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Ceo blackwolf

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Copyright © 2022 Lettie S.J.
1ª Edição | Março/2022
Obra registrada no AVCTORIS
Todos os direitos reservados. Proibida a reprodução, armazenamento ou transmissão de qualquer parte
desse livro, por quaisquer meios existentes, sem a prévia autorização por escrito da autora.
Esta é uma obra de ficção. Todos os nomes, personagens e acontecimentos descritos são produtos da
imaginação da autora. Qualquer semelhança com nomes, pessoas ou fatos reais é mera coincidência.
Edição Digital | Brasil
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Sumário
Sinopse
Playlist
Nota de Autora
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28
Capítulo 29
Capítulo 30
Capítulo 31
Capítulo 32
Capítulo 33
Capítulo 34
Capítulo 35
Capítulo 36
Capítulo 37
Capítulo 38
Capítulo 39
Capítulo 40
Capítulo 41
Capítulo 42
Capítulo 43
Capítulo 44
Capítulo 45
Capítulo 46
Capítulo 47
Capítulo 48
Capítulo 49
Capítulo 50
Capítulo 51
Capítulo 52
Capítulo 53
Capítulo 54
Epílogo
Biografia e Redes Sociais
Sinopse
Um erro crasso acontece na clínica de reprodução
humana onde o poderoso CEO Tyler Blackwolf deixou o seu
sêmen congelado para ter filhos quando fosse mais conveniente.
Ele mesmo havia nascido de uma inseminação artificial e nunca
conheceu a própria mãe, portanto, na concepção fria de sua
mente calculista, aquele era o método mais seguro e confiável
de ter o próprio filho. Conhecido no mundo financeiro como O
Lobo Negro de Wall Street, não apenas por causa do seu
sobrenome, mas por ser um predador implacável nos negócios,
Tyler pretendia escolher todas as características físicas e
genéticas da mulher que seria a mãe do seu herdeiro. Contudo, o
destino não pode ser controlado, mesmo para um CEO
poderoso. Por causa desse erro, a filha do seu pior inimigo é
inseminada com o sêmen dele e engravida do meticulosamente
planejado herdeiro Blackwolf.
Michelle Barton sempre sonhou com o homem ideal,
mas nunca teve a sorte de encontrá-lo, apesar dos vários
pretendentes que tinha, todos almejando ser o marido da filha do
banqueiro Colin Barton. Após uma fatalidade, Michelle decide
ser mãe solo e recorre à clínica de fertilização mais renomada
do país para engravidar, escolhendo um pai que tivesse as
características físicas do homem dos seus sonhos, que seria um
doador anônimo. Um doador que deixou de ser anônimo quando
o erro foi descoberto e um certo CEO vingativo surgiu na sua
vida, cheio de exigências, mas também de ódio.
O que nenhum deles esperava era o perigo que aquela
gravidez traria. Tyler e Michelle terão suas vidas viradas pelo
avesso por um filho muito desejado por ambos, ainda que por
motivos diferentes.
Playlist
Love Bites — Def Leppard
Skyfall — Adele
Still Don’t Know My Name — Labrinth
Middle Of The Night — Elley Duhé
Mountains — Carolina Deslandes ft. Agir
Arcade — Duncan Laurence ft. Fletcher
Frozen — Madonna
It’ll Be Okay — Shawn Mendes
Summertime Sadness — Lana Del Rey
Não Me Perdoei — Victor e Leo
Mais ou Menos Isto — Rita Rocha
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Nota de Autora
Oi, meus amores.
Preparadas para mais uma viagem emocionante
comigo? Desta vez, o nosso destino é Wall Street em Manhattan,
o centro financeiro americano. Vamos conhecer a exclusiva
Billionaires’ Row, onde mora o bilionário da Forbes, Tyler
Blackwolf. O sobrenome dele já diz tudo, não é mesmo? Não é
à toa que este CEO é conhecido no mundo financeiro como O
Lobo Negro de Wall Street.
Neste livro, vou abordar algumas curiosidades sobre a
inseminação artificial, um mundo que passei a conhecer melhor
depois das pesquisas que fiz para construir o enredo. Garanto
que há coisas bem interessantes que acontecem no ramo e que
talvez surpreendam vocês, por isso estejam atentas às notas de
rodapé.
O livro tem alguns gatilhos, mas não os descrevi
demais, um cuidado que sempre tenho ao escrever. Há apenas
uma menção à depressão e ao suicídio.
Agora, venham comigo conhecer Blackwolf, o lobo
negro de Wall Street.
Boa leitura, obrigada por estarem aqui e não se
esqueçam de avaliar o livro no final. Que o coração de vocês
fique bem quentinho (e outras partes do corpo também, rsrs)
com esta história de amor. Mais um dos meus amores
predestinados, do jeitinho que eu gosto.
Beijinho!
Se você está lendo este livro em outro lugar que não
seja a Amazon — Kindle Unlimited, onde ele foi originalmente
publicado, saiba que está colaborando indiretamente com a
distribuição ilegal da obra e deixando de ajudar a autora.
Conheça o Kindle Unlimited da Amazon, um sistema de leitura
online onde terá acesso a milhares de livros por um preço
acessível.
Lettie S.J.
Capítulo 1
Nova York
Tyler
— Estou surpreso com a sua vinda ao meu escritório.
— Cumprimentei Gary com um caloroso aperto de mãos e me
sentei, observando-o com atenção. — Você está com uma cara
terrível. Aconteceu alguma coisa que eu possa ajudar?
Gary era meu primo, mas também era o melhor amigo
que eu tinha desde a infância, uma das poucas pessoas que me
entendiam. Eu tinha de admitir que me entender não era algo
fácil para os outros, muito menos ser meu amigo, por isso
valorizava ainda mais a nossa amizade.
Estranhei a expressão carregada que ele trazia no rosto
e que sequer conseguia disfarçar.
— Eu precisava falar com você o mais rápido possível
e já adianto que não será um assunto fácil.
— Ser for algum problema que a clínica esteja
passando, sabe que é só me dizer e ajudo.
Gary era médico ginecologista especializado em
reprodução humana e recentemente havia realizado o sonho de
sair do hospital onde trabalhava e abrir a sua própria clínica de
reprodução assistida. Eu não duvidava do sucesso da Plan Life1,
mas talvez ele estivesse precisando de ajuda financeira para um
investimento maior na empresa.
— O problema não é comigo, mas com você, Tyler. Na
verdade, é um problemão.
Recostei-me contra o espaldar da cadeira, olhando-o
com seriedade. Eu não imaginava que problemão seria aquele,
considerando que eu tinha tudo da minha vida muito bem
controlado.
— Então diga logo o que é e não faça mais drama. Se
há um problema me envolvendo, quero saber agora do que se
trata — falei calmamente, apesar do meu tom de voz ter soado
muito duro. — Você sabe que não gosto de rodeios.
— Não vou fazer rodeios, apenas quis preparar você
antes.
— Me preparar para o quê?
Ele suspirou profundamente, contraindo os lábios finos
em um gesto tenso e passando a mão com nervosismo pelos
cabelos louros, como se estivesse se enchendo de coragem para
falar. Aguardei, tentando não perder a paciência com tanto
drama. Gary era um excelente amigo e um profissional
competente, mas pecava pelo excesso de sentimentalismo.
— Tem uma mulher que está grávida do seu filho.
Impassível, continuei olhando para ele enquanto a
informação entrava no meu cérebro e era analisada friamente.
Aquele suposto problemão não existia.
— Não sou doido de foder sem preservativo com
tantas infecções sexuais por aí. Nenhuma mulher pode estar
grávida de um filho meu.
— Sim, pode — ele afirmou com convicção. — Você
não entendeu. Houve um erro na Fertile Future2 e engravidaramuma mulher com o seu sêmen que foi criopreservado3.
Desencostei-me lentamente da cadeira e me inclinei na
direção dele, apoiando os antebraços nos joelhos.
— O que foi que você disse?! — Apesar do meu tom
de voz controlado, eu me sentia enfurecer por dentro. — Me
conte isso direito.
— É isso mesmo que você ouviu. Fiquei sabendo hoje
pela manhã e vim correndo lhe contar assim que pude. O assunto
é tão sério que não quis falar por telefone.
Inspirei fundo, enchendo o peito de ar para
descomprimir a tensão.
— Quero os detalhes.
— Tenho um amigo médico que trabalha na Fertile
Future. Ele foi hoje na minha clínica para falar comigo em
caráter confidencial e contou tudo o que aconteceu.
Confundiram o seu nome com o de um doador anônimo que foi
escolhido por uma paciente. Ela foi inseminada com o seu
sêmen e não com o dele. Só depois que tudo estava feito e a
mulher já tinha ido para casa foi que perceberam o erro.
Porra! Eu não estou acreditando nesta merda!
— Quando foi isso?
— Há um mês.
— Um mês?! — rugi, cerrando os punhos de raiva. —
E até agora ninguém me disse nada?
— O coordenador do departamento se reuniu com os
responsáveis para decidir o que fazer, mas a decisão sem
dúvida foi abafar o caso, já que ninguém entrou em contato com
você. Segundo Philip me contou, esta não foi a primeira vez que
aconteceu um erro desse tipo no departamento, apesar de ter
sido a primeira vez envolvendo um dos clientes VIP4. Das vezes
anteriores, eles abafaram o caso dentro do departamento assim
que ficaram sabendo, sem passar o ocorrido para a diretoria. O
coordenador quis se preservar no emprego, sem dúvida. Depois
que o primeiro erro é encoberto, a situação se transforma em
uma bola de neve e todos os erros seguintes também precisam
ser acobertados. Um escândalo de troca de embriões mancharia
a reputação da clínica e significaria a demissão de muita gente.
O absurdo daquilo me enfureceu ainda mais. Levantei-
me da cadeira, sem acreditar que o meu sêmen foi usado
indevidamente por um bando de incompetentes.
— Como é que você me indica uma clínica merda
dessas, Gary? — rugi, cerrando os punhos de raiva.
Ele se levantou também, fazendo um gesto conciliador
com as mãos para me acalmar.
— Eu nunca soube de nada que desabonasse o trabalho
deles, Tyler! Aquela clínica é considerada a melhor do país.
Para mim e para muitos médicos da área, a Fertile Future
sempre foi uma referência, um exemplo de profissionalismo. Foi
por isso que a indiquei anos atrás para você quando me pediu
orientação. Jamais pensei que eles encobrissem erros dessa
natureza, o que é extremamente antiético.
