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Faculdade Estacio Curitiba Curso bacharel em direito Livancler de oliveira A identidade de gênero no sistema prisional brasileiro. Orientador: Prof. CRISTIANE DUPRET FILIPE PESSOA Curitiba 2022 2 Faculdade Estacio Curitiba Curso bacharel em direito A identidade de gênero no sistema prisional brasileiro. Livancler de Oliveira Trabalho de conclusão de curso apresentado como requisito parcial para obtenção do título de bacherel em direito Orientador: Prof. CRISTIANE DUPRET FILIPE PESSOA Curitiba 2022 3 A identidade de gênero no sistema prisional brasileiro. Livancler de Oliveira Resumo: Esse trabalho tem como objetivo explorar o universo das travestis que em algum momento de suas vidas vem a cometer um ato criminoso, vamos entender quem são as pessoas pertencentes a essa comunidade, os desafios que elas enfrentam no dia a dia, entre preconceitos e direitos fundamentais que ao longo da vida são negados, falta de oportunidade de empregos, as dificuldades da sobrevivência, prostituição, uso de drogas e a vida no submundo do crime. Vamos nos aprofundar na questão do cumprimento da pena em caso de ação penal condenatória transitada em julgado, onde a travesti deve cumprir a sua pena, em uma penitenciaria feminina ou masculina. como garantir os direitos fundamentas previstos na constituição do Brasil, para que essas pessoas tenham a sua dignidade respeitada dentro do sistema prisional, de que forma o Estado brasileiro tem se comportado para que não haja abusos sexuais nessa população minoritária. Palavras-chave: Travestis, sistema prisional, garantias e direitos. Abstract: This work aims to explore the universe of transvestites who at some point in their lives commit a criminal act, let's understand who the people belonging to this community are, the challenges they face on a daily basis, between prejudices and fundamental rights lifelong denials, lack of job opportunities, the difficulties of survival, prostitution, drug use and life in the criminal underworld. We will delve deeper into the issue of serving the sentence in the case of a final and unappealable criminal action, where the transvestite must serve her sentence, in a female or male penitentiary. how to guarantee the fundamental rights foreseen in the Brazilian constitution, so that these people have their dignity respected within the prison system, how the Brazilian State has behaved so that there is no sexual abuse in this minority population. Key words: Transvestites, prison system, guarantees and rights. 4 Sumário 1. INTRODUÇÃO .............................................................................................................. 5 2. QUEM SÃO AS PESSOAS PERTENCENTES A COMUNIDADE DAS TRAVESTIS. .... 6 3. TRAVESTIS, PROSTITUIÇÃO E O UNIVERSO DO CRIME. ........................................ 8 4. O SISTEMA PRISIONAL PARA AS TRAVESTIS ........................................................ 12 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................................... 17 6. REFERÊNCIAS ........................................................................................................... 18 5 1. INTRODUÇÃO Este artigo procura trazer o entendimento de como nosso sistema prisional se encontra para abrigar as classes chamadas minorias, em especial a classe das travestis, em quais condições ocorrem o encarceramento e as garantias constitucionais mínimas para o cumprimento da pena. Vamos analisar de forma concreta a deficiência de nosso sistema prisional em garantir direitos fundamentais e os crimes de natureza sexual e psicológicos que ocorrem com essa classe dentro das penitenciarias brasileiras. Estabelece a constituição federal do Brasil de 1988 os direitos e garantias fundamentais de qualquer ser humano, sem que haja discriminação no que tange ao sexo e gênero. Não obstante, existem diversos tratados internacionais no mesmo sentido que garantem a proteção dos direitos humanos, infelizmente esses preceitos básicos não têm sido respeitados no Brasil, haja vista o notório conhecimento da estrutura debilitada, precariedade, da superlotação de nossas cadeias, inclusive do reconhecimento do supremo tribunal federal, do estado de coisa inconstitucional de nossos estabelecimentos prisionais. O problema na maioria das vezes não se