Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
136 Capítulo V Efeito Eletroóptico Linear O efeito eletroóptico refere-se à mudança nas propriedades ópticas de um dielétrico, induzidas por um campo elétrico cuja frequência encontra-se muito abaixo da ressonância cristalina do meio [1]. O efeito eletroóptico quadrático foi observado primeiramente por Kerr, em 1873, em líquidos e vidros. Aproximadamente 20 anos mais tarde, Röntgen e Kundt observaram o efeito eletroóptico linear no quartzo. Porém, coube a Pockels investigar este efeito sob o ponto de vista da física, não só no quartzo, como também na turmalina, clorato de potássio e sal de Rochelle [2]. Pockels provou a existência de um efeito eletroóptico intrínseco, independente da piezoeletricidade induzida por deformações mecânicas. 5.1 - EFEITO ELETROÓPTICO (EO) De acordo com a Teoria Quântica dos Sólidos, o tensor impermeabilidade dielétrica )( jiη depende da distribuição de cargas no cristal [1], [3]. A aplicação de um campo elétrico externo E ao cristal resulta numa redistribuição das cargas ligadas e causa uma pequena deformação da rede atômica. O resultado global é uma variação no tensor impermeabilidade, conhecido como efeito eletroóptico, e descrito matematicamente como: ( )0jijiji E ηηη − =Δ → (5.1) onde )(Eij η é o tensor impermeabilidade perturbado pelo campo elétrico E , enquanto que, )0(ijη é o tensor impermeabilidade não perturbado. Escrevendo-se a expansão de (5.1) em série de potências (Taylor), obtém-se ++=Δ lklkjikkjiji EEsErη (5.2) onde kjir é o coeficiente de Pockels, ou, coeficiente eletroóptico linear, e lkjis é o coeficiente de Kerr, ou, coeficiente eletróptico quadrático. 137 Conforme se observa, o coeficiente eletroóptico linear é um tensor de terceira ordem, enquanto, o quadrático é de quarta ordem. Na expansão em série (5.2), os termos superiores ao quadrático foram desprezados, uma vez que os efeitos de ordem superior são muito reduzidos para a maioria dos materiais. Tipicamente, o efeito EO quadrático é bastante fraco comparado ao efeito linear e, freqüentemente, é desprezado quando o efeito linear está presente. Em princípio, o efeito EO quadrático ocorre em qualquer material transparente, porém, às custas de campos elétricos cujas amplitudes são extremamente elevadas (as vezes, superior ao limite de ruptura dielétrica do meio, o que pode tornar inviável sua aplicação prática). São comuns células de Kerr com líquidos como o nitrobenzeno [4]. Por outro lado, o efeito EO linear não acontece com qualquer material, mas apenas naqueles cujas redes cristalinas não exibem centro de simetria. Dentre estes estão o KH2PO4 (fosfato de di-hidrogênio potássio), CdS (Sulfeto de Cádmio), BaTiO3 (Titanato de Bário), (NH4)H2PO4 (fosfato de di-hidrogênio amônia), LiNbO3 (niobato de lítio), LiTaO3 (tantalato de lítio), Bi4Ge3O12 ou BGO (germanato de bismuto), etc. As tensões necessárias para se obter o efeito EO linear, embora elevadas, são inferiores aquelas do efeito quadrático. Assim, quando o material exibe efeito EO linear, normalmente, não são atingidos os valores de tensão necessários para que o efeito quadrático se manifeste. Portanto, ele pode ser desprezado. Exemplo 5.1 - Mostrar que o efeito eletro-óptico linear é nulo em cristais com centro de simetria. I x3 x3' x1 x1' x2 x2' Figura 5.1 – Esquema de um cristal com centro de inversão. Solução: Na Fig.5.1 está esquematizado um cristal que exibe centro de simetria. Utilizando-se a regra prática discutida na seção 3.5, a qual estabelece que “as componentes de um tensor de 138 ordem n se transformam como os produtos de ordem n das coordenadas de um ponto”, obtém-se: 321321321 ))()(( xxxxxxxxx −=−−−=′′′ e assim, conclui-se que ijkijkijk rrIr −=′=)( Contudo, recorrendo-se à propriedade identidade (E), vem ijkijkijk rErIr == )()( A partir dos resultados acima se pode concluir que ijkijkijk rrIr =−=)( a qual só é satisfeita quando 0=ijkr . Assim, todas as componentes do tensor rijk são nulas nas 11 classes cristalinas que possuem centro de inversão (cristais centro-simétricos) [1]. ____________________________________________________________________________ Utilizando-se resultados do Capítulo 3 sabe-se que, relativamente ao sistema de coordenadas principal e na ausência de campo elétrico externo, tem-se o seguinte elipsóide de índices de refração (não perturbado): ( ) 10 2 2 2 2 2 2 =++= zyx jiji n z n y n xxxη (5.3) Por outro lado, quando o campo elétrico externo E está presente, a impermeabilidade )( jiη passa a ser função deste, bem como, o elipsóide de índices (elipsóide perturbado) associado: 1= → jiji xxEη (5.4) Combinando-se (5.1) e (5.4), obtém-se ( )( ) 10 =Δ+ jijiji xxηη (5.5) e, utilizando-se a parcela linear de (5.2) ( )( ) 10 =+ jikkjiji xxErη (5.6) que conduz ao elipsóide de índices de refração perturbado pela ação do campo elétrico externo. 139 Uma propriedade importante pode ser obtida analisando- se a seguinte relação ( ) kkjijijiij ErE =− =Δ → 0ηηη (5.7) Como se sabe, mesmo que a matriz jiη não seja diagonal, ainda é simétrica e, portanto, os índices i e j podem ser permutados entre si. Consequentemente, kijkji rr = (5.8) Sabe-se, também, que o número de elementos de um tensor de ordem n é n3 . Por exemplo, jiε é de segunda ordem e possui 933 2 ==n elementos. Assim, o tensor de terceira ordem kjir possuirá 273 3 = elementos. Contudo, devido à (5.8), existirão alguns elementos repetidos e o tensor possuirá no máximo 18 elementos diferentes. Expandindo-se a relação (5.7), obtém-se 33112211111111 ErErEr ++=Δη (5.9 a) 33222222112222 ErErEr ++=Δη (5.9 b) 33332233113333 ErErEr ++=Δη (5.9 c) 3332223211322332 ErErEr ++=Δ=Δ ηη (5.9 d) 3331223111311331 ErErEr ++=Δ=Δ ηη (5.9 e) 3321222111211221 ErErEr ++=Δ=Δ ηη (5.9 f) ou então, na forma matricial = Δ Δ Δ Δ Δ Δ 3 2 1 321221121 331231131 332232132 333233133 322222122 311211111 21 31 32 33 22 11 E E E rrr rrr rrr rrr rrr rrr η η η η η η (5.10) onde se verifica que, de fato, devido a propriedade de simetria (5.8), restam apenas 18 elementos. 