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Percepção Espacial, Crime e Medo em Marília-SP

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0 
 
UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA – UNESP. 
FACULDADE DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS – FFC 
CAMPUS DE MARÍLIA . 
 
 
 
 
 
MÁRCIO RICARDO DE CARVALHO 
 
 
 
 
 
 
 
 
Percepção Espacial, Crime e Medo: entre o real e o imaginário.Percepção Espacial, Crime e Medo: entre o real e o imaginário.Percepção Espacial, Crime e Medo: entre o real e o imaginário.Percepção Espacial, Crime e Medo: entre o real e o imaginário. 
Um estudo sobre as evidências sócio-espaciais e as sociabilidades em Marília-SP. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Marília 
2007 
 
 
1 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
C P 
Carvalho, Marcio Ricardo de 
Percepção espacial, crime e medo: entre o real e o imaginário: um estudo sobre 
as evidências sócio-espaciais e as sociabilidades em Marilia-SP. / Marcio Ricardo 
de Carvalho. – Marilia, 2007. 
174 f,: 30 cm. 
 
Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais) – Faculdade de Filosofia e Ciências, 
Universidade Estadual Paulista, 2007 
Bibliografia: f. 155-164. 
Orientadora: Profª. Drª. Sueli Andruccioli Felix. 
 
1. Percepção espacial. 2. Crime. 3. Medo. 4. Sociabili dades. 5. Marília/SP. I 
Autor. II Titulo. 
 
CDD 
 
 
 
 
 
 
2 
 
UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA – UNESP. 
FACULDADE DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS – FFC 
CAMPUS DE MARÍLIA . 
 
 
 
 
 
MÁRCIO RICARDO DE CARVALHO 
 
 
 
 
 
 
 
 
Percepção Espacial, Crime e Medo: entre o real e o imaginário.Percepção Espacial, Crime e Medo: entre o real e o imaginário.Percepção Espacial, Crime e Medo: entre o real e o imaginário.Percepção Espacial, Crime e Medo: entre o real e o imaginário. 
Um estudo sobre as evidências sócio-espaciais e as sociabilidades em Marília-SP. 
 
 
 
Texto apresentado como Dissertação de 
Mestrado junto ao Programa de Pós-Graduação 
em Ciências Sociais da Faculdade de Filosofia 
e Ciências da Universidade Estadual Paulista -
UNESP “Júlio de Mesquita Filho”, Campus de 
Marília. 
 
Orientadora: Dra. Sueli Andruccioli Félix 
 
 
 
 
 
 
 
 
Marília 
2007 
 
 
3 
 
MÁRCIO RICARDO DE CARVALHO 
 
 
 
 
Percepção Espacial, Crime e Medo: entre o real e o imaginário.Percepção Espacial, Crime e Medo: entre o real e o imaginário.Percepção Espacial, Crime e Medo: entre o real e o imaginário.Percepção Espacial, Crime e Medo: entre o real e o imaginário. 
Um estudo sobre as evidências sócio-espaciais e as sociabilidades em Marília-SP. 
 
 
 
 
 
Dissertação de Mestrado junto ao 
Programa de Pós-Graduação em 
Ciências Sociais da Faculdade de 
Filosofia e Ciências da Universidade 
Estadual Paulista - UNESP “Júlio de 
Mesquita Filho”, Campus de Marília 
sob avaliação da Banca Examinadora: 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
__________________________ 
Drª. Sueli Andruccioli Felix 
Orientadora 
__________________________ 
Drª. Maria Teresa Miceli Kerbauy 
 
__________________________ 
Prof. Drª. Lívia de Oliveira 
 
 
 
Suplentes: 
_________________________ 
Drª. Noêmia Ramos Vieira 
 
_________________________ 
Dr. Paulo Ribeiro Rodrigues da Cunha 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Marília, 08 de Agosto de 2007.
 
 
 
4 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
DedicatóriaDedicatóriaDedicatóriaDedicatória 
 
Dedico este trabalho a todos os 
homens e mulheres que se enveredam 
na luta por uma vida livre de 
constrangimentos em meio à 
igualdade e à solidariedade de todos, 
para todos. 
 
 
 
 
 
 
 
 
5 
 
AgradecimentosAgradecimentosAgradecimentosAgradecimentos 
Neste momento, de encerramento do trabalho desenvolvido, rememoramos as agruras desse 
caminho sinuoso da universidade pública paulista, em face de tantos constrangimentos e 
determinações que transcendem comer, morar, vestir-se, manter-se. Alcançar cada etapa na 
vida acadêmica exige de todos nós um esforço brutal de mediação severa contra os 
imperativos e as possibilidades do vir-a-ser. Porém, não fazemos quase nada sozinhos. 
Necessitamos de cada um daqueles que permanecem em nossas linhas, em cada pensamento 
que contribui para construir esse texto. Relembro-me de todos que compartilharam meus dias. 
De tantos nomes, seria exaustivo citá-los aqui. Suas consciências sabem o quanto lhes 
agradeço. Todos, amigos, colegas da Moradia Estudantil, do movimento estudantil, da 
biblioteca da faculdade, do laboratório de informática, do bar do Kanashiro, do trailer do 
Oswaldão, do Clube de Cinema de Marília, do Teatro do Sesi, dos cafezinhos do saguão, dos 
cigarros e cigarros – e mais cigarros... –, das viagens, de muitos lugares, que conseguiram 
trocar alguma experiência nestes anos de convivência e tentativa de construção de laços de 
solidariedade. Agradeço, em particular, 
aos colegas do G.U.T.O. que tanto me auxiliaram e souberam demonstrar a importância do 
esforço coletivo em meio aos caminhos tão solitários da vida universitária; 
ao Escritório de Pesquisa que sempre nos auxilia, apoiao e acompanha as expectativas de 
bolsas, relatórios e pareceres; 
à Banca Examinadora do Exame de Qualificação da Dissertação, Dr. Paulo Ribeiro 
Rodrigues da Cunha e Drª Maria Teresa Micele Kerbauy pelas valiosas contribuições; 
à Banca Examinadora do Exame Geral de Defesa da Dissertação, Drª Maria Teresa Micele 
Kerbauy e Drª Lívia de Oliveira pela avaliação profunda, crítica e generosa deste trabalho; 
e e à FAPESP – Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo pela bolsa de 
pesquisa concedida trazendo algum conforto material por nesses momentos, afinal, nem só de 
elogios vivemos. Ao Escritório de Pesquisa que sempre nos auxilia com toda a atenção que a 
[minha] miopia burocrática necessita. 
Por fim, devo sincera gratidão à Drª Sueli Andruccioli Félix por continuar me orientando 
apesar das ousadias “pueris” que denunciam nossa formação profundamente humanas, éticas 
e necessárias. À admiração e respeito dedicados, encontrei, nessa relação de paciência, 
seriedade e confiança, todos os elementos para torná-la emum verdadeiro “padrão de 
qualidade” em pesquisa. 
 
 
6 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
O verdadeiro fundador da sociedade civil foi 
o primeiro que, tendo cercado um terreno, 
lembrou-se de dizer isto é meu e encontrou 
pessoas suficientemente simples para 
acreditá-lo. Quantos crimes, guerras, 
assassínios, misérias e horrores não 
poupariam ao gênero humano aquele que, 
arrancando as estacas ou enchendo o fosso, 
tivesse gritado aos seus semelhantes: 
“Defendei-vos de ouvir esse impostor; 
estareis perdidos se esquecerdes que os 
grandes frutos são de todos e que a terra não 
pertence a ninguém!” 
 
(ROUSSEAU, Jean-Jacques. Os Pensadores. 
Discurso sobre a origem e os fundamentos 
da desigualdade entre os homens. Volume II. 
Nova Cultural, 1999. p. 87) 
 
 
 
7 
 
RESUMO 
 
Percepção espacial, crime e medo: entre o real e o imaginário. 
Um estudo sobre as evidências sócio-espaciais e sociabilidades em Marília-SP. 
 
Como a cidade nos aparece na experiência cotidiana? É possível entender a flagrante 
segregação sócio-espacial e os receios e temores que advém da assim chamada “escalada da 
violência” sob a ótica dos moradores das cidades? Essas questões têm sido objeto de análise 
de uma série de estudiosos, da geografia à sociologia, da arquitetura à antropologia e 
orientaram nossa pesquisa sobre a percepção espacial – em especial, do crime e medo – nos 
diversos bairros de Marília/SP. Nosso objetivo foi apreender as condições sócio-espaciais – 
conforme os dados do IBGE – e dinâmica criminal – proveniente dos estudos do Grupo de 
Pesquisa e Gestão Urbana de Trabalho Organizado – GUTO/UNESP – e, finalmente, as 
percepções de moradores por meio de entrevistas semi-estruturadas gravadas. À luz do 
arcabouço teórico de Yi-Fu Tuan e seus conceitos de “topofilia” – de afeição e familiaridade 
com o lugar – e “topofobia” – de recusa ou temor de determinados lugares da cidade – e 
demais teóricos que se dedicam a apreender as sociabilidades que se tecem nas cidades, 
buscamos o confronto das diversaspercepções apreendidas. No conjunto, as percepções se 
revelaram de maneira múltipla e relativas às experiências, na cidade em particular e no urbano 
em geral, demonstrando a apreensão de uma espacialidade desigual. No entanto, quando se 
referiram a “outros” espaços da cidade, distante da experiência propriamente dita, 
contrariaram os dados criminais ao se alinharem aos preconceitos, estigmas e estereótipos 
correspondentes à tese pobreza e criminalidade. Assim, este trabalho aponta a percepção 
espacial como uma ferramenta que recupera os sujeitos e suas experiências na cidade ao 
mesmo tempo em que dota de complexidade a análise e crítica dos diversos fenômenos da 
realidade urbana. 
 
