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190 FAZENDO ARTE NA ESCOLA DE ENSINO FUNDAMENTAL Luiza Helena da Silva CHRISTOV1 Resumo: O presente artigo registra reflexão sobre o desenvolvimento de um projeto que aliou ações de educação continuada junto a professores de primeira a quarta séries do Ensino Fundamental em escola da rede municipal de São Paulo e ações de arte - educação coordenadas por alunos do curso de Educação Artística do Instituto de Artes da UNESP junto a crianças de dez salas de aula da referida escola municipal. O projeto foi desenvolvido de junho a dezembro de 2004 no interior da Escola Municipal de Ensino Fundamental Brigadeiro Faria Lima. Participaram do projeto 350 alunos de primeira a quarta série do Ensino Fundamental; dez professoras deste mesmo nível de ensino; a coordenadora pedagógica da escola municipal em questão; 13 alunos e uma professora da UNESP. A seguir, serão apresentados os procedimentos metodológicos principais adotados, bem como resultados desta experiência. Palavras-chave: arte-educação, artes cênicas; artes visuais; leitura, escrita PROCEDIMENTOS E PRESSUPOSTOS METODOLÓGICOS Desenvolveu-se um projeto de educação continuada junto às dez professoras responsáveis pelas salas de primeira a quarta séries, cuja agenda previa leituras e registros semanais com o objetivo de favorecer o acesso ao referencial teórico que fundamentou a proposta de arte-educação desenvolvida junto às crianças. Este referencial foi disponibilizado pela universidade juntamente com proposta de elaboração, pelas professoras, de resumos, comentários, questionamentos e encaminhamentos de dúvidas para serem esclarecidas em encontros periódicos sob orientação de docentes da UNESP. Assumindo-se a metodologia de ação - reflexão - ação, em momentos de reuniões pedagógicas, os professores do ensino fundamental puderam problematizar as ações implementadas junto aos seus alunos para o replanejamento das mesmas, desencadeando ainda um processo de orientação dos alunos da UNESP por parte das professoras do Ensino Fundamental . Cada dupla de alunos da UNESP assumiu duas turmas do Ensino Fundamental para atuar como arte-educadores em encontros semanais em de uma hora para cada sala de aula.. Assim, de segunda a sexta feira, alunos do Instituto de Artes estiveram na escola Brigadeiro Faria Lima desenvolvendo trabalho de arte-educação junto a duas salas de aula de crianças cujas idades variavam de 06 a 12 anos. 1Docente do Instituto de Artes – UNESP – São Paulo 191 Planejaram ações de acordo com três diretrizes centrais: ♣ Ampliar universo expressivo das crianças, oportunizando o acesso às linguagens artísticas da música, de artes cênicas e de artes visuais; ♣ Associar o trabalho com tais linguagens ao trabalho com literatura infantil, oportunizando desenvolvimento de leitura e de escrita; ♣ Ampliar o universo cultural das crianças a partir de repertório identificado em diagnóstico inicial, no início das ações. O desenvolvimento de leitura e escrita foi uma exigência da coordenação pedagógica, uma vez que o Projeto Pedagógico da escola tem como um dos compromissos fundamentais a articulação dos seus diferentes projetos com a construção de competências leitoras e escritoras. Esta associação revela uma determinada concepção de arte-educação, ou seja, a de que a arte deve estar a serviço dos demais conhecimentos a serem construídos na escola. Embora, entendamos ser a arte um campo de conhecimento em si e que não precisa necessariamente estar a serviço das diferentes áreas do currículo, concordamos com esta diretriz por considerarmos interessante o compromisso de uma instituição de ensino com seu projeto pedagógico e por valorizarmos também o desenvolvimento de competências de leitura e de escrita. O intenso processo de urbanização observado na sociedade brasileira ao longo do século XX vem reiterar, de modo cada vez mais expressivo, a hegemonia da cultura escrita, em que pese também a presença marcante dos meios de comunicação