inicia dentro do sistema prisional, ele vem da falta de políticas públicas para garantir a dignidade das travestis. Em muitos casos não a aceitação delas no mercado de trabalho, o que leva muitas a se prostituírem para sobreviver, há uma luta diária para garantir um misero prato de comida e dessa forma terminam adentrando no submundo do crime, várias vezes tentadas por uma vida melhor que o Estado nega a elas todos os dias. A incentivos para empregabilidade de deficientes, menor aprendiz, primeiro emprego, idosos, porém não se fala em incentivos para empregar travestis, embora exista um projeto de lei apresentado a câmera dos deputados PL 114/21 que estimula a contratação de travestis e transexuais, ainda é muito pouco. Diante dessa problemática, nossa questão de pesquisa consiste no seguinte ponto, entender melhor sobre o universo das travestis e o conceito do que é ser uma travesti, como nosso sistema prisional as recebem e quais os mecanismos utilizados pelo estado para garantir a segurança delas. 6 2. QUEM SÃO AS PESSOAS PERTENCENTES A COMUNIDADE DAS TRAVESTIS. Quando se trata de como conceituar o que é uma travesti há sempre um paradoxo para resolver, nem mesmo as pessoas pertencentes a essa comunidade conseguem definir exatamente o que é ser uma travesti, ou falar qual a diferença entre uma travesti e um transexual. Muitos dizem que travesti é um termo pejorativo que faz alusão a prostituição, na verdade travesti é uma pessoa que foi designada homem no seu nascimento, mas se entende como uma figura feminina. A revista veja de São Paulo-sp, em sua edição de abril de 2022, traz uma matéria sobre a atriz e cantora Linn da Quebrada, participante do BBB22, que gerou na internet o debate sobre os termos mulher trans e travesti. A atriz e cantora afirmou que se identifica como travesti, e não como mulher trans. Mas qual é a diferença entre os termos? A psicóloga especializada em sexualidade e co-fundadora do Instituto de Psicologia e Sexologia Essência Rara (IPSER), Priscila Junqueira, explica que, segundo a definição aceita pela comunidade LGBTQI+, mulher trans é uma identidade feminina que está dentro da binariedade de gênero, ou seja, as classificações homem e mulher. Já travesti é um termo que está no espectro feminino, mas tem identidade própria de gênero. Ou seja, a pessoa não necessariamente se identifica como uma mulher, mesmo que pareça feminina (lembrando que ambos os termos se referem à identidade de gênero que, segundo a especialista, é sempre autodeclarada e não definem a orientação sexual do indivíduo). A própria Linn da Quebrada, em discurso de apresentação, ressaltou: “Não sou homem nem mulher, sou travesti”. Uma travesti não quer ser uma mulher, não quer ter uma genitália feminina, ela se sente feminina, age como feminina, mas não é uma mulher. Isso ao longo dos anos tem trazido uma grande problemática para a sociedade, não é fácil entender o que de fato acontece dentro da psique do indivíduo que se declara travesti, muitos não entendem e em decorrência da falta de conhecimento nasce o que chamamos de preconceito. Talvez muitos estejam se perguntando o que isso tem a ver com a matéria de direito penal? Eu digo, tudo haver, precisamos entender um pouco melhor sobre o universo dessa classe, para traçar um entendimento de comoa sociedade 7 brasileira tem sido omissa as mazelas que vem acontecendo e os impactos que isso tem gerado em nosso país. . A ignorância gera o preconceito, o preconceito limita e elimina as minorias. Hoje no Brasil a uma grande dificuldade para que pessoas que se declarem travestis consigam adentrar ao mercado de trabalho, as empresas costumam não contratar e eliminam as candidatas sem informar um motivo aparente, simplesmente informam que não foram aprovadas no processo seletivo. Muitas infelizmente não têm qualificação para pleitear vagas com melhores remunerações, pois o problema estrutural se inicia já nos primeiros anos de vida, na escola, já no ensino básico sofrem preconceitos pois os colegas de turma não conseguem entender que um menino se comporte como uma menina, não havendo aceitação por grande parte dos colegas de classe, sem dúvida isso leva a criança, que ainda não tem ciência de que é uma travesti, a perder o interesse na escola. Com o passar dos anos isso também se estende para dentro de casa, muitos país