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DOENÇA INFLAMATORIA PELVICA Fillype Varão A Doença Inflamatória Pélvica (DIP) é uma síndrome clínica atribuída à infecção polimicrobiana do trato genital superior, causada pela ascensão de microrganismos do trato genital inferior, espontânea ou devido à manipulação. Essa infecção pode comprometer o endométrio, tubas uterinas, anexos uterinos e/ou estruturas contíguas e a virulência dos germes e a resposta imune definem a progressão: · Endometrite · Salpingite (trompa de falópio) · Miometrite (miométrio) · Ooforite (ovários) · Parametrite (parede do útero) · Pelviperitonite (peritônio) · Abscesso tubo-ovariano ou de fundo de saco de Douglas · Dor pélvica crônica EPIDEMIOLOGIA - A incidência de DIP é extremamente difícil de determinar, pois grande parte dos casos ocorre de forma insidiosa e são assintomáticos ou oligossintomáticos, sendo detectados, principalmente, pelas sequelas que ocasionam. - Sério problema de saúde pública. - É comum em mulheres jovens com atividade sexual desprotegida, sendo mais prevalente entre os 15 e 25 anos. - Cerca de 70% das pacientes acometidas apresentam idade inferior a 25 anos. As adolescentes possuem risco três vezes maior de desenvolver DIP do que as pacientes acima de 25 anos. - Sua morbidade é alta. A DIP está associada a sequelas importantes em longo prazo, que causam morbidades reprodutivas. SE LIGA! A DIP é um dos processos infecciosos mais frequentes nas mulheres pobres em idade reprodutiva e os dados mais recentes apontam que a incidência de DIP tem diminuído em países desenvolvidos, porém o impacto da infertilidade como sequela não diminuiu. FATORES DE RISCO Diversos são os fatores de risco para DIP e a maior parte deles corresponde a situações de vulnerabilidade social, já que, a maior etiologia dessa síndrome é de causa sexualmente transmissível. · Idade entre 15 e 24 anos: Imaturidade do epitelio cervical e a utilização de contraceptivo oral. · Vida sexual ativa: A frequência da atividade sexual influencia pela maior probabilidade de entrar em contato com agentes causadores de DIP e pela maior facilidade na ascenção microbiana. · Múltiplos parceiros: Um fator de risco importante, pelo contato da mulher com parceiros portadores de ISTs, porém se torna ainda mais importante quando as relações sexuais são desprotegidas. · Nível socioeconômico baixo: Pela associação com comportamentos promíscuos, menos contato com cuidados médicos, hábitos de higiene deficientes e maior incidência de ISTs. · Período menstrual: A ascensão dos microrganismos é favorecida por variações hormonais do ciclo menstrual. O muco cervical durante o fluxo menstrual apresenta menor efeito bacteriostático. · Menstruação retrógrada: Pode favorecer a ascensão dos agentes patogênicos. · História de IST ou DIP Prévias ou Atuais: Pessoas com infecção por clamídia, micoplasmas e/ou gonococo na cérvice uterina apresentam um risco aumentado de DIP. · Tabagismo / Alcoolismo / Uso de Drogas Ilícitas: São cofatores imunossupressivos. AGENTES ETIOLÓGICOS Aproximadamente 85% dos casos de DIP são causados por agentes patogênicos sexualmente transmitidos ou associados à vaginose bacteriana. As principais etiologias de DIP são: · Chlamydia trachomatis* · Neisseria gonorrhoeae Apenas cerca de 15% dos casos de DIP não são transmitidos sexualmente, estando associados a germes entéricos, patógenos respiratórios ou outros que colonizam o trato genital inferior. A DIP por Actinomyces incide em usuárias de dispositivo intrauterino (DIU). Atenção: A DIP normalmente inicia com a infecção cervical por Chlamydia trachomatis e/ou por Neisseria gonorrhoeae, que ascende ao trato genital superior e, na maior parte dos casos, conduz à infecção polimicrobiana. Os agentes primários ocasionam alterações imunológicas e bioquímicas, como menor produção de radicais livres, que favorecem a chegada, a instalação e a manutenção dos agentes secundários. FISIOPATOLOGIA A DIP começa com a ascensão de micro-organismos pelo trato genital, mais precisamente pela passagem destes pelo colo uterino. Este processo é facilitado em dois períodos: período perimenstrual e pós-menstrual imediato. Ela ocorre mais frequentemente nestes dois períodos pela abertura do colo, pela fluidez do muco cervical imposta pela ação estrogênica, e pela sucção do conteúdo vaginal promovida pela contratilidade uterina. Todo processo começa com uma endometrite que se caracteriza pela presença de plasmócitos no estroma endometrial (manifestação inicial da DIP). É devido à endometrite