PALAVRAS-CHAVE: Percepção Espacial, Crime, Medo, Sociabilidades, Marília/SP. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
8 
 
RÉSUMÉ 
 
Perception spatiale, crime, peur: entre le réel et l'imaginaire. 
Un étude sur les caractéristiques socio-spatial et sociabilités dans la ville de Marília-SP 
 
Comment percevons nous la ville à travers nos expériences quotidiennes? Pouvons nous 
comprendre les mécanismes de ségrégation socio-spatiale ainsi que les craintes liées à une 
supposée “escalade de la violence” par la vision qu’en ont les propres habitants des villes ? 
Ces questions ont fait l’objet d’une série d’études, où la géographie et la sociologie autant que 
l’architecture et l’anthropologie ont orienté nos recherches sur la perception de l’espace – et 
en particulier sous les aspects liés au crime et à la peur qu’il inspire– dans plusieurs quartiers 
de la ville de Marilia, dans l’état de São Paulo. Notre objectif a été d’appréhender à la fois les 
conditions socio-spatiales – d’après des données de l’IBGE – la dynamique criminelle – à 
travers les données provenant des études du Grupo de Pesquisa e Gestão Urbana de Trabalho 
Organizado GUTO/UNESP – et enfin les perceptions des habitants au travers d’entretiens 
semi dirigés et enregistrés. En nous appuyant sur la charpente théorique de Yi-Fu Tuan et ses 
concepts de “topophilie” – désignant une affection et une certaine familiarité avec un lieu – et 
de “topophobie” – le rejet et la crainte liés à certains espaces urbains – ainsi que sur d’autres 
travaux théoriques tendant à appréhender les liens sociaux qui se nouent dans les villes, nous 
chercherons à confronter les diverses perceptions qui se dégagent de ces entretiens. De cet 
ensemble, ces différentes perceptions apparaissent multiples et très liées aux expériences 
particulières, de la ville en particulier et l’urbain en général, démontrant ainsi une inégalité 
dans l’appréhension des espaces. Cependant, quand on se réfère aux espaces “autres” de la 
ville, c'est-à-dire déconnectés de toute expérience propre, les perceptions s’éloignent des 
conclusions des données criminelles pour s’aligner sur les préjugés et les stéréotypes 
correspondant à la thèse comme quoi la criminalité serait le fait des pauvres. Ainsi, cette étude 
utilise la perception spatiale comme un outil, et prend comme objet d’étude l’expérience de la 
ville vécue par ses habitants, celle-ci venant questionner et enrichir l’analyse critique et 
théorique des divers phénomènes de la réalité urbaine. 
 
MOTS CLES: Perception Spatiale, Crime, Peur, Sociabilités/Lien Social, Marília/São Paulo. 
 
 
 
9 
 
ÍNDICE DE FIGURAS. 
 
 
 
Figura 01: População da micro-região de Marília, sua sede e alguns de seus municípios 
vizinhos ............................................................................................................................... 
 
73 
Figura 02: Origem dos entrevistados .................................................................................. 73 
Figura 03: Evolução da mancha urbana de Marília - anos de 1970, 1980 e 1990 .............. 74 
Figura 04: Escolaridade dos entrevistados........................................................................... 84 
Figura 05: Índice geral de exclusão social de Marília, 2001................................................ 86 
Figura 06: Índices de ocorrências atendidas pela Polícia Militar de Marília, por mil 
hab/ano, entre 1981-1991. ................................................................................................... 
 
89 
Figura 07: Índices de ocorrências atendidas pela Polícia Militar de Marília, por mil 
hab/ano, entre 1981-1991..................................................................................................... 
 
89 
Figura 08: Bairros com mais ocorrências, por mil habitantes/ano, atendidas pela Polícia 
Militar de Marília: períodos 1970-1980 e 1981-1991.......................................................... 
 
91 
Figura 09: Divisão em setores de bairros de Marília - ano de 1996; Marília: 
criminalidade geral, por mil hab. (1985-1993); Crimes contra o patrimônio, por mil hab 
(1985-1993); e Crimes violentos (contra o patrimônio), por mil hab. (1985-1993)............ 
 
 
93 
Figura 10: Total de BO’s por setores de bairros – 2001...................................................... 96 
Figura 11: Total de BO’s por setores de bairros – 2002...................................................... 97 
Figura 12: Concentração dos estudantes de 3º Grau nos Setores de bairros de 2001 ......... 98 
Figura 13: Setores de bairro, população e entrevistas (1/5.000 hab)................................... 105 
Figura 14: Entrevistados e respectivos setores de bairro (por gênero)................................ 106 
Figura 15: Faixas etárias dos entrevistados.......................................................................... 107 
Figura 16: Avaliação das condições do bairro pela oferta de serviços................................ 114 
Figura 17: Participação ou freqüência nos equipamentos urbanos e eventos sociais ......... 115 
Figura 18: Resposta à questão: “se pudesse mudar de residência, para qual bairro 
gostaria de ir? – I ................................................................................................................. 
 
121 
Figura 19: Modelo de incivilidade e vizinhança de Herbert................................................ 125 
Figura 20: Resposta à questão: “o seu bairro é perigoso?” – I ............................................ 129 
Figura 21: Resposta à questão: “o seu bairro é perigoso?” – II .......................................... 130 
 
 
10 
 
Figura 22: Resposta à questão: “já sofreu ou ouviu falar de algum tipo de violência no 
bairro” – I............................................................................................................................. 
 
131 
Figura 23: Resposta à questão: “já sofreu ou ouviu falar de algum tipo de violência no 
bairro” – II............................................................................................................................ 
 
132 
Figura 24: Resposta à questão: “se pudesse mudar de residência, para qual bairro 
gostaria de ir? – II ............................................................................................................... 
 
138 
Figura 25: Resposta à questão: “se pudesse mudar de residência, para qual bairro 
gostaria de ir? Por quê?”...................................................................................................... 
 
138 
Figura 26: Resposta à questão: “se pudesse mudar de residência, para qual bairro não 
gostaria de ir?” – I................................................................................................................ 
 
140 
Figura 27: Resposta à questão: “se pudesse mudar de residência, para qual bairro não 
gostaria de ir?” – II............................................................................................................... 
 
141 
Figura 28: Resposta à questão: “se pudesse mudar de residência, para qual bairro não 
gostaria de ir? Por quê?”......................................................................................................141 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
11 
 
ÍNDICES DE TABELAS. 
 
Tabela 01: População do Estado de São Paulo, da Micro-Região de Marília/SP, sua sede 
e alguns de seus municípios vizinhos................................................................................... 
 
72 
Tabela 02: Equipamentos e serviços urbanos por mil hab. em Marília/SP, 2001................ 78 
Tabela 03: Rendimento dos chefes de família em Marília/SP, 2001................................... 83 
Tabela 04: Escolaridade dos chefes de família em Marília/SP, ano 2001........................... 83 
Tabela 05: Abastecimento de água em Marília/SP, ano 2001............................................. 84 
Tabela 06: Escoadouro de esgoto em Marília/SP, ano 2001............................................... 85 
Tabela 07: Bairros de Marília agrupados em setores, ano de instalação e índice, 1996...... 92 
Tabela 08: Criminalidade geral por setores de bairros – ano 2001...................................... 94 
Tabela 09: Setores e respectivos bairros em Marília/SP (2001-2002)................................. 95 
Tabela 10: Avaliação geral das condições do bairro pela oferta de serviços em Marília.... 114 
Tabela 11: Marília: Índice de participação ou freqüência nos equipamentos urbanos e 
eventos sociais...................................................................................................................... 
 
115 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
12 
 
SUMÁRIO 
 
 
 
Introdução ......................................................................................................................... 13 
Capítulo 1 – Percepção Espacial, Crime e Medo: 
Por uma breve reflexão desses temas da realidade urbana ................................................ 
 
14 
1.1. Percepção espacial: da Geografia Humanística às Ciências Sociais ....................... 19 
1.2. Sobre a conceituação de crime e a assim chamada “escalada da violência”.......... 34 
1.3. Medo urbano: sobre o novo (ou velho) “espectro” que ronda a cidade ................... 47 
Considerações do Capítulo 1 ............................................................................................ 63 
Capítulo 2 – Os lugares da cidade: 
Aspectos históricos, sócio-espaciais e criminais de Marília/SP ........................................ 
 
66 
2.1. Gênese e devir da “Capital da Alta Paulista”............................................................ 68 
2.2. Sobre as desigualdades e segregações sócio-espaciais ............................................. 76 
2.3. A geografia do crime: elementos para uma análise da dinâmica criminal ............... 88 
Considerações do Capítulo 2 ............................................................................................ 100 
Capítulo 3 – Percepções em confronto: 
Uma análise das percepções apreendidas em Marília/SP ................................................. 
 