não aceitam os filhos se assumindo como filhas, o que gera o conflito familiar, muitas ainda adolescentes são colocadas para fora de casa, o fator psicológico destrói a capacidade de aprendizagem o que leva a evasão escolar. O deputado federal Alexandre Padilha (PT-SP), percebendo essa dificuldade que muitas tem para conseguirem se inserir ao mercado de trabalho, elaborou um projeto de lei que cria uma obrigatoriedade para as grandes empresas em contratar travestis, trata-se da PL 114/21, esse projeto dispõe sobre a reserva de vagas de emprego ou estágio para mulheres transexuais, travestis e homens transexuais nas empresas privadas. Esse projeto determina que as empresas com mais de 100 empregados que gozem de incentivos fiscais, participem de licitação ou mantenha contrato ou convenio com poder público federal, contratem pessoas autodeclaradas travestis e transexuais na proporção de, no mínimo, 3% do total de seus empregados. Pela proposta em análise na Câmara dos Deputados, a mesma reserva será aplicada às vagas de estágios e trainees dessas empresas. Caso as empresas descumpram os percentuais, ficarão sujeitas à perda dos incentivos fiscais ou à rescisão do contrato ou convênio. 8 Autor do texto, o deputado Alexandre Padilha (PT-SP) cita a estimativa da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra) apontando que 90% das pessoas trans recorrem à prostituição ao menos em algum momento da vida, por conta da exclusão do mercado de trabalho. Isso vai ajudar, mas não solucionar o problema, é impressionante o fato de ser necessário a criação de uma obrigatoriedade para que empresas contratem pessoas, seres humanos como qualquer um, que por uma orientação sexual são excluídas da sociedade. O fato é que quando o Estado falha no comprimento de suas obrigações, o chamado poder paralelo do crime assume o controle. Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes. (Constituição Federal do Brasil 1988.) 3. TRAVESTIS, PROSTITUIÇÃO E O UNIVERSO DO CRIME. Basta algumas voltas palas principais avenidas das grandes cidades para verificar que em várias esquinas existem travestis oferecendo seu corpo em troca de dinheiro, sim, estão se prostituindo, as calçadas imundas são testemunhas do desespero daquelas que precisam sobreviver, sem emprego, sem dignidade, com seus direitos cerceado por um Estado inoperante que trata os pobres como pobres, ricos como ricos e claro as minorias como minorias. A constituição só existe no papel, porque é rasgada todos os dias quando uma pessoa precisa se prostituir, para comer, dormir, tomar banho, vestir-se, enfim ter uma vida com a mínima dignidade possível, uma classe que até aos olhos de Deus é reprimida e condenada, o amor que o cristianismo prega não é estendido a elas, pois as próprias igrejas as condenam e muitas não permitem a sua presença em seus cultos ou projetos sociais. O fato de viverem nas ruas vendendo a única coisa que possuem, o próprio corpo, acaba permitindo que muitas travestis terminem suas trajetórias de maneira muito triste. Em 2021 foram registrados o assassinato de 140 pessoas trans, sendo 135 travestis, o número foi menor do que o ano anterior que foram registrados 175 9 assassinatos de pessoas trans, os dados estão no dossiê assassinatos e violências contra travestis e transexuais brasileiras. O Brasil foi pelo 13° ano consecutivo, o país onde mais pessoas trans foram assassinadas, em relação a distribuição geográfica, São Paulo foi o estado com mais homicídios (25), seguido por Bahia (13), Rio de Janeiro (12) e Ceará e Pernambuco (11). 53% tinham entre 18 e 29 anos; 28% entre 30 e 39 anos; 10% entre 40 e 49 anos; 5% entre 13 e 17 anos e 3% entre 50 e 59 anos. Quanto à raça, 81% das vítimas se identificavam como pretas ou pardas, enquanto 19% eram brancas. A pesquisa ainda aponta que 78% das pessoas eram profissionais do sexo, segundo a pesquisa esse perfil é majoritário por consequência de serem empurradas para prostituição compulsoriamente pela falta de oportunidades, onde muitas se encontram em alta vulnerabilidade social e expostas aos maiores índices de violência, a toda sorte de agressões físicas e psicológicas. Embora o texto de lei não seja claro quanto ao entendimento de que mulher trans é mulher também, em um julgado recente, a sexta turma do Superior tribunal de justiça (STJ) estabeleceu