— Antiético uma porra! Isso é um crime e eles vão
pagar. Hoje mesmo vou acionar os meus advogados para entrar
com um processo gigantesco contra eles. Quero todos os
responsáveis atrás das grades e ver a merda daquela clínica
fechada!
— Não faça nada de cabeça quente.
— Você ainda não me viu de cabeça quente, Gary —
garanti, mesmo me sentindo ferver de raiva.
— E nem quero ver — ele desabafou, voltando a se
sentar pesadamente na cadeira. — Estou me sentindo culpado
por ter colocado você nesta situação ao indicar a Fertile Future.
Sei que você estava planejando esse filho para depois que
conseguisse incorporar o banco de Colin Barton ao seu, porque
antes precisa estar focado nesta aquisição.
Só de ouvir falar o nome de Colin Barton, a minha
raiva aumentou. Há anos que eu lutava para comprar o Barton
Bank5 e tirar a família Barton do poder. Aquilo era uma questão
de honra para mim, desde que o meu pai havia falecido sem
conseguir destruir o homem que foi o seu maior inimigo durante
décadas.
Ambos foram amigos e estudaram até finalizar a
faculdade de Finanças, ocasião em que decidiram abrir uma
instituição financeira juntos e seguir como sócios, consolidando
a amizade que já existia. Mas Colin Barton era por demais
ambicioso e um grande cafajeste. Traiu o amigo e se apoderou
do banco anos depois, tirando o meu pai da sociedade sob a
alegação de desvio de dinheiro.
Foi humilhante e vergonhoso para o meu pai, que ainda
sofreu um outro duro golpe ao ver a mulher que amava se
casando com o seu ex-amigo e pior inimigo. Margaret Barton o
abandonou quando ele perdeu o prestígio, a reputação e,
logicamente, o dinheiro também.
Apesar de o meu pai nunca ter comentado nada comigo,
eu desconfiava que a traição da mulher que ele amava havia
sido um golpe mais duro do que a perda financeira ou a queda
de sua reputação. Eu não duvidava que ele tirou forças do ódio
para se reerguer décadas depois, tornando-se mais rico e
poderoso do que o homem que o traiu.
O objetivo principal da vida do meu pai tinha sido
tomar de volta tudo o que Colin Barton havia tirado dele, exceto
a mulher. A traição de Margaret Barton o deixou marcado, a
ponto de nunca ter se casado na vida. Quando quis ter um filho,
foi por inseminação artificial.
Ele foi honesto comigo e não escondeu a maneira como
fui gerado. Como nunca tive uma mãe, a ausência dela não me
fez falta. Em contrapartida, o relacionamento que eu tinha com o
meu pai era perfeito, sempre fomos verdadeiros amigos e não
apenas pai e filho. Fomos companheiros em tudo e a morte dele
aos sessenta e três anos, vítima de um câncer de pâncreas,
deixou-me devastado. Foi a luta do meu pai contra o câncer que
me fez tomar a decisão de congelar o meu sêmen e garantir que
teria espermatozoides saudáveis no futuro, quando decidisse
que estava na hora de ter o meu filho.
Há três anos que eu estava lutando sozinho para
adquirir o Barton Bank e não faltava muito mais para aquilo
acontecer. Eu vingaria o meu pai, destruindo de vez o homem
que o traiu.
Depois que aquilo acontecesse, eu teria o meu filho por
inseminação artificial, seguindo o exemplo do homem que foi o
meu herói a vida inteira, e não apenas um pai. Planejei passo a
passo aquele filho. Agora, aos trinta e cinco anos, eu estava
preparado para ser um pai igual ao que tive.
Fui criado por uma governanta que eu adorava e que
até hoje trabalhava para mim. O mesmo aconteceria com o meu
filho, que teria um pai tão amigo que compensaria a ausência de
uma mãe. As mulheres eram muito traiçoeiras e eu não queria
que nenhuma delas tivesse direitos sobre o meu filho.
Voltei a inspirar profundamente, tentando manter o
foco, apesar de me sentir enfurecido com a Fertile Future. Eu
nem queria pensar que o filho que planejei com tanto cuidado ia
nascer antes da hora e de uma mãe que não escolhi, de uma
mulher que nunca vi e que eu nem sabia quem era.
— Quero a ficha completa da mulher que está com o
meu filho na barriga.
— Merda! — Gary blasfemou, fazendo uma careta e
desviando o olhar do meu, o que me deixou desconfiado.
— Gary — rosnei em tom ameaçador.
Ele bufou, exasperado.
— Todas as provas foram recolhidas, para não deixar
pistas e ninguém descobrir depois o que aconteceu. Podem até
ter sido eliminadas, que é o mais provável. Este é o
procedimento padrão da coordenação, segundo Philip me
contou. Ele só ficou sabendo por que a namorada trabalha no
setor responsável e uma amiga confidenciou para ela ontem o
que aconteceu. Mila desabafou com ele quando estavam em
casa. Os dois estão pensando seriamente em sair de lá.
Inclusive, Philip aproveitou para perguntar se ambos poderiam
trabalhar comigo na Plan Life — ele contou, ajeitando
nervosamente os óculos sobre o nariz. — Philip e Mila sabem
dos problemas que vão ter caso acusem a clínica sem prova
alguma em mãos, por isso ele me pediu sigilo. Para ser bem
sincero, acho que ele só me contou, porque sou seu primo e
quiseram que eu prevenisse você. Vai ser sempre a palavra do
coordenador contra a de qualquer funcionário que se atreva a
falar algo fora da clínica, o que nunca aconteceu até hoje.
Paralisei, incapaz de acreditar que nunca veria o meu
filho.
Filhos da puta!
— Alguém lá dentro deve saber quem foi a mulher.
— Pode ser que sim, mas Philip e Mila agora não têm
mais como saber quem é ela. A única coisa que Philip sabe, é
que a mulher era alguém importante, porque foi atendida no
andar VIPda clínica. O seu sêmen foi enviado para o setor que
faz inseminação artificial intrauterina e não as fertilizações in
vitro. A mulher recebeu os espermatozoides direto no útero para
que a fecundação acontecesse lá dentro — ele me explicou os
detalhes técnicos.
— Então, ela é a mãe.
— Sim, é. Se fosse uma fertilização in vitro, o óvulo
poderia ser de qualquer outra mulher, já que a fecundação
acontece em laboratório e só precisamos de um espermatozoide
e de um óvulo, seja de quem for. A tal mulher poderia até ser
apenas uma portadora de gestação, a conhecida barriga de
aluguel, que receberia dentro do útero o embrião já
desenvolvido em laboratório de um casal qualquer, por
exemplo. Só que este não foi o caso. A mulher que está há um
mês grávida do seu filho, recebeu os seus melhores
espermatozoides para que fecundassem um óvulo dela,
entendeu?
Porra! A mulher é a mãe do meu filho e eu nem sei
como ela é!
— Há alguma chance de essa fecundação não ter
acontecido e ela não estar com o meu filho na barriga?
— Sim, claro que há uma chance, mas eu não contaria
com isso se fosse você. A mulher pode, inclusive, engravidar de
gêmeos.
— Eu não estou conseguindo acreditar nesta merda! —
estourei, afastando-me de Gary antes que descontasse no meu
primo a raiva que estava sentindo.
Eu preciso encontrar essa mulher a todo custo!
Andei durante um bom tempo em frente à parede de
vidro do meu escritório em Manhattan, pensando nas
implicações do que havia acontecido. Afinal, aquele era mesmo
um problemão, como Gary havia dito.
Minutos depois, virei-me para ele, que aguardava
pacientemente na cadeira.
— O funcionário que descobriu o erro deve saber
quem é ela — falei, convicto. — Converse com o seu amigo e
peça a ele que convença a namorada a conseguir essa
informação para mim. Eu pago o quanto for preciso para
descobrir quem é a mulher que está com o meu filho.
Capítulo 2
Michelle
Voltei a arrumar o porta-retrato com a foto da minha
mãe sobre o console da lareira do apartamento que eu havia
comprado meses atrás, controlando as lágrimas que teimavam
em cair. Não havia feito nem um ano da morte dela, mas eu
ainda não tinha conseguido superar aquela perda.
Na foto, a minha mãe sorria ternamente ao meu lado,
nós duas abraçadas e felizes em umas férias que tiramos em
Paris. Apesar dos sérios problemas que tínhamos em casa, a
felicidade era tanta quando estávamos juntas que nos
esquecíamos de tudo.
Como sinto sua falta, mãe!
Depois da morte dela, permanecer na mansão fria da
família Barton se tornou algo impossível para mim. Ainda
passei alguns meses tentando, até desistir. Depois, decidi lutar
para conseguir sair de lá, mesmo contra a vontade do meu pai.
Graças a Deus, consegui.
Só fiquei triste em deixar o meu irmão para trás, que
lidaria sozinho com a personalidade despótica do poderoso
Colin Barton. Andrew era dez anos mais velho do que eu. Entre
nós dois, a minha mãe teve um aborto espontâneo bem antes de
eu nascer.
O meu irmão aguentava a custo o nosso pai.
Infelizmente, por ser o único filho homem, tinha de cumprir o
papel de herdeiro interessado nos negócios da família, quando
eu sabia que a verdadeira vocação dele era a pintura, igual a
mim. Eu achava que Andrew possuía um talento inquestionável,
algo que nunca consegui alcançar com os quadros que pintava.
Como nunca pude me especializar, a pintura acabou se
transformando em uma fuga para mim, uma terapia, mas para ele
era uma necessidade da alma. Contudo, como dizer aquilo para
um pai castrador que o forçava a ser um executivo de terno e
gravata?
Suspirei com tristeza, afastando-me da lareira e
observando a decoração que fiz no meu novo apartamento. Ele
era minúsculo, se comparado com a grandiosidade da mansão
Barton, mas era meu. Eu o havia comprado graças à minha mãe,
que sabiamente deixou um bom dinheiro para mim guardado em
uma conta secreta que abriu no BW Bank6, um banco
concorrente do Barton Bank, que era o banco do meu pai. Ela
sabia que apenas lá os tentáculos do marido não a alcançariam.
Se eu fosse depender do dinheiro do meu pai para sair
de casa, seria obrigada a viver eternamente presa lá. Fui criada
por ele para ser uma “esposa exemplar” e não uma mulher dona
da própria vida, com uma carreira e ambições próprias. Se não
fosse pela minha mãe, a minha vida teria sido sufocante.