102 
3.1. Notas metodológicas sobre as agruras e descobertas na pesquisa de campo ........... 104 
3.2. Topofilia: sentimentos positivos em relação ao espaço ............................................. 111 
3.3. Topofobia: sentimentos negativos na relação sujeito-espaço.................................... 124 
3.4. Percepções sobre outros lugares da cidade ............................................................... 135 
Considerações do Capítulo 3 ............................................................................................ 147 
Breves Considerações ....................................................................................................... 152 
Referências ........................................................................................................................ 155 
Bibliografia Consultada .................................................................................................... 162 
Anexos ............................................................................................................................... 165 
 
 
13 
 
Introdução 
Eu classifico São Paulo assim. O Palácio é a sala de visita. A 
prefeitura é a sala de jantar e a cidade é o jardim. E a favela é o 
quintal onde jogam os lixos (JESUS, 1960, p. 33). 
 Essas são as palavras de Carolina Maria de Jesus, moradora de uma das muitas favelas 
de uma próspera cidade de São Paulo na década de 50. Essa escritora expôs em diários e 
livros os pensamentos de sua trajetória urbana em todos os sentidos – sobre o trabalho, seus 
filhos, as ruas, a favela, o preconceito. No trecho acima está a cidade tal como Carolina 
compreende. É seu relato/retrato ao percorrer ruas e avenidas da cidade em busca dos restos 
urbanos e retornar à sua moradia em uma favela no bairro do Canindé. Desde a iniciação 
científica temos nos inspirado em percepções dessa natureza, não somente de Carolina, mas 
de tantos outros sujeitos, em metrópoles como São Paulo ou em cidades médias como Marília, 
a 450 quilômetros da capital. 
Essas cidades, guardadas as devidas proporções, apresentam uma enorme variedade de 
formas no que se referem a todos os elementos que as constituem. Conhecer as historicidades 
que as conformam sempre nos pareceu uma tarefa inadiável, afinal, por que moramos em 
cidades com tais formatos razoavelmente diferentes, mas sempre desiguais? Além disso, 
como os sujeitos que nelas vivem, percebem as disparidades e explicam para suas próprias 
razões o fato de morar em um determinado bairro ou outro? Como os fenômenos são 
entendidos pelos sujeitos como, por exemplo, a violência e a criminalidade na cidade, quando 
o medo do crime urbano se coloca tão presente nos meios midiáticos e nas políticas urbanas a 
partir do receio de vitimização e da sensação crescente de insegurança? Captar o que pensam 
homens e mulheres sobre as cidades em que vivem tem nos parecido fundamental para 
entender as compreensões sobre os diversos aspectos da realidade urbana, pois entendemos 
que os lugares onde se vive e os espaços que se percorre dotam de significados nossas 
percepções sobre o mundo e sobre a própria história individual e coletiva. 
É por essa razão que escolhemos a percepção espacial como o aporte necessário para 
adentrar nesses sentidos que os sujeitos atribuem à experiência urbana vivida. Neste aspecto, à 
formação das ciências sociais, agregamos os conceitos e o arcabouço teórico de Yi-Fu Tuan 
(1980, 1982, 1983 e 2005) de maneira que pudéssemos reunir as ferramentas imprescindíveis 
para chegar aos sujeitos que moram nesta cidade de Marília, nosso campo de pesquisa mais 
imediato. Na iniciação científica realizamos uma pesquisa em três regiões da cidade com base 
em 254 questionários e seus resultados justificaram a continuidade dos estudos na pós-
 
 
14 
 
graduação1. Naquela pesquisa, o grande número de questionários exigia uma investigação a 
partir de “entrevistas” rápidas e dirigidas (pesquisa direta) sendo que, sem o uso de gravador, 
as respostas dos entrevistados, muitas vezes reveladoras, ficaram nos limites da memória e do 
bloco de anotações. Assim, os resultados foram compreendidos como um “espectro” da 
percepção, portanto, uma idéia da percepção espacial. Um “espectro” que nos levou a novas 
investidas em torno da percepção e dos conflitos urbanos relativos à relação sujeito-espaço, de 
porte do gravador, com uma amostragem menor e que alcançasse todos os bairros de Marília. 
Neste aspecto, a pesquisa aqui apresentada teve por horizonte a percepção espacial, 
crime e medo, buscando realizar a relação entre as evidências sócio-espaciais organizadas nos 
trabalhos do Grupo de Pesquisa e Gestão Urbana de Trabalho Organizado – GUTO/UNESP e 
as sociabilidades na cidade de Marília, identificadas por meio de entrevistas semi-estruturadas 
gravadas. Os escritos de Tuan (1980), Felix (1996) e outros autores com pesquisas e reflexões 
correlatas compuseram o quadro de análisefundamental para a pesquisa de campo e, 
finalmente, dos capítulos que se seguem. 
Em razão da necessidade de estabelecer os apontamentos teóricos que circunscrevem 
os temas percepção espacial, crime e medo, reunimos as reflexões no primeiro capítulo como 
uma maneira de apresentar os pressupostos exigidos para a pesquisa de campo. Desse modo, 
abordaremos: a percepção espacial da geografia humanística de Tuan (1983) como 
possibilidade teórico-metodológica de estudo da relação entre os sujeitos e a cidade; uma 
análise crítica do crime e da “escalada da violência” que explicita estigmas e criminalizações, 
as quais estão sempre presentes nas instituições estatais dessa sociedade de classes; e, 
finalmente, o medo urbano como a caracterização mais corrente da relação desses temas, 
percepção espacial e crime/violência, na formatação das cidades e nas sociabilidades vividas. 
Em seguida, apresentamos a cidade de Marília em aspectos históricos, sócio-espaciais 
e da dinâmica criminal a partir dos estudos de Felix (1996 e 2003) e do GUTO/UNESP. Esse 
segundo capítulo compreende: os principais elementos que conformaram a organização do 
espaço da cidade; sua caracterização sócio-espacial marcada por uma flagrante fragmentação 
e segregação dos sujeitos nos diversos bairros e regiões; e a dinâmica criminal em uma 
processualidade histórica e o diagnóstico sobre os anos mais recentes, fundamentais para o 
confrontamento com as percepções da violência ou criminalidade. 
 
1 Para não nos determos nos resultados apresentados na iniciação científica, financiada pelo Conselho Nacional 
de Desenvolvimento Científico e Tecnológico/CNPq e que compôs nosso trabalho de conclusão de curso, 
sugerimos o acesso em um dos artigos produzidos: http://www.espacoacademico.com.br/061/61carvalho.htm 
 
 
15 
 
O terceiro e último capítulo contém a pesquisa de campo nos termos da percepção 
espacial, crime e medo. Inicialmente, as notas metodológicas que demonstram os passos da 
pesquisa na consecução deste trabalho e, a partir disso, o contato com as percepções dos 
sujeitos conforme: o sentimento de “topofilia” de Tuan (1980), tendo em vista as percepções 
positivas na relação com bairros da cidade; a “topofobia” ou “paisagens do medo”, também de 
Tuan (2005) relacionados aos dados criminais; e, finalmente, as idéias sobre outros espaços da 
cidade, colocando em confronto as diversas percepções captadas na cidade. 
De maneira geral, todos esses capítulos oferecem uma possibilidade de análise da 
realidade urbana, tendo em vista a construção de alguns nexos entre: as diversas 
compreensões de cidade que se impõem; e a necessidade cada vez mais premente de se 
evidenciar a maneira como os sujeitos sentem, percebem e compreendem os espaços em que 
vivem. Almejamos, com isso, demonstrar que as percepções dos sujeitos, advindas da 
experiência na cidade com todos os seus imperativos, podem contribuir para uma crítica 
necessária ao modelo de cidade vigente e às políticas urbanas que se colocam em todos os 
níveis, desde a organização desigual do espaço às políticas de segurança que insistem em 
agravar as contradições econômicas dessa sociedade. Estamos convencidos de que não é 
possível pensar a cidade e qualquer projeto político, social, econômico ou de segurança 
pública, sem a explicitação e confronto das diversas e antagônicas relações que os sujeitos 
estabelecem com a cidade e seus bairros – pautadas por diferentes condições de moradia e 
trabalho – dotando de complexidade todo e qualquer fenômeno que constitui isto a que 
chamamos mundo. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
16 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Capítulo 1 
 
Percepção Espacial, Crime e Medo 
 
Por uma breve reflexão desses temas da realidade urbana 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
17 
 
Enquanto sujeitos que vivenciam o mundo, observamos e sofremos todas as suas 
feições e meandros, a partir do lugar onde se mora, se trabalha, se relaciona, por espaços 
urbanos ou rurais, pequenas cidades, metrópoles, bairros, vilas, favelas, como pedestres ou 
ocupantes de veículos (carros ou transportes coletivos), em casas térreas ou apartamentos, 
enfim, em toda a diversidade contraditória que este mundo nos oferece. Um hieróglifo social 
com cores, relevos e texturas diferenciados. Lugares distintos, diminutos ou suntuosamente 
amplos. Humildes ou requintados. Vivenciados ou inacessíveis. Uma multiplicidade 
aparentemente caótica, mas para muitos um todo estruturado – coerentemente contraditório, 
mas cognoscível. Uma realidade que se revela para nós em paisagens e sociabilidades que nos 
provocam a questionar: é possível apreender suas evidências mais perceptíveis e organizá-las 
em algo razoável? Qual pode ser o ponto de partida para uma análise profunda da realidade de 
maneira que possamos esboçar alguma compreensão crítica e, quiçá, propositiva às demandas 
e necessidades que nos são apresentadas? 
Essas são algumas inquietações que afloram nas ciências sociais e nas que se propõem 
a pensar a cidade, o urbano ou o lugar, especialmente em apreender tais conceitos para além 
das formas mais aparentes e alcançar as relações sociais que produzem e reproduzem essas 
mesmas formas. O desafio é problematizar essa paisagem urbana à luz das sociabilidades que 
se tecem e que, por vezes, explicam ou obscurecem o trágico e complexo mundo vivido. 
Aqui, neste texto, temos a preocupação, portanto, de inscrever as reflexões que 
buscam as razões humanas que se revelam nas sociabilidades, em especial, aquelas pautadas 
nos problemas sempre referenciados como a violência ou a criminalidade e, finalmente, o 
medo urbano como a caracterização mais corrente da relação desses temas com a realidade 
urbana. A discussão sobre a percepção espacial em torno do crime e do medo é o que norteia 
nosso texto e é, neste aspecto, que apresentamos as proposições de Tuan (1980 et al) enquanto 
redirecionamento da produção geográfica às relações humanas no espaço. Dessa maneira, 
relacionamos, ainda que timidamente, as teses desse geógrafo humanista às proposições não 
menos humanistas da análise marxista sobre a produção do espaço e as apropriações humanas 
de um espaço de conflitos nos marcos do capitalismo. Não se trata, portanto, de um tratado 
sobre as aproximações entre a produção fenomenológica que orienta os escritos de Tuan e as 
formulações marxistas, mas um ensaio dessas possibilidades teórico-metodológicas. 
Além desse preâmbulo que inscreve essa razão humanista por meio da percepção 
espacial na apreensão da realidade e dos conflitos teóricos presentes, nos preocupamos em 
situar as conceituações correntes de crime e violência nos termos consagrados das ciências 
 
