nosso conhecimento sobre as políticas públicas educacionais que inseriram o tema étnico-racial nos currículos escolares, baseadas em mecanismos legais que têm como pano de fundo reconhecer a desigualdade racial e proporcionar a consciência da formação do povo brasileiro conforme sua multiculturalidade. TEMA 1 – GLOBALIZAÇÃO, NAÇÕES MULTICULTURAIS E IDENTIDADES Para entender a introdução dos temas étnico-raciais nos currículos escolares, temos de compreender a situação global e a discussão em torno das culturas e identidades dos grupos sociais. Com a emergência da pós-modernidade, ou seja, das relações sociais advindas do mundo globalizado, a questão identitária foi centralizada nos debates filosóficos e sociológicos. A razão desse debate estava de acordo com os efeitos do mundo globalizado: se de um lado as trocas culturais se intensificaram e derrubaram as fronteiras, de outro ocorreu a imposição cultural de determinadas nações sobre outras, como mostrou o fenômeno da americanização dos costumes da cultura ocidentalizada baseada na hegemonia branca (Santos, 1997). Assim, os debates étnico-raciais se voltam para o multiculturalismo na busca de reforçar as identidades, entendendo que a própria globalização pode ser útil para compartilhar as culturas ao redor do globo. TEMA 2 – IDENTIDADES: ENTRE A IGUALDADE E A DIFERENÇA Nesses debates acerca da questão identitária, criou-se a seguinte problemática: como estabelecer a igualdade sem danificar o direito a ser 3 diferente, ou seja, de que maneira alcançar a igualdade social de acesso à cidadania sem homogeneizar a sociedade do ponto de vista cultural? A primeira questão que deve ser apresentada é aquela sobre o conceito de identidade, que se configura pela constituição das subjetividades do indivíduo conforme sua personalidade, o que influi na criação e na troca de aspectos culturais constantemente. Nesse ponto, se estabelece o direito à diferença, ou o direito à diversidade, que se configura em reconhecer que todos os sujeitos podem expressar suas identidades. No que tange à igualdade, as políticas públicas preferem trabalhar com o conceito de equidade, que estabelece a noção de igualdade no acesso à cidadania sem a necessidade de o sujeito ser igual no aspecto cultural (Candau, 2008). TEMA 3 – MARCOS LEGAIS DE INTRODUÇÃO DAS TEMÁTICAS ÉTNICO- RACIAIS NOS CURRICIULOS ESCOLARES Após entender as noções de identidade, equidade e diferença, podemos adentrar a legislação que materializou essas noções nas políticas públicas educacionais, sobretudo nos currículos escolares. Neste tema, apresentaremos algumas das principais leis e seus respectivos objetivos. Como sabemos, a Lei de Diretrizes e Bases (LDB) (Lei n. 9.394/1996) é o documento que norteia a educação brasileira, seja ela pública, seja ela privada, independentemente do nível – ela abrange desde o ensino infantil até à educação superior. A Lei n. 10.639/2003, bem como a Lei n. 11.645/2008, alteraram a LDB, instituindo o art. 26-A, que obriga a introdução da história e das culturas africanas, indígenas e afro-brasileiras na educação básica. Tal legislação está atrelada a alguns objetivos: compreender a multiculturalidade na formação do povo brasileiro, entender as noções de igualdade e diferença e reconhecer as situações históricas de desigualdade social de determinados grupos culturais. TEMA 4 – A NOÇÃO MULTICULTURAL PRESENTE NO CURRÍCULO ESCOLAR Para a efetivação da legislação citada anteriormente, faz-se necessária a adequação da noção de currículo conforme se fundamentaram as respectivas leis. Por currículo se entende todo o caminho que o estudante deve percorrer 4 para adquirir os fundamentos básicos de determinado nível escolar, ou seja, são as disciplinas e os assuntos obrigatórios do ensino básico. A legislação de que estamos tratando nesta aula entende que o currículo deve ser multicultural, incorporando temas como diversidade, identidade e culturas, cabendo aos profissionais da área realizar tais tarefas. No entanto, no meio social – com a interferência de lutas sociais, ideologias, poderes –, a materialização da legislação sofre resistências ocasionadas por outras noções de currículo, sobretudo por um imaginário colonial, que entende o mundo a partir de uma visão eurocêntrica, fundada nos mesmos princípios das teorias de branqueamento, bem como da democracia racial. TEMA 5 – DIFICULDADES NA MATERIALIZAÇÃO DA LEI N. 10.639/2003 E DA LEI N. 