que a paciente se queixa comumente de dor à mobilização do colo uterino e de dor abdominal infra-umbilical. A seguir, o processo infeccioso pode se dirigir às trompas. Nesta, o gonococo e a clamídia causam lesão direta e indireta do epitélio ciliar, que induz à intensa reação inflamatória, caracterizada por edema e infiltrado leucocitário. Isso explica a dor à palpação dos anexos. A inflamação da superfície tubária pode acarretar a formação de aderências. Estas justificam a queixa de dor pélvica crônica que alguns pacientes apresentam. As aderências podem levar à oclusão do lúmen tubário ou à formação de traves. A oclusão da trompa justifica a sequela de infertilidade por fator tubário que alguns pacientes desenvolvem. Provavelmente, as traves são as responsáveis pelo aumento da incidência de gestações ectópicas. A aglutinação das fímbrias pode produzir oclusão tubária total e a formação de piossalpinge (formação de aderências pélvicas). Em alguns casos, as fímbrias envolvem o ovário, e formam o abscesso tubo-ovariano. O processo infeccioso pode, então, progredir em direção à cavidade peritoneal. Eventualmente, o conteúdo dos abscessos pode cair na cavidade e constituir um abscesso em fundo de saco de Douglas, ou entre alças intestinais, ou no espaço sub-diafragmático. Neste estágio, as pacientes já apresentam sinais de irritação peritoneal. QUADRO CLÍNICO · Principal sintoma da DIP: - Descarga vaginal purulenta, quase sempre acompanhada de dor abdominal infra umbilical. - Dor em topografia anexial, dor à mobilização do colo uterino. - Febre. - Sintomas atípicos, como sangramento uterino anormal (hipermenorreia ou metrorragia), dispareunia. - Sintomas urinários. - A dor geralmente é bilateral e com duração menor que duas semanas. - Náuseas e vômitos, surgem quase sempre quando há acometimento peritoneal (abcessos tubo-ovarianos). - Tensão abdominal nos quadrantes inferiores do abdome, distensão abdominal e ausência ou diminuição dos ruídos hidro-aéreos. - Astenia. · Fase inicial da DIP: O estado da paciente normalmente não se altera. No entanto, à medida que a doença progride, pode-se observar piora do mesmo, com surgimento de desânimo, fácies de sofrimento e ansiedade. A disúria pode ocorrer em 20% dos casos, principalmente se há uretrite. O corrimento genital purulento é referido por 50% das pacientes. A febre pode se manifestar em aproximadamente 30 a 40% dos casos. A dor pélvica aguda é o sintoma principal e se exacerba quando são realizadas manobras de palpação do hipogástrio e/ou das fossas ilíacas. Ao toque vaginal, a mobilização do colo uterino é altamente dolorosa. · Com a progressão da doença: Podem surgir sinais de irritação peritoneal, com exacerbação da dor e ocorrência de náuseas e vômitos. Nesta fase, a palpação abdominal evidenciará sinais de defesa em 90% e dor à descompressão em aproximadamente 70% dos casos. Massa palpável nas fossas ilíacas poderá ser encontrada em aproximadamente 50% dos casos durante o toque vaginal. Os ruídos hidroaéreos quase sempre estão presentes. DIAGNÓSTICO Não existe um teste diagnóstico definitivo para o diagnóstico de DIP, e além disso o diagnóstico é difícil em função da grande variação na intensidade de sinais e sintomas em mulheres com esta condição. · Exame clínico: O profissional de saúde deverá realizar a aferição dos: - Sinais vitais - Exame abdominal completo - Exame especular vaginal (deve incluir a inspeção do colo do útero para verificar se ele está friável e se existe a presença de corrimento mucopurulentocervical). - Exame bimanual (não pode faltar a mobilização do colo e palpação dos anexos). · Diagnóstico clínico: De DIP é feito com base em uma lista de critérios: maiores, menores e elaborados, presentes na lista abaixo. O diagnóstico é realizado a partir da presença de três critérios maiores mais um critério menor ou apenas um critério elaborado isoladamente. SE LIGA! Quando uma mulher sexualmente ativa se apresenta com dor abdominal baixa e/ou dor pélvica, deverá investigar DIP no diagnóstico diferencial, independentemente da história de atividade sexual recente. · Exames complementares: Os exames complementares de imagem e laboratorial devem ser realizados para diagnóstico etiológico e avaliação da gravidade. - Exame de sangue mostrará em linhas gerais os achados encontrados em infecções bacterianas (leucocitose com desvio para esquerda, aumento da VHS e da proteína C reativa). Hemograma completo: Evidenciará a presença de leucocitose superior a 10.000-12.000/ mm3, com aumento da contagem de bastões. - Teste