 
18 
 
sociais. Isso significa considerá-los enquanto conceitos partícipes de um fenômeno social 
mais abrangente que incorpora os aspectos políticos e culturais que permeiam a produção 
acadêmica dedicada a compreendê-los. É desse modo que orientamos nossos escritos na 
tentativa de entender a percepção do crime tal como historicamente tem sido tecida e, 
particularmente, na necessidade de evidenciá-la como um campo de análise possível, 
sobretudo pelo fato de circunscrever o terceiro e último tema desse primeiro capítulo: a 
percepção do medo ou o medo urbano propriamente dito. 
 Assim, apontaremos algumas das reflexões sobre o medo na cidade apresentadas sob o 
quadro de “paisagens do medo”, “ecologia do medo”, “arquitetura do medo” ou “estetização 
cultural do medo” que, no conjunto, adensam as compreensões sobre a violência e a 
criminalidade. Ao incorporar as percepções dos sujeitos e suas vivências na cidade, propomos 
uma complexização teórica de tais fenômenos dirigindo-nos ao assim chamado “medo 
urbano”: um novo (ou velho) “espectro” que ronda a cidade. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
191.1. Percepção espacial: da Geografia Humanística às Ciências Sociais 
De que maneira um geógrafo contribui para o bem estar humano como, por 
exemplo, no projeto de um meio ambiente físico melhor? Seu colega 
científico pode sugerir um sistema de transporte mais eficiente, ou 
localizações ideais para novas indústrias ou para as estações de esgoto. O 
que pode fazer o humanista? [...] a competência de um humanista repousa na 
interpretação da experiência humana em sua ambigüidade e complexidade. 
Sua principal função como geógrafo é esclarecer o significado dos conceitos, 
dos símbolos e das aspirações, à medida que dizem respeito ao espaço e ao 
lugar (TUAN, 1983, p. 162). 
A percepção espacial, uma perspectiva íntima da relação sujeito-espaço, na análise 
sobre o urbano como o aporte conceitual, teórico e metodológico nos provoca a ampliar o 
espectro da análise dos fenômenos que compõe o nosso mundo e, no nosso caso específico, as 
cidades em seus diversos aspectos sociais, políticos, econômicos e culturais. A percepção 
espacial, conceitualmente, nos remete à dimensão de como os sujeitos apreendem e se 
apropriam de tudo aquilo que se observa, vivencia e transforma. Isso significa dizer que, em 
busca de agregar elementos para uma perspectiva que se proponha crítica e necessariamente 
pungente sobre o modo como nossas vidas são orientadas em nossos países, cidades e bairros, 
nos dirigimos à reflexão sobre a maneira como os sujeitos se apropriam dessas realidades de 
modo a traduzi-las às suas cruciais necessidades e aspirações. 
Nesse sentido, a análise pautada na percepção espacial exige uma apreensão de 
múltiplos aspectos imperativos às experiências que se tecem nos contextos sociais 
identificando as perspectivas dos sujeitos sobre esses próprios imperativos. Dessa maneira, a 
percepção espacial necessita, enquanto categoria de análise, de uma vigilância epistemológica 
conseqüente capaz de nos orientar para uma relação fidedigna às reflexões que detalharam 
essa dimensão afetiva correspondente à percepção espacial e, se possível, que estabeleceram 
análises dos imperativos sociais presentes nas diversas percepções.2 
 
2 Para Bourdieu (1999, p. 17), quando uma ciência como a sociologia se utiliza de conceitos emprestados de 
outras ciências sociais, é necessária uma conseqüente vigilância epistemológica: “é necessário submeter a prática 
científica a uma reflexão que aplica-se não à ciência já constituída, mas à ciência em vias de se fazer”. No 
entanto, para não recair em uma sociologia espontânea, deve-se compreender que “a pesquisa científica 
organiza-se em torno de objetos construídos que não tem nada em comum com as unidades separadas pela 
percepção ingênua” (BOURDIEU, 1999, p. 45). Portanto, para Bourdieu (1999, p. 11), “é necessário submeter as 
operações da prática sociológica à polêmica da razão epistemológica para definir e, se possível, inculcar uma 
atitude de vigilância que encontre no conhecimento adequado do erro e dos mecanismos capazes de engendrá-lo 
um dos meios de superá-lo” e, ainda, acrescenta que a utilização de conceitos como “relativismo cultural” por 
determinados sociólogos da “cultura popular”, buscando outras “culturas” em uma mesma sociedade, esquece 
que: “diferentes culturas que se encontram na mesma sociedade estratificada estão objetivamente situadas umas 
em relação às outras porque os diferentes grupos se situam uns em relação aos outros, em particular, quando se 
referem a elas; pelo contrário, a relação entre culturas que fazem parte de sociedades diferentes pode existir 
 
 
20 
 
Tal como se apresentam as palavras iniciais deste texto, Tuan (1983) nos questiona 
sobre o papel que se revelava quase técnico do geógrafo, esse estudioso das relações humanas 
sobre o espaço. “Esclarecer o significado dos conceitos, dos símbolos e das aspirações, à 
medida que dizem respeito ao espaço e ao lugar” nos parece uma máxima antropológica, tal 
como diversos antropólogos que Tuan (1983, 1982, 1983 e 2005) recorre para pensar a 
relação sujeito-espaço sob uma perspectiva cultural, histórica e humanista. 
Antes de tudo, é necessário considerarmos a origem das preocupações de Tuan ao 
propor tal perspectiva humanista na história da Geografia, seus desdobramentos e 
ramificações. Segundo Christofoletti (1982, p. 12), “embora lançando raízes históricas ao 
longo dos séculos, foi somente no século XIX que a Geografia começou a usufruir do status 
de conhecimento organizado, penetrando nas universidades”. Desde então, a Geografia se 
caracterizou por uma fase tradicional e, a partir de 1950, surgiram movimentos que 
questionaram suas formulações, entre eles a Geografia Humanística e a Geografia Radical. 
Conforme um “texto-manifesto” da Geografia Humanística, publicado inicialmente 
em junho de 1976, Tuan (1982) descreve a urgência da ciência geográfica em ampliar o raio 
de análise dos fenômenos e temas humanos sobre o espaço, propondo um viés centrado nas 
ações, sentimentos e pensamentos humanos. Para ele, os estudos geográficos que se 
restringiam às ferramentas oriundas das ciências exatas e naturais reduziam, por sua vez, o 
papel dos homens na apreensão dos fenômenos espaciais, naturalizando-o. Sua orientação 
fundava-se em uma necessidade inadiável aos geógrafos humanistas: dirigir-se à filosofia de 
modo a buscar exemplificações no mundo real às grandes questões filosóficas e, 
principalmente, delimitar seu ponto vista fundamental.3 
As perspectivas humanistas de Tuan correspondiam às demandas expostas por 
Edmund Husserl (1859-1938) que, quase um século antes, estabeleceu uma crítica severa às 
ciências humanas como a psicologia. De acordo com a fenomenologia de Husserl, ao observar 
os homens e suas vicissitudes a partir de um empirismo pragmático e sem o devido 
questionamento das categorias e conceitos utilizados, a psicologia “matematizava” a vida 
humana de acordo com os propósitos e imperativos de uma sociedade que se industrializava e 
a tudo “objetificava”. Para Husserl, era necessário negar essas análises e “voltar às coisas 
 
unicamente na e pela comparação operada pelo etnólogo” (BOURDIEU, 1999, p. 63). Neste caso, os conceitos 
de “percepção espacial”, devem ser verificados constantemente em seus limites e possibilidades de utilização na 
análise da realidade urbana. 
3 Segundo Tuan (1982, Nota 24, p. 161), sua afiliação epistemológica refere-se aos fenomenologistas e filósofos 
preocupados com o símbolo, particularmente Merleau-Ponty, Cassirer, Susanne Langer e Nelson Goodman. 
 
 
21 
 
mesmas” [züruck zu dem Sachen selbst] sem desconsiderar os avanços empíricos e, tampouco, 
retornar aos sistemas filosóficos (DARTIGUES, 1973). 
Segundo Dartigues (1973, p. 19), Husserl negava os apriorismos da psicologia 
experimental ao fazer suas análises do comportamento humano e não se indagando sobre o 
que significava cada um dos seus conceitos primordiais, como por exemplo: o que é 
consciência, inteligência, percepção, sensação, memória. O naturalismo característico desse 
psicologismo confundia a “descoberta das causas externas de um fenômeno com a natureza 
própria deste fenômeno”. Assim, somente o estudo do fenômeno superaria essa proposição 
empiricista sem cair nas concepções filosóficas do passado, pois, para Dartigues (1973, p. 20): 
[...] o caminho que Husserl busca e que comandará até suas últimas obras a 
concepção da fenomenologia é uma via média entre esses dois escolhos: 
como pensar a sua natureza e em cada uma de suas nuanças – e, portanto, 
sem jamais ultrapassá-los – os dados da experiência em sua totalidade. Todo 
fenômeno e nada mais que o fenômeno, poder-se-ia dizer. O postulado que 
funda tal empresa, é que o fenômeno está mais penetrado no pensamento, dologos, e que por sua vez, o logos se expõe e só se expõe no fenômeno. 
Apenas sob essa condição é possível uma fenomenologia. 
Isso significava refundar as ciências dos homens a partir dos fenômenos – por isso, 
“fenomeno-logia” – em que a experiência humana, o “ser” no “mundo na vida” [Lebenswelt], 
se revelaria enquanto categoria primeira de compreensão da realidade. 
Dessa maneira, tratava-se de romper com a dualidade sujeito-objeto, propalada pela 
filosofia cartesiana com reverberações nas ciências humanas por meio do positivismo. 
Segundo alguns autores, a fenomenologia e o marxismo se propuseram a realizar tal tarefa, de 
maneira que, para Smart (1978, p. 150), ao buscar entender o nível em que a ciência 
predominante no século XIX encerrava o homem, 
Husserl empenha-se numa análise radical, “de uma maneira rigorosamente 
histórica e crítica”, semelhante à afirmação e prática de Marx, de que para 
ser radical é necessário retornar às raízes do problema, às origens. Tanto no 
caso da análise da ciência em geral por Husserl, como da crítica da ciência 
da economia política em particular, por Marx, o entendimento só se 
materializa pela revelação da realidade que existe sob a aparência, pela 
revelação de que a experiência e o estudo científico de um “mundo 
objetivamente verdadeiro” se fundamentam e são produto da base 
intersubjetiva das relações entre os membros de um determinado mundo.4 
 
4 Nas relações que Smart (1978) encontram-se um conjunto de pensadores notadamente considerados seguidores 
da fenomenologia de Husserl e daqueles consagrados como teóricos do marxismo do século XX. O raciocínio do 
autor obedece às análises de membros do grupo Telos, que se dispuseram a revisar a análise marxista, 
trabalhando na área geral da fenomenologia e marxismo, sendo estes Rovatti, Marcuse, Kosik, Piccone, Miller e 
O’Neill. Um conjunto de autores que se amplia quando somados a Paci, Labriola, Gramsci e Lucács, 
incorporados aos temas que Smart (1978) considera comuns entre as duas correntes. 
 