que a lei Maria da penha se aplica aos casos de violência doméstica ou familiar contra mulheres transexuais, entendeu-se que mulher trans é mulher também, o colegiado deu provimento ao recurso do Ministério Publico de São Paulo e determinou a aplicação das medidas protetivas requeridas por uma transexual, nos termos do artigo 22 da lei 11.340/2006, após ela sofrer agressões de 10 seu pai na residência da família. Porém vale destacar que os Juízes de primeiro grau negaram as medidas protetivas, entendendo que a proteção maria da penha seria limitada a condição de mulheres biológicas, diante disso fica muito obvio o engessamento e a falta de interpretação que muitos magistrados demonstram na aplicação e interpretação da norma em alguns casos concretos que se apresentam nas varas criminais. É difícil imaginar uma vida de medo e descriminação que ocorre todos os dias, 24 horas por dia, somente quem vive tal situação pode tentar mensurar a agonia de ter medo a cada esquina que avista um grupo de pessoas vindo em sua direção, nunca se sabe se naquele momento haverá alguma agressão, seja ela física ou psicológica, são vistas como objeto sexual, muito longe de serem observadas como ser humano, vivem as mazelas das ruas, adentram carros sem conhecer a pessoa que está conduzindo o veículo, se expõem ao risco de morte constante para se mantarem vivas, mas o preço em alguns casos é a morte, uma dicotomia que se aplica ao famoso ditado popular, se corre o bicho pega e se ficar o bicho come. Precisamos rever a interpretação da letra da lei, nosso código penal prevê o crime de feminicídio no artigo 121 § 2° inciso IV (contra a mulher por razões da condição de sexo feminino, incluído pela Lei nº 13.104, de 2015), para muitos esse artigo refere-se a mulheres biológicas, não se estendendo a mulheres que tenham nascidas biologicamente homens, mas você pode estar se perguntando, as próprias travestis não se consideram mulheres, porque deveriam ser enquadradas como se assim fossem? o texto diz em razão do sexo feminino, lembrando que uma travesti é feminina, embora não seja mulher. Dessa forma fica evidente que o texto de lei se estende as travestis, mas não é o que se vê na maioria dos tribunais,o crime contra elas é enquadrado como homicídio comum, salvo por algum outro agravante. O STJ, em um julgado, recentemente decidiu que caberia ao tribunal do júri decidir se o homicídio cometido contra uma travesti deveria ser qualificado como feminicídio, segundo os advogados dos réus, os agressores e assassinos no momento do crime, gritavam você precisa virar homem, o que desfigurava o crime de feminicídio, apontando para o crime de ódio, porém para os ministros isso pode caracterizar o menosprezo para com o sexo feminino, diante do impasse a corte decidiu que caberia aos jurados decidirem a questão. Esse é a penas um dos casos que todos os dias adentram as delegacias, varas criminais e tribunais em todos os 11 estados brasileiros, o que acaba criando um limbo muito grande de como interpretar a lei nesses casos, mas o fato de o crime contra travestis por razão de serem femininas ser enquadrado como feminicídio, pode trazer uma punibilidade maior ao agente causador, o que certamente irá diminuir o número de crimes contra a vida das travestis. Diante desse contexto existe o fato de que nossas calçadas e esquinas tem dono, como dito anteriormente onde o Estado não atua, o chamado crime organizado domina, existem centenas de relatos de travestis que precisam pagar para trabalhar nas ruas, seria uma quantia diária para poder ficar naquele espaço, muitas são obrigadas a vender entorpecentes se quiserem trabalhar. Em uma operação realizada pela polícia civil do paraná na cidade de Curitiba no ano de 2015 foi desmantelada uma quadrilha que explorava sexualmente travestis, segundo a reportagem cerca de 60 policiais civis foram as ruas para cumprir 11 mandados de prisão e outros 12 de busca e apreensão. As investigações foram conduzidas pelo 7° distrito policial, o suspeito apontado como líder da quadrilha extorquia as vítimas obrigando-as a vender drogas para os clientes durante o programa sexual, A investigação ainda apontou que cada travesti deveria repassar R$ 250,00 por semana ao líder da quadrilha. O crime é algo que rodeia a vida das travestis constantemente, muitas dês de a