Anos sendo apenas a “filha de Colin Barton” me
deixou despreparada para o mundo. Eu não tinha uma profissão
definida e o dinheiro que a minha mãe deixou não duraria para
sempre. Precisaria gerir muito bem cada centavo, pois pretendia
que sobrasse o suficiente para terminar os estudos depois que o
meu filho nascesse. Eu tinha planos de me formar em artes
plásticas, algo que sempre quis fazer e não pude.
Era preciso encontrar uma maneira de sobreviver no
futuro, ainda mais com a chegada do meu filho.
Deitei-me no sofá da sala com um sorriso de
satisfação, acariciando a minha barriga.
— Em alguns meses estaremos juntos, fofinho. Lá do
céu onde a vovó está, tenho certeza de que ela está muito feliz
com a sua chegada.
Aquela gravidez foi muito bem pensada durante o ano
que passei de luto. Uma decisão que tomei ao me lembrar da
história de vida da minha mãe. Como sempre fomos amigas e
confidentes, ela havia me contado em segredo sobre o namorado
por quem foi apaixonada na adolescência e a quem teve de
abandonar para se casar com o meu pai.
Igual a mim, a minha mãe foi criada para ser a esposa
exemplar de um bem-sucedido homem de negócios e tinha o
futuro garantido ao lado do homem que amava. Até o dia em que
ele foi acusado de fraude financeira e o meu avô a proibiu de o
ver novamente. O meu pai, que sempre esteve interessado nela,
falou com o meu avô e a pediu em casamento. Obviamente que
foi aprovado pela família inteira e ela foi obrigada a se casar.
— Eu me arrependi muito de não ter lutado para ficar
com ele quando o seu avô me forçou a me casar com o seu pai
— ela havia me confidenciado em uma ocasião em que
estávamos sozinhas no meu quarto. — Eu era virgem naquela
época. Em vez de ter tido a minha primeira vez com o homem
que amava, tive com o seu pai depois do casamento. Quando
chegar a sua vez, não deixe que ninguém a force a aceitar um
homem que não ame, filha. Só se case por amor.
— Até hoje não conheci ninguém que me interessasse,
mãe. Deve ter algo de errado comigo.
Ela riu, meneando a cabeça e me olhando com amor.
— Não tem nada de errado com você, fofinha. Os
homens que conheceu até hoje é que foram os errados. No tempo
certo, Deus vai colocar no seu caminho o homem ideal.
O problema era que o meu homem ideal parecia não
existir. Eu já estava com vinte e sete anos e nunca tinha me
apaixonado na vida. Pretendentes não faltavam, mas eram todos
homens de negócios iguais ao meu pai, que só queriam uma
esposa rica para aumentar ainda mais a própria riqueza.
A última coisa que eu queria, era que o meu pai
começasse a me pressionar para aceitar a proposta de algum
pretendente indesejado, como Nicholas Brooks, o homem
considerado por ele como o genro perfeito. Enquanto a minha
mãe estava viva, nós duas conseguimos evitar aquela tragédia,
mas depois da morte dela, o meu pai não esperou mais do que
seis meses para começar a falar de casamento para mim.
Antes que a pressão fosse insustentável, encontrei
aquele apartamento com a ajuda de Andrew e o comprei com
parte do dinheiro que a minha mãe havia deixado. Na semana
seguinte, comuniquei a minha saída de casa.
— Você ficou louca?! — o meu pai havia gritado,
enfurecido. — Não vai sair de casa e ponto final!
— Sou livre para sair — lembrei-o o mais calmamente
possível. — O senhor vai me prender aqui?
— Claro que ele não vai — Andrew afirmou,
defendendo-me e deixando evidente que me apoiava. — Você já
é maior de idade e pode ir morar onde quiser.
O meu pai ficou vermelho de raiva.
— E vai se sustentar com qual dinheiro? — perguntou,
usando o seu poder financeiro sobre mim. — Não vou lhe dar
nem um centavo, muito menos sustentar você fora de casa.
Eu sabia daquilo e agradecimentalmente à minha mãe
por ter pensado em mim ao abrir aquela conta secreta.
— Tenho algumas economias.
— E elas vão durar a vida inteira? — Ele foi
sarcástico no comentário.
— Trabalharei para me sustentar.
A gargalhada dele se espalhou pela ampla sala de
jantar onde nós três fazíamos a refeição.
— Você não sabe fazer nada! Vai trabalhar em quê?
— Nunca é tarde para aprender a fazer algo e estou
disposta a tentar.
— Garanto que vai precisar de muita disposição para
servir café em bares e restaurantes a madrugada inteira.
Não comentei nada na ocasião nem ele insistiu no
assunto e troquei um olhar de gratidão com Andrew por me dar
apoio. No dia seguinte saí definitivamente de casa, esperando
não voltar nunca mais.
Agora, deitada na sala aconchegante do meu
apartamento, eu me sentia livre e feliz para viver do jeito que
quisesse, sem dar satisfações a ninguém, muito menos a um
homem dominador como o meu pai. Foi por causa daquele
trauma paterno que decidi ser mãe usando o sêmen de um
doador anônimo. A última coisa que eu queria para o meu filho
ou filha, era ter um pai igual ao meu, sem sentimentos, focado
apenas no trabalho, frio, calculista e incapaz de amar. Andrew e
eu sabíamos muito bem como era conviver com alguém assim.
Para mim, vinte e sete anos de opressão tinha sido o suficiente.
Demais até.
O meu celular tocou em cima da mesa de centro e
estiquei o braço para pegá-lo.
— Bom dia, senhorita Smith — uma mulher me
cumprimentou quando atendi, chamando-me pelo sobrenome de
solteira da minha mãe. — Sou Melanie Bishop e trabalho na
Clínica Fertile Future. Estou ligando para marcar uma consulta
com a doutora Lisa Brown.
Lisa Brown era a ginecologista que havia feito o
procedimento da minha inseminação e eu me lembrava de
termos nos despedido definitivamente da última vez. Eu tinha a
minha própria ginecologista e pretendia ser acompanhada por
ela durante a gravidez, dispensando os serviços da Fertile
Future, fato que deixei bem claro para a doutora Brown. Era
estranho que agora estivessem me ligando para marcar uma
consulta com ela.
— Não me lembro da necessidade de uma nova
consulta. Foi a doutora quem pediu?
— Sim, foi ela mesma. Trata-se apenas de um novo
procedimento que estamos adotando, para ter a certeza de que
está tudo bem. A senhorita Smith já confirmou a gravidez?
Aquela funcionária só podia ser novata para estar
perguntando-me aquilo. Eu mesma já havia confirmado com a
médica sobre a minha gravidez, informando que a inseminação
tinha sido um sucesso.
— Posso falar com a doutora? — pedi, sem disposição
alguma de conversar com uma atendente sobre um assunto que
eu considerava confidencial e que só deveria ser tratado entre a
médica e eu.
Não foi à toa que fiz questão de preencher a ficha na
clínica com o sobrenome de solteira da minha mãe, em vez de
colocar o conhecido sobrenome do meu pai. Apenas a médica
sabia quem eu era, para quem confidenciei a minha verdadeira
identidade. Seria preciso alguém investigar os meus documentos
registrados na ficha para comprovar que faltava o sobrenome
principal.
— A doutora Brown não se encontra no momento.
Temos um horário pela manhã e outro à tarde, caso a senhorita
possa comparecer amanhã mesmo.
Pareceu-me cedo demais. Na verdade, rápido demais.
Será que descobriram algo de errado com o sêmen
que inseriram em mim, tipo uma anomalia?
De repente, fiquei insegura e coloquei a mão sobre a
barriga.
Quando fui à clínica pela primeira vez e tive uma
consulta com a médica, uma das coisas que mais gostei foi
poder escolher as características físicas do doador anônimo que
seria o pai do meu filho. Acabei por me divertir com a
experiência, escolhendo os atributos físicos do homem dos meus
sonhos, como se estivesse em uma agência de namoro e
precisasse descrever o tipo de homem que eu queria.
Preenchi a ficha colocando uma altura mediana,
cabelos louros e olhos claros iguais aos meus, além de um
corpo magro. Eu não gostava de homens truculentos, barbados e
intimidantes. Esses, eu dispensava! Quase acrescentei que ele
tinha de ser carinhoso, simpático, sorridente e de bem com a
vida, mas a clínica não estava interessada na personalidade do
homem ideal que eu queria para ser o pai do meu filho, ou “o
doador”, como o chamavam.
Agora, eu estava preocupadíssima que “o doador” não
tivesse um espermatozoide tão perfeito como me disseram e
resolvi marcar o mais cedo possível.
— Pode ser amanhã no primeiro horário livre que a
doutora tiver.
— Às nove horas da manhã.
— Para mim está bom. Pode marcar.
Capítulo 3
Michelle
Não dormi bem aquela noite e me acordei na manhã
seguinte sentindo-me estranha, levemente apreensiva com a
consulta marcada às pressas pela doutora Brown. Bem antes do
horário marcado, eu já estava entrando na clínica e indo para o
elevador privativo do andar VIP onde ela trabalhava.
Tentei controlar o nervosismo enquanto parava atrás de
quatro homens engravatados que também aguardavam a chegada
do elevador. Um deles olhou para mim assim que me aproximei,
parecendo muito atento ao que acontecia ao nosso redor.
Acostumada com aquela atitude e com a aparência truculenta
dele, identifiquei logo que se tratava de um segurança.
Ele pareceu satisfeito ao ver que eu era apenas uma
mulher inofensiva e voltou a olhar para a frente.
Observei-os discretamente, identificando de imediato a
situação.
Dois deles eram seguranças. Um dos homens que
estavam no centro segurava uma pasta e consultava o celular,
parecendo um executivo qualquer. Talvez, um advogado. A
minha atenção foi logo desviada para o homem de porte altivo
no meio deles, que, sem dúvida alguma, era o mais importante
dos quatro. Usava um terno azul marinho de alta qualidade,
impecável e que favorecia o porte poderoso. De costas, pouco
pude ver além dos ombros largos em um corpo aparentemente
tão forte quanto o dos seguranças que o ladeavam. A postura
altiva e arrogante era algo que eu conhecia muito bem, típica de
quem tinha excessivo poder nas mãos, como o meu pai, e foi
impossível não torcer a boca com desprezo com aquela
semelhança.
Mais um dono do mundo!
O elevador chegou e o outro segurança se adiantou
para garantir a porta aberta. O “dono do mundo” foi o primeiro
a entrar no elevador depois que um casal desceu, ficando de
frente para mim. A expressão dura e rígida era salientada pelo
formato quadrado do rosto de traços fortes, que a barba escura e
cerrada tornava mais anguloso ainda. Nossos olhos se cruzaram
e o dele era tão frio e seco quanto o do meu pai, se não fosse
pior. Fiquei com a impressão de não haver alma ali dentro,
apenas uma máquina programada para atingir um objetivo
sombrio. Tive a certeza de que o homem era mais perigoso do
que os dois seguranças que o protegiam, parecendo muito mais
um assassino sem coração do que um alto executivo.
