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1 1 SUMÁRIO 1A CONCEPÇÃO DE CURRÍCULO INTEGRADO E O ENSINO DE QUÍMICA NO “NOVO ENSINO MÉDIO” ...................................................................................... 2 2 HISTÓRIA DA QUÍMICA ............................................................................. 9 3 RAMOS DA QUÍMICA............................................................................... 15 3.1 Química inorgânica ............................................................................ 15 4 Química orgânica ...................................................................................... 17 5 Físico Química .......................................................................................... 19 6 Química analítica ...................................................................................... 21 7 Química Quântica ..................................................................................... 25 8 Química Biológica ..................................................................................... 28 bibliografia ...................................................................................................... 32 9 LEITURA COMPLEMENTAR .................................................................... 33 BIBLIOGRAFIA ............................................................................................... 45 2 2 1 A CONCEPÇÃO DE CURRÍCULO INTEGRADO E O ENSINO DE QUÍMICA NO “NOVO ENSINO MÉDIO”1 Fonte: manualdaquimica.uol.com.b Nos últimos anos, em um mundo cada vez mais globalizado e interligado, a preocupação com um ensino mais integrado ganha destaque nos debates educacionais, orientando a construção e a concretização das propostas curriculares. Dentre elas, podemos situar a reforma do Ensino Médio. Os Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (PCNEM), um dos braços da reforma e objeto de estudo e análise deste trabalho, apresentam como eixo central a reorganização curricular baseada na integração, via interdisciplinaridade e contextualização. Por intermédio desses princípios, os documentos visam formar um ensino mais geral, polivalente e flexível e propõem um currículo dividido em três áreas, abrangendo disciplinas entendidas como mais afins entre si. Nesta apostila, focaliza-se a organização do conhecimento escolar do “Novo Ensino Médio” para a área de Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias (Biologia, Física, Química e Matemática), expressa nos documentos oficiais. Analisa- 1 Texto adaptado de Rozana Gomes de Abreu 3 3 se, a partir das teorias curriculares críticas, os pressupostos dessa nova organização curricular e suas limitações e implicações para o ensino de Química. A análise dessa proposta envolve a concepção de currículo como construção social, defendida por Goodson, de currículo integrado e interdisciplinaridade, desenvolvidas por Santomé, além dos princípios de classificação e enquadramento de Bernstein. Argumenta-se que o currículo deve ser entendido como uma construção sócia histórica constituída por relações sociais mais amplas e que a integração também pode ser desenvolvida em um currículo disciplinar. O Ensino Médio é um ensino tradicionalmente disciplinar, uma vez que as disciplinas escolares tendem a se aproximar das disciplinas acadêmicas em busca de status, recursos e território, delineando relações de poder e controle mais nítidos e constituindo padrões de estabilidade curricular (Goodson, 1995). Assim, entender como a integração pode ser desenvolvida nesse nível de ensino depende da compreensão dos mecanismos de organização e de controle presentes nessa nova forma curricular. Goodson (1997) argumenta que as disciplinas são construídas sócias historicamente a partir de exigências sociais, tanto no contexto científico quanto no acadêmico e escolar. Entretanto, ressalta que não existe uma identificação entre disciplina escolar e disciplina científica ou acadêmica, pois os mecanismos de regulação presentes nesses contextos são diferentes. Apesar de o discurso oficial orientar a nova organização curricular para o reconhecimento e aceitação de que o conhecimento é uma construção coletiva (MEC/SEMTEC, 1999, vol. I, p.75), a ideia de disciplina trabalhada nos documentos parece querer estar isenta das relações sociais, pois não há um questionamento quanto à sua forma de organização e seleção. Além disso, inúmeras vezes o conhecimento escolar é tratado como se fosse o próprio conhecimento científico- tecnológico valorizado no mundo do trabalho, uma vez que o aprendizado deve possibilitar ao aluno a compreensão tanto dos processos químicos em si quanto da construção de um conhecimento científico em estreita relação com as aplicações tecnológicas (MEC/SEMTEC, 1999, vol. III, p.31). Não é considerado que o conhecimento escolar não é igual ao conhecimento científico-tecnológico: existem processos de transposição didática (Chevallard, 1991) e de recontextualização (Bernstein, 1996a), a fim de atender aos objetivos escolares e às relações sociais existentes no espaço escolar. 4 4 A defesa do currículo integrado, objeto dos PCNEM, pode se basear em diversas razões, como Santomé (1998) desenvolve. Primeiro, em razões epistemológicas e metodológicas, as quais defendem que um ensino mais integrado possibilita a análise de um problema ou de uma situação sob diferentes óticas disciplinares. Nesse caso, o argumento é de que o conhecimento científico atual está tão inter-relacionado que romperia com as barreiras disciplinares. Segundo, em razões psicológicas, que defendem a integração como meio de atender às necessidades e aos interesses dos indivíduos, valorizando-se a experiência individual e os processos de aprendizagem. Terceiro, em razões sociológicas, as quais defendem a humanização do conhecimento escolar, pois este produz e realça visões alienadas da sociedade, como se o mundo fosse a-histórico, inevitável e sem atores participantes de sua configuração. Dessa forma, o currículo integrado permitiria: trabalhar com conteúdos culturais mais relevantes e/ou situados nas fronteiras das disciplinas; favorecer a atuação e formação de professores-pesquisadores; a adaptação aos atuais processos de trabalho e à crescente mobilidade de empregos; além de estimular a análise de problemas e a busca de soluções (Santomé, 1998). Entretanto, é preciso considerar que o currículo é condicionado por relações de poder e de controle existentes no contexto social mais amplo. A defesa do currículo integrado baseada na maior aproximação do conhecimento científico limita a interpretação das disciplinas a espaços neutros e harmoniosos, como se as disciplinas estivessem dissociadas das relações sociais de poder e controle existentes. A supervalorização das questões psicológicas pode fazer com que o currículo fique centrado apenas na experiência individual e nos processos de aprendizagem, não ampliando para outras questões e visões mais gerais. Assim como as questões sociológicas também devem ser analisadas com cuidado, uma vez que podem não estar considerando e questionando as relações de poder e controle que existem na sociedade. A discussão sobre currículo integrado fica ainda mais complexa com a diversidade de orientações teóricas que são construídas em torno do mesmo tema, capazes de organizar de diferentes formas o currículo integrado. Sabe-se que a integração pode ser desenvolvida tanto em uma matriz disciplinar como em outras matrizes (projetos, áreas, etc.), de maneira a coexistirem disciplinas e integração (Macedo & Lopes, 1999). Bernstein (1996a) aprofunda essa argumentação. Para o 5 5 pesquisador, o currículo é um conjunto de conhecimentos selecionados e organizados de acordo com os códigos de poder e controle, os quais se baseiam em dois princípiosregulativos: a classificação e o enquadramento. A classificação se refere às relações entre as categorias, isto é, se a relação entre as disciplinas é mais ou menos integrada. Quanto mais forte a classificação, maior o isolamento entre as disciplinas, menor a integração entre elas. Já o enquadramento se refere ao controle na transmissão dos conhecimentos. Quanto maior o controle do processo de transmissão, maior é o enquadramento, ou seja, maior é o controle do tempo, do ritmo, do que pode ser dito ou não, como, por quem e quando. É com base nesses dois princípios regulativos que Bernstein identifica dois tipos de currículo: o currículo tipo coleção, com alto grau de enquadramento e classificação, e o currículo tipo integrado, com baixo grau de enquadramento e classificação. O currículo tipo integrado, defendido pelo pesquisador, apresenta relações menos hierarquizadas, maior diálogo e trânsito entre as disciplinas e menor controle do processo de transmissão de conhecimentos. Na realidade, existem variações entre um extremo e outro, ou seja, entre o tipo coleção e o tipo integrado. Nos PCNEM, a interdisciplinaridade é defendida pela afirmação de que existem limites frágeis e pouco nítidos entre as disciplinas, os quais poderiam favorecer o diálogo e a interação entre as mesmas. Argumentam assim, que a demarcação rígida do currículo é epistemologicamente frágil. Entretanto, esses limites frágeis e pouco definidos, os quais levam a uma classificação fraca segundo Bernstein, não garantem sozinhos a integração. Não se pode esquecer que a integração também depende do grau de controle de professores e alunos sobre a seleção, a organização e a distribuição dos conhecimentos (enquadramento), questões não discutidas nos PCNEM. Dessa forma, a não diluição das disciplinas a que os documentos fazem referência não está relacionada somente à existência de uma base para o trabalho