adolescia já praticam pequenos furtos, para conseguirem comprar algo para si, o fato de passarem muitas horas de suas vidas nas ruas, quando a o abandono da escola e da família, acaba facilitando o convívio com usuários de drogas e por consequência muitas se tornam viciadas e para manter o vicio iniciam a vida criminal, a princípio através de furtos, roubos, estelionato. Não é novidade assistir ou ler matérias em jornais que tratam de golpes aplicados por travestis utilizando as redes sociais. Elas realizam chantagens com clientes, alegando que em caso de não haver um pagamento em dinheiro pelo seu silencio, vão trazer a público o relacionamento entre eles. Em matéria publicada pelo portal de notícias g1, evidencia um caso em que travestis filmavam clientes durante o programa, sem que eles percebessem para depois extorquir dinheiro das vítimas, o caso ocorreu em Sorocaba (SP) no ano de 2019, esse é apenas um dos inúmeros crimes que são registrados todos os dias. O tráfico de drogas é algo muito sedutor, a promessa de um dinheiro fácil sem o emprego de violência e grave ameaça, ao contrário do roubo, e o fato de que não há a necessidade de procurar uma vítima para cometer o crime, o próprio viciado vem 12 até elas, acaba corroborando para que muitas adentrem ao submundo do tráfico de drogas, quem utiliza entorpecentes na maioria das vezes realizam essa pratica durante a noite, o que facilita para as travestis angariarem clientes, além do programa não é difícil encontrar travestis vendendo drogas. É fácil encontrar manchetes em diversos meios de comunicação sobre o envolvimento de travestis praticando essa ação delituosa, sendo essa apenas uma porta para o acometimento de outros crimes. Entre um programa e outro sempre há espaço para cheirar uma carreira de cocaína, ou fumar um cigarro de maconha, o cliente além do sexo pode encontrar o fornecedor da droga para ele utilizar, é perfeito, muitos já não as procuram para o programa, mas sim para adquirir o entorpecente. O trabalho da polícia é incessante, para reprimir a prática criminosa, porém é difícil lograr êxito na questão do estado flagrancial, pois muitas portam quantias pequenas, o que descaracteriza em alguns casos o crime de tráfico de drogas, na maioria dos casos os ilícitos são repassados a elas em pequenas proporções, é necessário um trabalho de investigação para desmantelar todo um esquema, além do tráfico, fica evidenciado o crime previsto no artigo 288 do código penal, formação de quadrilha. Diante disso é evidente o fato de que a comunidade das travestis esta expostas a prática delituosa com mais frequência do que as outras classes da sociedade, embora isso não seja fator protuberante para a prática criminal. 4. O SISTEMA PRISIONAL PARA AS TRAVESTIS Em 27/08/2015 o supremo tribunal federal, proferiu decisão da medida cautelar na ação de descumprimento de preceito fundamental n° 347, de relatoria do ministro Marcos Aurelio, nesse feito ficou reconhecido o estado de coisa inconstitucional, confirmando que nosso sistema prisional está falido, diversos direitos constitucionais são negados aos presos, como direito ao trabalho e a educação, o que reflete os autos níveis de reincidência no crime por parte daqueles que deixam a prisão após cumprirem a sua pena, porem logo retornam, por não ter passado por uma ressocialização correta. O tempo ocioso em que ficam encarcerados poderia ser mais bem aproveitado, para estudar e trabalhar, além de passar por um acompanhamento psicológico, a fim de tratar os traumas sofridos durante a sua trajetória de vida, e repensar os motivos que levam o indivíduo a prática delituosa. 13 Quando se trata de travestis o problema se mostra mais complexo, além das problemáticas supracitadas anteriormente, existem quentões mais profundas como o fato de que estamos falando de uma mulher com genitália masculina. Nosso sistema prisional separa homens e mulheres em penitenciaria destintas, classificas como femininas e masculina, mas onde as travestis devem ser alocadas? na penitenciar masculina ou feminina ? na maioria dos casos elas ficam em alas separadas dos outros presos em uma cadeia masculina, porem os presídios brasileiros estão abarrotados com o problema da superlotação, sendo que nem sempre é possível alocar as travestis em uma cela separada, o que coloca em risco a sua