audiovisuais. Nesse contexto, o domínio da língua oral e escrita e o envolvimento nas práticas sociais letradas é visto como fundamental para a participação social efetiva dos cidadãos, pois é por esse meio que o homem recebe informação, elabora visões de mundo, produz conhecimento, e no dizer de Paulo Freire (1970): “lê e escreve o mundo”. Para tanto, o ideal é que, no processo de alfabetização, os alunos possam dizer, ler e escrever suas histórias vividas em suas comunidades, representativas de suas formas de pensar o mundo em que vivem. Narrar e ler histórias, fazer perguntas, criar hipóteses e refletir sobre uma leitura em sala de aula é uma forma de se favorecer o contato com textos e a construção de leitura e escrita. Porém, a diversidade de textos com os quais as crianças se deparam na sociedade contemporânea exige da escola que assuma concepções mais alargadas para o processo de construção de leitura e de escrita. Dentre estas concepções, temos o letramento que pode ser definido como um conjunto de práticas sociais que usam a escrita enquanto sistema simbólico e enquanto tecnologia em contextos específicos e para objetivos específicos. Assim, mais do que favorecer o processo de decodificação e permitir que as crianças identifiquem códigos ao ler, é fundamental trazer para a escola toda a dinâmica da cultura letrada na qual vivemos, desafiando- 192 as a construírem capacidades de compreensão, interpretação e de diálogo com os diferentes discursos que estão disponíveis em nossa sociedade. Entendendo que os discurso estão organizados em gêneros, a escola deve favorecer o contato com diferentes gêneros como poesia, crônica, dramaturgia, artigos de opinião, etc, além dos textos tradicionalmente trabalhados na educação escolar. Entendendo ainda, que além dos diferentes gêneros do discurso, os alunos estão em contato com um mundo denso de informações visuais incitando-os à leitura e escrita em diferentes linguagens, propusemos o presente projeto com a intenção de ampliar universo expressivo dos alunos, bem como sua condição de leitores no mundo contemporâneo. O presente projeto assumiu o compromisso de instrumentalizar os alunos da escola em questão na direção de favorecer sua leitura de signos não verbais em um contexto cultural que se torna cada vez mais simbólico, cada vez mais visual e metafórico. Buscou-se, assim, desenvolver ações que pudessem estimular os alunos do Ensino Fundamental a construírem capacidades no âmbito de três linguagens artísticas: artes cênicas, música e artes visuais, além de se favorecer a construção de competências leitoras e escritoras. Aprendizados conquistados Conquistamos aprendizados em três âmbitos distintos: ♣ no âmbito da formação dos alunos do Instituto de Artes; ♣ no âmbito dos alunos do Ensino Fundamental; ♣ no âmbito das professoras do Ensino Fundamental. Sobre os ganhos para a formação dos alunos do Instituto de Artes da UNESP, pode-se afirmar que o presente projeto foi de extrema importância. O esforço de estudar e realizar reflexões para ação planejando as atividades adequadas para cada sala de aula, aliado ao esforço de analisar a execução de tais atividades, considerando as especificidades das turmas bem como as relações estabelecidas com cada uma das crianças constituiu aprendizado prático-teórico afirmado pelos alunos da universidade em cada encontro de reflexão. O enfrentamento de dificuldades relativas à disciplina em sala de aula, buscando manter a atenção e o compromisso de todas as crianças com as elaborações previstas, como por exemplo, ilustrar uma história ou construir um boneco, ou ainda, participar de um jogo dramático foi um dos desafios vivenciados e analisados pelos futuros arte-educadores. 