escolar. Está relacionada também às relações sociais de poder e controle as quais estabelecem fronteiras/limites bem definidos, pelos quais as lutas por espaço, status e recursos são justificados. A questão não é somente epistemológica, é também social e política. Entretanto, será que a integração precisa necessariamente de uma base disciplinar para ocorrer? Na medida em que a integração pode ocorrer em outras organizações curriculares, ela necessita principalmente de uma organização que 6 6 permita o diálogo entre os diferentes saberes, e é justamente por isso que a interdisciplinaridade pode ser ameaçada. As disciplinas possuem socialmente uma individualidade tão forte e arraigada, isto é, características e conhecimentos específicos marcantes, códigos e regras tão próprios, os quais influenciam e são influenciados pelas estruturas rígidas escolares, que podem prejudicar as interações e o diálogo entre elas. Entendo que a rigidez entre essas demarcações varia entre as diferentes disciplinas, porém é preciso lembrar novamente que qualquer disciplina atende a demandas sociais, sendo constituída e influenciada por interesses e relações de poder e controle. Além disso, a integração requer também novas formas de poder e controle sobre todo o processo pedagógico. Isso pode constituir um empecilho para sua implantação e legitimação. Ou seja, os mecanismos de seleção, organização e distribuição escolar devem mudar para atender às exigências da nova organização curricular e também para continuar atendendo às demandas sociais existentes. Os PCNEM parecem seguir esta orientação, pois, ao mesmo tempo em que promovem um ensino mais aberto e flexível, também são controlados pelas avaliações nacionais. Quanto à contextualização, ela é entendida como forma de garantir a integração do conhecimento escolar com a realidade social, facilitando o processo de aprendizagem. Os textos oficiais defendem que o ensino atual está descontextualizado, pois os conhecimentos trabalhados são muito abstratos. Porém, não relacionam essa abstração ao reflexo da aproximação entre as disciplinas escolares e as acadêmicas (Goodson, 1997), capaz de justificar as demandas sociais na seleção, hierarquização e exclusão escolar. Analisam a descontextualização de forma neutra, como se a mudança no currículo fosse apenas uma questão técnica e não social e política, a qual garantiria novas relações da organização do conhecimento. Assim, a ideia de que a integração proposta pelos documentos somente será alcançada por intermédio da interdisciplinaridade e da contextualização é questionável, pois é possível contextualizarmos sem que haja integração, sem nos tornarmos interdisciplinares. Por exemplo, é possível contextualizar a velocidade das reações relacionando-a com a degradação ou a conservação de um alimento, sem promover uma interação com as outras disciplinas, como a Biologia. Há muito existem propostas desse tipo no Ensino de Química, como a de Lutfi (1988), sem que necessariamente desenvolva-se o foco na interdisciplinaridade. Também é possível 7 7 promover a interdisciplinaridade sem contextualizar, a partir da tentativa de articulação de diferentes áreas de conhecimento para análise de determinado conceito ou conteúdo, sem que necessariamente se estabeleça uma ligação entre teoria e prática no cotidiano. Os PCNEM desconsideram tais questões por tratarem a interdisciplinaridade e a contextualização somente como conceitos metodológicos, e não como conceitos sócio históricos. Os documentos argumentam também que o contexto do trabalho é imprescindível para a compreensão dos fundamentos científico-tecnológicos dos processos produtivos (MEC/SEMTEC, 1999, vol. I, p. 81). Dessa forma, elegem as tecnologias como princípio integrador, uma vez que permitem contextualizar os conhecimentos de todas as áreas e disciplinas no mundo do trabalho. Temas relacionados à vida social e, principalmente, ao mundo do trabalho, como metalurgia, solos e fertilização, combustíveis e combustão, tratamento de água, obtenção, conservação e uso dos alimentos, chuva ácida, fermentação e muitos outros são mencionados e indicados como fontes potenciais para a discussão integrada dos conhecimentos químicos com os demais. Nesse caso, estabelecem uma relação estreita entre trabalho, tecnologias e conhecimento, como se essas relações fossem naturais e neutras, dissociadas das relações sociais. Na verdade, existe uma supervalorização das tecnologias, à medida que adquirem a função de formar indivíduos mais capacitados e flexíveis para as novas exigências do “trabalho” e da “vida” (Bernstein, 1996b). Assim, desconsideram a capacitação dos professores e a necessidade de mudanças na organização escolar. Com relação à visão interdisciplinar apresentada para a disciplina Química, os documentos defendem que os modelos, os conceitos, os princípios, os fenômenos e os processos não pertencem exclusivamente a uma ou outra disciplina, eles transitam por todas as disciplinas. Por exemplo, os processos de evaporação, condensação, dissolução, emissão e recepção de radiação térmica e luminosa estão presentes na Biologia, na Física e na Química, através do ciclo da água e da fotossíntese, do funcionamento de uma hidrelétrica e do biodigestor, da poluição dos rios, etc. Quanto à Matemática, ela permite a interpretação de fenômenos e informações além de estabelecer relações. 8 8 Fonte: www.cpctreinamentos.com.br/quimica.php É necessário ressaltar que essa nova forma de organização curricular incorporou vários princípios e conclusões das pesquisas em Ensino de Química, principalmente do projeto GEPEQ-USP, equipe responsável pela primeira versão da proposta. Por exemplo, a ideia de inverter a ordem dos conteúdos tradicionais (visão macroscópica antes da microscópica), partindo das vivências do indivíduo; a ideia da vinculação dos conhecimentos químicos com o cotidiano; a ideia de que a Químicatrabalha com modelos e não, com verdades absolutas; a não-memorização de símbolos e fórmulas; e o resgate histórico do conhecimento científico. Tais ideias são consenso há anos nas pesquisas em Ensino de Química e não se constituem em novidades (Chassot, 1995; Maldaner, 1992). Concorda-se que a possibilidade de trabalho integrado e contextualizado para os conhecimentos de Química com os demais conhecimentos da área é bastante grande nessa perspectiva curricular, embora em um primeiro momento arrisque afirmar que os esforços se concentrarão apenas na contextualização. Buscar temas relacionados à vida social e ao trabalho, associando os conteúdos aos processos tecnológicos, para a partir deles construir os conceitos fundamentais da química, será muito mais fácil do que promover a interdisciplinaridade, desde que os processos de avaliação centralizada como o ENEM desenvolvam-se também nesta direção. A interdisciplinaridade, diferentemente, dependerá em maior grau das novas formas de relação e de organização que se constituirão uma exigência dentro da atual estrutura 9 9 escolar (grau de classificação e enquadramento presentes). A integração da Química com as demais disciplinas exigirá um tempo maior para o diálogo entre as disciplinas, o preparo de atividades integradas e formação distinta dos professores. Essas novas condições para o desenvolvimento de um trabalho mais integrado produzirão conflitos/tensões na estrutura, muitas vezes rígida e inflexível, do contexto escolar desenvolvida como forma de controle do trabalho pedagógico. Os documentos oficiais condicionam a integração à interdisciplinaridade e à contextualização, e não ao fato de que é necessário compreendermos as relações presentes no contexto escolar e na sociedade como um todo. Dessa forma, não analisam que o conhecimento escolar possui relações profundas com a estruturação social, com o fato de que esse conhecimento escolar é construído socialmente segundo suas relações, não é um produto natural e neutro. Com isso, a ideia de integração fica comprometida com o enfoque epistemológico e psicológico que a proposta assume. Dessa forma, argumento que a integração do conhecimento químico com os demais conhecimentos da área parece estar identificada com o conhecimento científico e com a supervalorização das tecnologias, o que pode comprometer a superação da forte divisão disciplinar existente no Ensino Médio. Portanto, defendo que os PCNEM tendem a não favorecer mudanças significativas na organização curricular para a área de Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias. 2 HISTÓRIA DA QUÍMICA O desenvolvimento material da civilização, tanto no oriente, como no ocidente, foi acompanhado do desenvolvimento de procedimentos de natureza química para obtenção de substâncias ou para sua purificação. Processo de destilação, de fermentação, de redução e de extração são conhecidos da civilização do norte da África, do Oriente médio, da China e da Índia. O fato químico, porém, talvez devido à própria complexidade, não era objeto de investigação, tal como ocorreu com o fato físico, o que não impediu, todavia, a formação de respeitável corpo de conhecimentos práticos. 