140 É possível obter uma notação mais simples, usando-se a representação conhecida como notação de índices reduzidos ou notação de Voigt [5]. Estes novos sub-índices são definidos associando-se 111 → 222 → 333 → 23324 =→ (5.11) 13315 =→ 12216 =→ os quais, substituídos nos índices ij em (5.10) conduzem a = Δ Δ Δ Δ Δ Δ 3 2 1 362616 352515 342414 332313 322212 312111 21 31 32 33 22 11 E E E rrr rrr rrr rrr rrr rrr η η η η η η (5.12) Entretanto, devido a considerações adicionais de simetria cristalina, na maioria dos materiais, a matriz dos coeficientes eletroópticos (5.12) é esparsa. Ou seja, as relações de simetria cristalina estabelecerão quem dos 18 coeficientes serão nulos, bem como, as relações que existirão entre os coeficientes remanescentes. _____________________________________________________________________________ Exemplo 5.2. Considere-se a matriz de coeficientes EO no KDP − fosfato de di-hidrogênio potássio (KH2PO4), dada por (consultar a Tab.7.2 do livro do Yariv [1]): = 36 14 14 00 00 00 000 000 000 r r r r ji na qual se observa a existência de muitos termos nulos. Além disso, dos três termos nãonulos que ainda restam, apenas dois são distintos entre si. Os valores numéricos [m/V] dessas componentes, podem ser encontrados na Tab.7.3 do livro do Yariv [1]. 141 Exemplo 5.3. Considere o grupo cristalino trigonal m24 , dentre o qual se inclui o KDP. Dado que os elementos de simetria desse grupo são EC2C’2C’’2σ’v2S4σ’’v , obter os coeficientes remanescentes do tensor rijk. Solução: A notação E C2 C’2 C’’2 σ’v 2S4 σ’’v implica que o cristal exibe as propriedades de identidade (E), rotação de π rad em torno dos eixos x1, x2 e x3 (C2 , C’2 e C’’2 , respectivamente), espelho a 45o de x1 e x2 (σ’v e σ’’v , respectivamente) e 2 inversões de rotação (2S4). Usando-se a notação não reduzida e aplicando-se a propriedade de simetria do tensor rijk obtém-se que == = 123122121 231221121 133132131 331231131 233223123 332232132 333323133 322222122 311211111 213212211 231221121 313312311 331231131 332232132 332232132 333323133 322222122 311211111 ][][ rrr rrr rrr rrr rrr rrr rrr rrr rrr r rrr rrr rrr rrr rrr rrr rrr rrr rrr r jikijk Aplicando-se a operação C2 em torno de x1, conforme esquematizado na Fig. 5.2a, observa-se que x’1=x1, x’2= −x2 e x’3= − x3 e, portanto, verifica-se que: π rad x1 x2 x3 x'1 x'2 x'3 x3 x2 (a) (b) Figura 5.2 Operação de rotação C’2. a) rotação de π rad em torno do eixo x1. b) Sistema rodado. 221221122122 113113311311 112112211211 111111111111 rrxxxxxx rrxxxxxx rrxxxxxx rrxxxxxx =′=′′′ −=′−=′′′ −=′−=′′′ =′=′′′ 142 331331133133 223223322322 222222222222 rrxxxxxx rrxxxxxx rrxxxxxx =′=′′′ −=′−=′′′ −=′−=′′′ e assim por diante, obtendo-se também: 332332 rr −=′ , 333333 rr −=′ , 231231 rr =′ , 232232 rr −=′ , 233233 rr −=′ , 131131 rr −=′ , 132132 rr =′ , 133133 rr =′ , 121121 rr −=′ , 122122 rr =′ e 123123 rr =′ . Porém, devido à operação E, ocorre 0)()( 0)()( 0)()( 2222222222222 1131131132113 1121121122112 =⇔=−= =⇔=−= =⇔=−= rErrCr rErrCr rErrCr e, analogamente, 0121131233232333332223 ======= rrrrrrr . Portanto, a matriz dos coeficientes eletro-ópticos reduz-se para (usando a propriedade de simetria): = 123122 231221 133132 331231 123 132 133 122 111 0 0 0 0 00 00 00 00 00 ][ rr rr rr rr r r r r r r ijk = 123 231 132 231 123 132 00 00 00 00 00 00 000 000 000 r r r r r r Aplicando-se um procedimento similar, no caso da rotação C2 em torno de x2, mostra-se que 0122133331221111 ===== rrrrr , o que aumenta ainda mais a esparsidade da matriz [r]ijk. A operação de rotação C2 em torno de x3 não causa mudanças adicionais. Já a operação de espelhamento a 45o de x1 encontra-se esquematizada na Fig.5.3. espelho x2 x1 x'1 x'2 x3=x'3 45o Figura 5.3 – Operação de espelhamento à 45o do eixo x1. 143 Assim, a operação σ’v conduz a x’1= −x2, x’2= −x1 e x’3=x3, ou seja, os índices 1 e 2 podem ser permutados, obtendo-se que 41231132231132231231132231 41132231132231132132231132 63123213123213123312321123 )()()( )()()( )()()( rrrErrrxxxxxxr rrrErrrxxxxxxr rrrErrrxxxxxxr =====′′′ =====′′′ =====′′′ σσ σσ σσ e, com isso, a matriz rijk fica reduzida a = 123 231 132 231 123 132 00 00 00 00 00 00 000 000 000 ][ r r r r r r r ijk = = 63 63 41 41 14 41 123 231 231 231 123 132 00 00 00 00 00 00 000 000 000 00 00 00 00 00 00 000 000 000 r r r r r r r r r r r r que corresponde à matriz apresentada no Exemplo 4.2, em notação de índices reduzidos (e usando a propriedade de comutação de ij). _____________________________________________________________________________ De forma geral, um elipsóide de índices (5.6) terá a seguinte forma: 1222111 654 2 32 2 22 2 12 =+++ ++ ++ + xyErxzEryzErzEr n yEr n xEr n kkkkkkkkz kk y kk x (5.13) onde Ek (k=1,2,3) refere-se à componente do campo elétrico aplicado. Assim, por exemplo, considere-se a análise do efeito EO no LiNbO3 (Niobato de Lítio). Sua matriz de coeficientes EO é dada por (trigonal, classe de simetria 3m) [1]: − − = 00 00 00 00 0 0 22 15 15 