 
22 
 
A aproximação dessas duas correntes, fenomenologia e marxismo, é de difícil 
mediação, mesmo a partir dessa recusa dos apriorismos e da dualidade sujeito-objeto, sob um 
viés histórico e crítico que recupera as ações humanas como a centralidade no devir histórico 
e na definição do que seja a realidade5. Assim sendo, Kosik (1969, 23) aponta que: 
Os problemas estudados pela fenomenologia sob a denominação de 
“intencionalidade para alguma coisa”, “intenção significativa para alguma 
coisa” ou então de vários “modos de percepção” foram justificados por Marx 
sobre pressupostos materialistas, como diversos aspectos de apropriação do 
mundo pelos homens (grifo nosso). 
Dessa maneira, cabe salientar que as nossas preocupações podem assim serem 
descritas: diante de uma série de fenômenos existentes no mundo, suas conexões e 
complexidades, está o homem. Logo, na relação com as coisas da realidade, os homens ao 
“perceberem-nas” ou delas se “apropriam”, também se “fazem” enquanto homens e, portanto, 
estabelecem todas as relações entre si e o mundo. 
Se, nas acepções de Marx (1963) os estudos devem se pautar na relação primeira que 
constitui a “qualidade de homem” é o “trabalho” (compreendendo ser o “trabalho” a 
capacidade do homem em se realizar enquanto “humano” ao transformar as coisas do 
mundo)6; na Geografia Humanística, a “experiência” é o ponto de partida de observação e 
investigação das relações entre o homem e o espaço e, decorrentemente, de explicação dos 
inúmeros fenômenos que compõem a vida dos homens. 
Segundo Tuan (1983) na “experiência” no espaço, ao vivenciarem o meio ambiente os 
homens sentem, percebem e tomam consciência do mundo vivido. Logo, é necessário captar 
 
5 É importante notar a afirmação de Kosik (1969, p. 11) de que, tal como o marxismo, a fenomenologia de 
Husserl se propôs a romper com a pseudo-concreticidade, compreendida por “o complexo dos fenômenos que 
povoam o ambiente cotidiano e a atmosfera comum da vida humana que, com a sua regularidade, imediatismo e 
evidência, penetram na consciência dos indivíduos agentes, assumindo um aspecto independente e natural”. 
Além disso, Kosik (1969, Nota 05, p. 17) discorre em uma extensa nota sobre o confronto entre marxismo e 
fenomenologia elaborado por Tran-Duc-Thao em “Phenomenologie et materialisme dialectique” (1951), 
considerando que este autor descobriu “o sentido autentico do método fenomenológico husserliano e toda a 
conexão do seu núcleo racional com a problemática do século XX” e termina por afirmar que: “o autor [Thao] 
define expressivamente o caráter paradoxal e rico da destruição fenomenólogica da pseudo-concreticidade”. 
6 Nas palavras de Marx (1963, 161-165), “A economia política esconde a alienação na natureza do trabalho 
porquanto não examina a imediata relação entre o trabalhador (trabalho) e a produção. [...] A relação imediata 
do trabalho aos seus produtos é a relação do trabalhador aos objectos de sua produção” (p. 161). Essa 
imediaticidade na relação “trabalhador-produto”, “sujeito-objeto” é que deve ser o ponto de partida para a 
compreensão do homem em sua “genericidade”, pois, “[é] precisamente ao trabalhar o mundo objectivo que o 
homem primeiro se prova de maneira efetiva como um ser genérico. Tal produção é a sua vida genérica activa. 
Através dela, a natureza aparece como a sua obra e a sua realidade. Por conseguinte, o objecto do trabalho é a 
objectivação da vida genérica do homem: ao reproduzir-se não só intelectualmente, como na consciência, mas 
activamente, ele duplica-se de modo real e intui o seu próprio reflexo num mundo por ele criado. Pelo que, na 
medida em que o trabalho alienado subtrai aos homens o objecto de usa produção, furta-lhe sua vida genérica, a 
sua objectividade real como ser genérico, e transforma em desvantagem a sua vantagem sobre o animal 
porquanto lhe é arrebatada a natureza, o corpo inorgânico”. 
 
 
23 
 
os sentidos atribuídos aos fenômenos de modo a apreendê-los cada qual em seu contexto sob 
o percurso de conhecimento do mundo proposto por Tuan (1983, p. 09) que, gradativamente, 
se elabora entre a emoção e o pensamento: 
Experiência 
sensação, percepção, concepção 
EMOÇÃO emoção 
 
pensamento PENSAMENTO 
É através da “experiência” que “uma pessoa conhece e constrói a realidade”, desde os 
sentidos mais diretos como o olfato, paladar e tato até a percepção visual e os modos de 
simbolização. Para tratar da “experiência”, Tuan (1980 e 1982) se apóia, primeiramente, em 
uma perspectiva que contempla as condições físicas e psicológicas dos corpos humanos com o 
mundo afirmando a existência de diferentes percepções conforme a idade – fases infantil, 
adulta e velhice – e o sexo, quando da diferença entre os papéis de masculino e feminino. 
Num segundo momento, Tuan (1980) demonstra que as relações dos homens com o espaço se 
baseiam em simbolismos e esquemas cosmológicos a partir das “oposições binárias”, 
estudadas por Levi-Strauss (1970) como céu/terra, claro/escuro, esquerda/direita, novo/velho 
etc.; do etnocentrismo; e, finalmente, da delimitação entre “sagrado” e “profano”; do 
conhecimento meramente estético, para visitantes, ou familiar, para nativos. Valores que, no 
conjunto, compõem em grande medida o sentimento de “topofilia”, um elo afetivo do homem 
com o espaço propriamente humano: espaço como “produção”, “meio ambiente” e “habitat” 
dos homens para os homens; meio de defesa das hostilidades da natureza; ou, ainda, de 
expressão humana sobre a natureza. 
Os textos e proposições de Tuan (1983), nesse sentido, orientavam os estudos 
geográficos para os modos como os homens apreendem o mundo e fazem dele uma 
compreensão organizada. Assim, tal como nas correntes que romperam com o positivismo nas 
ciências sociais ou o funcionalismo no tratamento da cidade e do urbano,esse geógrafo 
dotava de um sentido eminentemente humano, ou humanista, às relações sócio-espaciais. 
É preciso ressaltar que essas considerações não significam um redirecionamento dos 
estudos geográficos ou das relações entre o homem e o mundo para um “subjetivismo”, mas 
uma ciência social fundada em pressupostos distintos das projeções das ciências naturais 
 
 
24 
 
sobre as ciências humanas7. Vale citar, neste aspecto, que a fenomenologia de Husserl 
pretendia uma “nova racionalidade” a partir dos eventos propriamente humanos, como 
considera Leoncini (2003, p. 150): 
O objetivo [...] foi fundar uma nova base racional para a ciência, buscando 
captar a essência das coisas por meio da compreensão que nega o 
subjetivismo e o relativismo, afirmando o mundo vivido como possibilidade 
de viver a experiência sensível e de simultaneamente poder pensá-la de 
forma racional. 
Contemplando essa preocupação, Buttimer (1982), outra geógrafa que inscreve suas 
reflexões na perspectiva humanista, mostrou que a apreensão do mundo vivido não se limita a 
uma compreensão meramente subjetivista, mas a uma “intersubjetividade” das experiências8. 
Segundo Buttimer (1982, p. 175), 
[...] enquanto o modo subjetivista concentra-se na experiência individual 
única, e o modo objetivista procura a generalização, o modo “intersubjetivo” 
ou o modo fenomenológico esforçar-se-ia para elucidar um diálogo entre as 
pessoas individuais e a “subjetividade” do seu mundo.9 
De um lado, a perspectiva de Buttimer rejeita o positivismo que ignora a experiência 
humana ao separar o observador daquele que é observado e, por outro, o idealismo que afirma 
existir um mundo real fora da consciência (JOHNSTON, 1986)10. Assim, a fenomenologia 
seria o caminho para uma compreensão, 
 