10 10 Fonte: www.wreducacional.com.br A metalurgia do cobre (e do estanho, do ouro, da prata) era bem conhecida, como também a do ferro. A técnica de fabricação do vidro e de sua coloração era razoavelmente dominada. Sabia-se falsificar a aparência de um metal para fazê-lo passar por nobre; utilizavam-se soluções de polissulfetos, obtidas a partir de enxofre e carbonato. Esses conhecimentos passam aos árabes e retornam à Europa, por volta do séc.XIV. O século XVI encontra, então, sólido terreno para desenvolver uma química técnica apurada, com procedimentos e métodos bastante semelhantes aos atuais. Aparece à preocupação quantitativa, e os praticantes (farmacêuticos, metalurgista e mineralogistas) começam a ponderar as substâncias reagentes. A balança instala-se na química, para se tornar instrumento decisivo de investigação aprofundada de relações. A análise de uma obra capital na história da química da ideia de sua prática no século XVI. Em 1556 surge, aparentemente depois de mais de vinte anos de preparação, o livro de Georg Bauer (1494-1555), conhecido pelo nome latinizado de Georgis Agrícola - De Re Metallica - manual prático de metalúrgica e química, cuja popularidade não arrefeceu durante mais de um século. É surpreendente a soma de informações nele contidas. Ao lado d indicações sobre a técnica de exploração de minas (levantamento das jazidas, cortes no terreno, escavação de galerias, 11 11 esgotamento de água, sustentação do terreno, transporte do minério), Agrícola dá informações e receitas, detalhadas e precisas, sobre os processos de obtenção de metais. Descreve a metalúrgica do chumbo, do bismuto, do ferro, do cobalto, do cobre, do ouro, da prata, do estanho, do mercúrio, do antimônio. A obtenção do enxofre, do óxido de arsênio. A obtenção e/ou do uso de grande número de compostos e ligas: alúmen, álgamas, ácido nítrico, bronze, latão, óxidos de chumbo, ácido sulfúrico, cloreto de sódio, cloreto de amônio, vinagre e etc. O extraordinário no livro - a refletir certamente evolução técnica cultural - são as objetividade e a precisão das descrições, feitas com o intuito de serem úteis e funcionais aos funcionários aos usuários. Não se discutem, e é isso outro traço característico da obra, nem teorias e hipóteses da constituições das substâncias. Sobre essa sólida base, continua a evolução do conhecimento científico das substâncias, no século XVII. É especialmente notável o aumento das informações sobre as propriedades terapêuticas das substâncias, desenvolvido (a meio de especulações teóricas nebulosas) pelos iatroquímicos. São, à época, os farmacêuticos os ativos pesquisadores da química, secundados pelos médicos; não a ainda a profissão de químico. Dessa época data o conhecimento preciso do ácido sulfúrico e do ácido clorídrico. O alemão Johann Rudolf Glauber (1603 ou 1604 - 1668 ou 1670) faz do sulfato de sódio quase de uma panécia (até hoje é ele conhecido como sal de Glauber). O séc. XVIII é época de vigoroso desenvolvimento do conhecimento empírico. O número de metais conhecidos com segurança amplia a listagem agrícola: platina, níquel, manganês, molibdênio, telúrio, tungstênio, cromo. São identificados os óxidos de zircônio, de estrôncio, de titânio, de ítrio, mas não se isolam os metais. A descoberta da técnica de manipulação de gases permite identificar o dióxido de carbono, o hidrogênio (ar mefítico) e o hidrogênio (ar inflamável). Joseph Priestlay (1733-1804) aumenta os conjuntos dos gases conhecidos, numa sequência de experiências memoráveis; identifica o óxido de nítrico, o dióxido de enxofre, o gás clorídrico, o amoníaco e finalmente o oxigênio (ar desflogisticado, ar ígneo, de Sheele). Não é demais realçar o extraordinário feito técnico da identificação de um gás. Ao lado das limitações naturais dos equipamentos disponíveis, concorria para tornar 12 12 mais difícil a questão o fato de não dispor de teoria coerente para a interpretação dos fenômenos químicos. Por isso mesmo, no final do século. XVIII, tornou-se indispensável formulação desse tipo, que viria coroar a evolução do pensamento teórico que acompanhará o amealhar do conhecimento experimental. As formulações teóricas da química até o séc. XVIII. A diversidade das modificações das substâncias - aparente na variedade ampla de propriedades, formas e comportamentos - constituiu sempre um motivo básico para a procura de uma teoria unificadora, capaz de interpretá-la coerentemente. OP pensamento teórico químico (mesmo quando não explicitado como tal) teve sempre essa preocupação. A princípio, naturalmente, a interpretação só poderia ser feitapor via racional, consoante o desenvolvimento histórico do pensamento humano. Foi o que fez, por exemplo, Aristóteles, no séc. IV A.C., com os seus quatro elementos (água, fogo, terra, e ar) em que estavam asa qualidades elementares - frio, quente, seco e úmido - combinadas aos pares. As propriedades das substâncias decorriam de variações do grau dessas elementares, da modificações das suas proporções. A unificação teórica era completa e as ideias de Aristóteles, sob uma forma ou outra, mantiveram sua integridade essencial até o séc. XVIII. Daí surgiu à alquimia, não apenas como cura especulação intelectual, mas como consequência de uma forma racional do pensamento, embora não factual. Para o químico moderno é a alquimia obscura, nebulosa e verossímio. Talvez o seja, nos seus aspectos esotéricos; mas como forma de pensar em química, como tentativa de elaboração teórica, é coerente com uma filosofia e, portanto, não lhe falta sustentação intelectiva. O alquimista vem do artesão, que tentava purificar, transformar, alterar substâncias e se guiava pela existência das qualidades elementares. Então, para conseguir modificações essenciais (hoje se diriam estruturais) era necessário levar a substância à forma primeira, mas indiferenciado, para depois imprimir-lhe, mediante adições apropriadas, as qualidades desejadas. Assim se desenvolveram escolas de alquimia em Alexandria, em Bizâncio, no mundo árabe. A sistematização da alquimia no Islã - Ao lado do seu envolvimento no pensamento místico - foi importante por sua ocasião de sua transmissão aos países europeus. Organizaram-se as teorias da constituição das substâncias, partindo da teoria de Aristóteles, segundo a qual as qualidades podiam ser exteriores ou interiores. Seria possível modificar uma 13 13 substância se as suas qualidades interiores fossem exteriorizadas, o que se conseguia mediante um elixir. As qualidades elementares eram materiais que podiam ser manipulados, desde que houvesse um veículo apropriado. As substâncias eram classificadas segundo as suas propriedades: espíritos (voláteis), metais (fusíveis), corpos (pulverizáveis). A evolução do conhecimento levou à formulação da teoria dualista da constituição das substâncias (enxofre-mercúrio) e à possibilidade teórica da transmutação das substâncias, que se traduziu em vigoroso esforço experimental. Quando a alquimia retorna à Europa, vem envolta na especulação paramaterial que lhe é característica, mas traz também grande soma de conhecimentos que iriam florescer no esforço experimental e teórico dos séculos XVI e XVII. É importante não esquecer a elaboração teórica, que ficou mais ou menos renegada ao segundo plano até o século XVIII, das ideias atomistas de Leucipo e Demócrito, dos epicuristas e de Lucrécio. É interessante especular também se outras tivessem sido as condições do desenvolvimento do mundo Romano, se a ideia atômica poderia ou não ter ganhado mais cedo à aceitação do mundo ilustrado. É possível que se tivesse mais cedo chegado às concepções modernas da química. Historicamente, o pensamento atomista não exerceu influência no pensamento científico, até quase o limiar da ciência moderna. A teoria da alquimia prevalece absoluta como formulação teórica no século XVI. Os iatroquímicos, procurando sistematicamente aplicar substâncias químicas à cura de doenças, pensavam em termos de princípio. Para Celso enuncia a teoria dos Tria Prima, enxofre, mercúrio e sal, que é um refinamento de alquimia árabe. A preocupação teórica é de explicar como uma substância passa a outra, pela modificação dos seus princípios. Mas, ao mesmo tempo, por parte especialmente dos apotecários, o pensamento químico se torna mais prático, mais objetiva, mais quantitativa: os germes da química medida, mensurada, começaram a surgir no século XVII. É disso testemunha a obra de Glauber. O médico e químico belga Johannes Baptista van Helmont (1579 - 1644), embora se tenha mantido fiel às concepções teóricas da alquimia, elabora uma teoria que aumentava de três para cinco, os princípios fundamentais: Enxofre, mercúrio, sal, fleugma e terra. Aparecem, também, no século XVII, as primeiras formulações da descontinuidade da matéria. O filósofo e matemático francês Pierre Garsend (1582 - 14 14 1655) retoma a ideia dos átomos, atribuindo-lhes pequeninos ganchos para constituírem os corpos. Essa ideia, oposta à dos princípios de Aristóteles, ou aos Arcanos, elixires e essenciais dos alquimistas, aparecem mais claramente expressa pelo químico inglês Robert Boyle (1627-1691), The Sceptical chymist (1661; o químico céptico). Para Boyle, a matéria em movimento seriam os conceitos fundamentais, para o entendimento das propriedades químicas. A matéria seria constituídas por pequeninos blocos indivisíveis com forma próprias que se justaporiam agregando-se nos compostos. O calor seria também uma espécie de substância, com partículas em rápida movimentação. É controvertido se Boyle concebia as substâncias elementares como imutáveis, ou se admitia a possibilidade de transmutação. De qualquer forma, sua obra influenciou decididamente o pensamento químico, ajudando-o a purificar-se dos princípios primeiros dos princípios abstratos e não factual. Por outro lado, os êxitos do pensamento mecânico, expostos de uma forma superior e magistral dos princípios de Newton (1687), mostraram aos químicos um caminho novo para unificar teoricamente a massa de fatos. Ao terminar o século XVII, as ideias de átomo, de movimento, de interação mecânica, já eram subjacentes ao pensamento químico, embora ainda não formulada com clareza. No século XVIII, A investigação do fenômeno da combustão leva à formulação da teoria do flogístico por Georg Ernst Stahl (1660-1774) e Ermman Boerhaave (1668- 1738). Em linguagem moderna, o flogístico era o negativo do oxigênio, na combustão exalava-se flogístico, em lugar de haver combinação com o oxigênio. Foi este o primeiro princípio teórico da química, explicando satisfatoriamente uma multidão de fatos experimentas, mais deixando de lado outros que não se enquadravam na desflogistificação. A grande vantagem da teoria era de oferecer explicação mecânica e simples de fenômenos diversos. Por isso mesmo, pôde acompanhar, vicissitudes, o rápido avanço da química empírica registrada no século XVIII. Ao término deste período, estavam maduras asa condições para uma formulação unificadora dos fenômenos da química. Essa tarefa coube ao fundador da química moderna o francês Antoine Laurent de Lavoisier (1743-1794). 