33 3122 3122 r r r r rr rr r ji (5.14) Expandindo-se a relação (5.7), kkjiij Er=Δη , obtém-se 144 33122211 ErEr +−=Δη (5.15a) 33122222 ErEr +=Δη (5.15b) 33333 Er=Δη (5.15c) 21532 Er=Δη (5.15d) 11531 Er=Δη (5.15e) 12221 Er−=Δη (5.15f) e, portanto, o elipsóide de índices perturbado (5.5), ( )( ) 10 =Δ+ jijiji xxηη , torna-se: ( ) ( ) ( ) +Δ++Δ++Δ+ 233333222222211111 xxx ηηηηηη (5.16) ( ) ( ) ( ) 1222 212121313131323232 =Δ++Δ++Δ++ xxxxxx ηηηηηη na qual foi usada a simetria jiij ηη Δ=Δ . Sabe-se, também, que no sistema de eixos do cristal, a permissividade e a impermeabilidade são diagonais, isto é = = 33 22 11 33 22 11 /100 0/10 00/1 00 00 00 ε ε ε η ε ε ε ε (5.17) Além disso, como o niobato de lítio é um cristal uniaxial, tem-se 332211 εεε ≠= , 2211 2 εε ==on e 33 2 ε=en em (5.17). Reunindo as informações (5.15) e (5.17) em (5.16), obtém-se + ++ +++ +− 233332 2 23312222 0 2 13312222 0 111 xEr n xErEr n xErEr n e 1222 321 211223111532215 =−++ xem rotação xem rotação xem rotação xxErxxErxxEr (5.18) Assim, por exemplo, para um campo elétrico aplicado ao longo de z, tal que 0,0 321 ≠== EEE (5.19) o elipsóide perturbado torna-se 1111 233332 2 23312 2 13312 = ++ ++ + xEr n xEr n xEr n eoo (5.20) 145 não havendo rotação de eixos do elipsoide. Desta forma, os eixos 1x , 2x e 3x continuam sendo eixos principais, porém, com novos índices de refração: 1x n , 2x n e 3x n . A equação (5.20) também pode ser escrita como 12 2 3 2 2 2 2 2 1 321 =++ xxx n x n x n x (5.21) onde 233122 21 111 xox n Er nn =+= (5.22 a) 33322 11 3 Er nn ex += (5.22 b) Ou seja, [ ] 21 2133121 1 x o ox n Ern nn = + = (5.23 a) [ ] 2133321 1 3 Ern nn e ex + = (5.23 b) Dados r13 = 9,6 × 10-12 m/V e r33 = 30,9 × 10-12 m/V (livro do Yariv [1]), normalmente ocorre que: 1)(,)( 333 2 331 2 <<ErnErn eo , mesmo para amplitudes de campo elétrico muito intensas (da ordem de kV). Então, aplicando-se a expansão em série binomial ... 4.2 3.1 2 11 1 1 2 ++−= + xx x para |x| < 1 (5.24) verifica-se que (5.23 a-b) são convertidas para 21 331 2 2 11 xoox nErnnn ≅ −≅ (5.25 a) −≅ 333 2 2 11 3 Ernnn eex (5.25 b) evidenciando que os novos índices de refração são funções lineares do campo elétrico externo. Até este estágio da análise, estudou-se apenas o efeito do campo elétrico externo sobre o elipsóide de índices de refração. A seguir, investigam-se as suas repercussões sobre a propagação de uma onda óptica ao longo do eixo X, do esquema da Fig.5.4. Deve-se estar atento pois, agora, 146 são considerados dois campos elétricos no interior do cristal: um correspondente ao campo elétrico externo de modulação (E3), e outro, correspondente ao campo elétrico associado ao modo óptico (Eop) que se propaga no cristal.Figura 5.4- Propagação da onda óptica ao longo do eixo X de um cristal EO submetido à ação de campo elétrico externo. Como se observa na Fig.5.4, o eixo óptico do cristal está na direção ortogonal à de propagação. Admite-se que o campo óptico possua polarização linear, a 450 de Z, tal que excite modos polarizados nas direções Y e Z com iguais amplitudes. Os dois modos de propagação, com vetor deslocamento elétrico paralelo aos eixos 2x e 3x , têm vetores de onda 2K e 3K dados por: 2 0 2 2 xnK λ π= [rad/m] (5.26 a) 3 0 3 2 xnK λ π= [rad/m] (5.26 b) Se os dois modos forem excitados na interface 01 =x com a mesma fase inicial, a diferença de fase entre eles, após percorrerem uma distância Lx =1 , é dada por ( LKΔ=Δφ ): ( ) LErnnErnnLnn eeooxx +−−=−=Δ 333 3 331 3 0 2 0 22 22 3 λ π λ πφ (5.27) ou então, ( ) ( ) LErnrnnn eoeo −−−=Δ 333 3 31 3 0 2 12 λ πφ (5.28) 147 A expressão (5.28) torna evidente que existem dois tipos de defasagem relativa. O primeiro tipo, correspondente à primeira parcela de (5.28), e se deve à birrefringência natural do cristal. O segundo tipo, corresponde à segunda parcela de (5.28), e é induzida pelo campo elétrico externo. Esta parcela pode ser controlada eletronicamente, bastando controlar a amplitude da componente de campo modulador E3. Estas diferenças de fase são denominadas de defasagens natural e induzida, respectivamente. Desta forma, torna-se possível implementar, por exemplo, placas de quarto-de-onda, 4/λ wave plate, para um comprimento de amostra (L) arbitrário, controlando-se apenas o campo elétrico externo 3E . Deve-se ressaltar, contudo, que este controle pode não ser uma tarefa tão trivial, pois as amplitudes desses campos elétricos normalmente são da ordem de centenas a milhares de volts. Este assunto será tratado com mais detalhes adiante. 5.2 CONFIGURAÇÕES UTILIZADAS EM DISPOSITIVOS ELETROÓPTICOS No exemplo anterior, considerou-se que o campo elétrico aplicado estivesse na direção Z (ou x3), porém, não ficou claro como obtê-lo. O dispositivo constituído pelo cristal eletroóptico, juntamente com os eletrodos para aplicar o campo elétrico, é denominado de Célula Pockels. Nas figuras a seguir, ilustram-se alguns exemplos dessas células. 