7 Do ponto de vista da fenomenologia na sociologia, Schutz propõe a Sociologia do Conhecimento que, em 
crítica severa de Bastos (1984), faz um elogio exagerado às “coisas” da realidade do senso-comum. Para Bastos 
(1984), a Sociologia Fenomenológica de Schutz, ao considerar o mundo do senso comum o limite da 
participação social, “permitiria o conhecimento de uma parte bastante restrita do mundo social”. 
8 Os pressupostos filosóficos de Buttimer (1982. p. 166) percorrem os raciocínios de Martin Heidegger e o 
conceito de dwelling – traduzido por “habitação” que significava compreender que “habitar implica mais que 
morar, cultivar ou organizar o espaço. Significa viver de um modo pelo qual se está adaptado aos ritmos da 
natureza, ver a vida da pessoa como apoiada na história humana e direcionada para um futuro, construir um lar 
que é o símbolo de um diálogo diário com o meio ambiente ecológico e social da pessoa”; Tuan; Merleau-Ponty, 
Husserl; T. Hägerstrand; Kierkegaard; Schutz, entre outros. Schutz, citado na nota anterior, é criticado por 
Buttimer (1982, Nota 51, p. 182) ao sugerir o conceito weberiano de verstehen como uma forma de 
conhecimento, quando, para a autora, Weber afirma que verstehen [compreender] abarcava tanto os significados 
atribuídos por um ator à sua própria conduta quanto o significado atribuído a ele por um observador externo. 
Para Buttimer (1982), após definir a “apreensão” – ou compreensão – como “empatética” ou “racional”, Weber 
não procedeu fenomenologicamente ao enfatizar o modo racional, por meio do “tipo ideal”, como uma condição 
“pura”, deixando de examinar “as suposições tácitas ou subjacentes de sua posição teorética ou metodológica”. 
9 Uma das indicações nesse sentido é posta por Capalbo (1987, p. 30) quando afirma que: “O problema que surge 
para a fenomenologia é o de saber como essas vivências podem ser não só válidas para mim, mas válidas para 
qualquer pessoa. Como se dá a comunicação das vivências?”. 
10 Segundo Buttimer (1982, p. 174), embora os positivistas tivessem argumentado que suas noções científicas do 
espaço estavam assentadas na experiência, a generalização da experiência no espaço por meio de categorias 
científicas, lógicas e matemáticas reduzia as experiências sobre o espaço em relações geométricas. Dessa 
maneira, essa geógrafa, então, que “do ponto de vista fenomenológico, entretanto, o ‘espaço é um conjunto 
contínuo dinâmico, no qual o experimentador vive, desloca-se e busca um significado. É o horizonte vivido ao 
longo do qual as coisas e as pessoas são percebidas e valorizadas’”. 
 
 
25 
 
[...] mais clara das questões dos valores, que envolvem o modo de vida 
normal de qualquer pessoa, e uma apreciação sobre os tipos de educação e 
socialização que seriam apropriados para pessoas cujas vidas podem oscilar 
entre vários ambientes (BUTTIMER,1976 Apud JOHNSTON, 1986, p. 214). 
É desse modo que ao se investir no desafio de compreender a realidade a partir das 
percepções, como “um retorno às coisas mesmas” como diria Husserl, e tal como sugere a 
análise antropológica de Tuan, busca-se uma relação com os diversos autores que consideram 
essa perspectiva na análise de fenômenos sociais “sensíveis” como a violência, o crime e o 
medo na cidade. Não se trata de uma revelação da percepção do mundo como a explicação 
mais razoável dos fenômenos da realidade, mas, antes de tudo, a possibilidade de utilizá-la 
como aporte para uma reflexão das sociabilidades que se engendram nas cidades, quem sabe 
com a intensidade que a tarefa fenomenológica sugere, na leitura de Dartigues (1973, p. 29): 
[...] analisar as vivências intencionais da consciência para perceber como aí 
se produz o sentido dos fenômenos, o sentido desse fenômeno global 
chamado mundo.11 
E é, nesse aspecto, que chamamos a atenção para as alterações sugeridas por Tuan 
(1982) no que se refere aos temas tratados pela Geografia Humanística: 
1) o “conhecimento geográfico” não poderia se limitar às compreensões acadêmicas do 
espaço geográfico, pois o espaço não é apenas um espaço medido e quantificado, mas também 
apreendido e organizado a partir da experiência vivida, se assim podemos considerar os 
“mapas mentais” que os homens elaboram a partir de suas vivências. 
 Esse questionamento dos limites do conhecimento geográfico predominante na 
academia acompanha as pretensões dos geógrafos do período em que Tuan escrevia seu 
“texto-manifesto”, em 1976. Em 1977, Lacoste (1997) publicava uma crítica radical à 
geografia acadêmica afirmando que “a geografia, isso serve, em primeiro lugar, para fazer a 
guerra” e, por essa razão, provoca o aparecimento do termo Geografia Radical, onde se 
concentraram os estudos marxistas sobre o espaço geográfico – por muito tempo foi 
considerada pejorativa a nomeação de “radical” para essa nova interpretação da geografia. 
Assim, o “conhecimento geográfico” antes de qualquer pretensão cientificista, continha um 
conteúdo superior ao modelo fragmentário e disciplinar ensinado nas escolas e universidades, 
quando pensado por exércitos e empresas em suas estratégicas sobre o espaço geográfico.12 
 
11 No mesmo sentido, para Capalbo (1987, p. 39) a fenomenologia se volta “para os problemas da constituição, i. 
é, os modos pelos quais meu corpo, a existência dos outros e do mundo aparecem em minha experiência”. 
12 Para Lacoste (1977), tratava-se, portanto de transcender as cisões metodológicas da “geografia dos 
professores” (aspectos sociais, físicos, climáticos, cartográficos, econômicos, urbanos, rurais) e estabelecer uma 
 
 
26 
 
 Além disso, esse contexto questionador sobre a própria produção do conhecimento 
geográfico exigia a fundamentação em etnologias, etnografias e até mesmo na literatura para, 
conforme as preocupações de Tuan (1982, p. 147), observar que: 
Algumas pessoas têm falta de um senso formalizado de espaço e lugar, elas 
podem achar seu caminho no seu mundo, mas esta habilidade não é 
transformada em conhecimento que possa ser passado adiante verbalmente e 
ou em mapas e diagramas. 
2) “lugar e território”,por sua vez, merecem outras definições na medida em que, para Tuan 
(1982 e 1983), “lugar” é um “ponto de parada” que ultrapassa as necessidades fisiológicas 
quando se vincula à referência aos espaços de morte e de vida. 
 Segundo os etologistas, os animais vivem em seus nichos ecológicos, “ponto de 
parada”, território que varia de animal para animal, mas se compõe do lugar onde pode 
satisfazer necessidades como acasalar, descansar, comer ou beber, além de se defender de 
intrusos. Para os homens, isso é até aplicável, desde que se questione o papel da emoção e do 
pensamento na ligação ao lugar. A peculiaridade humana encontra-se na significação de 
nascimento e morte, o que justifica o nascimento das cidades ao redor dos santuários. Além 
disso, o sentido de lugar para os homens, tem se complexizado em todos os âmbitos da vida 
social, de tal maneira que o colo da mãe é o primeiro lugar do homem, mas o Estado-nação 
também se configura por meio da língua e território comum, numa abrangência que 
transcende a capacidade individual de apreciar suas grandezas.13 
3) “modo de vida e economia” devem ser entendidos para além dos mesmos pragmatismos 
fisiológicos relativos ao raciocínio de conservação da espécie, incompatível com uma 
economia que coloca em risco não apenas a espécie humana. 
 Nesse tema, Tuan (1982, p. 151-152) considera que “todos os animais são quase 
exclusivamente econômicos”, compreendendo que economia signifique “atividades de 
sustentação da vida”. Contudo, o mundo humano, em seu “modo de vida”, dispensa pouco de 
sua energia para essas atividades mais preocupadas com a vida biológica, na medida em que, 
“até mesmo para os povos mais primitivos, o ganhar a vida é colorido por objetivos e valores 
não zoológicos”. Na sociedade moderna e industrial, “a produção de armamento, p. e., é um 
 
geograficidade, na medida em que a apreensão do espaço em diferentes ordens escalares de grandeza ampliaria o 
“conhecimento geográfico” para uma análise crítica do espaço como “totalidade”. Sumariamente, deve-se fazer 
juz ao precursor dessa concepção de espaço: Élisée Reclus, socialista libertário do começo do século XX que 
atentava sobremaneira para os aspectos geopolíticos, mas esquecido no processo de cisão da geografia humana e 
geografia física, cisão característica da geografia tradicional, até ser lembrado por Lacoste (1997). 
13 Tuan (1982 e 1983) faz menção às obras de Suzanne Langer que critica o modelo etológico aplicado ao 
comportamento humano e à obra de Edward Relph: “Place and Placelessness”, de 1976. 
 
 
27 
 
empreendimento econômico que proporciona meio de vida para muitos operários, mas está 
em dúvida a sua contribuição para a sobrevivência da espécie”.14 
4) a “religião”, no espaço geográfico, não deve ser pensada apenas a partir da localização dos 
templos e dos locais considerados sagrados, que na especialização das disciplinas estaria 
restrita à geografia da religião. Para Tuan (1982), “religião” é um “impulso por coerência e 
significação” e uma “compreensão de mundo”, tal como a ciência e as ideologias, tendo por 
função reunir as coisas – no sentido de religare – e estruturar a vida social15; e, finalmente, 
5) “aglomeração humana e privacidade” tema que mais se aproxima de nosso objeto: a recusa 
da premissa de que o adensamento populacional como explicação quantitativa dos conflitos 
sociais como a violência. Para Tuan (1982, p. 150), não é possível se pautar nesta assertiva 
quando Los Angeles tem baixa densidade, mas elevados índices criminais e, em contrapartida, 
as apinhadas aglomerações urbanas orientais, por sua vez, não são mais propensas ao crime 
que as cidades americanas. Para ele, a sensação de aglomeração e a necessidade de 
privacidade, embora sejam temas presentes em diversas sociedade e situações espaciais, “o 
modo como a cultura é medianeira entre a densidade da população e o comportamento é um 
desafio para o cientista social e como para o humanista”. Mais do que isso, Tuan (1983, p. 67) 
considera a importância das relações entre as pessoas para caracterizar um determinado lugar 
em “espaciosidade” e “apinhamento” que até a sensação de solidão traz: 
A solidão é uma condição para adquirir a sensação de imensidade. A sós, 
nossos pensamentos vagam livremente no espaço. Na presença de outros, os 
pensamentos recuam devido ao fato de que outras pessoas projetam seus 
próprios mundos na mesma área. O medo do espaço muitas vezes vai junto 
com o medo da solidão. A companhia de seres humanos – mesmo de uma 
 