15 15 3 RAMOS DA QUÍMICA Fonte: www.forquilhinhanoticias.com.br 3.1 Química inorgânica A química inorgânica no século XIX. O pensamento de Lavoisier coloca-o conceitualmente na corrente do pensamento típico do século XIX, embora temporariamente pertença ao século XVIII. Não há rigidez na distinção. O mérito de Lavoisier foi de Ter elucidado o fenômeno da combustão, sepultando a teoria do flogístico; Ter colocado a química numa firme base experimental; Ter reconhecido a natureza das substâncias elementares; Ter formulado explicitamente a lei da conservação da massa; Ter suportado estimulado o sistema de nomenclatura que, em essência, é o que se utiliza atualmente na química inorgânica. Seu livro Traité élémentaire de chimie (1789; tratado elementar de química) teve importância comparável ao de Newton pela influência que exerceu sobre os químicos. Dispunha-se depois dele de arma teórica para o entendimento das reações químicas. Começa a época da formulação de leis gerais da combinação. J. B. Richter (1824-1898) e, com mais clareza J. L. Proust (1762-1807), formulam as leis das proporções constantes, que dá origem a formidanda controvérsia. Com C. L. Berthollet (1748-1822): Hoje se sabe que há ambos sobravam razões. A lei da constância da 16 16 composição, noentanto, teve aceitação universal. Abriu caminho para o trabalho de John Dalton (1786-1844), que deu uma formulação precisa e clara sobre o átomo (partícula indivisível de uma partícula simples); que admitiu a combinação dos átomos para formar compostos (Dalton achava que só dois átomos se reuniam, raramente três), e estabeleceu a base teórica da lei das proporções constantes; que organizou uma tábua de pesos relativos (equivalentes). Passou a química a navegar com bússola mais segura. É época dos trabalhos de J. J. Berzelius (1779-1848), que determina com técnica analítica vasta. Pesos atômicos e descobre elementos (selênio, silício, titânio) além de diversas espécies de minerais. Berzelius organiza uma notação química simples, embora tenha sido modificada para melhor posteriormente; os símbolos dos elementos são, no entanto os que até hoje se usam. As descobertas sucedem-se no terreno da química inorgânica. Obtêm-se puros o silício o zircônio, o titânio e o tório. O magnésio e o berílio são isolados. Obtêm-se o alumínio. Tudo por métodos puramente químicos. Com a utilização da espectroscopia torna-se possível identificar quantidades minutíssimas de substâncias em sistemas complexos. Assim, R. W. Bunsen (1811-1889) descobre o césio e o rubídio. Os padrões de medida aperfeiçoam e constroem-se extensas tábuas de pesos equivalentes a hipótese de A. Avogrado (1776-1856) - desprezada por quase cinquenta anos - ganha rápida aceitação, uma vez exposta por S. Cannizzaro (1826- 1910), em 1860. Desfazem-se as confusões sobre os pesos atômico e molecular, e os valores atribuídos a essas grandezas correspondem aos modernos. Mas uma vez o conhecimento vastíssimo das propriedades dos elementos permitia um nova síntese - a da classificação periódica. A obra de Mendeleev (1834-1907) tem atrás de si toda a elaboração teórica e todo o trabalho experimental da química dos séculos anteriores. É como o coroamento de uma etapa. A obra aparece em alemão, pela primeira vez, em 1869. De fato, logo após o aparecimento da obra, não lhe prestaram os químicos de grande aceitação. No entanto, a descoberta do Gálio (identificado como o eka- alumínio, previsto por Medeleev), a do escândio (identificado como eka-boro), e a do gremânio (análogo ao eka-silício) foram convincentes demonstrações da genialidade da classificação. Atualmente, com o conhecimento mais ou menos detalhado da 17 17 estrutura atômica, não é mais possível deixar de reconhecer a extraordinária intuição do sábio russo. Com a sistematização da classificação das substâncias elementares, ficavam de uma vez enterradas as ideias das essências alquímicas. As combinações inorgânicas apareciam como consequência de propriedades naturais dos elementos. Faltava, porém, explicar porque ê estes combinavam e o que havia de comum entre as combinações química e o resto do comportamento da matéria. A síntese desse pensamento ocorreu no desenvolvimento da físico-química. 4 QUÍMICA ORGÂNICA Fonte: unimonte.br Não foi novidade no séc. XIX a investigação dos compostos orgânicos. Já a alquimia árabe os considerava em detalhe, especialmente na sua atuação medicinal. Muitos processos orgânicos eram conhecidos e praticados há séculos (fermentações, por exemplo). Não havia, porém, clareza sobre o quê distinguia os compostos orgânicos dos inorgânicos. No início do séc. XIX ficou evidente os compostos orgânicos obedeciam à lei das combinações (Berzelius). Supunha-se, porém, que uma força vital os permeasse, distinguido dos orgânicos e impedindo a sua obtenção em laboratório. 18 18 O primeiro grande golpe contra essa teoria foi à obtenção da ureia, a partir do cianato de amônio, por Friedrich Wöhler. Pouco depois P.E.M. Berthelot (1827-1907) anuncia a possibilidade de obtenção de qualquer substância orgânica a partir de carbono, hidrogênio, oxigênio e nitrogênio. Foi o golpe mortal no vitalismo. O crescimento da química orgânica foi então rápido. Descobrem-se os radicais e estrutura-se toda uma teoria, em parte falsa, sobre eles. Reconhece-se o isomerismo. E as reações de substituição. Ficam evidentes os grupamentos funcionais. E, curiosamente, esquecem-se os orgânicos dos átomos, fixando-se nas unidades orgânicas, elas mesmas compostas. Em meados do séc. XIX F. A. Kekulé (1829-1896) mostra a tetra valência do carbono, contribuindo assim para a formulação da estrutura dos compostos orgânicos. A dos compostos alifáticos parece ficar completamente elucidada, quando se representam as ligações entre os átomos - o olvido orgânico - por pequenos traços, como ainda se faz. A estrutura dos compostos aromáticos recebe, de Kekulé, a chave de interpretação do hexágono do benzeno. A ideia de uma estrutura espacial vem com J. Le Bel (1847-1930) e tem bonita confirmação experimental nos trabalhos de L. Pasteur (1822-1895) sobre os isômeros do ácido tartárico. O progresso da síntese orgânica é rapidíssimo. Obtêm-se, por via sintética, corantes de importância industrial: a química orgânica transforma-se em grande indústria química. Apesar disso, a concepção da estrutura molecular ainda é qualitativa. As moléculas existiam sem que se tentasse representar razões mias gerais que garantissem e explicassem a sua estabilidade. O que só se consegue, no séc. XX, com a reunião frutífera da física à química. 19 19 5 FÍSICO QUÍMICA Fonte: manualdaquimica.uol.com.br A físico-química é a ciência cuja fronteiras podem ser largas ou estreitas, conforme o entendimento desse ou daquele autor. Conceitualmente, seria a investigação física das estruturas químicas, isto é, tudo o que, modernamente, se chama física atômica, física nuclear, mecânica quântica atômica e molecular. Historicamente, formou-se como um ramo da química preocupado com a investigação dos efeitos químicos da corrente elétrica (eletroquímica). Esses efeitos começaram a ser investigados quase imediatamente depois da descoberta de A. Volta (1745-1827). Os trabalhos de H. Davy e de M. Faraday, sobre eletrólise, datam do início do séc. XIX. A investigação eletroquímica toma, porém, sua feição mais moderna no estudo da dissociação eletrolítica (Grotthuss, Willianson, Clausius, Arrhenius) e da condução de carga pelos íons (Hittorf, Kohlrausch, Debye), que chegam até o séc. XX. A investigação das pilhas eletroquímicas (Nernst) tem oportunidade de utilizar, na química, as armas oferecidas por uma ciência puramente física – a termodinância, a termoquímica, foi objeto de investigação por parte dos químicos). Começava uma síntese intercientífica que iria culminar no início do século XX. 20 20 O estudo das velocidades de reação foi outro rebento da química do século XIX, é estudada a hidrólise da sacarose (Wilhelmi), a esterificação de ácidos e de álcoois. Define-se a ordem de uma reação (Van’t Hoff) e procura-se entender o mecanismo da reação (energia de ativação, Arrehenius). Investiga-se a catálise e define-se a função do catalisador (Ostwald). Ao terminar o século XIX, as descobertas químicas ofereciam um panorama satisfatório. Sem Ter conseguido as sínteses magistrais da física (termodinâmica, eletromagnetismo, teoria cinética dos gases, mecânica e etc.) tinha obtido a necessária uniformidade e a possibilidade de grande expansão. Alguns pontos eram desconfortáveis: não havia explicações para a afinidade química, nem para as estruturas das moléculas. A resolução desses problemas, ou pelo menos o avanço na sua resolução, veio da física, com a descoberta da radioatividade e a do elétron; a medida da carga específica e a da carga do elétron sua utilização inequívoca; a descoberta do efeito fotelétrico; a aplicação dos princípios da quantificação de Planck ao efeito fotelétrico, por Einstein; o modelo atômico imposto por Rutherford e modificado por Bohr; a mecânica ondulatória de Schrodinger; a quantificaçãodo átomo; a radioatividade artificial; a descoberta do nêutron; a descoberta de uma multidão de partículas elementares; a fissão nuclear. Todas essas descobertas e teorias viera de físicos e sacudiram espetacularmente a química, dando conteúdo novo e inesperados as suas teorias, unificando seus conceitos, criando uma química física, onde não há limite nítido entre o fato químico e o fato físico. 