5.2.1 Célula Pockels transversal Neste caso, o campo elétrico é transversal à direção de propagação da luz. Quando a amostra é espessa, pode-se utilizar eletrodos de placas paralelas, como mostrado na Fig. 5.5 a). Estes eletrodo podem ser constituídos por placas metálicas, no interior das quais se insere o cristal, por filmes metálicos depositados pela técnica de evaporação, ou mesmo, por tintas metálicas (tinta prata). Por outro lado, quando a amostra é delgada (como no caso de cerâmicas eletro-ópticas), torna-se difícil empregar tais tipos de eletrodos [6]. Neste caso, recomenda-se a disposição da Fig.5.5 b), obtida através de filmes ou tinta condutora. Analiticamente, é preferível utilizar a configuração da Fig.5.5 a), a qual constitui um simples capacitor de placas paralelas, cuja expressão do campo elétrico (E=V/L ou E=V/d) é facilmente obtenível a partir da teoria de potenciais (assunto presente em qualquer livro de Eletromagnetismo). Por outro lado, a configuração da Fig.5.5 b), apresenta um cálculo mais complicado para se obter a distribuição do campo elétrico na abertura. Tal cálculo torna necessário, por exemplo, a utilização da técnica de mapeamento conforme, especificamente, a transformação de Schwarz-Christoffel (ver livros de Física Matemática) [7]. 148 (a) (b) Figura 5.5- Célula Pockels com aplicação de campo elétrico transversal. a) Para amostra espessa. b) Para amostra delgada. 5.2.2 Célula Pockels longitudinal Alguns materiais eletro-ópticos (BGO = Bi2Ge4O12, KDP = KH2PO4) tornam necessários aplicar campos elétricos na direção em que a propagação ocorre. Nesta situação, o dispositivo é denominado de célula Pockels longitudinal, como os mostrados na Fig.5.6 a) e b). No caso a), os eletrodos devem ser semitransparentes, a fim de permitir que a luz os atravesse. Obviamente, ocorrem perdas ópticas severas, que algumas vezes não podem ser toleradas. Os eletrodos devem ser depositados, preferivelmente, com tecnologia de filmes finos (ITO = Indium Tin Oxide). No caso b), os eletrodos são cilíndricos e, portanto, não afetam a propagação da luz. (a) (b) Figura 5.6- Célula Pockels com aplicação de campo elétrico longitudinal. a) Com eletrodos semitransparentes. b) Com eletrodos cilíndricos. Novamente, o caso a) pode ser modelado como um capacitor de placas paralelas, sendo o campo elétrico obtido de forma simples. Os eletrodos de filmes finos não são capazes de operar com potência elevadas, contudo, em baixas frequências, o dielétrico é quase ideal, sem perdas, e 149 a corrente de deslocamento é reduzida (mesmo que a tensão elétrica seja muito alta). Porém, quando a frequência for elevada (por exemplo, em RF), deve-se tomar cuidado, uma vez que a reatância capacitiva cai e o eletrodo pode se evaporar devido ao excesso de aquecimento causado pela circulação da corrente. Por outro lado, embora o caso b) não apresente este problema, seu equacionamento matemático é mais complexo. _____________________________________________________________________________ Exemplo 5.4: Analisar a Célula Pockels com KDP, para campo elétrico aplicado na direção Z e laser de He-Ne. Solução: O KDP (ou KH2PO4) é uniaxial, cuja matriz de coeficientes EO foi apresentada no Exemplo 5.2. Para o laser de He-Ne (λ=0,6328 μm), os coeficientes remanescentes valem (ver o livro do Yariv) [1]: Vmr /106,8 1214 −×= e Vmr /106,10 1236 −×= . Os índices de refração são: 51,1=on e 47,1=en . Usando-se (5.5), ou seja, ( )( ) 10 =Δ+ jijiji xxηη , e considerando-se que o campo elétrico externo seja aplicado paralelo ao eixo Z, ZEE ˆ0= → , obtém-se o seguinte elipsóide de índices de refração perturbado: 12 3 210362 2 3 2 2 2 2 2 1 =+++ = zxdetorno emrotaçãoeoo xxEr n x n x n x A existência do produto cruzado em x1x2, significa que houve uma rotação do respectivo elipsóide em torno do eixo x3=Z, conforme esquematizado na Fig.5.7. Figura 5.7- Rotação do sistema de coordenadas x1, x2, x3 em torno de x3. A fim de descobrir qual o ângulo de rotação, θ, considere-se a matriz de rotação: 150 ( ) ( ) −= + − = 100 0cossen 0sencos 100 0cos90cos 090coscos θθ θθ θθ θθ jia Então, sua inversa será [ ] [ ] − ==− 100 0cossen 0sencos 1 θθ θθ T jiji aa e assim, θθ senxxx '2 ' 11 cos −= θθ cos'2 ' 12 xsenxx += '33 xx = Substituindo-se estas informações na equação do elipsóide de índices antigo: ++++− 2 ' 3 2 2' 2 ' 1 2 2' 2 ' 1 )cos()cos( eoo n x n xsenx n senxx θθθθ ( ) ( ) 1coscos2 '2'1'2'136 =+−+ θθθθ xsenxsenxxEr o + ++ θθθθ cos2cos 0362 2 2 2 2' 1 senErn sen n x oo + −+ θθθθ cos2cos 0362 2 2 2 2' 2 senErnn senx oo 1coscoscos2 2036 2 03622 ' 2 ' 12 2' 3 = +−−− θθθθθθ senErEr n sen n senxx n x ooe ++ −+ + 2 2' 3 0362 2' 20362 2' 1 2 121 eoo n xsenEr n xsenEr n x θθ ( ) 1cos2 '2'122036 =−+ xxsenEr θθ No novo sistema de coordenadas, o elipsóide tem seus eixos próprios alinhados com os eixos geométricos, e assim, o termo cruzado deve-se anular. O coeficiente de '2 ' 1 xx se anula quando ( ) 0cos2 22036 =− θθ senEr , ou seja, para: θθθθ sencossencos 22 == ⇔ 4 πθ = rad. Portanto, ocorre uma rotação cujo valor é 4 πθ = !!! No novo sistema '3 ' 2 ' 1 xxx , oelipsóide pode ser escrito como: 151 12' 2' 3 2' 2' 2 2' 2' 1 321 =++ xxx n x n x n x no qual ou então, = − = + = ex o o x o o x nn Ern nn Ern nn ' 036 2 ' 036 2 ' 3 2 1 1 .1 Porém, como r63 possui valor extremamente reduzido (da ordem de 10-12 V/m), ocorre 1036 2 <<Erno , mesmo para amplitudes de campo E0 elevadas. Assim, é possível aplicar a expansão binomial (5.24), obtendo-se = +≅ −≅ ex oox oox nn Ernnn Ernnn ' 036 3' 036 3' 3 2 1 2 1 2 1 5.3 TENSÃO DE MEIA-ONDA No Exemplo 5.4 analisou-se uma célula Pockels de KDP, na qual o campo elétrico externo estava aplicado na direção do eixo Z, de um cristal com comprimento L, conforme esquematizado na Fig. 5.8. Nesta situação, obteve-se que no sistema de coordenadas girado os índices de refração correspondentes a cada eixo são: 152 = +≅ −≅ ex oox oox nn Ernnn Ernnn ' 036 3' 036 3' 3 2 1 2 1 2 1 (5.29) onde E0 é a amplitude do campo elétrico externo. Considere-se agora, que incide sobre o cristal de KDP uma onda óptica com polarização linear