Um calafrio de medo percorreu o meu corpo ao dar de
cara com aquela energia macabra.
Que horror!
Permaneci parada, deixando que os quatro seguissem
sozinhos. Eu estava adiantada na consulta e tinha tempo. Podia
muito bem esperar o elevador descer, para depois subir sozinha,
sem ser obrigada a seguir com aquele homem tenebroso.
— Pode entrar, senhorita — o segurança que segurava
a porta convidou educadamente.
— Vou na próxima vez, obrigada.
Ele não insistiu, nem ninguém se opôs, obviamente. A
porta se fechou lentamente e a última coisa que saiu da minha
linha de visão foi o olhar gélido e o rosto rigidamente
impassível daquele homem.
Assim que ele desapareceu totalmente dentro do
elevador, soltei a respiração que havia prendido e suspirei de
alívio. Só não fiz o sinal da cruz porque seria um exagero no
local onde eu estava.
Foi com curiosidade que fiquei olhando os números
dos andares se acendendo à medida que o elevador subia,
apostando que ele seguiria para o último andar, onde ficava a
diretoria da clínica. Quando parou no décimo quinto, comprovei
a minha teoria.
Será que é um dos diretores?
Só de imaginar aquela possibilidade, já desgostei da
clínica. Um homem com aquela energia macabranão podia ser o
responsável por trazer vidas ao mundo. Ele parecia mais do tipo
que tirava vidas.
Não demorou para ser a minha vez de entrar no
elevador junto com dois casais. A felicidade que emanava deles
com a possibilidade de ter filhos limpou rapidamente a energia
anterior e me esqueci do encontro sinistro.
Assim que desci no meu andar, aproximei-me do
balcão de atendimento da recepção.
— Tenho uma consulta marcada com a doutora Lisa
Brown.
A recepcionista, cujo crachá dizia se chamar Elizabeth
Malory, olhou para mim com interesse.
— É a senhorita Michelle Smith?
— Sim, sou eu mesma.
Ela sorriu, mas foi um sorriso que não chegou aos
olhos e que não me passou confiança. Aquilo me incomodou e
pensei se estava demasiadamente sensível por causa da
gravidez. Primeiro, o homem macabro. Agora, a recepcionista
desagradável.
A mulher se levantou da cadeira no mesmo instante.
— Acompanhe-me, por favor.
Inspirei fundo e fui atrás dela, sendo conduzida para a
sala de um dos consultórios médicos. Não era a mesma sala
onde fui atendida das vezes anteriores, nem a médica que me
aguardava lá era a doutora Lisa Brown.
— Bom dia, senhorita Smith — a médica estranha me
cumprimentou com um sorriso que também não achei ser
sincero, enquanto a atendente saía da sala e fechava a porta do
consultório. — Sou a doutora Chelsea Anderson, a responsável
por cuidar do seu caso a partir de hoje. Sente-se, por favor.
Sentei-me, completamente aturdida.
— Onde está a doutora Lisa? Pensei que a minha
consulta seria com ela.
— A doutora Lisa Brown já não trabalha mais na
clínica. Todas as pacientes dela passaram para mim, por isso a
chamei aqui hoje, para poder examiná-la e ter a minha própria
opinião sobre como anda o seu tratamento de gravidez.
Não gostei nada daquilo.
— Não entendo por que não me disseram isso ontem
quando marcaram a consulta. Vim achando que teria uma
consulta com a minha médica.
— Eu sou a sua médica — a mulher afirmou com uma
voz que achei antipática, aumentando o meu desagrado. —
Quem lhe ligou ontem foi o setor de marcação de consultas.
Provavelmente a atendente não sabia que a doutora Lisa já não
trabalhava mais na clínica.
Se havia uma coisa fundamental entre médico e
paciente era a confiança, e eu não sentia confiança alguma
naquela médica. Só não a dispensei e saí imediatamente da sala
porque antes precisava descobrir o motivo real daquela
consulta. Ainda estava na minha cabeça a hipótese de o sêmen
do doador anônimo ter algum problema.
— Sim, claro. É compreensível esse engano. Pode
iniciar a consulta, doutora.
Ela pareceu satisfeita.
— Vou pedir que tire a roupa na sala ao lado e coloque
uma bata para que eu possa fazer um exame ginecológico
completo. Quero ver as condições da sua gravidez.
Achei que íamos apenas conversar sobre o
procedimento a que me submeti e como eu me sentia, mas não
fazer um exame físico. Eu jamais colocaria o meu corpo nas
mãos de uma médica com quem antipatizei de cara.
— Pensei que fôssemos apenas conversar.
A doutora Chelsea me olhou com um toque de ironia.
— Preciso ver como está o desenvolvimento da
gravidez e não posso fazer isso só com uma conversa — ela
falou com autoridade de médica, como se quisesse me forçar a
atender à sua exigência.
O que ela disse tinha toda a lógica, mas o desconforto
que eu sentia também tinha muita lógica para mim.
— Tenho a minha própria ginecologista. Ela já está
acompanhando a minha gravidez e a doutora Lisa sabia disso.
Leia a minha ficha com atenção, doutora — informei
calmamente, sem me deixar intimidar. — Se houve algum
problema com o esperma do doador anônimo que escolhi, pode
me dizer. Se quiser saber como me sinto fisicamente, também
direi, mas que fique bem claro que não pretendo fazer nenhum
exame ginecológico aqui na clínica. Nada no meu contrato com
a Fertile Future me obriga a isso.
Usei o tom de voz de herdeira Barton, que era o único
que aquela médica parecia entender.
Ela sorriu mais uma vez, no que deveria ser um sorriso
de desculpas, mas que novamente não chegou aos olhos.
— Eu entendo tudo isso. O que estamos querendo é
apenas ter a certeza de que a inseminação foi um sucesso.
— Se não há nada de errado com o sêmen do doador
anônimo, posso garantir que foi um sucesso.
— Impossível haver algo de errado com o sêmen,
senhorita Smith. O lema da nossa clínica é o profissionalismo e
a excelência. Só os melhores doadores são aceitos. Isso é
inquestionável.
— Foi exatamente por isso que procurei a Fertile
Future. Por ser a melhor clínica do país e ter profissionais
humanizados — alfinetei-a, que de humanizada não tinha nada.
Foi cômica a tentativa que ela fez de parecer simpática
ao sorrir mais uma vez.
— Só um minuto, por favor — ela pediu, pegando o
telefone e falando com a atendente. — Elizabeth, traga um café
para mim e um chá para a senhorita Smith.
Hã?!
A doutora Chelsea desligou e pegou imediatamente a
minha ficha, agindo normalmente.
— Conte-me então como está se sentindo. Tem tido
sintomas de gravidez, como enjoos, dores nos seios,
sonolência?
Nem cheguei a responder. A porta se abriu e a eficiente
Elizabeth entrou com uma rapidez impressionante, colocando
uma bandeja pronta sobre a mesa.
As duas trocaram um olhar.
— Obrigada, Elizabeth — a médica agradeceu,
olhando depois para mim. — Sirva-se, senhorita Smith. Um chá
é sempre melhor para uma gestante do que um café.
Ela pegou a própria xícara e olhei para a minha, onde
um chá de cor amarelada me aguardava. Senti-me enjoada só de
o olhar, quanto mais de beber.
— Agradeço, mas vou negar. Não aprecio nenhum tipo
de chá.
— Sim, claro. — A médica voltou a olhar para a
atendente, que aguardava ao lado da mesa. — Pode levar.
Elizabeth pegou a bandeja e saiu, enquanto eu tentava
controlar a sensação ruim que me dominou. Podia parecer um
absurdo, considerando que eu estava na clínica mais renomada
do país em matéria de reprodução humana assistida, mas nunca
me senti tão ameaçada na vida.
Devo estar mesmo muito sensível por causa da
gravidez ou então estou ficando paranoica!
Aquele não era um dia bom para estar ali. Talvez, não
fosse um dia bom nem para sair de casa.
Decidida, levantei-me.
— Peço desculpas pela indelicadeza, mas preciso ir,
doutora. Tenho um outro compromisso inadiável.
Ela se levantou também.
— Mas ainda estamos no meio da consulta!
— Como foi uma consulta marcada às pressas pela
clínica, acabei por encaixar esse horário na minha agenda.
Pensei que fosse algo mais rápido, mas agora preciso mesmo ir.
Não dei mais satisfação alguma e fui para a porta,
abrindo-a e saindo para o corredor que levava à recepção.
Passei por Elizabeth sem dizer absolutamente nada, mas notei
como ela se levantou abruptamente quando me viu indo embora.
Cada vez mais incomodada com aquelas duas, fui para
o elevador, decidida a nunca mais colocar os pés naquela
clínica.
Capítulo 4
Tyler
— Nosso profissionalismo é inquestionável — o
doutor Harrison Davis disse com um ar chocado. — Isso que
está me dizendo é algo inadmissível na Fertile Future, senhor
Blackwolf.
Estávamos na sala da diretoria da clínica, para onde
me desloquei naquela manhã com a intenção de resolver
pessoalmente o problema causado pela incompetência dos
funcionários da Fertile Future. A namorada de Philip não havia
conseguido descobrir nada sobre a “mãe” do meu filho, apenas
que se chamava Michelle Smith, um nome que não me dizia
nada. Havia uma infinidade de Michelle Smith no país.
— Inadmissível foi o erro que cometeram. O
profissionalismo do qual fala não existe. Quero saber agora
mesmo quem é a mulher que está com o meu filho!
Ele meneou a cabeça em um gesto de incredulidade, os
olhos arregalados refletindo uma mistura de surpresa e de medo
das consequências que um erro daquele tamanho acarretaria
para a reputação da clínica.
O doutor Harrison Davis não era apenas o diretor
presidente da Fertile Future, era também o dono da clínica, um
profissional respeitadíssimo no mundo pelo trabalho que
desenvolvia na reprodução humana. Foi ele quem me atendeupessoalmente quando procurei a clínica para congelar o meu
sêmen e ter a segurança de que poderia ter um filho saudável a
qualquer altura da minha vida. Nunca pensei que estava
colocando o destino do meu filho nas mãos de um profissional
que sequer imaginava os erros que aconteciam debaixo do
próprio nariz.