21 21 6 QUÍMICA ANALÍTICA Fonte: www.infoescola.com A química analítica remonta ao antigo Egito, onde já foram conhecidas entre outras, as técnicas de copelação do couro e da prata, em que o metal impuro era aquecido numa copela (cadinho poroso feito de cinza de osso); essa prática pode, de certo modo, como um método da química analítica. A química de então não podia ser considerada como ciência, isto é, sistemas de conhecimentos ordenados de acordo com certas leis e princípios, mas apenas como conjuntos de conhecimentos empíricos esparsos sem nenhuma interligação. Transmitidas dos egípcios aos gregos e destes aos árabes, essas técnicas empíricas foram desenvolvidas durante toda a Idade Média, constituindo o alicerce da alquimia. Visando a descoberta da panaceia universal e de todos os processos para a obtenção do ouro e da prata através da transmutação dos outros metais, os alquimistas contribuíram decisivamente para o progresso dos conhecimentos químicos. Mas só no século XVII, com Robert Boyle (1627-1691), a química começa a Ter aspecto de verdadeira ciência. Para estabelecer o conceito de que elementos são os corpos mais simples do que os quais os corpos complexos são formados, Boyle usou 22 22 pela primeira vez um novo método de química, baseado nos princípios de que os conhecimentos vem de uma generalização de dados experimentais e leis observadas na natureza. Esse conceito de elemento químico determinou grande desenvolvimento da química analítica. O próprio Boyle sistematizou as reações químicas até então conhecidas então propôs um número de novos testes, originando a química analítica por via úmida. Foi o primeiro a usar o litmo ou tornassol como indicador para substâncias ácidas e básicas. A química analítica teve importante avanço com os trabalhadores de Lavoisier (1743-1794) – desenvolvimento de técnicas de análises de gases – e do químico sueco Torbern Olof Bergman (1735-1784), que separou os metais (cátions) em grupos, dando origem a análise sistemática. O fundador da química analítica quantitativa com base científica foi, porém, o químico russo Mikhail Vasilievich lomonosov, o primeiro a usar a balança para pesar gentes e produtos numa reação química, e que, em 1756, confirmou experimentalmente a lei da conservação da matéria, geralmente atribuída a Laoisier, que a verificou em 1774. Fonte: www.quidelta.com.mx As observações feitas na química analítica quantitativa constituíram preciosos elementos para a química teórica, levando às descobertas das leis ponderais, cuja confirmação experimental permitiu a John Dalton (1766-1844) formular a teoria 23 23 atômica. Isso, por sua vez estimulou muito a química analítica quantitativa, já que se tornou necessária à determinação das massas atômicas dos elementos de maior rigor, campo ao qual Bezerlius (1779-1848) deu importante contribuição. Após ou durante esse período, Liebig (1803-1873) Gay-Lussac (1778-1850), Bunsen (1811-1899), Kirchhof (1824-1887), Nikolai Aleksandrovitch Menchtchunkin (1842-1907) e outros contribuíram de modo notável para o desenvolvimento da química analítica, qualitativa ou quantitativa, com grandes números de estudos e de descobertas. A química analítica quantitativa no final do século XIX foi grandemente influenciada pelos excepcionais progressos da química orgânica e da inorgânica, devendo-se destacar principalmente a classificação periódica dos elementos, de Mendeleev (1834-1907). A aplicação da dimetiglioxima como reagente para a determinação qualitativa e quantitativa do níquel, pelo químico russo L. A. Chugaev (1873-1922), significou a introdução do uso intensivo dos reagentes orgânicos nas análises químicas, desde 1905, ano em que aquele químico apresentou seus estudos. Atualmente, conhece-se grande número de reagentes orgânicos que se combinam com os compostos inorgânicos, formando compostos poucos solúveis e na maior parte das vezes, coloridos, no qual o metal não se encontra no estado iônico, mas sim formando compostos de coordenação. Esses compostos geralmente têm elevada massa molecular, de modo que pequena fração do íon fornece quantidade relativamente grande de precipitado. O precipitante orgânico ideal deve ser específico em caráter, isto é, só deve dar precipitado com um íon determinado. Isso, porém, é bastante difícil, sendo mais comum que o regente orgânico reaja com um grupo de íons; por controle das condições experimentais, é possível precipitar-se apenas um dos íons do grupo. Os químicos analistas já há muito tempo ensaiavam com apenas uma gota de solução. Exemplo familiar é o uso do papel indicador para detectar rapidamente um excesso de íons hidrogênio ou hidroxila. Esse tipo de reação despertou os interesse do químico Fritz Feigl (1891-1959) também desenvolveu estudos nesse campo de atividades científicas. Em consequência dos estudos e pesquisas de Feigl, surgiu nova especialidade na química analítica, a análise de toque (ver microanálise), que tem aplicações em 24 24 minérios e minerais, metais, ligas, produtos farmacêuticos, solos, águas, produtos industriais etc. Os físico-químicos Arrhenius (1859-1927) - com a teoria da dissociação eletrolítica -, W Ostwald (1853-1932) - com a lei da diluição - W. H. Ernst (1864-1941) - com o princípio de produto de solubilidade -, L. Pizarzhevsky -, reconhecendo as reações de oxirredução com um processo envolvendo transferência de elétrons - e outros deram à química analítica uma sólida base científica. Historicamente, o desenvolvimento dos métodos analíticos foi acompanhado pela introdução de novos instrumentos de medida, como a balança para análises gravimétricas a aparelhagem de vidro para análises volumétricas e gasométricas. Quase toda propriedade física característica de um elemento ou substância pode ser à base de um método para sua análise. Surgiram, então, com o desenvolvimento da físico-química, novos métodos de análise baseado em princípios diversos da química analítica clássica, originando-se análise instrumental, pela qual os constituintes são determinados pela medida de uma propriedade física. Dentre os principais métodos estão os que usam as propriedades envolvendo interação com a energia radiante - raios-X, absorção de radiação, fluorescência, ressonância magnética nuclear -, e os que utilizam propriedades nucleares, como, por exemplo, a radioatividade. Esses métodos em muitos casos apresentam grandes vantagens em relação aos métodos clássicos da química analítica: a rapidez das análises, a possibilidade do uso de método não destrutivo e a utilização de uns poucos miligramas ou, no caso de soluções, de frações de mililitro, sem prejuízo da exatidão da análise. Em 1954, o químico suíço Gerold Karl Schwarzenbach publicou trabalhos que tinham sido iniciados dez anos antes sobre a aplicação de ácidos poliaminocarbo- xílicos em química analítica quantitativa, principalmente em análise volumétrica, considerando que os complexos formados com os metais são de alta estabilidade. A introdução desse tipo de reagente resultou numa ampliação extraordinária dos métodos complexométricos, sendo que o ácido etilenodiaminotetracético (EDTA) é o mais importante composto desse grupo. Em uns poucos casos, o ácido nitrilotriacético (NITA) é mais adequado. O estudo desse tipo de compostos continua em desenvolvimento, e a cada dia novas aplicações. Como a química analítica se fundamenta nos princípiose leis gerais 25 25 da química inorgânica e da físico-química, pode-se esperar que o seu progresso acompanhasse o dessas especialidades. 7 QUÍMICA QUÂNTICA Fonte: www.portalpapillon.com.br A química quântica propõe-se a utilizar as teorias da mecânica sobre estrutura atômica e, a partir das propriedades dos átomos, estudar as propriedades das moléculas, isto é, dos elementos e compostos químicos. Para isso, desenvolveu uma teoria da ligação químicas e métodos convenientes de cálculo das propriedades moleculares, distâncias e ângulos de ligação, momentos dipolares e parâmetros de reatividade em diferentes tipos de reações. Assim como se pode dizer que a mecânica quântica nasceu a 14 de dezembro de 1900, quando o físico alemão Max Palnck (1858-1947) apresentou à Sociedade Alemã de Física o trabalho em que introduzia o quantum de ação, a constante universal h (constante de Plank, de valor 6,55 x 10-27 ergs. s) e a equação E=hv, pode- se dizer que a química quântica nasceu no dia 27 de janeiro de 1926, quando a revista Annalen der Physik recebeu a primeira de quatro comunicações do físico austríaco 26 26 Erwin Schrödinger (1887-1961) com o título geral “A Quantização como um problema de valores próprios” da qual constava a sua equação independente do tempo. A quarta comunicação, recebida a 21 de junho de 1926, com a sua equação dependente do tempo, completava o trabalho de Schrödinger, que iria ter a maior influência na física teórica e servir de base para várias disciplinas hoje florescentes, aprofundando a compreensão dos fenômenos físicos e químicos e levando ao desenvolvimento de uma nova teoria da valência e da ligação química. Para o elétron, como para outras partículas subatômicas, ao contrários dos corpos em movimentos da mecânica