193 Outro desafio importante pode ser situado na própria inserção no contexto escolar, denso de dificuldadesestruturais e relacionais, obrigando a um replanejar constante. No que diz respeito aos aprendizados dos alunos do Ensino Fundamental, muitas foram as conquistas. De início revelaram dificuldades para o desenvolvimento de ações que exigiram o rompimento com as posturas tradicionais – sentados, calados em fileiras - para dançarem, cantarem, jogarem em grupos, enfim para “movimentarem-se fazendo barulho”. Resistiam, ora exagerando em gritos e movimentos, ora não querendo participar das propostas de arte-educação. Aos poucos, foram incorporando com mais tranqüilidade as novas posturas. Uma conquista importante refere-se ao fato de que as salas que recebiam aulas de arte-educação às sextas-feiras pediram “por favor”, segundo as próprias professoras, para que as mesmas não faltassem mais às sextas-feiras para que eles pudessem “ter aulas com os professore da UNESP”. Vale o esclarecimento de que, algumas professoras faltam às sextas- feiras, pois têm direito a duas faltas ao mês e, em caso de falta da professora responsável pela classe, as crianças eram dispensadas, pois os arte-educadores só poderiam permanecer com elas durante as duas primeiras aulas, por não terem disponibilidade para mais tempo e, também, por não serem substitutos legalmente reconhecidos pelo sistema municipal. O projeto Núcleo de Ensino favoreceu o fim das faltas das professoras. E o que é mais interessante: graças a um pedido das próprias crianças. O tempo do projeto, bem como toda a adaptação vivenciada pelas crianças com as novas posturas e linguagens não foram suficientes para uma avaliação mais rigorosa a respeito das capacidades desenvolvidas a partir das ações propostas, porém é possível afirmar que em sua maioria as crianças revelaram compromisso e interesse aproximando-se de forma curiosa e crítica dos temas abordados. A respeito dos aprendizados construídos pelas professoras do Ensino Fundamental, nos encontros de avaliação do presente projeto, todas foram enfáticas ao afirmar que aprenderam a desenvolver as diferentes linguagens com os alunos da universidade e que as atividades apresentadas eram desconhecidas para elas. Vale o registro de que as professoras tiveram dificuldades para realizar sua agenda de leituras e reflexões, uma vez que alegaram não dispor de tempo para leituras semanais. Dentre as dez professoras, apenas uma cumpriu o cronograma de leituras e realizou registros sobre os textos analisados. 194 Sabemos que a reflexão realizada no interior das escolas pela equipe de educadores vem assumindo papel cada vez mais relevante no processo de implantação de políticas de educação continuada. Sabemos, também, que tais políticas são merecedoras de análises e adequações para que os educadores sejam valorizados em sua profissionalização e possam, além de receber salários dignos, contar com tempo suficiente para seu aperfeiçoamento. No caso da rede de ensino municipal de São Paulo, as professoras contam com duas horas/aula coletivas semanais para reflexão, além de outros momentos, também semanais, para reflexão individual e para participação em projetos. Para finalizar, lembramos que este projeto está em continuidade em 2005, a pedido da coordenação e das professoras. As capacidades construídas pelas crianças serão avaliadas e poderão oferecer pistas valiosas sobre a importância da arte-educação. BIBLIOGRAFIA ALMEIDA, Laurinda R. A dimensão relacional no processo de formação docente: uma abordagem possível. In: O coordenador pedagógico e a formação docente. p. 77-87. São Paulo: Loyola, 2001. ALMEIDA, LAURINDA R. E MAHONEY, ABIGAIL A. HENRI WALLON: psicologia e educação. São Paulo, Loyola, 2000. ANDRÉ, Marli. Pesquisa em Educação: abordagens qualitativas. São Paulo . Ed. Pedagógica Universitária, 1993. BACHELARD, Gaston. A formação do espírito científico: contribuição para uma psicanalise do conhecimento. Rio de Janeiro: Contraponto, 1996. BARBOSA, Ana Mae (Org.). Inquietações e mudanças no ensino da arte. São Paulo. Cortez Editora, 2002. BERGE, Yvonne. Viver o seu corpo - por uma pedagogia do movimento. Editora Martins Fontes, 1981,SP; BIASOLI, Carmem Lúcia Abadia. 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