— Eu preciso primeiro investigar isso que está me
dizendo, para só depois conseguir alguma informação concreta
que possa lhe passar. Entenda que não estou duvidando do que
me disse, mas isso é um absurdo sob o meu ponto de vista. Não
consigo acreditar que um erro grotesco dessa natureza,
imperdoável a nível humano, tenha acontecido na minha clínica.
— Tenha acontecido, não. Esteja acontecendo por
vezes seguidas. Pelo que me informaram, esta não foi a primeira
vez.
— O que é mais inadmissível ainda! Não fui
comunicado de nada disso e garanto que os responsáveis vão
ser punidos. Só espero que entenda que não tenho como lhe dar
uma resposta neste exato momento sobre a mulher que foi
inseminada com o seu sêmen.
— Escute bem, doutor Harrison — praticamente rosnei
para ele, controlando a vontade de me levantar da cadeira e o
agarrar pelo colarinho, arrastando-o por cima da mesa até onde
eu estava. — Tem uma mulher lá fora com o meu filho na
barriga e quero saber quem é ela. Quero para ontem a ficha
completa dessa mulher nas minhas mãos ou vou meter um
processo milionário contra a clínica que vai deixar vocês de
portas fechadas. Todos os membros da diretoria e os outros
responsáveis vão dar consulta no presídio onde estarão
cumprindo pena, que fique bem claro.
Ele abriu mais os olhos diante da minha ameaça e os
fixou em Ryan Fisher, o meu diretor jurídico, que acompanhava
tudo sentado na cadeira ao meu lado. O médico parecia estar
pedindo que o ajudasse a me acalmar, o que não aconteceu.
— No mínimo, constará do processo o erro
profissional, a negligência, o descaso ao lidar com a
reprodução de vidas humanas, o descumprimento de contrato e a
eliminação de provas — Ryan disse com severidade, sem
amenizar nem um pouco a situação. — Vamos acrescentar
também a publicidade enganosa, já que a clínica tem como lema
um profissionalismo inquestionável. Sem esquecer os danos
morais e emocionais do meu cliente.
O doutor Harrison ficou pálido diante da seriedade da
situação, mas não tive piedade alguma com ele.
— Encontre o meu filho imediatamente! — exigi,
deixando bem claro que iria até as últimas consequências para o
encontrar.
— Preciso de um tempo para apurar os fatos.
— Tem uma hora para fazer isso. O meu advogado e
um dos investigadores da minha equipe ficarão aqui aguardando
até que lhe passe as informações. — Levantei-me, sentindo-me
frustrado e enraivecido. — Agradeça por não ser a polícia a
investigar o caso.
Ele se levantou também, a fisionomia refletindo
indignação.
— Tenho todo o interesse em investigar o que está
acontecendo na minha clínica e não vou deixar sem punição os
responsáveis. Peço apenas que não envolva a polícia nisso. Eu
mesmo vou apurar os fatos e descobrir se realmente houve
outros erros além desse. Entenda que não estou desacreditando
do que me disse. Eu jamais faria isso. Ainda que fosse outro
cliente que me procurasse com uma acusação dessa gravidade, a
minha atitude seria a mesma — ele garantiu e senti sinceridade
no que disse. — Estou tão enraivecido quanto você, Blackwolf.
Dediquei a minha vida inteira ao trabalho e a Fertile Future é o
reflexo desta dedicação. Não admito que ninguém destrua o que
construí com esforço, nem manche a minha reputação.
Eu sabia muito bem o que era aquilo. O meu pai
também havia construído com esforço o próprio nome e depois
o viu ser jogado na lama, tendo a reputação destruída por Colin
Barton. Apesar de ele ter conseguido se reerguer décadas
depois, não foi um processo nada fácil, ainda mais no ramo das
finanças. Uma boa parte dos investidores mais tradicionais
continuaram sem fazer negócios com ele. A sorte foram os
novos investidores, um pessoal mais jovem e arrojado que
acreditou no que ele ofereceu, arriscando.
O meu pai costumava dizer que só havia conseguido
por minha causa, uma vez que eu era tão jovem e arrojado
quanto a nova geração de investidores que tinha surgido no
mundo financeiro. Segundo dizia, se não fosse eu, ele
continuaria sendo apenas um fraudador, mas eu não acreditava
naquilo. Eu até podia ter trazido credibilidade para os nossos
negócios, mas o meu pai sempre foi dono de uma mente
brilhante.
Olhando agora para o doutor Harrison, eu tinha noção
de que não podia tirar dele o direito de defesa do próprio nome.
— Se quer salvar a Fertile Future de um escândalo sem
precedentes, investigue a fundo o que aconteceu e me informe
tudo sobre a mulher que foi inseminada com o meu sêmen.
— Farei isso, fique tranquilo.
Ele estendeu a mão e apertei-a com firmeza, selando
um acordo entre nós.
Saí da diretoria deixando Ryan e um dos
investigadores da minha equipe acompanhando tudo e fui para o
elevador com Miles, o meu homem de confiança. Entramos nele
e consultei o relógio para ver quanto tempo ainda teria até
chegar à reunião que me aguardava no escritório.
Faltava ainda cerca de duas horas, tempo suficiente
para eu ficar sozinho e me preparar para os contratos que ia
assinar.
O elevador parou em um dos andares e recuei para o
fundo, enquanto Miles permanecia atento à abertura da porta.
Quem entrou foi a mesma mulher que estava no térreo à espera
do elevador e que havia se negado a subir em nossa companhia.
Na ocasião, senti o olhar crítico dela sobre mim, o que em nada
me abalou.
Pensei que ela faria o mesmo e se negaria mais uma
vez a seguir no elevador em minha companhia, mas me enganei.
A mulher entrou às pressas, esbaforida, como se estivesse com
urgência de ir embora. Atrás dela veio uma atendente da clínica,
que prontamente apertou o botão que mantinha a porta aberta.
— A doutora ainda precisa falar com a senhorita. — A
atendente se calou subitamente quando me viu parado atrás da
mulher.
Eu não tive dúvida de que ela me reconheceu de algum
lugar e fiquei pensando de onde seria. Exceto se fosse uma
leitora assídua das páginas de economia e de finanças dos
jornais e revistas, não havia como me reconhecer em um rápido
olhar.
— Estou atrasada para uma reunião e já informei isso à
doutora — a mulher respondeu, desviando a minha atenção.
Ela usou um tom de voz bastante firme, mas notei a
atitude corporal defensiva e tensa.
— Será só por mais alguns minutos, senhorita. É
importante — a atendente insistiu com cautela, o olhar fixo na
mulher e não em mim.
— Infelizmente não posso.
— Mas...
— Desde quando os clientes são forçados a alguma
coisa dentro desta clínica? — perguntei, perdendo a paciência
de vez com tudo o que dizia respeito à Fertile Future.
A insistência da atendente era abusiva, quando estava
mais do que óbvio que a cliente em questão não queria voltar.
A atendente, cujo nome no crachá era Elizabeth
Malory, voltou a me olhar. Havia respeito nos olhos dela, mas
também medo.
— Apenas cumpro ordens, senhor.
— Então a ordem está dada. Retire-se!
Ela entreabriu a boca, chocada com a minha grosseria,
mas obedeceu no instante seguinte.
— Sim, senhor.
Soltou o botão que mantinha o elevador aberto e se
afastou. Observei-a enquanto as portas se fechavam. Ela
apertava os lábios tensamente, sem conseguir disfarçar a
frustração ao olhar para a mulher à minha frente, que soltou um
longo suspiro de alívio quando o elevador começou a descer.
Ela se virou para trás.
— Obrigada por... — Hesitou quando finalmente
identificou quem eu era —, por me ajudar.
A mulher devia estar mesmo muito perturbada para não
ter notado com quem dividia o elevador.
— Não há de quê — respondi com seriedade, ciente de
que ela antipatizava comigo.
Eu não ia fingir agora que não havia percebido a
antipatia imediata que ela sentiu assim que me viu entrando no
elevador. Sem dúvida, julgou-me pela aparência.
A mulher voltou a se virar para a frente e aprumou o
corpo com rigidez, provavelmente se sentindo mal agoraque
sabia com quem compartilhava o elevador.
Observei-a friamente enquanto descíamos. Ela era
excessivamente magra e aquela magreza afinava o rosto de
linhas harmoniosas, o que lhe dava uma aparência frágil e por
demais delicada. Contudo, os olhos azuis reprovadores
mostravam que a delicadeza era apenas física, evidenciando
uma personalidade forte e, talvez, difícil de lidar. Os cabelos
louros estavam soltos e iam até o meio das costas rigidamente
tensas, onde alguns cachos se formavam.
Notei a bolsa de marca que ela usava e as roupas de
qualidade que vestia. A aparência geral era de uma dondoca
fútil da sociedade novaiorquina, sem nenhum objetivo na vida
que não fosse orbitar nos eventos sociais.
Chegamos ao térreo em total silêncio e Miles abriu a
porta, deixando que ela saísse primeiro.
Observei-a andar apressadamente para fora da clínica,
como se estivesse fugindo de alguma coisa. Só então me dei
conta de que podia ter ajudado uma criminosa disfarçada de
socialite a escapar impunemente.
Vindo dessa clínica, tudo é possível!
Capítulo 5
Tyler
No meio daquela tarde, Ryan Fisher me ligou da Fertile
Future com uma excelente notícia.
— Já tenho as informações comigo, senhor. Chegarei
em trinta minutos no escritório.
Excelente!
Ele sabia que o assunto era confidencial e que só
deveria ser tratado pessoalmente.
— Venha direto à minha sala. Estou aguardando.
— Sim, senhor.
Agora eu poderia encontrar a mulher que estava com o
meu filho.
Se havia algo que aprendi ao longo da vida, era saber
aguardar o momento certo de conquistar cada um dos objetivos
a que me propus alcançar. Apesar de aquele assunto ter tirado
parte da minha concentração desde que conversei com Gary,
agora ele estava resolvido. Faltava apenas falar com a mulher e
pagar para que ela fosse apenas a barriga de aluguel do meu
filho, desaparecendo depois das nossas vidas para sempre.
Trinta minutos depois, eu já estava com a ficha dela em
mãos, junto com um relatório que continha outras informações
que o próprio Ryan havia investigado no caminho de volta para
o escritório.
Incrédulo, mas principalmente enfurecido, apesar de
não demonstrar o que sentia, olhei-o sentado à minha frente.
Com um rosto redondo, cabelos ruivos e pele cheia de sardas,
Ryan empurrou os óculos sobre o nariz, sustentando o meu olhar.