clássica, não é possível saber exatamente posição e momento nem calcular trajetórias: é o princípio da incerteza, de Heisenberg, formulado em 1927 pelo físico alemão Werner Karl Heisenberg (1904-1976). Mas o elétron existe em determinada região do espaço e é possível calcular a probabilidade do espaço de sua localização em determinada região. Essa probabilidade em que tem que ser, por definição, uma função sempre positiva, podendo ter qualquer valor entre 0 e 1. Segundo Max Born (1882-1970), a função de onda é a grandeza tal que seu quadrado, mede a probabilidade de encontrar-se o elétron em determinada região. Essa região é chamada na química quântica atual de orbital, em oposição às órbitas fixas das teorias atômicas anteriores a Schrödinger. Os orbitais podem ter somente determinadas fórmulas, classificando-se em esférica segundo sua forma. Os orbitais tem níveis de energia discretos, crescentes, que são os únicos que os elétrons podem ocupar. Existem em cada nível p (2p, 3p etc.) 3 orbitais de mesma energia, 7 orbitais f de mesma energia etc. Os orbitais de mesma energia são chamados ‘degenerados’. Cada orbital só pode ser ocupado por dois elétrons, com spin desemparelhado. É o princípio da exclusão, de Pauli, formulado pelo físico austríaco Wolfgang Pauli (1900-1958). Esses postulados permitem saber como estão arrumados os elétrons nos orbitais de um átomo qualquer. Assim, combinando-se os orbitais atômicos de acordo com as regras simples calculando-se matematicamente qual a combinação de funções de onda que torna mínima a energia do orbital molecular com base na equação de Schrödinger, tem-se um orbital molecular onde podem estar os elétrons de ligação: um de energia mínima chamado estado fundamental da molécula. Há outras combinações permitidas pela 27 27 teoria, que dão orbitais de energia cada vez maior; Quando a energia chega a igualar a dos orbitais componentes, o orbital molecular é chamado não ligante e quando ultrapassa essa energia é chamado antiligante. Os elétrons só ocupam orbitais em estados excitados. Quando surgiu a equação de Schrödinger, o físico inglês paul Adrien Maurice Dirac disse que: “as leis físicas necessárias para teoria matemática de uma grande parte da física e da química inteira já estão completamente conhecidas e a dificuldade está apenas em que a aplicação dessas leis leva a equações muito complicadas para erem solúveis”. Embora só tenham sido encontradas soluções exatas para poucos átomos e íons, desenvolveram-se métodos empíricos aproximados que permitiram a extensão da teoria a sistemas multieletrônicos e a sistemas conjugados, com elétrons, como o benzeno e outros mais complicados. Além da teoria de Huckel, desenvolveram-se outras teorias - a dos Campos ligantes é a principal -, que permitem explicar a ligação e calcular as propriedades moleculares nos compostos de coordenação, especialmente nos complexos de metais ou íons metálicos com complexantes (ligantes) orgânicos e inorgânicos. Recentemente, a química quântica foi enriquecida com novos métodos qualitativos de fácil utilização, como a teoria das relações de simetria em orbitais, dos químicos norte-americanos Rubert Burns Woodward e Roald Hofmann, em que uma série de reações pode ter o seu curso previsto quando se conhece a simetria do orbital demais alta energia ocupado. Essa teoria aplica-se especialmente a sistemas com elétrons e permite explicar diferenças entre rações no estado fundamental da molécula (via térmica) e reações no estado excitado (reações fotoquímicas por exemplo) Pode-se resumir dizendo que a química quântica permitiu aprofundar o conhecimento do que se passa no interior dos átomos e das moléculas, constituindo ainda hoje um campo de pesquisa muito ativo. Houve sábios que previram que ela daria solução a todos os problemas da química e, embora tudo indique que esse ideal não será atingido, sua contribuição foi e continua sendo inestimável para o estudo e compreensão dos fenômenos químicos. Com o advento e o emprego cada vez maior de métodos físicos e da química quântica, há alguns físicos e químicos que pensam que a química acabou, que se está 28 28 reduzindo a um capítulo da física. Essa afirmação é facilmente refutável, pois a física enriquece a química e vice-versa; os pesquisadores de cada uma das duas ciências são obrigados a conhecer cada vez mais profundamente alguns aspectos da outra, pois elas têm alguns problemas comuns. Preocupam-se, porém, com coisas diferentes; o químico estuda o átomo e a molécula para compreender as reações químicas, enquanto físico estuda as reações para compreender o que se passa com as moléculas e os átomos. Pelo menos em futuro previsível, as duas ciências conservarão sua diversidade de pontos de vista ao encarar os fenômenos naturais, diversidade que lhes dá o mesmo status de ciências distintas, ao mesmo tempo autônomas, com objetivos e métodos próprios, e interdependentes. / Taba/ Nabu. 8 QUÍMICA BIOLÓGICA Fonte: www.visaociencia.com.br Química biológica ou, melhor, bioquímica, é a parte da química dedicada ao estudo da composição dos seres vivos e das transformações químicas que neles se passam. 29 29 A descoberta do oxigênio, em 1772, logo seguida do conhecimento de sua utilização pelos seres vivos, do papel da luz na sua produção pelos vegetais, e da medida, feita por Lavoisier (1743-1794), do seu consumo pelos animais, marcam o início da investigação dos seres animados. Muitas descobertas se situam no período de 1773 a 1830, tais como a ureia, isolada da urina, por Guillaume François Rouelle (1703-1770), a asparagina, identificada por L.N. Vauquelin (1763-1829) e P.J Roubiquet (1780-1840), e fermentação alcoólica, explicada por Gay-Lussac, em 1810, e cuja natureza catalítica foi, em 1837, indicada por Berzelius (1779-1848). Pasteur (1822-1895) demonstrou, mais tarde, que a fermentação alcoólica é produzida por microrganismos e Eduard Buchner (1860-1917) completou a descoberta mostrando que os extratos de levedura produzem a fermentaçãona ausência de células vivas. Importantes conquistas de fisiologia se relacionaram com o conhecimento de processos químicos: o glicogênio, isolado por Claude Bernad (1813-1878) , em 1850; a hemoglobina, cristalizada por Hoppe-Seyler (1825-1895), em 1884; os ácidos nucléicos (desoxirrinucléico), isolados por J.F. Mescher (1811- 1887), em 1869; e a histo-hematina, descoberta por MicMum e, mais tarde, em 1923, redescoberta e estudada por David Keilin, que introduziu o termo ‘citocromo’ e mostrou o papel dessa substância n respiração celular. Wilhelm Kühne (1837-190) lança, em 1877, o termo ‘enzima’ e Hans Ficher (1881-1945), em 1893, o conceito enzima-substrato. Seguiram-se, nas primeiras décadas do séc. XX, notáveis avanços no domínio da fermentação alcoólica, com a descoberta do papel dos fosfatos e o isolamento, por Sir Arthur Harden (1865-1940) e Sydney Young (1857-1937), da cozimase, e, no terreno da respiração celular, com a descoberta do fermento respiratório e do papel do ferro, por Otto heinrich Warburg (1883-1970), em 1912; com a revelação do efeito catalíticodos ácidos carboxílicos, por Albert Szent-Györgyi, e, depois, com a descrição do ciclo dos ácidos tricarboxílicos, feita por Sir Adolf Krebs, em 1937. O termo ‘coenzima’ foi proposto por Gabriel bertrand (1851-1917), em 1897. A compreensão do mecanismo íntimo das reações que se passam nos organismos vivos alargou-se com a descoberta, por Wargburg, em 1937, do ATP (ou TAP) e do papel que ele desempenha na oxidação fosforilativa, bem como com os conhecimentos das reações de transaminação, dado por Aleksander Evsairyrvith Braunstein e Kirtizman, em 1938. Foram, a seguir, desvendadas as via de degradação 30 30 da glicose (glicólise), por Gustav Embden (1834-1933) e Otto Meyerhof (1884-1951), e reconhecidas às semelhanças delas com os processos químicos que se passam na contração muscular. Aos poucos se foi conhecendo o mecanismo de processos metabólicos, mediante a identificação de suas reações com as que se produzem em laboratório. Já Friedrich Wöhler (1800-1882) havia, em 1828, conseguido realizar a síntese da ureia a partir do cianato de chumbo e amônio, mostrando, com isso, que a síntese dos compostos orgânicos não é, como até então se supunha, propriedade exclusiva dos seres vivos. No campo da nutrição descobriram-se, no começo do século XX, novas substâncias nutricionais - as vitaminas - cujo mecanismo de ação pareceu, inicialmente, misterioso. Aos poucos foram elas estudadas, o mecanismo de ação elucidado, a constituição química estabelecida e a síntese realizada. A vitamina A foi logo descoberta, por Elmer Werner McCollum (1879-1969); o papel do caroteno, por Hans August Simon Euler-Chelpin (1873-1964); o das flavo proteínas por Warburg; a vitamina B1 (tiamina), por Jansen. Em outro sentido, não foram menos sensacionais a cristalização de uma enzima, a ureze, por James Batcheller Sumner (1887-1955), e a de um vírus, o do mosaico do tabaco por Wendell Meredith Stanley (1904-1971) a genética, valendo-se da bioquímica, pôde desvendar a natureza química do gene, e conhecendo-o como um composto ácido desoxiribonucleico, e James Dewey Watson e Francis Harry Compton Crick, em 1953, acertaram-lhe a intricada estrutura molecular. Esse gênero de estudos tornou tal vulto que hoje se constitui em ramo individualizado da genética, a genética bioquímica. Não menos fundamentais foram as aplicações práticas decorrentes dos avanços dos conhecimentos no domínio da bioquímica dos seres vivos. Basta mencionar a descoberta da penicilina por Sir Alexander Fleming (1881- 1955), seguido de numerosos antibióticos. Da mesma forma, a preparação de extratos ativos de glândulas endócrinas abriu vasto campo de pesquisas que permitiu o isolamento e síntese de hormônios com largo emprego de medicina. Por diversas fases passou a bioquímica no seu relacionamento com outras ciências biológicas no final do século XIX, a química biológica era, ainda, apenas um capítulo da fisiologia. A partir de 1903, quando se adotou a denominação bioquímica, então proposta por Carl Neuberg (1977-1956), ela se constituiu em ciência autônoma e progressivamente 31 31 alarga o seu domínio de ação. Além da genética bioquímica, já referida a há cito química ou bioquímica celular, que é a bioquímica em nível celular; a bioquímica vegetal, dedicada aos vegetais; a bioquímica animal, consagrada aos animais; e a bioquímica dos microrganismos, aplicada aos seres unicelulares (algas, bactérias e protozoários). 