paralela ao eixo cristalino 1x , na face 03 =x , propagando-se ao longo do eixo 3x conforme esquematizado na Fig.5.8. Como θ=45 0, esta onda excita, com igual amplitude, as componentes ao longo dos eixos x'1 e x'2. A equação (5.29) informa que as velocidades dessas duas ondas são diferentes ao longo de x3. Figura 5.8- Propagação da onda óptica em um cristal de KDP ao longo do eixo x3. Na posição += 03x , são estabelecidas as seguintes componentes de campo elétrico da onda óptica: 2 ' 1 op x E E = ( )3'1 xKtj xe −ω (5.30 a) 2 ' 2 op x E E = ( )3'2 xKtj xe −ω (5.30 b) onde Eop é a amplitude da modo óptico. As constantes de fase para cada polarização são −== 036 3 00 ' ' 2 122 1 1 Ernn n K oo x X λ π λ π rad/m (5.31 a) 153 +== 036 3 00 ' ' 2 122 2 2 Ernn n K oo x X λ π λ π rad/m (5.31 b) para o qual 51,1=on e 47,1=en , considerando-se o caso de laser de He-Ne (λ=0,6328 μm) propagando-se no KDP. A diferença (ou retardo) de fase entre os dois modos de polarização, na posição Lx =3 , é dada por: ( ) LKK xx '' 12 −=Γ (5.32) e assim, substituindo-se (5.31 a) e (5.31 b) em (5.32), obtém-se LErno =Γ 0 036 3 2 λ π (5.33) A amplitude de E0 estabelece o valor de Γ. Na Fig.5.9 ilustra-se o estado da polarização óptica no interior KDP, em função de 3x . Obviamente, a radiação em x3=0 é linear por definição. Quando Γ atinge o valor π/2 rad, são obtidas componentes ortogonais, com amplitudes iguais e defasadas entre si de 900. Isto caracteriza uma polarização circular. Aplicando-se este raciocínio para os demais valores de Γ, completa-se a análise da Fig.5.9. Figura 5.9- Estado de polarização da radiação óptica no interior do KDP. Portanto, através do ajuste de E0 , é possível controlar eletronicamente o estado de polarização da radiação óptica de saída, mantendo-se fixo o comprimento L. Se a célula Pockels for inserida entre placas metálicas paralelas com distância L, o campo elétrico externo, E0, pode ser obtido a partir da tensão elétrica aplicado a elas (V): L VE =0 (5.34) 154 Então, substituindo-se (5.34) em (5.33), obtém-se Vrno 0 36 3 2 λ π=Γ (5.35) a qual relaciona o retardo de fase Γ diretamente com a tensão de controle V. Além disso, observa-se que esta relação é linear com V. O valor da tensão elétrica aplicada ao cristal, e que proporciona o retardo eletroóptico de π radianos é denominada de tensão de meia-onda, representada por πV . Assim, a partir de (5.35), obtém-se: πλ ππ Vrno 0 36 3 2 /=/ 36 3 0 2 rn V o λ π = (5.36) a qual não depende de L. A tensão de meia-onda constitui uma figura de mérito do dispositivo, e é usada para comparar diferentes células Pockels. Quanto menor o valor de Vπ, menor é a tensão necessária para alimentá-la, o que constitui uma característica desejável para moduladores ópticos. A tensão de meia-onda da célula Pockels da Fig.5.8 depende do material (ne e r63) e do comprimento de onda da radiação óptica (λ0). Os parâmetros ne e r63 não variam tanto com a frequência da luz e, portanto, valores elevados de Vπ , serão obtidos quando o próprio λ0 for grande (em infravermelho, por exemplo). Em telecomunicações, normalmente, as células Pockels longitudinais são mais adequadas para operar com luz de comprimentos de onda reduzidos (visível). Substituindo-se (5.36) em (5.35), obtém-se que ( ) V V V )( π π=Γ (5.37) a qual fornece o retardo de fase como função linear de V. Quanto menor o valor de Vπ , maior será o retardo obtido para um mesmo valor de V. 5.4 INTENSIDADE ÓPTICA E TRANSMISSÃO Antes de prosseguir com a análise da célula Pockels, é conveniente fazer uma breve revisão sobre a definição de intensidade óptica de uma radiação propagando-se no ar. Para isto, 155 inicia-se relembrando o conceito de vetor de Poynting num meio isotrópico [1], [4]. Considere-se os campos elétrico e magnético representados no domínio do tempo ( ) = →→ tjeEte ωRe e ( ) = →→ tjeHth ωRe (5.38) Define-se o vetor de Poynting instantâneo, ( )ts → , a partir do produto vetorial ( ) ( ) ( )thtets →→→ ×= (5.39) Substituindo-se (5.38) em (5.39), pode-se rescrever o vetor de Poynting instantâneo como × = →→→ tjtj eHeEs ωω ReRe = +× −→→→ tjtjtj eHeHeE ωωω *Re 2 1 = ×+× →→→→ tjeHEHE ω2*Re 2 1 (5.40) o qual apresenta uma parcela independente de t e uma parcela que varia harmonicamente com t. Com isso, o valor médio desta segunda parcela é nulo. O valor médio do vetor de Poynting, AVS , corresponde apenas à primeira parcela, isto é: AVS → = = × →→ *Re 2 1 HE × →→ * 2 1Re HE (5.41) Dessa forma, define-se o vetor de Poynting complexo → S , como * 2 1 →→Δ→ ×= HES (5.42) de maneira que }{Re SS AV = → . (5.43) Conforme visto no Capítulo 4, no caso de onda plana, a equação de Maxwell para lei de Faraday conduz a seguinte relação: ωμ →→ → ×= EKH (5.44) 156 sendo εμω=K . Assim, (5.44) pode ser reescrita numa forma mais adequada: →∧→ → → ×=×= EKE K KH εμ εμω ωμ 11 (5.45) ou então →→ ×= EKH ˆ1 η (5.46) onde η exibe unidades de ohms, e corresponde à impedância intrínseca do meio, conforme visto no Capítulo 2. No caso do ar, tem-se Ω≅=×== − − 377120 36/10 104 9 7 0 0 π π π ε μη . (5.47) Substituindo a expressão (5.46) em (5.42), observa-se que o vetor de Poynting complexo vale ××= →∧→→ EKES η2 1 * (5.48) a qual, após expandir o duplo produto vetorial, gera → S { } KEEEEKKEE ˆ*)( 2 1*)ˆ(ˆ*)( 2 1 ηη =−= (5.49) Como 0* =EK , (5.49) conduz a: ∧→ = KES η2 2 [W/m2] (5.50) Assim, nos meios sem perdas e isotrópicos, o vetor de Poynting complexo aponta na direção do vetor de onda da onda plana e uniforme. Sua unidade é W/m2 , e