— É isso mesmo que está aí, senhor. Ela é filha de
Colin Barton — afirmou com resignação, mesmo eu não tendo
perguntado nada.
Controlei-me para não amassar os papéis que
segurava, sem acreditar que o meu filho teria como avô o meu
pior inimigo. Eu sabia que Colin Barton tinha um casal de
filhos, mas nunca me preocupei com a garota, apenas com
Andrew Barton, o filho mais velho que trabalhava com o pai.
— Tem certeza disso? Essa Michelle Smith é mesmo a
filha dele?
— Ela usou o sobrenome de solteira da mãe, omitindo
o do pai, provavelmente para não ser identificada, mas é ela. Os
números dos documentos que informou na ficha são realmente os
dela e confirmei se tratar de Michelle Smith Barton.
— Obrigado pelo excelente trabalho, Ryan. Agora
pode ir — dispensei-o em um tom de voz neutro e controlado.
— O que faço com relação à Fertile Future? Avanço
com o processo?
— Avance. Quero todos os responsáveis atrás das
grades, custe o que custar.
Agora que eu sabia a identidade da mulher, não
deixaria mesmo ninguém impune. Todos os meus planos
meticulosamente arquitetados durante anos estavam em risco de
rutura por causa da negligência de profissionais incompetentes.
Assim que Ryan saiu e fiquei sozinho, respirei
profundamente várias vezes para me acalmar, cerrando os
punhos com força no relatório a ponto de sentir os músculos dos
braços se retesarem. Amassei o relatório lentamente, querendo
que fosse o pescoço de Colin Barton que estivesse agora em
minhas mãos e não aqueles papéis.
Controlar com vontade férrea a raiva que me consumia
não estava sendo fácil, mas eu não ia perder o juízo justamente
agora. Precisava manter o foco, ser frio, racional, pensar com
clareza.
Aquele filho significava muito para mim. Eu o amei
antes mesmo que fosse gerado, certo de que teria com ele o
mesmo companheirismo e amizade que tive com o meu pai. Ele
compartilharia comigo o mesmo objetivo de vida, recebendo
uma educação igual a que tive e herdando depois toda a minha
fortuna. No tempo certo, outros filhos ou filhas viriam através
do mesmo método de reprodução assistida.
As mulheres eram maravilhosas como amantes, mas
não como esposas ou como mães dos meus filhos.
Saber que a tal Michelle Smith era, na verdade,
Michelle Barton, estava sendo um duro golpe do destino nos
meus planos. Ainda assim, o filho que ela carregava na barriga
era meu e eu não ia abrir mão dele. Mesmo sendo Michelle
Barton a mãe do meu filho, eu jamais o rejeitaria. Ele era o filho
que tanto desejei, o meu sangue, uma parte de mim. Fosse quem
fosse a mãe, seria ela a renunciar à criança quando nascesse.
Determinado a atingir aquele objetivo, desamassei o
relatório e li todas as informações que Ryan havia investigado
sobre a mulher que invadiu a minha vida sem pedir licença.
Para aniquilar um inimigo, era preciso conhecê-lo a fundo e era
exatamente aquilo o que eu ia fazer com Michelle Barton.
Concentrei-me no relatório. Não havia foto dela na
ficha da clínica, mas aquilo não seria difícil de conseguir. As
características físicas da mãe do meu filho era algo que sempre
quis escolher, mas o erro da Fertile Future me roubou esse
direito. Agora, era primordial descobrir a aparência física da
filha de Colin Barton.
Digitei o nome dela no computador e logo encontrei as
fotos que precisava. Loura, magra, rosto oval fino e olhos azuis.
A minha perplexidade não teve tamanho ao descobrir que ela
era a mulher antipática do elevador.
— Merda! Mas que grande merdaaa! — rugi alto
dentro do escritório.
A cada minuto que passava a situação só piorava,
tornando-se mais complexa e difícil de ser resolvida.
Convencer aquela mulher a desistir do filho a meu favor não ia
ser fácil, mas também não era impossível. Nada era impossível
para mim!
Peguei a ficha e comecei a ler com atenção as
informações que constavam nela.
A letra que a havia preenchido era elegante e feminina,
sem erros de escrita, o que já mostrava a educação esmerada
que ela teve. Além do próprio nome, do endereço da mansão
Barton, dos dados pessoais e dos documentos, Michelle havia
colocado também as características físicas do homem que
queria como doador anônimo.
Torci os lábios com desprezo ao ler que ele deveria ter
um metro e setenta de altura, corpo magro, cabelos louros e
olhos azuis, provavelmente para combinar com os dela. Além
daquilo, ainda acrescentou que, se possível, queria que o
doador fosse um homem simpático, compreensivo, divertido e
de sorriso fácil.
Aquelas características físicas eram completamente
opostas às minhas, isso sem falar da personalidade do pai tão
desejado por ela. Eu era quase vinte centímetros mais alto,
possuía um corpo avantajado e largo, além de ter cabelos e
olhos castanhos escuros, quase pretos.
O pai perfeito para o filho dela se assemelhava com
um bom vivant7 qualquer da sociedade novaiorquina, um
janotinha que vivia divertindo-se o tempo todo com os
rendimentos do pai, sem mexer um único dedo para conquistar o
próprio dinheiro, sorrindo por qualquer motivo e aproveitando
os prazeres da vida.
Com um esgar desdenhoso, virei a ficha para ler o
verso, onde estavam registradas as anotações feitas pela médica
que a atendeu. A letra era quase ilegível, mas entendível para
mim. A minha surpresa ficou em saber que Michelle Barton era
uma mulher de vinte e sete anos que havia decidido engravidar
através de uma inseminação artificial mesmo sendo virgem.
Eu não fazia ideia dos motivos que a motivaram a
engravidar sem nunca ter experimentado uma relação sexual,
mas havia uma coisa boa naquilo. Ela não tinha um homem
metido no processo de inseminação. Se existisse um namorado
ou um marido esperando ansiosamente por aquela gravidez, eu
teria de lutar contra duas pessoase não apenas contra uma. A
inexistência de um homem reivindicando os direitos sobre o
meu filho facilitava as coisas.
Eu só precisava agora conversar com a mulher e
negociar um contrato com ela em que renunciasse à criança após
o nascimento, desaparecendo completamente do meu caminho e
das nossas vidas.
Capítulo 6
Michelle
Meu Deus, que dia horrível!
Além da situação estranha com a médica substituta e
com a atendente da Fertile Future, ainda tive a desagradável
surpresa de descer de elevador com o homem mais tenebroso
com quem cruzei na vida. Ele me causava uma repulsa instintiva
e quase não acreditei que aquele bloco de gelo me ajudou.
Fiquei em choque quando me virei para agradecer e vi
que era ele.
Foi com um alívio muito grande que entrei no meu
apartamento e tranquei a porta à chave, agradecendo a Deus por
tudo já ter passado. Eu esperava nunca mais ver nenhum deles
outra vez na minha frente.
Tomei um banho relaxante e logo depois liguei para o
consultório da minha ginecologista, conseguindo marcar uma
consulta com ela dentro de dois dias. A doutora Jane Young
sempre foi a ginecologista da minha mãe e passou a ser a minha
também. Eu a adorava. Inclusive, foi ela quem me indicou a
Fertile Future para fazer a inseminação, depois de uma conversa
que tivemos sobre o assunto.
No final da tarde, quando eu já me sentia bem mais
tranquila, o celular tocou com uma ligação do meu irmão
querendo saber como eu estava.
— Como andam estes dois bebês? — ele perguntou em
tom de riso, provocando-me.
— Estamos ótimos e pare de me chamar de bebê —
respondi com bom humor. — E você? Está tudo bem por aí?
— Tudo igual como sempre. Papai de cara feia, os
empregados silenciosos e a mansão mais fria sem a sua
presença aqui. Sinto sua falta, baby.
Eu conseguia imaginar facilmente o cenário que ele
descreveu. Um cenário que fez parte da minha vida depois da
morte da minha mãe. A luz daquela casa havia sido ela. Depois
de sua morte, senti como se estivesse morando em uma mansão
fantasma carregada de más energias.
— Você é um amor, Andrew. Também sinto muito a sua
falta. Por que não sai logo daí e vai viver a sua vida longe da
mansão? Acho que John ia amar que você o assumisse de vez e
fossem morar juntos.
Ele ficou calado quando me ouviu falar do namorado.
O meu irmão ainda não havia assumido a própria
homossexualidade para o nosso pai, ciente de que o poderoso
Colin Barton seria capaz de matar o próprio filho se soubesse
daquilo. Da família, apenas a nossa mãe e eu sabíamos. Sempre
fomos muito unidos e nunca houve segredos entre nós três.
A situação de Andrew era muito pior do que a minha.
O meu pai surtaria se soubesse que engravidei por inseminação
com o sêmen de um doador anônimo, mas nunca me mataria,
como faria com Andrew caso ele se casasse com outro homem e
não com uma das herdeiras novaiorquinas que ele insistia para o
meu irmão namorar.
Até aquele momento, Andrew havia conseguido evitar
o casamento com uma delas, mesmo já estando com trinta e sete
anos e sofrendo a pressão do nosso pai. Ele ainda aguentou ficar
noivo de uma delas durante três anos, mas depois desfez o
noivado. Nós dois havíamos lutado quase que diariamente para
continuarmos solteiros depois que a nossa mãe partiu. Agora, eu
não via escapatória para ele além de fazer o que fiz e sair de
casa o mais rápido possível.
— Ainda não chegou a hora de assumir o meu
relacionamento com John e ele sabe disso. Nosso pai anda
muito nervoso ultimamente por causa de uns problemas lá no
banco e este seria o pior momento para eu sair de casa. — Ele
suspirou pesadamente e eu imaginava a pressão que devia
sentir. — Estou mais preocupado com você agora. Está
precisando de alguma coisa? Sabe que não vou deixar que passe
dificuldades financeiras nem que lhe falte nada.
Sorri, amando-o ainda mais.
— Tenho o suficiente e você sabe disso. Nossa mãe foi
previdente ao deixar aquele dinheiro para mim no BW Bank. É
um banco forte, muito maior do que o do nosso e onde ele nunca
vai conseguir colocar a mão no meu dinheiro. Graças a Deus
que são concorrentes e que existem pessoas mais poderosas no
mundo do que o nosso pai ou estaríamos mesmo mal. Sou
econômica, também. O dinheiro vai render o suficiente para eu
ter uma vida tranquila pelos próximos anos.