integridade física e psicológica. Muitas pessoas da sociedade civil, são contra o entendimento de que os apenados precisam ter seus direitos fundamentais preservados, principalmente o da dignidade da pessoa humana. São chamados de lixo por grande parte das pessoas, porém o termo lixo, nada mais é do que o dejeto produzido pela própria sociedade, que são levados e aterrados nos grandes aterros sanitários, mas não obstante, basta uma boa garimpada para que se encontre materiais valiosos nesses aterros, como plásticos, metais, papeis, entre outros, que passando por um processo de reciclagem retornam para a sociedade utilizar novamente com outras finalidades. Nosso sistema prisional é como um grande aterro sanitário, onde enterramos nossos presos, mas se fizermos um trabalho de reabilitação de forma correta, essas pessoas podem retornar a sociedade de maneira a agregar valores a ela, deixando a vida criminosa. Quando falamos das precariedades do nosso sistema fica claro que deve se pensar que a questão da identidade de gênero deve ser repensada, uma travesti cumprir pena junto com homens é algo extremamente complicado, a grandes indícios de que mesmo sobre a tutela do estado elas enfrentam uma serie de abusos, o Estado tem fechado os olhos para essa situação e violentam os direitos já conquistados por essa classe, através de leis internas e tratados internacionais.O Estado brasileiro reconhece o nome social dos indivíduos, o que é considerado um avanço para aceitação de que uma travesti é uma mulher, embora biologicamente seja masculina, entendimentos recentes do judiciário traz alento a esse respeito, porém quando se trata da questão carceraria isso tudo é apagado, pois para os poderes que regem a nação nada disso é levado em consideração, colocar uma travesti junto com homens em um mesmo alojamento é algo desumano. Se trata 14 de uma classe de pessoas que como já analisado anteriormente sofre diversos tipos de preconceito ao longo da vida e dentro do sistema penitenciário esses problemas se intensificam, não se encontram em lugar nenhum. A juíza da Vara de Execuções Penais do DF julgou improcedente pedido formulado por 11 presas provisórias, que se declararam transexuais femininas ou travestis, e indeferiu sua alocação em estabelecimento prisional feminino. Ao pleitear a transferência das transexuais para a Penitenciária Feminina do DF, a defesa alega que a permanência na unidade prisional em que se encontram não lhes preserva, por inteiro, a dignidade inerente às identidades de gênero e aponta decisão recente do ministro do STF Luis Roberto Barroso, que teria determinado a transferência de duas travestis alocadas em cela masculina no estado de São Paulo para “estabelecimento prisional compatível com a orientação sexual”. Ao decidir, a magistrada destaca que, além de a decisão do ministro do STF não ter efeito erga omnes (para todos), nela não há menção expressa à transferência para presídio feminino. O ministro faz, sim, referência à Resolução Conjunta 1 do Conselho Nacional de Combate à Discriminação, a qual estabelece que a pessoa travesti ou transexual em privação de liberdade deve contar com espaços de vivência específico, repita-se, sem referência expressa a presídio feminino. A julgadora ressalta, ainda, que, no DF, as pessoas trans encontram-se alocadas em celas separadas dos homens e recebem banho de sol separado deles, “de forma que suas situações não se assemelham em nada àquelas enfrentadas pelas 15 travestis beneficiadas com a concessão de ordem no HC do ministro Barroso”. Ao discorrer sobre as diferenças biológicas entre as transexuais que não realizaram cirurgia de transgenitalização, as travestis e as mulheres cis, a juíza afirma: “A musculatura esquelética de quem nasceu homem tem fator hormonal que lhe assegura vantagem de força sobre a mulher”. E prossegue: “Sopesando todas as informações relativas às diferenças físicas e a falta de privacidade aliadas ao fator confinamento, não é preciso muito esforço intelectual para facilmente concluir que a probabilidade de ocorrerem brigas ou desentendimentos é grande, comum aos ambientes em que há aglomeração de pessoas, especialmente em privação de liberdade, assim como a probabilidade de haver superioridade física das mulheres trans em relação às mulheres cis é maior ainda, de forma que estas se