32 32 BIBLIOGRAFIA BERNSTEIN, Basil. A estruturação do discurso pedagógico: classe, códigos e controle. Petrópolis: Vozes, 1996a. BERNSTEIN, Basil. Pedagogia, control simbólico e identidad: teoria, investigación y crítica. Madrid: Morata, 1996b. CHASSOT, Attico I. Catalisando transformações na educação.3a ed. Ijuí: Unijuí, 1995. GOODSON, Ivor F. Currículo: teoria e história. Petrópolis: Vozes, 1995. GOODSON, Ivor F. A construção social do currículo. Lisboa: Educa, 1997. LUTFI, Mansur. Cotidiano e educação em química. Ijuí: Unijuí, 1988. MACEDO, Elizabeth F. de & LOPES, Alice R. C. A estabilidade do currículo disciplinar: o caso das Ciências. 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Porto Alegre: Artes Médicas, 1998. 33 33 9 LEITURA COMPLEMENTAR AUTOR: Maria Inês Petrucci Rosa e Andréa Helena Tosta DISPONÍVEL EM: http://www.scielo.br/pdf/ciedu/v11n2/07.pdf ACESSO: 11 de agosto de 2016 O LUGAR DA QUÍMICA NA ESCOLA: MOVIMENTOS CONSTITUTIVOS DA DISCIPLINA NO COTIDIANO ESCOLAR THE PLACE OF CHEMISTRY IN THE SCHOOL: MOVEMENTS CONSTITUTIVE OF THE SUBJECT IN THE DAILY SCHOOL Resumo: Este trabalho pretende analisar discursos presentes na escola, relacionados com a química enquanto componente disciplinar, explorando para isso, o conceito de “lugar” e suas implicações para o estudo da evolução dessa disciplina no currículo em ação no contexto escolar. Ao se buscar uma compreensão da problemática posta, foram entrevistados diferentes atores na escola: professores, alunos, funcionários, diretores, coordenadores, propondo a seguinte questão: “Qual é o lugar da Química na escola?” A essa pergunta, foi produzido um espectro amplo de manifestações, que aqui serão analisadas à luz da problemática já exposta e de um quadro teórico que se apóia em De Certeau, Goodson, entre outros. Unitermos: ensino de Química, currículo, cotidiano escolar. Abstract: This work analyzes attitudes at school related to chemistry, exploring the concept of place and its influences on the evolution of that discipline within the curriculum as it is active in the scholars' context. For understanding the problem, different actors at school: teachers, students, employees, directors, have been interviewed with the following question - What is the place of Chemistry in school? From this question, a large spectrum of replies was produced. The results are analyzed in the light of the problem already expressed and from one theoretical perspective that is provided by De Certeau, Goodson, among another. Keywords: Chemistry teaching, curriculum, school daily. A constituição sócio-histórica da disciplina Química Procuraremos, aqui, discutir o lugar da Química na escola, tomando-a como componente curricular localizado numa matriz escolar que tem uma gênese sócio- histórica, a qual recuperamos a partir de contribuições de Goodson, Chassot e Scheffer. Para isso, estamos nos referindo à disciplina na perspectiva apontada por Lopes:34 34 As disciplinas, de uma forma geral, compreendem saberes com bases epistemológicas mais ou menos explícitas, porém não são essas bases epistemológicas que definem a concepção de disciplina escolar. Trabalho com quatro princípios teórico-metodológicos que se interconectam e se sustentam mutuamente, configurando o entendimento de que disciplinas escolares são diferentes de disciplinas científicas e acadêmicas. De acordo com esses quatro princípios, a disciplina escolar é: 1) uma construção sócio- histórica; 2) uma tecnologia de organização curricular; 3) um produto da recontextualização de discursos; 4) um híbrido de discursos curriculares. (LOPES, 2003: 3) Nessa perspectiva, entendemos a disciplina escolar Química como um conjunto de premissas, atividades, materiais, documentos, ações pedagógicas etc., que levam, para o espaço escolar, discursos recontextualizados e hibridizados que são reconhecidos por professores, alunos e outros atores escolares como um campo de conhecimentos relacionados com a ciência química. Analisando a história da educação sob o ponto de vista da história das disciplinas, Ivor F. Goodson relata os casos da Biologia e das Ciências, na Grã-Bretanha, trazendo à pauta questões relacionadas com os estudos históricos das disciplinas do Ensino Secundário do currículo escolar britânico. Do nosso ponto de vista, tal relato traz também referências significativas para reflexões voltadas para a constituição sócio-histórica da disciplina Química. Para esse autor, o exame desses casos revela uma passagem “consistente de uma marginalidade de baixo status, dentro do currículo, passando por uma etapa utilitária, até chegar, em última instância à definição da disciplina como um corpo rígido e rigoroso de conhecimento” (GOODSON, 2001: 101). Nesse contexto, almejando status acadêmico, a disciplina Biologia num primeiro momento, ainda no século XIX, envolveu-se num processo de controle por instâncias acadêmicas. Nesse período, foi ofuscada pela Botânica e pela Zoologia, na entrada das disciplinas científicas no currículo do Ensino Secundário. Descobertas científicas relacionadas com a bacteriologia e com a biologia marítima, por exemplo, e financiadas por agências de fomento britânicas, acabaram por contribuir na promoção da Biologia como disciplina escolar, devido à conquista de um caráter científico mais acentuado. Já no período entre guerras do século XX, emergiram discursos valorizadores dos aspectos utilitários da disciplina, enfatizando suas relações com a agricultura ou com a medicina, o que contribuiu para que ela permanecesse no currículo nos anos 30. Contudo, na década de 1950, a Biologia ficou restrita aos anos iniciais da escolaridade secundária, sob o argumento que ela vinha assumindo um caráter excessivamente vocacional. Nos anos 60, propostas curriculares para Biologia surgiram valorizando a experimentação laboratorial e 35 35 técnicas matemáticas, o que passou novamente a contribuir para atrair recursos financeiros para projetos na área. Na década seguinte, no entanto, começaram a surgir algumas preocupações em relação a um excessivo caráter científico “duro”, que se distanciava de uma abordagem de ensino mais voltada às questões sociais e humanas. Como sintetiza Goodson: Portanto, a Biologia seguiu um padrão histórico que culminou na sua transformação numa disciplina acadêmica, caracterizada por um corpo de conhecimento cujo conteúdo foi selecionado pelos universitários. Em troca, professores de Biologia receberam status, alunos e recursos que testemunharam a sua aceitação do estatuto de veiculadores de um conhecimento culturalmente válido. (GOODSON, 2001: 103) Outro caso notório já mencionado é o da disciplina Ciências, que também teve uma trajetória interessante na história do currículo na Grã-Bretanha. Goodson aborda o relato de D. Layton sobre a “Ciência das Coisas Comuns”, que consistia numa espécie de educação científica desenvolvida em escolas elementares nos anos 40 do século XIX. A intenção era, segundo Layton, ensinar “o conhecimento científico tal como se aplicava a uma compreensão das coisas familiares” (apud GOODSON, 2001). Logo essa experiência tornouse um empreendimento de sucesso, transformando-se na versão mais importante da educação científica na escola elementar, segundo Goodson. Todavia, nos anos 50 do século XIX, mesmo com todo esse reconhecimento, o programa começou a sofrer algumas perdas, tais como o caso da Física, que era obrigatória no currículo e passou a ser optativa. Professores não estavam mais sendo formados, verbas para os programas de formação e de ensino de ciências foram sendo cortadas. Duas décadas depois, as ciências reapareceram no currículo das escolas britânicas, mas numa versão de ciência laboratorial pura, calcada em formas científicas consideradas corretas, que acentuavam a academia, a pesquisa e a indagação como fins em si mesmos, divorciando-se do mundo da experiência cotidiana. Mesmo em outros países, é possível depreender movimentos parecidos, como, por exemplo, no caso do Canadá, onde por volta dos anos 20 do século passado, as instituições que formavam o professor universitário estavam definitivamente voltadas para a formação do profissional orientado para a pesquisa. Goodson encerra esses relatos, sintetizando: 36 36 À medida que a definição universitária de ciência cresceu em poder e prestígio no século XX, as pressões para os professores de Ciências se conformarem com critérios acadêmicos, em vez de procurarem responder aos problemas imediatos relativos ao ensino eficaz da disciplina aumentaram fortemente. (GOODSON, 2001: 106) No Brasil, Chassot traz elementos importantes para uma análise da constituição sócio-histórica da disciplina Química, apontando registros relacionados ao seu ensino já no século XIX. Segundo o autor, o primeiro decreto oficial que se refere ao ensino de Química no Brasil é o de 6 de julho de 1810, que cria uma cadeira de Química na Real Academia