— Nem me fale do BW Bank. Nosso pai não pode
ouvir esse nome sem ter ataques de raiva e ficar com um humor
pior do que já tem. Quanto mais esse banco cresce e se
solidifica no mercado, mais ele surta.
— Sempre achei isso estranho. Há tantos bancos no
país, mas parece que só esse incomoda ao nosso pai.
— Ele tem tantas esquisitices que nem perco mais o
meu tempo analisando — Andrew desabafou comigo. — E você
não deixe de me ligar se precisar de alguma coisa. Tenho
dinheiro suficiente para nós dois ficarmos muito bem e não
quero que falte absolutamente nada para você, baby.
— Você é o melhor irmão do mundo.
— Você também é a melhor irmã do mundo. Cuide bem
do meu sobrinho ou sobrinha.
Foi com um sorriso de alegria que desliguei o celular
quando nos despedimos, sentindo-me feliz como há tempos não
me sentia.
Passei os dois dias seguintes ocupada em pintar um
quadro que ficaria na parede da minha sala quando estivesse
pronto. Não faltava muito para aquilo acontecer e resolvi me
isolar do mundo para o terminar.
No dia da consulta com a minha ginecologista, cheguei
à clínica bem mais cedo do que o normal.
— Olá, Bertie! — cumprimentei a recepcionista, que
me recebeu com um sorriso caloroso.
Bertie era uma mulher na faixa dos trinta anos que
trabalhava há pelo menos uns dez com a doutora Jane. De rosto
redondo, cabelos castanhos lisos e ralos, era de uma simpatia
ímpar. Ela sempre tratou a mim e à minha mãe com um carinho
enorme, e pessoas simpáticas me atraíam muito.
— Olá, minha querida. Chegou cedo para a consulta.
— Ela se levantou e veio me dar um abraço caloroso. — Como
está se sentindo?
— Estou ótima, Bertie. Não pretendia chegar tão cedo,
mas acho que estava ansiosa para falar com a doutora Jane.
— Fique tranquila. Isso é mal de gestante de primeira
viagem. — Ela riu, compreensiva. — A ansiedade para saber
como o bebê está se desenvolvendo é sempre grande. Falo por
experiência própria. Eu mesma não largava a minha médica.
Olhei-a com verdadeiro carinho.
— Fiquei mais aliviada agora. Achei que fosse só eu.
— Que nada! A maioria das grávidas são todas iguais.
Ficamos conversando por vários minutos até uma
paciente sair do consultório e chegar a minha vez.
Assim que entrei na sala, a minha médica se levantou e
veio me receber com um abraço. A doutora Jane tinha mais de
cinquenta anos, mas aparentava ter dez a menos. Era uma mulher
bem cuidada, com cabelos castanhos onde não se via um único
fio grisalho à mostra. Os olhos eram da mesma cor e a pele do
rosto ainda possuía bastante o viço da juventude.
— Minha querida, como está?
— Fisicamente me sinto ótima, mas emocionalmente
nem tanto, doutora — desabafei, rindo com um certo
nervosismo.
— Sente-se e me conte o que está acontecendo — ela
pediu, voltando a se sentar na cadeira atrás da mesa.
Sentei-me também e contei tudo o que havia acontecido
de estranho na Fertile Future. Ela me ouviu com atenção,
ficando cada vez mais séria à medida que eu falava.
— Saí de lá me sentindo ameaçada, apesar disso
parecer meio surreal. Também não consegui descobrir se houve
algum problema com o sêmen do doador anônimo. Acha que
isso é possível, doutora? Não vi nenhum outro motivo para
terem me chamado na clínica.
— Tenho de confessar que estou tão chocada quanto
você, Michelle. Este tipo de comportamento da médica e da
atendente é muito fora do normal. Quanto ao suposto problema
com o sêmen, acho muito improvável que tenha acontecido. A
Fertile Future desenvolve um trabalho de excelência e os
doadores são muito bem selecionados. O material doado passa
por um rigoroso processo de análise e só o que há de melhor é
colocado à disposição das pacientes.
Suspirei, ficando mais aliviada. Se a doutora Jane
dizia aquilo, não havia mesmo motivo depreocupação.
— Tentei raciocinar dessa maneira, mas a minha
intuição me dizia que algo estranho estava acontecendo ali.
Fiquei desconfiada também com a troca da médica, pois gostei
muito da doutora Lisa. Já não posso dizer o mesmo da doutora
Chelsea, que não conquistou a minha confiança. Eu jamais
deixaria que ela me examinasse.
— Isso foi o mais preocupante de tudo o que me
contou. Um médico não deve forçar o paciente a fazer um
procedimento que ele não queira, ainda mais um desta natureza.
Vou conversar com o Harrison sobre o que aconteceu.
Eu sabia que ela conhecia pessoalmente o médico
proprietário da Fertile Future. Tanto, que havia me indicado a
clínica dele.
— Eu não quero criar confusão nem prejudicar
ninguém, doutora. Pode ter sido só coisa da minha cabeça.
Ela me deu um sorriso tranquilizador.
— Não se preocupe. Tenho um ótimo relacionamento
com ele e sei como abordar o assunto. Confie em mim.
— Confio totalmente — afirmei sem hesitar.
— Agradeço a confiança, querida. Já que veio hoje,
vamos antecipar o exame da gestação e ver como você está.
Uma hora depois, saí da clínica sentindo-me aliviada,
feliz e tranquila. Estava tudo bem comigo e com o bebê. Não
havia motivo algum de preocupação da minha parte e a doutora
Jane ainda tentaria descobrir para mim o que havia acontecido
na Fertile Future.
Resolvi ir para o centro comercial exclusivo que havia
no caminho para casa, onde compraria alguns itens de
decoração para o quarto do meu bebê. Passei horas agradáveis
escolhendo roupinhas também, sonhando com o momento em
que poderia vesti-las nele ou nela. Optei por uma cor neutra,
assim daria tanto para um menino quanto para uma menina.
Eu havia acabado de sair da loja quando uma mulher
passou por trás de mim carregando um monte de sacolas e me
empurrou com brusquidão contra a proteção de ferro que
circundava as escadas daquele andar do shopping. O que me
impediu de cair lá embaixo foi a grade. Se não fosse ela, eu
teria me estatelado no chão do andar inferior.
— É melhor ter cuidado! — uma outra mulher disse ao
meu lado, segurando-me pelo braço. — Essas grades são muito
baixas e você pode cair.
— Eu sei disso! Foi aquela mulher que me empurrou
— esclareci, indicando a mulher que continuava andando com
pressa ao longo do corredor de lojas. — Que mal-educada!
A mulher que estava comigo ainda olhou para onde
indiquei, mas agora era impossível identificar a outra no meio
de tanta gente.
— É cada vez mais raro encontrarmos pessoas
educadas nas ruas — ela reclamou com razão, olhando para
mim depois com um sorriso. — Tenha cuidado.
— Obrigada pela atenção.
Ela foi embora e eu também. Por precaução, afastei-me
da área próxima à grade e segui em direção ao estacionamento.
Peguei o carro e fui para casa, ouvindo a minha playlist favorita
e fazendo planos para quando o meu bebê nascesse.
Capítulo 7
Michelle
Achei que nunca mais ia ter problemas relacionados à
Fertile Future, mas como eu estava enganada. Redondamente
enganada!
Na manhã do dia seguinte, abri a caixa onde guardava
algumas coisas de lembrança da minha mãe. Entre os objetos,
peguei a foto dela abraçada com o homem que havia amado
antes de se casar com o meu pai. Eu pretendia pintar um quadro
deles.
Eu havia encontrado aquela foto escondida em uma das
gavetas do closet da minha mãe logo depois da morte dela e
guardei comigo como se fosse um tesouro. Na época em que a
foto foi tirada, eles eram jovens e o amor que havia nos olhos
dos dois era tocante demais. A minha mãe estava linda nos
braços dele. Eu conseguia ver o quanto estava feliz e tranquila
com o futuro que teria com o homem que amava.
Coloquei a foto no canto do cavalete e comecei a fazer
o esboço do quadro, concentrando-me totalmente no trabalho.
Uma hora depois, aprovei o esboço que fiz e o guardei,
planejando pintar o quadro no dia seguinte. Peguei uma outra
tela com uma paisagem desenhada e comecei a pintar, por achar
mais fácil para o adiantado da hora.
O meu celular tocou quando eu estava no meio da
sessão de pintura. Sem querer largar o pincel justamente
naquele momento de inspiração, olhei para o aparelho sobre a
mesinha ao meu lado e resolvi não atender. Era um número que
eu não conhecia, por isso podia muito bem esperar.
Tirei o som do celular para não me incomodar e
continuei pincelando a tela até me dar por satisfeita. Só então
voltei a colocar o som nele. Se a pessoa ligasse novamente, eu
atenderia. Se não ligasse, eu retornaria a ligação mais tarde.
Levei o quadro para a sala e o coloquei na parede que
eu queria, afastando-me depois para analisar o resultado. Não
poderia ter ficado melhor! As cores combinavam com o
ambiente, exatamente como imaginei.
Eu estava comemorando a beleza da minha obra de arte
quando o meu celular voltou a tocar. Daquela vez fui atender,
confirmando que era o mesmo número que havia me ligado
antes.
— Alô?
— Bom dia. Estou falando com Michelle Smith? —
uma voz masculina muito grave perguntou do outro lado da
linha.
— Bom dia — respondi ao cumprimento com
educação. — Sim, sou eu mesma.
— O meu nome é Tyler Blackwolf e gostaria de marcar
um encontro para conversarmos sobre um assunto de nosso
interesse.
Eu não conhecia nenhum Tyler Blackwolf, muito menos
tinha algum assunto em comum com ele. Pelo tom de voz do
homem, parecia ser algo muito sério.
— Posso saber do que se trata? Talvez possamos
resolver por telefone mesmo. Estou sem horário livre para me
encontrar com o senhor.
— É um assunto particular e de caráter confidencial,
que não deve ser tratado por telefone. Seria melhor abrir um
espaço na sua agenda.
Eu não conseguia imaginar que assunto particular e
confidencial era aquele ao qual ele se referia, um homem que
era um total desconhecido para mim. Cogitei seriamente a
possibilidade de estar sendo vítima de uma brincadeira de mau
gosto ou de assédio.
— Prefiro que me adiante alguma coisa antes de alterar
a minha agenda para um encontro.
Ele permaneceu em silêncio por um instante e senti que
não gostou da minha insistência em saber do que se tratava.
— Sou o seu doador anônimo.
Hã?!
Paralisei, chocada.
— Meu o quê?