14 Aqui nos remetemos às contribuições de Mauss (2003) e Malinowski (1978) sobre o “modo de vida” a partir 
das dávidas presentes nas relações entre os diversos grupos sócio-culturais da polinésia meridional: a relação do 
Kula entre os tro’biandeses. Estes autores expõem a complexidade das trocas de bens e mulheres entre os grupos 
como uma relação social, que não se equivale às trocas comerciais entre as sociedades ocidentais, por assim 
dizer, mercantilizadas. Outros valores e significados estariam presentes nestas trocas de maneira que a 
recorrência das dádivas, atribuídas e retribuídas, ordenava e reorganizava as relações sociais, econômicas, 
religiosas e políticas entre os diversos grupos. 
15 Essa concepção de “religião” parece corroborar com a concepção de Durkheim (1996) ao desmitificar a 
religião de misticismos e apreendê-la a partir da análise do totemismo como uma forma de organizar o mundo 
concretamente, entre sagrado e profano, como pensamento científico pretérito. Outra abordagem interessante é a 
de Levi-Strauss (1970) sob a máxima de que o mito presente nas sociedades “primitivas” não se trata de uma 
criação sem parâmetro na realidade vivenciada por elas, mas uma forma de estruturar o mundo conforme a 
apreensão das evidências da natureza como uma “ciência do concreto”. Segundo Levi-Strauss (1970), para 
alcançar esse nível de compreensão do pensamento mítico, é fundamental que o antropólogo entenda de botânica 
e zoologia, uma vez que a realidade vivida pelos grupos que analisa, pode não ter sido apreendida pela ciência 
moderna e que, portanto, as classificações dos fenômenos da natureza – que encontram sua organização nos 
mitos conforme outra organização, como uma bricolage – estão diretamente atreladas às experiências dos grupos 
que percebe as mínimas diferenças entre os fenômenos. Munido dessas ferramentas da botânica ou zoologia, o 
antropólogo poderia inclusive contribuir para uma classificação do meio ambiente, nos termos das ciências 
modernas, e captar o pensamento selvagem, não como exoticamente rico, mas dotado de complexa taxinomia. 
 
 
28 
 
única pessoa – produz uma diminuição do espaço e ameaça a liberdade. Por 
outro lado, à medida que as pessoas penetram no espaço, para cada uma 
chega um ponto em que a sensação de espaciosidade para ao seu oposto – 
apinhamento. O que é apinhamento? Podemos dizer que uma floresta está 
apinhada de árvores e um quarto está apinhado de bugigangas. Mas são 
basicamente as pessoas que nos apinham; elas mais do que as coisas, podem 
restringir nossa liberdade e nos privar de espaço.16 
No conjunto, esses apontamentos de Tuan (1982), recorrentes em suas demais obras na 
formulação e descrição de suas perspectivas, demonstram sua compreensão de que todos os 
fenômenos que compõem isso que chamamos mundo, embora existam compreensões parciais 
dadas às técnicas disciplinares que parcelarizam e especializam os conhecimento, devem 
todos serem mediados pela cultura. Isso significa dizer que, tudo o que compreendemos como 
sendo simplesmente expressão de uma natureza dada, só pode ser entendido quando 
relacionado aos valores e sentimentos, história e cultura, daqueles que sob determinado 
fenômeno vivenciam.17Portanto, o “espaço”, o “lugar”, a “cidade”, o “crime”, o “medo”, tantos e tantos 
outros conceitos merecem ser realinhados sob a compreensão de que depende de onde se fala, 
de quem se fala, ou ainda, de qual relação social se trata. Isso não significa relativizar, mas 
historicizar, sempre, evidenciando-os a partir das relações sociais tidas como predominantes, 
sem desconsiderar as que nem sempre são perceptíveis. A cidade e a sociabilidade que se vive 
neste momento de supremacia do capital e da organização do espaço às vicissitudes da 
acumulação estratégica e de sua produção de mercadorias, define uma espacialidade sempre 
confrontada com as intempéries relativas à sociedade de classes.18 
É claro que a percepção dos sujeitos, conforme a possibilidade aventada por Tuan 
(1982), pode encontrar seus limites nas características de uma paisagem programada e, por 
vezes, com a aparência caótica. Neste aspecto, Santos (1988), nos termos marxistas, 
caracteriza a percepção como um ponto de partida, mas também como um limite na apreensão 
 
16 Tuan (1982) faz referências aos escritores existencialistas, particularmente Sartre em “Being and Nothingness” 
(1966), para a análise do problema da existência dos outros. 
17 Kosik (1969, p. 240), de maneira similar, depreende os fenômenos “simples” que se colocam aos olhos de 
cada homem, após afirmar que a “práxis” objetiva da realidade é por onde se conjugam cada grau de 
conhecimento humano sensível ou racional, cada modo de apropriação da realidade, ligada a todos os vários 
modos. Em suas palavras: “O homem sempre vê mais do que aquilo que percebe imediatamente. A casa diante 
da qual me encontro, não a percebo como um conjunto de formas geométricas, de qualidades físicas do material 
de construção, de meras relações quantitativas; dela tomo consciência antes de tudo como habitação humana e 
como harmonia, não claramente percebida, de formas, cores, superfícies, etc”. 
18 As análises de muitos geógrafos e urbanólogos acerca deste espaço característico de nossa sociedade, em 
constante conflitualidade espacial, merecem a devida atenção ao afirmarem, tal como considera Carlos (2001, p. 
15) que: “[...] o espaço produzido assume a característica de fragmentado (em decorrência da ação dos 
empreendedores imobiliários e da generalização do processo de mercantilização do espaço), homogêneo (pela 
dominação imposta pelo Estado ao espaço) e hierarquizado (pela divisão espacial do trabalho)”. 
 
 
29 
 
da paisagem, caso outras inferências não sejam alcançadas. Porém, é válido afirmar que, na 
vida cotidiana, as determinações da totalidade se efetivam em níveis diferenciados e, 
inclusive, para Santos (2000a, p. 114) encontram resistências: 
O território tanto quanto o lugar são esquizofrênicos, porque de um lado 
acolhem os vetores da globalização, que nele se instalam para impor sua 
nova ordem, e, de outro lado, neles se produz uma contra-ordem, porque há 
uma produção acelerada de pobres, excluídos, marginalizados. 
Crescentemente reunidas em cidade cada vez mais numerosas e maiores, e 
experimentando a situação de vizinhança (que, segundo Sartre é reveladora), 
essas pessoas não se subordinam de forma permanente à racionalidade 
hegemônica, por isso, com freqüência podem se entregar a manifestações 
que são a contraface do pragmatismo. Assim, junto à busca da 
sobrevivência, vemos produzir-se na base da sociedade, um pragmatismo 
mesclado com a emoção, a partir dos lugares e das pessoas juntos. Esse é, 
também, um modo de insurreição em relação à globalização, com a 
descoberta de que, a despeito de sermos o que somos, podemos também 
desejar ser outra coisa. 
Nessa concepção de território e lugar como “esquizofrênicos”, Santos (2000b, p. 63) 
considera que neles estão conjugadas as potencialidades não somente do que “está-aí”, mas 
também do “vir-a-ser”, pois “no local tem-se a obediência e a revolta. Há sempre as duas 
coisas”. Por isso, em outra passagem Santos (2000a, p. 114) afirma que: 
Nisso, o papel do lugar é determinante. Ele não é apenas um quadro de vida, 
mas um espaço vivido, isto é, de experiência sempre renovada, o que 
permite, ao mesmo tempo, a reavaliação das heranças e a indagação sobre o 
presente e o futuro. A existência naquele espaço exerce um papel revelador 
sobre o mundo.19 
Igualmente fundado nas inquietações marxistas, Lefebvre (2001) cunha a categoria de 
“usadores”20 para encontrar os sujeitos da cidade, longe da conceituação de “consumidores”, 
consagrada por políticos e urbanistas “planejadores”.21 
Para Lefebvre (2001, p. 04), a cidade se forma como um centro de vida social e 
política onde não se acumulam apenas as riquezas, mas também conhecimentos, técnicas e 
obras. Neste sentido, a própria cidade é uma obra que contrasta com o dinheiro e a 
 
19 Sobre o mundo se realiza no lugar, em Santos (2000b, p. 52) encontramos novamente essa reflexão: “[...] o 
mundo não existe em si, o mundo existe para os outros. É o lugar que da conta do mundo. Há nele uma 
empiricização do mundo [...] que o geógrafo precisa] conhecer para reformular o conhecimento”. 
20 O termo utilizado por Lefebvre (1967, Apud CARLOS, 2001) para contrapor a concepção de cidadão 
“consumidor” é o do cidadão “usador” que categoriza os homens e mulheres que se apropriam do espaço, mas 
que nem sempre, quase nunca, detém o controle da produção e organização do espaço em que vivem. 
21 Para Tuan (1980, p. 243), a distância entre o planejador e aquele que “usa”, “habita” ou “mora” aparece neste 
trecho: “[a] idéia de bairro do planejador dificilmente coincide com a do morador. Um distrito bem definido de 
acordo com as suas características físicas e denominado no plano da cidade com um nome proeminente pode não 
ter realidade para os habitantes locais. As palavras ‘bairro’ e ‘distrito’ tendem a evocar na mente dos estranhos, 
imagens de formas geométricas simples, quando de fato os canais de atos amistosos, que definem o bairro, 
podem ser extremamente complexos e variam entre os pequenos grupos que vivem muito próximos”. 
 