11.645/2008 Como citado anteriormente, a real introdução da história e da cultura africanas, afro-brasileiras e indígenas na grade curricular é realizada por agentes sociais no cotidiano das instituições escolares. Assim, devemos nos atentar a esses profissionais para a formalização do que está reconhecido na legislação. No estudo realizado por Gomes e Jesus (2013) sobre a situação da introdução do tema nas escolas públicas, os autores obtiveram alguns resultados, entre eles: o frágil conhecimento do assunto por professores; resistências de algumas escolas em debater o tema devido a ideologias dos profissionais; a necessidade de se debater o tema nos projetos político- pedagógicos. Tais dados remetem a estratégias que devemos agregar para a efetivação da lei, entre elas a necessidade de formação continuada e permanente dos profissionais sobre a temática e a discussão democrática em cada instituição na elaboração de seus projetos. NA PRÁTICA Leia atentamente a Lei n. 10.639/2003 e a Lei n. 11.645/2008, que estabeleceram o ensino da história e da cultura africanas e afro-brasileiras nos currículos da educação básica. Após a leitura, elabore um esquema – em formato textual, de tabelas, tópicos etc. – que relacione dificuldades, recomendações e estratégias que você, como um docente da educação básica, 5 tem para ministrar suas aulas e projetos pedagógicos conforme o currículo multicultural que a respectiva legislação estabelece. FINALIZANDO A legislação educacional brasileira das últimas décadas trouxe avanços ao adotar as recomendações das organizações internacionais e introduzir um currículo multicultural, que enaltece os debates acerca de identidades e diversidade e reconhece as variadas culturas locais na formação da sociedade. A Lei n. 10.639/2003 e a Lei 11.645/2008 estabeleceram um marco ao alterar a Lei de Diretrizes e Bases (Lei n. 9.394/1996) e introduzir no currículo da educação básica a história e a cultura africanas e afro-brasileiras. Ainda assim, mesmo que a legislação tenha reconhecido a necessidade dessa política pública na busca de combater a desigualdade racial historicamente estabelecida na sociedade brasileira, percebemos que ainda se faz necessário adotar medidas de formação continuada dos professores nos temas elucidados pela legislação, bem como enaltecer os princípios democráticos na elaboração e na operacionalização dos projetos político-pedagógicos, entendendo a equidade na educação. 6 REFERÊNCIAS BRASIL. Lei n. 9.394,de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Diário oficial da União, Poder Legislativo, Brasília, DF, 23 dez. 1996. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9394.htm>. Acesso em: 29 nov. 2019. _____. Lei n. 10.639, de 9 de janeiro de 2003. Altera a Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática "História e Cultura Afro-Brasileira", e dá outras providências. Diário Oficial da União, Poder Legislativo, Brasília, DF, 10 jan. 2003. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/L10.639.htm>. Acesso em: 29 nov. 2019. _____. Lei n. 11.645, de 10 de março de 2008. Altera a Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996, modificada pela Lei n. 10.639, de 9 de janeiro de 2003, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro- Brasileira e Indígena”. Diário Oficial da União, Poder Legislativo, Brasília, DF, 11 mar. 2008. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007- 2010/2008/Lei/L11645.htm>. Acesso em: 29 nov. 2019. CANDAU, V. M. Direitos humanos, educação e interculturalidade: as tensões entre igualdade e diferença. Revista Brasileira de Educação, Rio de Janeiro, v. 13, n. 37, p. 45-56, jan./abr. 2008. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/rbedu/v13n37/05.pdf>. Acesso em: 29 nov. 2019. GOMES, N. L.; JESUS, R. E. As práticas pedagógicas de trabalho com relações étnico-raciais na escola na perspectiva da Lei 10.639/2003: desafios para a política educacional e indagações para a pesquisa. Educar em Revista, Curitiba, n. 47, p. 19-33, jan./mar. 2013. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104- 40602013000100003>. Acesso em: 29 nov. 2019. SANTOS, B. S. Por uma concepção multicultural dos direitos humanos. Revista Crítica de Ciências Sociais, São Paulo, n. 48, p. 11-32, jun. 1997. Disponível em: <http://www.boaventuradesousasantos.pt/media/pdfs/Concepcao_multicultural_ direitos_humanos_RCCS48.PDF>. Acesso em: 29 nov. 2019.
Compartilhar