representa o fluxo de potência por unidade de área. No caso de uma onda óptica propagando-se num meio sem perdas e isotrópico, || → S representa a intensidade óptica da radiação luminosa, I: 157 η2 || 2ESI == → (5.51) A intensidade óptica é uma grandeza de extrema importância em Optoeletrônica. A maioria dos transdutores de radiação óptica, desde o olho humano até os modernos fotodiodos e fototransistores, são sensíveis a esta grandeza. Embora o efeito eletroópticoe os cálculos apresentados neste capítulo trabalhem com o campo elétrico [V/m], a grandeza passível de medição direta é a intensidade óptica [W/m2]. Além disso, como os pontos de medição normalmente estão exterior ao cristal, via de regra, a relação (5.51) é aplicada para meios isotrópicos, em particular, para a região de ar. Prosseguindo com o estudo de moduladores eletroópticos, considere-se novamente o cristal de KDP do Exemplo 5.4, para campo elétrico aplicado na direção Z e polarização óptica na direção X. Um feixe de laser incide na sua face frontal, com propagação na direção Z. Na Fig. 5.10, representa-se o cristal de KDP, o qual está inserido entre dois polarizadores cruzados, ajustados a 90° entre si. Figura 5.10- Cristal de KDP inserido entre dois polarizadores a 90o entre sí. O primeiro polarizador faz com que o feixe que incide no cristal seja polarizado linearmente na direção X excitando, com amplitudes iguais, os modos ordinário e extraordinário, com deslocamentos elétricos a 45° de X (e 45° de Y). Seja inE o campo elétrico da radiação óptica após o polarizador de entrada opIN EE = → ( )xe zKtj ˆ−ω (5.52) onde ω é a frequência óptica, e Z é o eixo óptico. A intensidade óptica de radiação incidente é obtida aplicando-se (5.51) 158 η 2 2 1 op IN E I = [W/m2] (5.53) Na posição Z=0, os campos associados aos dois modos ópticos na entrada da amostra de KDP são: tAex ωcos ' = (5.54 a) tAey ωcos ' = (5.54 b) onde 2 opEA = (5.55) ou seja, η 2AI ni = (5.56) Para uma posição Z arbitrária, essas componentes de campo evoluem para −= ZntAe xx '' 2cos λ πω (5.57 a) −= ZntAe yy '' 2cos λ πω (5.57 b) Afirma-se que é mais adequado utilizar os fasores associados a (5.57 a-b), em vez da notação instantânea, ou seja AEX = ' Znj Xe '2 λ π− (5.58 a) AEY = ' Znj Ye '2 λ π− (5.58 b) Conforme se verifica na Fig.5.10, o segundo polarizador está alinhado com a direção Y, e realiza a análise (ou seja, a decomposição) do sinal de saída. Portanto, o campo total que emerge do segundo polarizador é a soma das projeções das componentes de (5.58 a-b) ao longo da direção Y, segundo esquematizado na Fig.5.11: Figura 5.11- Projeções das componentes de campo na saída do cristal de KDP. 159 Desta forma, o campo elétrico de saída, após o segundo polarizador será 4 cos 42 cos '' πππ YXOUT EEE + += ( )'' 2 1 XY EE −= (5.59) Substituindo-se (5.58 a-b) em (5.59) obtém-se 2 AEOUT = ( ZnjZnj XY ee '' 22 λ π λ π −− − ) 2 AEOUT = Znj Xe '2 λ π− ( ( ) Znnj XYe ''2 −− λ π )1− (5.60) Lembrando-se da expressão para o retardo eletroóptico (5.32), vem ( ) Znn XY ''2 −=Γ λ π , (5.61) a qual, substituída em (5.60) gera 2 AEOUT = Znj Xe '2 λ π− ( Γ− je )1− 2 AEOUT = Znj Xe '2 λ π− 2/Γ− je ( 2/Γ− je 2/Γ+− je ) AjEOUT 2 2−= Znj Xe '2 λ π− 2/Γ− je 2 Γsen (5.62) Portanto, aplicando-se (5.51) novamente, determina-se a intensidade óptica do sinal de saída (5.62), dada por Γ== 2 || 2 1 222 senAEI OUTOUT ηη (5.63) na qual, usando-se (5.56), gera Γ= 2 2senII NIOUT (5.64) Define-se a transmissão de um dispositivo óptico (T ) a razão entre as intensidades ópticas de saída e de entrada. Assim, no caso da célula Pockels de KDP, na qual Γ é dado por (5.37), tem-se 2 )/cos(1 2 )2/(2cos1 2 2 VVVV V Vsen I IT NI OUT ππ ππ π π −=−= == (5.65) A partir de (5.65), é possível determinar a intensidade óptica de saída, para qualquer 160 intensidade óptica de entrada numa célula Pockels de KDP, sobre a qual se aplica uma tensão elétrica V (AC ou DC). Representando-se (5.65) graficamente, obtém-se a curva de transmissão, tal qual a mostrada na Fig.5.12. A entrada é elétrica (volts) e a saída é óptica (W/m2). Figura 5.12- Curva de Transmissão de uma célula Pockels de KDP. A curva de transmissão indica que a relação entre as intensidade ópticas de saída e de entrada na célula Pockels é não linear. Esta curva é periódica, se anulando para V=0, V=2Vπ, etc. Apresenta máximos em V=Vπ, V=3Vπ, etc. Percebe-se que existe uma região nessa curva de transmissão, em torno de V=Vπ /2, na qual a intensidade do sinal óptico varia de forma quase linear com a tensão V aplicada, o qual é tão mais verdadeiro a medida que sua amplitude seja reduzida. A curva de transmissão da célula Pockels deve ser utilizada da mesma forma que as curvas características de entrada e de saída de um transistor. Por exemplo, deve ser estabelecido um ponto de polarização quiescente, Q na Fig.5.12, em torno do qual se obtém boa linearidade para sinais de baixas amplitudes. Este ponto Q pode ser obtido através de uma tensão DC aplicada à célula Pockels, em série com o sinal de informação v(t), cujo valor é VBIAS=Vπ /2. Como se verifica na figura, incidindo-se o sinal de tensão v(t) que oscila em torno deste ponto quiescente, a saída óptica (luz modulada) constituirá uma reprodução fiel desse sinal elétrico. 