 
30 
 
mercantilização dos produtos: “a obra é valor de uso e o produto é valor de troca. O uso 
principal da cidade, isto é das ruas e das praças, dos edifícios e dos monumentos, é a Festa 
[...]”. Tendo Lefebvre (2001) como referência, Carlos (1999, p. 184) afirma que o uso da 
cidade parte do corpo do sujeito: 
O uso enquanto forma de apropriação realiza-se enquanto expressão do 
corpo, isto é, o espaço é vivenciado pelo corpo com o emprego dos sentidos, 
dos membros, que forma a base prática da percepção do mundo exterior. 
Nesta relação espaço-corpo, Carlos (1999) se fundamenta em Lefebvre, de maneira 
que nos lembra o raciocínio de Tuan (1982) sobre a “experiência”, exposto acima: 
“a prática social tomada globalmente supõe o uso do corpo, emprego das 
mãos, membros, órgãos sensoriais, gestos do trabalho e das atividades fora 
do trabalho (...) o corpo é um elemento espacial (...) o espaço foi produzido 
antes de ser lido e não é produto para ser lido, mas para ser vivido por 
pessoas que tem um corpo e uma vida no contexto urbano (...) O homem 
prova o espaço com todo o seu corpo, o cheiro, as pernas, o ouvido, que 
percebe os ruídos com o olho que vai vendo (...) é a partir do corpo que o 
homem se percebe e vive o espaço, isso significa que há uma relação 
imediata entre o corpo e o seu espaço, entre o deslocamento no espaço e a 
ocupação do espaço (...); antes de se produzir e se reproduzir, cada corpo 
vivo é um espaço, o corpo com suas energias disponíveis, o corpo vivo que 
cria e produz seu espaço. A produção do espaço, inicialmente, aquela do 
corpo vai até a produção do habitar que serve ao mesmo tempo de 
instrumento e meio, compreende relações e movimentos, seguem-se para o 
corpo os lugares fundamentais, os indicativos do espaço são inicialmente 
qualificados pelo corpo, corpoem ato objeto de um dispêndio de energia, 
agressão ou desejo”. (LEFEBVRE, 1974 Apud CARLOS, 1999, p. 185). 
É nesse sentido que, sob as conceituações marxistas, se revela o “estranhamento”, 
“distanciamento” ou “desencontro” entre o sujeito e a obra, quando a cidade “se produz como 
exterioridade em relação ao sujeito” (CARLOS, 2001, p. 329) como “desconhecido e do não 
identificado”22. Essa concepção dialética que expõe a cidade enquanto “obra” e “produto” e, 
consequentemente, o uso/apropriação por parte dos sujeitos em “encontro” e “desencontro”, 
confirma o campo de possibilidades que reside no lugar, como vimos em Santos (2000a): 
O topos é o lugar de possibilidades e potencialidades. Os usos da rua são 
permeados por relações determinadas pela articulação espaço-temporal, 
sendo submetidos à lógica capitalista que impõe o produtivismo transforma 
o tempo em quantificação (uma quantidade abstrata) e o espaço numa 
distância a ser percorrida. As relações de propriedade criam os limites do 
uso, com a tendência à destruição do espaço público ou espaço acessível. 
Com isso limitam, pelo exercício do poder, uma ação que destrói o espaço da 
 
22 Conforme a exposição de Carlos (2001, p. 331), “como produto social, a cidade se opõe ao sujeito, que surge 
na relação imediata como estranhamento, o desencontro entre a vida como modo de apropriação e a cidade como 
produto, condição e produto da reprodução do capital”. 
 
 
31 
 
sociabilidade e proximidade, substituindo-o por aquele dos interditos em 
nome da lei e da ordem (CARLOS, 1999, p. 185). 23 
Dessa maneira, mesmo de matizes teóricas distintas, as preocupações humanistas de 
Tuan (1982) e outros geógrafos, particularmente os marxistas, caminham para essa 
particularidade na totalidade da experiência humana: o “lugar”. Em sua tentativa de relacionar 
as diferentes acepções do “lugar” geográfico, Leite (1998, p. 18)24 afirma que, Carlos (1996), 
ao acrescentar uma dimensão histórica, sob o viés marxista, “diz respeito à prática cotidiana, 
ou seja, às concepções que surgem do plano do vivido, e neste sentido é bastante similar à 
percepção humanística”25. Além disso, essa geógrafa considera a relevância cada vez maior 
dos “lugares” na análise de Santos (1988), conforme vimos acima, especialmente quando este 
afirma que “quanto mais os lugares se mundializam, mais se tornam singulares e específicos, 
isto é, únicos” (LEITE, 1998, p. 34). 
Para nos aproximarmos do fim desse tópico, a concepção de “lugar” cada vez mais 
“único” nos remete aos chamados “não-lugares” de Augé (1994), que colorem todos os 
apontamentos feitos até agora, a partir de Certeau e Merleau-Ponty. Certeau estabelece uma 
diferença entre “lugar” e “espaço” afirmado que “espaço” é o “lugar praticado” – o que nos 
parece uma inversão dos termos de Tuan (1982), mas igualmente interessante: “O espaço, 
[para Certeau], é um ‘lugar praticado’, ‘um cruzamento de forças motrizes’: são os passantes 
que transformam em espaço a rua geometricamente definida pelo urbanismo como lugar” 
(AUGÉ, 1994, p. 75). Por sua vez, Merleau-Ponty, em sua “Fenomenologia da percepção”, 
compreende o “espaço geométrico” como sendo distinto do “espaço antropológico”: um 
espaço “existencial”, “lugar de uma experiência de relação com o mundo de um ser 
essencialmente situado ‘em relação ao meio”’ (AUGÉ, 1994, p. 75). 
Outra referência que define “lugar” e “espaço”, a partir de Merleau-Ponty, está na fala 
e no ato de locução. Idéia presente também na acepção de Certeau que, ao refletir sobre os 
 
23 Em Lefebvre (1991, p. 39), o lugar enquanto potencialidade que se revela na vida cotidiana aparece nos 
seguintes termos “A vida cotidiana se define como um lugar social desse feedback. Um lugar desdenhado e 
decisivo que aparece sob um duplo aspecto: é o resíduo (de todas as atividades determinadas e parcelares que 
podemos considerar e abstrair da prática social) e o produto do conjunto social. Lugar de equilíbrio é também o 
lugar em que se manifestam os desequilíbrios ameaçadores. Quando as pessoas numa sociedade assim analisada, 
não podem mais continuar a viver sua cotidianeidade, então começa uma revolução. Só então. Enquanto 
puderem viver o cotidiano, as antigas relações se reconstituem”. 
24 As formulações de Leite (1998) compreendem Tuan (1982 e 1983), Buttimer (1982), Relph (1976) e Mello 
(1990) no campo da fenomenologia; e Harvey (1992), Corrêa (1997), Carlos (1996) e Santos (1988), no campo 
marxista. 
25 E continua Leite (1998, p. 18), falando sobre Carlos (1999): “[para] ela, pensar o lugar ‘significa pensar a 
história particular (de cada lugar), se desenvolvendo, ou melhor, se realizando em função de uma 
cultura/tradição/língua/hábitos que lhe são próprios, construídos ao longo da história e o que vem de fora, isto é, 
que se vai construindo e se impondo como conseqüência do processo de constituição do mundial”’. 
 
 
32 
 
nomes próprios dados aos diversos lugares, como aqueles observados nos mapas e estradas, 
compreende que se coloca aí uma “qualidade negativa” ao transformá-los em “passagens”. Ao 
mesmo tempo em que em que “praticado”, o “lugar”, ao ser repleto de nomes próprios, 
distante de um caráter identitário, relacional e histórico, torna-se um “não-lugar”. A idéia de 
Augé (1994) passa a se compor então no entorno da experiência dos viajantes, aqueles que 
vivenciam uma homogeneização cada vez maior dos lugares, aeroportos, estradas, shoppings. 
A expressão mais interessante que se sobressai neste movimento que constrói os “não-
lugares”, é manifestação de diversas cidades que recorrem a serem “capitais” ou “centros” de 
algo singular para chamar a atenção dos passantes/viajantes.26 
Tuan (1980), neste aspecto, aborda os “rótulos de urbano” que são muito 
característicos e atrativos e as cidades brasileiras, como Marília, também não se furtam em 
construir os seus próprios cognomes27. Assim, os cognomes, embora pareçam ser uma 
identidade de “lugar” (em alguns casos, pode até ser mesmo), quando se trata de um 
fenômeno recorrente no capitalismo da “supermodernidade”, como afirma Augé (1994, p. 74), 
parece-nos a necessidade cada vez mais premente da consagração de uma identidade que se 
escorre na homogeneização característica dos “não-lugares”, “prometido à individualidade 
solitária, à passagem, ao provisório e ao efêmero [...] como uma polaridade fugidia”.28 
Finalmente, depois todas essas relações expostas neste primeiro tópico, aproximamos 
de Caldeira (2000) e seu ponto de partida para compreender a cidade, sua espacialidade, os 
sujeitos e as relações com a história da violência e da criminalidade, tendo em vista as “falas 
do crime” como o substrato simbólico, jurídico ou ideológico que garante a configuração de 
São Paulo em “cidade de muros”. Caldeira (2000) se fundamenta na concepção de que a arte 
 
26 Augé (1994, p. 65) faz referências às diversas placas e dizeres “seja bem-vindo” e “volte sempre” nas estradas, 
atentando à particularidade significativa da cidade: “[se] Lyon, que é uma metrópole, reivindica, entre outros 
títulos, o de ‘capital da gastronomia’, uma cidade pequena como Thiers pode se dizer ‘capital da cutelaria’, [...] 
Digouin, ‘capital da cerâmica’, [...] e Janzé, ‘berço do frango caipira’”. 
27 São diversos os pretextos identitários que se forjam sobre as cidades. Tuan (1980) cita vários exemplos que se 
apóiam na localização (São Francisco, a “Rainha do Oeste”); nos fatos históricos (relativos aos processos 
migratórios: nos Estados Unidos muitas cidades chamadas de “portal” ou “porta” para o oeste), nas vantagens 
ambientais (Hawaí como “Paraíso” e Las Vegas, “A cidade abençoada com um clima ideal o ano todo”, além da 
farta utilização do “orgulho pelas façanhas industriais, identificando a cidade às suas indústrias e produtos 
(“Cidade

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