de gravidez: Para exclusão da suspeita de gravidez ectópica ou abortamento séptico. - Velocidade de hemossedimentação e proteína C reativa: Na quase totalidade dos casos, ambos os exames estarão elevados. - EAS e/ou urinocultura: Para afastar infecção do trato urinário. - Cultura de materiais da cérvice uterina com antibiograma ou NAAT para N. gonorrhoeae: A cultura só tem valor se for realizada em meio específico: para gonococo (Thayer-Martin), clamídia (McCoy), micoplasma e ureaplasma (meio A3 Shepard). - Exame bacterioscópico de outros sítios: com cultura e antibiograma de material obtido da uretra, por videolaparoscopia ou por punção do fundo de saco posterior - Sorologia para sífilis (VDRL), hepatites B e C, HIV e imunofluorescência indireta para clamídia. - Ultrassonografia abdominal e pélvica: Estes exames poderão revelar a presença de líquido livre na pelve, abscessos tubo-Ovarianos e pélvicos. O principal achado ultrassonográfico na DIP é a presença de uma fina camada líquida preenchendo a trompa, com ou sem a presença de líquido livre na pelve. - Biópsia de endométrio: Pode confirmar a presença de endometrite. - Ressonância magnética: Poderá revelar a presença de líquido livre na pelve, abscessostubo-ovarianos e pélvicos. - Videolaparoscopia: Permite a obtenção de um diagnóstico acurado nos casos de salpingite e de um diagnóstico bacteriológico mais completo DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL - Apendicite: geralmente há presença de anorexia e a dor inicia após 14º dia do ciclo menstrual. - Gestação ectópica: há irregularidade menstrual, ausência de febre, HCG positivo, ecografia suspeita. -Abortamento séptico: há história de gestação e manipulação uterina. - Torção ou ruptura de cisto ovariano: ausência ou elevação discreta da temperatura associada à dor pélvica. - Outros diagnósticos a serem afastados: dismenorréia, tumor ovariano, adenomiose uterina, torção de mioma, endometriose, corpo lúteo hemorrágico, Mittelschmerz, infecção urinária, litíase renal, gastroenterite, colecistite, diverticulite. ESTADIAMENTO TRATAMENTO O tratamento de DIP deve ser imediato, por menor que seja a suspeita, visando evitar complicações tardias, como infertilidade, gravidez ectópica e dor pélvica crônica. · Tratamento ambulatorial: É realizado em mulheres que apresentam quadro clínico leve, na ausência de sinais de pelviperitonite nos exames abdominal e ginecológico. · Tratamento hospitalar: - Abscesso tubo-ovariano - Gravidez - Ausência de resposta clínica após 72h do início do tratamento com antibioticoterapia oral - Intolerância a antibióticos orais ou dificuldade para seguimento ambulatorial - Estado geral grave (com náuseas, vômitos e febre) - Dificuldade na exclusão de emergência cirúrgica (apendicite, gravidez ectópica). - A duração do tratamento é de 14 dias. - Pacientes em tratamento ambulatorial devem ser reavaliadas após 72horas. - É extremamente importante ressaltar que os parceiros sexuais devem ser examinados e tratados se tiveram relações sexuais com a paciente até 60 dias antes do início dos sintomas. - Evitar relação sexual até o término do tratamento. - Tratar o parceiro sexual. - Retirar o DIU. · Situações Especiais · O uso parenteral deverá ser suspenso 24 horas após a cessação dos sintomas e a continuação terapêutica antimicrobiana por via oral deve se estender até 14 dias. · Orientar quanto ao não uso de bebidas alcoólicas durante e após 24h do uso de metronidazol para evitar efeito dissulfiram (antabuse) símile. · A doxiciclina é contraindicada durante a gravidez. · Uso DIU: o risco elevado de DIP ocorre nos primeiros 20 dias após sua inserção. CONCLUSÃO DIP é umas das infecções mais frequentes que ocorrem em mulheres não grávidas em idade reprodutiva, trata-se da complicação mais significativa das DSTs. Segundo o Ministério da Saúde, mais de 10% das mulheres em idade reprodutiva tem história de DIP com custos altos para a sociedade. Trata-se de uma doença de clínica variada, muitas vezes assintomática, o que dificulta seu diagnóstico precoce. Em virtude das sequelas graves, tanto agudas quanto crônicas, em especial no âmbito reprodutivo das pacientes, deve-se sempre suspeitar do diagnóstico de DIP em pacientes jovens sexualmente ativas com dor pélvica, especialmente naquelas com risco para DSTs, e o tratamento empírico com antibióticos deve ser iniciado o mais precocemente possível. Mulher idade fértil com dor pélvica, qual primeiro exame que tem que pedir? TESTE DE GRAVIDEZ.
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