tornariam alvos frágeis”. Diante disso, conclui que “para preservação do direito de uns não pode haver desrespeito aos direitos de outros”. Por fim, a magistrada registra que “o sistema penitenciário do DF segue à risca o conteúdo da Resolução Conjunta 1 do Conselho Nacional de Combate à Discriminação, que trata do acolhimento de pessoas LGBTI em privação de liberdade no Brasil”, e uma vez que as detentas estão com seus direitos preservados, “não há motivos legais suficientes para alocá-las em celas junto com mulheres. (TJDFT; NOTICIAS 2018.) Fica evidente que o problema é considerado complexo, mas não podemos penalizar uma pessoa duas vezes pela pratica de um único crime, diante desse impasse o conselho nacional de justiça publicou uma resolução em 2020 para abordar 16 o assunto ( resolução 348/2020), nela fica estabelecido procedimentos e diretrizes relacionadas ao tratamento da população lésbica, transexual, travestis e intersexo, onde o objetivo é a garantia do direito à vida e a integridade física e mental, além da sexual, segurança do corpo, liberdade de expressão da identidade de gênero e orientação sexual. Nela ficou estabelecido com base no glossário das Nações Unidas as características que identificam cada gênero da comunidade LGBTI. Ficou definido que o reconhecimento da população LGBTI, será feito exclusivamente por autodeclaração, e que o magistrado deve acolher em audiência e em qualquer fase do procedimento penal essa autodeclaração. As pessoas autodeclaradas têm o direto de serem tratadas pelo seu nome social, independente do nome que constar em seu registro de nascimento, isso é uma evolução no que diz respeito a dignidade da pessoa travesti. Porem o grande avanço nessa resolução é o fato da pessoa auto declarada pertencente a população LGBTI poder escolher onde irá cumprir a sua pena, em uma prisão masculina, feminina ou especifica, isso sem dúvida traz mais segurança jurídica a nosso sistema prisional, é uma resposta positivada do Estado a sociedade brasileira e a órgãos internacionais, indicando que o Brasil tem buscado a evolução de seu processo punitivo. Uma vez podendo escolher onde cumprir a sua pena, a travesti encarcerada pode ter o mínimo de dignidade e respeito, isso pode evitar muitas situações lamentáveis e irreversíveis que muitas sofrem dentro do sistema prisional, a diversos relatos de estupros sofridos por travestis dentro das cadeias brasileiras, quando as luzes do presidio se apagam o tormento começa, muitas são violentadas diariamente durante meses, outras são obrigadas a se prostituir para não morrer, seu corpo é explorado dentro da penitenciaria por outros detentos que recebem favores em troca dos abusos cometidos contra elas. Claro que ainda a muita coisa a se fazer para que essa população possa ter seu lugar garantido dentro da sociedade e do sistema penal de um modo geral, mas toda mudança infelizmente ocorre de maneira lenta em todos os setores da sociedade e elas precisam ser aprimoradas para que o resultado possa trazer uma resolução contemporânea. A resolução 348/2020 foi modificada pela 366/2021, o que acabou sendo de certa forma um retrocesso, uma vez que o novo texto barrou o direito de as travestis escolherem onde cumprir a sua pena, garantindo apenas as transexuais esse direito, no caso das travestis cabe ao magistrado indagar a 17 preferência pela custodia no convívio geral ou em alas ou celas especiais em penitenciarias masculinas. Diante disso fica evidenciado que a divergência de entendimento vem trazendo uma insegurança jurídica muito grande e isso reflete no processo de ressocialização das pessoas pertencentes a comunidade das travestis. O correto seria o Estado construir penitenciarias para receber somente pessoas pertencentes a comunidade LGBTI, porém o estado brasileiro não acena diante dessa possibilidade. Existe uma ADPF (arguição de descumprimento de preceito fundamental) proposta pela associação brasileira de lésbicas, gays, bissexuais travestis e transexuais (ABGLT), trata-se da ADPF- 527, o objetivo dela é exatamente sanar essas lacunas que existem ao exame da matéria, poder discutir de forma objetivada o tema em questão, mas está difícil chegar a um entendimento, durante julgamento realizado em setembro de 2021 o julgado acabou empatado em 5 cinco a cinco , o ministro Barroso defendeu em