5.5 MODULADORES ELETROÓPTICOS 5.5.1 Modulador de Amplitude Num sistema de comunicações ópticas, a luz modulada IOUT pode ser transmitida para um receptor remoto usando por exemplo, um enlace de fibra óptica. O processo de demodulação no 161 receptor remoto pode ser realizado com o auxílio de um fotodetector óptico, como um fotodiodo ou fototransistor. O valor DC superposto ao sinal AC de saída pode ser removido por um filtro passa-alta, ou então, por um simples capacitor de passagem. Conforme foi visto na seção anterior, o ponto de operação Q pode ser estabelecido através de aplicação de uma tensão de polarização com valor 2πVV = , a qual, normalmente, é elevada (vários kV). Uma forma mais eficiente de polarizar o modulador, consiste em utilizar uma lâmina de quarto - de - onda (λ/4), entre a célula Pockels e o analisador, conforme mostrado na Fig.5.13. Figura 5.13- Lâmina de quarto-de-onda (λ/4) inserida após a célula Pockels. A lâmina de λ/4 introduz um retardo adicional ( λλπλπϕ /)4/2(/2 =Δ=Δ L ) de π/2 rad, de forma a obter 2' π+Γ=Γ e, portanto, (5.64) pode ser substituída por: = NI OUT I I +Γ= Γ 42 sen 2 sen 2 ' 2 π 2 2 cos 2 2 22 2 Γ+Γ= sen ΓΓ+ Γ+ Γ= 2 cos 2 2 2 cos 22 1 22 sensen ( )Γ+= sen1 2 1 (5.66) Figura 5.14- Nova curva de transmissão após a inserção da lâmina de λ/4. 162 Com isso, a nova curva de transmissão terá o aspecto ilustrado na Fig.5.14. Observa-se assim, que o sinal elétrico de modulação não precisa de nenhuma polarização elétrica adicional para operar na região mais linear da curva de transmissão. A lâmina de quarto-de-onda emula o efeito da polarização DC discutida na seção 5.4. Admitindo-se que a tensão aplicada à célula Pockels da Fig.5.13 seja tVV mMAX ωsen.= , onde mω é freqüência do sinal modulador, então, usando-se (5.37) π π V =Γ tsenV mMAX ω = tsen mMAX ωΓ (5.67) Substituindo-se (5.67) em (5.66) obtém-se Γ+= tsensen I I m MAX NI OUT ωπ 24 2 (5.68) a qual revela uma relação não linear. Entretanto, na condição de baixo índice de modulação, isto é 1<<ΓMAX (tal que MAXMAXsen Γ≅Γ ), tem-se que xsenxsenxxxsenxsen 2 2 1 2 1coscos 2 1 2 1 4 22 2 +=++= +π (5.69) onde 1 2 <<Γ= tsenx mMAX ω rad (5.70) e, portanto, xx 22sen ≅ . Nestas condições, a transmissão (5.68) torna-se [ ]tsen I I mMAX NI OUT ωΓ+= 1 2 1 (5.71) Observa-se, em (5.71), que na condição de baixo nível de modulação a intensidade óptica do sinal modulado tem a mesma forma do sinal modulador. Se a condição 1<<ΓMAX radnão for satisfeita, tem-se uma modulação não linear. Este tipo de modulador eletroóptico é denominado de modulador de amplitude, no sentido que ele modula (ou transforma, ou controla) a amplitude da intensidade óptica da radiação. O modulador pode operar com sinais analógicos, como o sinal senoidal no exemplo acima, ou, com sinais digitais. Esta situação está ilustrada na Fig. 5.15. 163 Figura 5.15- Modulador eletroóptico operando com sinais digitais. 5.5.2 Modulador de Fase Um modulador eletroóptico de fase é um dispositivo usado para alterar a fase da radiação óptica. Todo dispositivo eletroóptico é inerentemente um modulador de fase, em vista que o campo elétrico atua modificando diretamente a fase da luz. Mesmo no modulador de intensidade óptica, o campo elétrico atua modificando as fases dos modos normais do dispositivo, os quais são então combinados através dos polarizadores para que seja obtida a modulação de amplitude. Desta forma, para se implementar um modulador de fase, basta excitar apenas um modo de propagação do cristal que exibe efeito eletroóptico. Na Fig.5.16 ilustra-se seu esquema geral, onde o polarizador de entrada seleciona um dos modos de polarização, alinhado com um dos eixos do cristal, no caso, o eixo X’ de um cristal de KDP. Figura 5.16- Modulador eletroóptico de Fase. Para uma célula Pockels de KDP, foi visto que os novos índices de refração perturbados obedecem (5.29). Para a polarização mostrada na Fig.5.16, obtém-se a seguinte variação de fase, 164 ao longo do comprimento L: Lnxx ' 0 ' 2 λ πφ =Δ (5.72) onde, ' 3 6 3 1 2x o o z n n n r E= − (5.73) Combinando-se (5.72) com (5.73), obtém-se LErnn zoox −−=Δ 36 3 0 ' 2 12 λ πφ (5.74) Considerando-se que tsenEE mmz ω= corresponde ao campo elétrico de modulação, e ( ) tzEE ININ ωcos0== corresponde ao campo óptico na entrada no cristal, pode-se representar o campo óptico na sua saída como ( )0 cos ( ')OUT IN xE E z tω ϕ= = − Δ , ou ( ) ( ) −−== LtsenErnntzEtE mmooINOUT ωλ πω 36 3 0 2 12cos0 (5.75) Define-se como o índice de modulação do modulador de fase o fator LErn mo = 36 3 0 2 12 λ πδ (5.76) e assim, desconsiderando-se o fator Lno 0 0 2 λ πφ = , uma vez que é uma fase independente do tempo (e portanto, não é relevante sob o ponto de vista de modulação), pode-se representar (5.75) como: ( ) ( ) ( )[ ]tsentzEtE mINOUT ωδω +== cos0 (5.77) a qual constituí a forma padrão empregada nos livros de telecomunicações para representar um sinal modulado em fase (PM – Phase Modulation), cujo índice de modulação é δ [8]. Em termos fasoriais a relação (5.77) pode ser escrita na forma: )0( == zEE INOUT ( )tsenj me ωδ (5.78) Contudo, do estudo das funções especiais, sabe-se que a seguinte propriedade se aplica 165 ( ) ≡tsenj me ωδ . ( ) ∞ ∞−=n nJ δ tnj me ω (5.79) onde ( )δnJ é uma função de Bessel de primeira espécie e ordem n. Além disso, ( ) ( )δδ nn JJ −= para n par (5.80 a) ( ) ( )δδ nn JJ −−= para n ímpar (5.80 b) Utilizando-se essas informações em (5.78), é possível concluir que )0( == zEE INOUT ( ) ∞ ∞−=n nJ δ tnj me ω (5.81) na qual, retornando-se ao domínio do tempo, torna-se )0(}Re{ === zEeEe IN tj OUTOUT ω ( ) tnJ m n n )(cos ωωδ + ∞ ∞−= (5.82) ou ( ){ ( ) ( ) ( )[ ] +−−++== ttJtJzEe mmINOUT ωωωωδωδ coscoscos)0( 10 ( ) ( ) ( )[ ] +−+++ ttJ mm ωωωωδ 2cos2cos2 ( ) ( ) ( )[ ] +−−++ ttJ mm ωωωωδ 3cos3cos3 } (5.83) sendo ω =2πf a portadora ótica. Recomenda-se ao leitor interessado em se aprofundar no assunto, uma leitura sobre as formas de modulação FM (frequency modulation) e PM (phase modulation), em livros sobre Princípios de Comunicações [8]. Deve ser lembrado, que uma radiação óptica possui frequência da ordem de 1014 Hz (ou seja, 105 GHz). Mesmo assim, o modulador eletroóptico permite que seja obtida modulação PM, tal qual ocorre nas faixas de RF (rádio frequências) ou microondas. A dúvida fundamental que surge neste procedimento é como realizar a demodulação desta informação no outro extremo do canal de comunicação, ou seja, no receptor. A demodulação do sinal PM não é um problema sério na faixa de frequências de RF, por exemplo, pois existe toda uma instrumentação consagrada para tratar com este tipo de sinal. Osciloscópios, analisadores de espectro, analisadores de redes, medidores de potência de RF, frequencímetros, etc., são disponíveis para estudar o sinal PM. Porém, na faixa óptica, não existe nem mesmo detectores capazes de responder aos campos elétricos instantâneos, operando 166 em frequências tão elevadas. Os fotodiodos ou fototransistores respondem apenas à intensidades ópticas, não possuindo rapidez (largura de banda) suficiente para responder às frequências ópticas. Se não houver modulação de amplitude, tudo o que um fotodetector percebe é uma intensidade média, a qual, em frequências ópticas, resulta numa tensão DC. O mesmo ocorre para modulação PM com portadora . Nesta situação, é necessário empregar uma técnica de processamento de sinais denominada, na linguagem da teoria de comunicações, de demodulação síncrona. Em eletroóptica, por outro lado, esta técnica é denominada de interferometria óptica, e será estudada em capítulos posteriores. 5.5.3 Moduladores Longitudinais e Transversais O modulador de KDP analisado na seção 5.4, com campo elétrico de modulação Ez e propagação na direção Z, é um modulador do tipo longitudinal. Ou seja, o campo elétrico externo está na mesma direção que o feixe óptico. Para este tipo de configuração, a tensão de meia-onda não depende do comprimento de interação eletroóptica, L, conforme especifica (5.36). Desta forma, dado um material eletroóptico operando num certo comprimento de onda, não existe nenhum grau de liberdade para reduzir a tensão de meia-onda A fim de poder operar com moduladores onde πV não seja muito elevado, é interessante utilizar estruturas onde πV varia inversamente com L. Isto pode ser obtido utizando-se moduladores eletroópticos transversais, como mostrado na Fig.5.17. Figura 5.17- Modulador eletroóptico em configuração transversal. O campo elétrico gerado pela tensão V aplicada à célula Pockels da Fig.5.17 vale : d VE = (5.84) No próximo exemplo, será mostrado que a tensão de meia onda pode ser reduzida diminuindo-se a espessura do cristal, d, o que causa um aumento na amplitude do campo elétrico. 167 Na Fig. 5.18 ilustra-se um modulador de amplitudes (intensidade óptica) com célula Pockels de LiNbO3, campo elétrico de modulação paralelo a Z e propagação paralela a Y. Como já foi mostrado na seção 5.1, nesta situação não ocorre rotação de eixos, o campo óptico deve ser polarizado a 45º do eixo Z, e ZooYX Ernnnn 31 3 2 1−== (5.85) ZeeZ Ernnn 33 3 2 1−= (5.86) Figura 5.18- Esquema de um modulador eletroóptico com campo elétrico transversal. A birrefringência do modulador é calculada como ( ) ( ) Z induzida nciabirrefrigê oe natural nciabirrefrigê oeXZ Ernrnnnnn 31 3 33 3 2 1 −−−=− (5.87) sendo Ez=V/d, e que está associada ao seguinte retardo eletroóptico ( 0/)(2 λπ Lnn XZ −=Γ ): ( ) ( ) d VLrnrnLnn induzido retardo oe natural retardo oe 31 3 33 32 −−−=Γ λ π λ π (5.88) Lembrando-se, novamente, que a tensão πV é definida como o valor de V que produz um retardo induzido igual a π radianos, a partir de (5.89) obtém-se L d rnrn V oe 31 3 33 3 − = λπ (5.89) A equação (5.89) revela que para reduzir Vπ no modulador transversal, é necessário reduzir a razão (d/L). Entretanto, esta informação deve ser usada com critério, uma vez que 168 valores muito reduzidos de (d/L) causam umaumento substancial na capacitância do modulador eletroóptico. Isto, por sua vez, faz com que a dispositivo não consiga responder em frequências elevadas, da ordem de MHz. Além disso, para dimensão “d ” muito pequena, existem problemas associados a largura do feixe de laser que é utilizado. Se esta for da mesma ordem de grandeza, o efeito da difração do feixe óptico pode degradar o desempenho do modulador [1]. 5.6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS [1] Yariv, A. & Yeh, P., Optical Waves in Crystals, New York, John Wiley & Sons, 1984. [2] Kaminow, I.P., An Introduction to Electrooptic Devices, Academic Press, Inc., 1974. [3] Yariv, A., Optical Electronics, third edition, New York, Holt, Rinehart and Winstonm 1985. [4] Ramo, S., Whinery, J.R., Van Duzer, T., Fields and Waves in Communication Electronics, third edition, John Wiley & Sons, 1994. [5] Nye, J.F., Physical Properties of Crystals – Their Representation by Tensors and Matrices, Oxford Press, 1957. [6] Spencer, E.G. et alii, Dielectric Materials for Electrooptic, Elastooptic, and Ultrasound Devices Application, Proceedings of the IEEE, vol.55 (12), pp.2074-2108, 1967. [7] Collin, R.E., Field Theory of Guided Waves, second edition, IEEE Press, New York, 1991. [8] Carlson, A.B., Communication Systems, McGraww-Hill, third edition, 1986.
Compartilhar