— O seu doador anônimo — ele praticamente soletrou
com impaciência. — Acredito que saiba ao que me refiro.
Como eu já disse antes, esse não é um assunto para ser tratado
por telefone. Quando podemos nos encontrar?
O homem estava exigindo e não pedindo. Aquele tom
autoritário me lembrou o meu pai, o que não gostei nada. Além
do mais, como é que o doador anônimo podia saber que o sêmen
dele gerou o meu filho? Tudo foi feito no mais completo sigilo
pela Fertile Future. O doador jamais deveria saber quem
recebeu o material que ele doou.
Deve ser um golpe. Só pode.
De alguma maneira, aquele homem me viu saindo da
clínica de reprodução assistida, reconheceu-me como filha do
banqueiro Colin Barton e achou que poderia ganhar dinheiro às
minhas custas, fingindo ser o meu doador anônimo.
Aquela era uma suposição meio surreal, mas nada
melhor passou pela minha cabeça que justificasse o absurdo da
ligação.
— O senhor deve estar me confundindo com outra
pessoa. Peço desculpas, mas preciso desligar.
Desliguei a chamada e imediatamente depois bloqueei
o número dele.
Aquilo me deu um alívio momentâneo, mas não
eliminou a preocupação. Algo de muito estranho estava
acontecendo e me senti insegura pela primeira vez desde que
decidi ter um filho sozinha. Um filho que não deveria conhecer
o pai, uma vez que a mãe dele era uma virgem incapaz de se
apaixonar pelos homens que conheceu.
A última coisa que eu queria agora era um doador
anônimo deixando de ser anônimo.
— Meu Deus! Se for mesmo verdade, qual é a intenção
desse homem?
Não aguentei a incerteza e liguei imediatamente para
Andrew. Eu precisava que ele me ajudasse a entender o que
estava acontecendo.
Assim que o meu irmão me atendeu, contei tudo sobre a
ligação.
— Ele só pode estar querendo dinheiro. Não consigo
imaginar outra coisa — Andrew disse depois que terminei de
falar. — O estranho é ele ter descoberto você, inclusiveo seu
número de celular.
— Você tem razão, nem pensei nisso. Será que algum
funcionário da clínica está metido nesse esquema e passou as
minhas informações para ele?
— Isso é um absurdo se considerarmos o nível daquela
clínica, mas não descarto a possibilidade. Tem gente disposta a
vender até a própria mãe por dinheiro, quanto mais
informações. Você tem todo o direito de processar a Fertile
Future.
— Ai, Andrew, nem me diga isso! Planejei tanto ter o
meu filho em paz e sozinha, sendo uma mãe solo livre de
problemas com um homem exigindo a paternidade dele. Não
acredito que vou precisar processar a melhor clínica do país
por vazamento de informações.
— Tenha calma, Michelle. O homem pode ter desistido
depois que você desligou na cara dele e tudo isso dar em nada.
Vamos aguardar. Se ele insistir de alguma maneira, você liga
para a clínica e marca uma reunião com a diretoria. Se quiser,
vou com você.
— Não precisa. Posso resolver tudo sozinha.
Não achei justo envolvê-lo nos meus problemas. Eu
sabia que Andrew quase não tinha tempo livre do trabalho no
banco.
— Tudo bem, mas prometa que vai me pedir ajuda se
precisar. Se este homem insistir de alguma forma, me avise
também. Posso investigar o número dele e descobrir quem é.
— Mas eu não quero saber quem é ele! — frisei
categoricamente. — Se for mesmo o doador anônimo, quero que
continue sendo anônimo para mim e para o meu filho. Foi para
isso que paguei caríssimo para passar por esse procedimento.
Me prometeram confidencialidade.
— Acho que o melhor a fazermos agora é aguardar
para ver se ele vai insistir. Não se preocupe, baby. Você tem
todos os direitos sobre o seu filho e não vou deixar que ninguém
tire isso de você — ele me tranquilizou e suspirei, relaxando.
— Agora se cuide. Uma grávida não pode estar tão preocupada
desse jeito. Pense no meu sobrinho.
Fiz um carinho na minha barriga, sorrindo pela
primeira vez desde que recebi aquela malfadada ligação.
— Obrigada pelo apoio, Andrew. Amo muito você.
— Eu também amo você, baby. Volto a ligar quando
chegar em casa à noite.
Desliguei, permanecendo sentada no sofá com o olhar
perdido na paisagem do quadro que eu havia pendurado na
parede da sala. Tanta coisa aconteceu naquele curto espaço de
tempo que nem parecia que o coloquei lá apenas minutos atrás.
Achei melhor voltar à pintura e distrair a minha mente
do que havia acontecido. Ficar remoendo o assunto não ia me
ajudar em nada.
Peguei uma outra tela, separei os tubos com as cores de
tinta à óleo que ia usar e me concentrei em criar um novo
quadro para colocar no hall de entrada.
Perdi a noção do tempo até a campainha tocar. Eu
estava tão absorvida no trabalho que me sobressaltei, errando
uma pincelada.
— Oh, merda!
Corrigi o erro e só então me levantei para atender a
porta, mas o que vi pelo olho mágico digital me deixou
boquiaberta.
Parado do lado de fora estava o homem desagradável
que encontrei no elevador da Fertile Future. Atrás dele, os dois
seguranças que eu já conhecia.
Até me arrepiei diante da expressão fechada e da
energia pesada que emanava dele.
Mas como isso é possível?
Senti um mal-estar repentino e encostei a testa na
madeira da porta, respirando fundo para me recuperar. Eram
tantos os questionamentos que se agitavam na minha mente que
fiquei atordoada. Afinal, como foi que aquele homem descobriu
onde eu morava? Quem era ele e o que queria comigo? Seria
mesmo um dos diretores da clínica? Se fosse, o homem não
viria à minha casa sem avisar para falar sobre o doador
anônimo que havia me ligado. Depois me lembrei que preenchi
a ficha da clínica com o endereço da mansão do meu pai e não
do meu novo apartamento.
Enquanto eu pensava em tudo aquilo, a campainha
tocou mais uma vez. Voltei a olhar para o homem, cuja
fisionomia havia ficado mais aterradora do que antes, e só então
a minha ficha caiu.
Não, meu Deus, não pode ser!
— Michelle Smith, precisamos conversar. Bloquear o
meu número não vai resolver a situação. — A voz gutural soou
abafada do outro lado da porta, mas bastante audível para mim.
Fechei os olhos ao ter a confirmação das minhas tristes
suspeitas. Arrasada, senti o desespero me dominar ao imaginar
que aquele homem horrível fosse o pai do meu filho.
Eu me nego a acreditar nisso! Eu me nego
terminantemente a acreditar nisso!
Afastei-me, olhando horrorizada para a porta. A
sensação que eu tinha era de que ele conseguia me ver através
da madeira sólida com aqueles olhos negros e geladamente
sombrios.
Eu não queria falar pessoalmente com ele, mesmo
tendo consciência de que não havia mais dúvida alguma que
aquele homem não era um golpista qualquer que me viu saindo
da clínica e resolveu ganhar dinheiro me chantageando. Agora
que o reconheci como sendo o homem do elevador, aquela
suspeita inicial caía por terra. Ainda assim, eu continuava
negando-me terminantemente a entrar em contato com o doador
anônimo, que, para o meu desespero, de anônimo já não tinha
mais nada!
Decidida, fui pegar o meu celular, desbloqueando o
número dele. Imediatamente depois, liguei-lhe.
O homem me atendeu logo no segundo toque.
— Peço que vá embora e me deixe em paz — falei sem
perder tempo com cumprimentos. — Não temos nada para
conversar sobre este assunto que o trouxe aqui.
— Temos muito o que conversar. Fingir que nada está
acontecendo é a pior decisão que você poderia tomar, porque
não vou desistir. — Ele foi duro, sem se preocupar em amenizar
o tom exigente e autoritário. — Nós dois fomos vítimas de um
erro e precisamos resolver esta situação o mais rápido possível.
Abra a porta para conversarmos ou me acompanhe até o meu
escritório para tratarmos do assunto com privacidade. Não vou
conversar sobre um assunto desses por telefone nem ficar
gritando do lado de fora da sua porta.
O tom de voz dele era insuportável! Porém, mais
insuportável ainda era a possibilidade de ele ser mesmo o dono
do espermatozoide que a Fertile Future implantou em mim.
“Nós dois fomos vítimas de um erro.”
Um erro crasso, grotesco e que eu não conseguia
aceitar. Só agora eu entendia o motivo que o fez ir à clínica
naquele dia e estar com aquela expressão assustadora de quem
seria capaz de matar alguém. Sem dúvida que o homem tinha ido
falar com o doutor Harrison Davis, dono da Fertile Future.
Lembrei-me da atitude estranha da doutora Chelsea e
de como a atendente foi atrás de mim praticamente dentro do
elevador. Talvez elas duas soubessem do erro e aquele tenha
sido o motivo de marcarem a consulta. Tudo indicava que a
médica ia me contar o que havia acontecido, mas me neguei a
ser examinada e fui embora às pressas.
Merda!
Se eu já estivesse sabendo sobre o erro da clínica,
teria dado um jeito de aquele homem horroroso nunca saber da
minha identidade ou onde eu estava.
Furiosa, desliguei o celular sem dizer mais nada e fui
abrir a porta, disposta a despachá-lo de vez da minha vida.
Capítulo 8
Michelle
Parte da minha coragem se desvaneceu quando abri a
porta e dei de cara com o olhar glacial daquele homem. Tyler
Blackwolf era dono dos olhos mais frios que já vi na minha
vida e inspirei profundamente para aguentar o impacto da
presença dele.
Aquele olhar que eu achava sinistro, analisou-me de
maneira penetrante de alto a baixo, como se quisesse ter a
certeza de que eu estava apta para ter um filho dele. Tive a
sensação de que me considerava apenas uma barriga de aluguel
e não a verdadeira mãe do bebê.
Quase mudei de ideia e fechei a porta na cara dele,
mas me contive a tempo. O homem tinha razão, precisávamos
conversar e esclarecer tudo entre nós dois, principalmente o
fato de que ele teria de desaparecer da minha vida e da vida do
meu filho.
— Pode entrar, mas sozinho, por favor.
Fui o mais educada que consegui, considerando que
estava sendo forçada a recebê-lo em minha casa.
Ele ergueu uma mão e fez sinal para os seguranças,
detendo-os lá fora e entrando sozinho no apartamento.
Fechei a porta e o conduzi para a sala, oferecendo-lhe
cortesmente o sofá para que se sentasse. Como da vez anterior
em que o encontrei,

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