seu voto que detentos transexuais e travestis possam escolher cumprir suas penas em presídios femininos ou masculinos em área reservadas. Já o ministro Lewandowski sustentou que a ação não deveria seguir adiante, uma vez que o problema já foi resolvido por meio de resolução do Conselho Nacional de Justiça. O posicionamento de Lewandowski foi seguido por quatro ministro e o de Barroso por outros quatro, agora a expectativa é que o tema seja retomado em um momento futuro. O STFdiscute o assunto deste de junho de 20018. Enquanto isso as travestis continuam a sua saga dentro dos presídios masculinos, mesmo em alas especiais, com as deficiências de nosso sistema prisional, muitas relatam sofrerem estupros e coação de outros detentos, continuam pagando duas vezes pelo crime cometido, vivendo de forma degradante e retornando para a sociedade sem um horizonte para buscar, com a certeza de que em quanto vivas estiverem, vão peregrinar pelas ruas, se prostituindo e sendo exploradas até que sejam presas novamente e o ciclo recomece todo novamente. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS 18 Percebemos que infelizmente a muito o que se fazer a respeito do tema em si, que a sociedade e o Estado precisam discutir a situação de maneira mais objetiva, rever posicionamentos a respeito do tema que não podemos fechar nossos olhos diante do que está estampado no nosso dia a dia. As travestis não podem mais ser ignoradas e esquecidas para sofrer todo tipo possível de descriminação, se calar diante dos fatos apresentados é ignorar a constituição e mais do que isso é abrir mão de preceitos norteadores dos direitos humanos, excluir uma pessoa por ela ter uma orientação sexual diferente da maioria é desumano, viver em um mundo onde não ha lugar para se encaixar é desolador, mas é assim que elas vivem, não são homens e nem mulheres, nem no sistema prisional a lugar especifico para cumprir suas penas e pagarem pelos seus erros, no mercado de trabalho as portas estão fechadas, servem apenas como objeto de prazer e é assim que muitas são vistas por muitos, só são valorizadas quando se tornam mulas do tráfico. Dignidade é algo que não existe para elas, tal termo nunca foi apresentado de maneira concreta, nasceram para sentir dores, e viverem com as feridas e chagas que todos os dias sangram diante do preconceito e da inoperância do estado, choram de maneira silenciosa em algum canto de suas selas, pois nem estando sob a tutela do estado elas estão livres do preconceito e do fantasma da prostituição e dos abusos. Muitas têm seus corpos apropriados por terceiros dês de muito jovens e de certa forma se acostumaram a serem violentadas, fisicamente, psicologicamente e constitucionalmente. 6. REFERÊNCIAS TJDFT. Detenas transexuais.site disponível em <https://www.tjdft.jus.br/institucional/imprensa/noticias/2018/maio/presas- transexuais-nao-devem-ser-alocadas-em-presidio-feminino>. Acesso em 2022 CAMARA DOS DEPUTADOS. Proposta legislativa.site disponível em <https://www.camara.leg.br/propostas-legislativas/2268820 >. Acesso em 2022 AGENCIA BRASIL. Assassinatos de pessoas trans. Site disponivel em <https://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos-humanos/noticia/2022-01/brasil-registrou- https://www.tjdft.jus.br/institucional/imprensa/noticias/2018/maio/presas-transexuais-nao-devem-ser-alocadas-em-presidio-feminino https://www.tjdft.jus.br/institucional/imprensa/noticias/2018/maio/presas-transexuais-nao-devem-ser-alocadas-em-presidio-feminino http://www.camara.leg.br/propostas-legislativas/2268820 http://www.camara.leg.br/propostas-legislativas/2268820 19 140-assassinatos-de-pessoas-trans-em-2021>. Acesso em 2022 G1 PARANA. Exploração sexual de travestis. Site disponivel em <https://g1.globo.com/pr/parana/noticia/2015/12/policia-prende-quadrilha-suspeita- de-exploracao-sexual-de-travestis.html>. Acesso em 2022 BRAH, Avtar. Diferença, diversidade, diferenciação. Cadernos Pagu (26), Campinas, SP: Núcleo de Estudos de Gênero – Pagu/Unicamp, 2006. EAGLETON, Terry. A ideia de cultura. Tradução de Sandra Castelo Branco. São Paulo, SP: UNESP, 2005. FOUCAULT, Michel. História da Sexualidade, vol.01. Rio de Janeiro, RJ: Graal, 2005. HALL, Stuart. Da diáspora: identidade e mediações culturais. Belo Horizonte: UFMG, 2006.
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