Militar. Cita uma Carta de Lei de 4 de dezembro do mesmo ano que traz a seguinte informação: No quinto ano haverá dois lentes. O primeiro ensinará tática e estratégia; o segundo, ensinará Química, dará todos os métodos para o conhecimento das minas, servindo-se das obras de Lavoisier, Vanderquelin, Jouveroi, Lagrange e Chaptal para formar seu compêndio, onde fará toda sua aplicação às artes e a utilidade que dela derivam. (PM-02, p. 51 apud CHASSOT, 1996: 137) Concordamos com Chassot, que aponta para a natureza deste texto que nos permite inferir um ensino dedicado a aspectos utilitários (p. 137). Esse autor cita ainda a importante contribuição dos documentos deixados por Antonio de Araújo e Azevedo – conde da Barca –, ilustre colaborador do Rei, que viveu entre os séculos XVIII e XIX. Tal contribuição é marcada por idéias que podem ser consideradas inovadoras para a época, com um claro movimento de aproximação entre a Química e a Medicina. Chassot aponta, ainda, que depois da morte do Conde da Barca, após cinco anos da independência do Brasil, são encontrados registros de um ensino de Química livresco, teórico, apêndice da Física, ou, em geral, em simbiose com a mineralogia. Do nosso ponto de vista, as trajetórias percorridas pela disciplina Química no currículo brasileiro das escolas básicas parecem se aproximar nitidamente dos exemplos citados por Goodson em relação à Biologia e às Ciências, na Grã-Bretanha. A história da disciplina Química no Brasil, também parece oscilar entre objetivos de ensino voltados para aspectos utilitários e cotidianos e outros objetivos centrados em pressupostos técnico-científicos. Remetendo-nos para o cenário do início do século XX, em 1918, quando foi criado o Instituto de Química no Rio de Janeiro, como a primeira escola brasileira formadora de profissionais para a indústria química, na época ainda bastante incipiente.Nesse mesmo ano, foi criado o curso de Química na Escola Politécnica de 37 37 São Paulo, e, paulatinamente, a pesquisa científica começou a ser introduzida nesses centros de formação. A primeira instituição fundada com objetivos claros de formar químicos cientificamente preparados foi o Departamento de Química da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo, em 1934 (MATHIAS, 1979). A disciplina de Química passa a ser ministrada de forma regular no currículo do Ensino Secundário no Brasil, a partir de 1931, com a Reforma Francisco Campos. Nos documentos da época, encontram-se registros que apontam objetivos para o ensino de Química voltados para a apropriação de conhecimentos específicos, além da tarefa de despertar o interesse científico nos estudantes e de enfatizar a sua relação com a vida cotidiana (MACEDO e LOPES, 2002). Esse dilema entre o científico e o cotidiano foi se desfazendo no contexto da legislação, na década de 1970, com a promulgação da primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação (5.692/71), com a criação do ensino profissionalizante em nível de 2º grau, que conferiu ao ensino de Química um caráter acentuadamente técnico-científico. (SCHEFFER, 1997). Nesse período, parece claramente valer a tese de estudiosos do campo do currículo de que as disciplinas relacionadas às ciências parecem se firmar como componentes curriculares, à medida que se aproximam das vertentes científicas de seus saberes de origem. Chegando na atualidade, no movimento de mudanças curriculares deflagrado a partir da publicação de documentos pelo Ministério da Educação, no final do século passado, depreendemos um lugar possível para a Química, pensado pela equipe que propõe os Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio, em suas palavras: Ela está presente e deve ser reconhecida nos alimentos e medicamentos, nas fibras têxteis e nos corantes, nos materiais de construção e nos papéis, nos combustíveis e nos lubrificantes, nas embalagens e nos recipientes. (BRASIL, 1999: 212) Tais palavras nos remetem a um lugar ou a lugares próprios da vida das pessoas e para a manutenção dessa vida, o documento ainda aponta: A sobrevivência do ser humano, individual e grupal, nos dias de hoje, cada vez mais solicita os conhecimentos químicos, que permitam a utilização competente e responsável desses materiais, reconhecendo as implicações sociopolíticas, econômicas e ambientais do seu uso. ( ibid ) Contudo, como Lopes nos chama a atenção: 38 38 Partes dos documentos oficiais podem ser interpretadas de diferentes formas por escolas – e por grupos disciplinares nas escolas –, produzindo inclusive sentidos contrários ao currículo nacional. Dessa forma, os efeitos das propostas curriculares oficiais nas escolas e a produção de diferentes textos pelas escolas, a partir dessas propostas, dependem de investigações que levem em conta tanto a dimensão disciplinar quanto a dimensão institucional (BALL e BOWE, 1992; BALL, 1994). (LOPES, 2003: 14) Escolas do Ensino Básico planejam, concebem e vivenciam suas práticas influenciadas pelos documentos oficiais, fazendo recontextualizações. Tendo em vista essa problemática, nos propomos, nesse trabalho, a investigar o lugar da Química na escola, compreendido como espaço delimitado de disputa e de validações de conhecimentos legitimados pelas pessoas que compõem as instituições escolares. A constituição sócio-histórica da disciplina Química e a delimitação de seu lugar na escola Ao indagar sobre o “lugar” da Química na escola, tivemos em mente o conceito de “lugar”, com uma inspiração muito centrada nos escritos de De Certeau, que são também valorizados por Alves. Falar de escola, preocupando-nos com as dimensões materiais do currículo, significa falar de dois mundos diferentes. Um deles é o próprio, o lugar fundado pelas estratégias do campo político que têm muito mais a ver com formas empregadas no ato da instituição/oficialização/legitimização, sempre renovado e com uma relação mecânica “entre eu/nós” e “eles/coisas”(SANTOS, 1993, p. 15) (...) Há assim, permanentemente, convivendo com este mundo, um outro mundo, que é o do cotidiano, que se objetiva no uso do próprio alheio, criando espaço, no qual é possível a intersubjetividade, o diálogo do eu/nós-você/vocês. (SANTOS, 1993, p. 15) (ALVES, 1998, p. 130-132) Assim, a questão norteadora desse trabalho centra seu foco no conceito de “lugar” entendido como dimensão material do currículo, cuja existência retrata posições e movimentos conquistados nas disputas de poder travadas no campo social e político das instituições. Quando se pergunta: “Qual é o lugar da Química na escola?”, tem-se como hipótese que posições mais legitimadoras da disciplina enquanto conhecimento científico apontam para um lugar que é próprio, como o laboratório ou a estante de tubos de ensaio. Nesses lugares, os exercícios do trabalho próprio do cientista e dos fazeres inerentes à construção de saberes validados no campo da ciência são referências máximas, marcando possibilidades de estabilização da disciplina no currículo, garantindo-lhe a continuidade de sua constituição sócio- histórica. O lugar indica aquilo que é próprio do sujeito, marcando sua existência 39 39 social, é também “a ordem segundo a qual se distribuem elementos nas relações de coexistência” (DE CERTEAU, 1994) . O lugar do cientista é o laboratório, a biblioteca, a bancada de experimentos, junto ao microscópio, ao armário de reagentes ou à balança. Esses são lugares que se transformam em espaços ao possibilitarem ações específicas que caracterizam a atividade do químico marcada pelo trabalho de “fazer” e “pensar”, como nos aponta Chagas (1989): A atividade do químico é caracterizada por dois aspectos complementares, o primeiro aspecto é sua atividade prática, a sua atividade própria e especial de manusear a matéria, encarando-a de forma macroscópica. O segundo aspecto é sua atividade teórica, o seu pensar sobre os fatos observáveis em termos de esquemas e modelos, sendo que na maioria das vezes encara a matéria sob o ponto de vista microscópico, sob o nome genérico de teoria molecular. O químico age e pensa simultaneamente dessas duas maneiras e a Química é a resultante desses dois modos de agir e pensar, da interação desses dois complementares. (CHAGAS, 1989, p. 14-15) Como já apontamos, essa complementaridade se dá no laboratório, na interação entre os pares, na socialização de conhecimento produzido. Essa é a face mais nítida da ciência Química, que produz um conhecimento que articula macro e micro, fenômeno e explicação, empírico e teórico. Nas palavras de Lazlo: “Um laboratório é uma sala de trabalho onde se manipula moléculas (...) o laboratório é o lugar onde se fabricam e se modificam as moléculas” (LAZLO, 1996: 13). Na escola, a disciplina Química não reproduz os modos de produção de conhecimento da ciência química, contudo, ela traz discursos hibridizados e recontextualizados (LOPES, 1998, 2003), que fazem referências a vários lugares e esses lugares aparecem como marcos nas falas de professores, alunos, funcionários, diretores etc. A química do cotidiano, por exemplo, se localiza em outros lugares, que não o laboratório: na cozinha, nos seres vivos, na natureza etc. Os discursos voltados para a valorização da química do cotidiano aprofundam possibilidades que vão além das técnicas laboratoriais químicas, apontam para sistemas complexos, com vida própria, cuja existência e funcionamento podem ser explicados através de conceitos científicos. Nessa perspectiva, é bastante comum a expressão A química está em tudo, confundindo os iniciantes no que se refere ao significado da palavra “química”: “Química é coisa ou é conhecimento?” 40 40 Ao analisar trabalhos que se detêm em documentos históricos que trazem indícios sobre a constituição