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Gestão Estratégica de Competências Apresentação Nesta Unidade de Aprendizagem, estudaremos a Gestão Estratégica de Competências. Um tema moderno que pertence ao conjunto de estudos da gestão do conhecimento. Uma empresa precisa de profissionais qualificados em determinadas áreas para cumprir funções e maximizar o retorno. Ou seja, pessoas que tenham competência para atuar de acordo com a necessidade da organização. Baseado nessa premissa, a gestão por competência vem crescendo na área de recursos humanos. Organizar estrategicamente esse tipo de profissional qualificado é um dos desafios da gestão contemporânea. Bons estudos. Ao final desta Unidade de Aprendizagem, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Explicar o conceito de competência.• Identificar as principais técnicas para gerir competências nas empresas.• Refletir sobre os desafios da gestão por competências nas organizações.• Infográfico A Gestão Estratégica de Competências trata de um princípio taylorista revisitado: a pessoa certa no lugar certo. Revisitado porque as empresas são essencialmente diferentes e, por consequência, precisam de pessoas diferentes. A gestão da competência organizacional assume, portanto, caráter estratégico dentro das organizações. Afinal, a partir da competência instalada, forma-se a base para uma gestão mais eficaz de todo o conhecimento organizacional. Conteúdo do livro Os trechos selecionados do livro gestão contemporânea de pessoas: novas práticas, conceitos tradicionais tratam do conceito de competência e gestão por competências, bem como algumas reflexões e críticas sobre o tema. É importante lembrar que o tema não é recente, mas que o interesse por estratégias com este perfil vem ganhando espaço e destaque nos meios acadêmico e empresarial. Boa leitura! c l a u d i a b i t e n c o u r t e colaboradores gestão contemporânea de pessoas n o v a s p r á t i c a s , c o n c e i t o s t r a d i c i o n a i s 2 ª ed ição C A P ÍT U LO S E E STUDOS D E C A S O G393 Gestão contemporânea de pessoas [recurso eletrônico]: novas práticas, conceitos tradicionais / Claudia Bitencourt e colaboradores. – 2. ed. – Dados eletrônicos. – Porto Alegre : Bookman, 2010. Editado também como livro impresso em 2010. ISBN 978-85-7780-622-5 1. Organização do trabalho – Administração de recursos humanos. I. Bitencourt, Claudia. CDU 331.101.262 Catalogação na publicação: Renata de Souza Borges CRB-10/1922 10 GestÃo De competÊNciAs: ArticuLANDo iNDiVÍDuos, orGANiZAÇÕes e socieDADe Claudia Cristina Bitencourt Allan Claudius Queiroz Barbosa OOOObjetivos deaprendizagem compreender a noção de competência sob diferentes perspectivas. conhecer a lógica da gestão de competências reconhecendo sua importância. reconhecer as difi culdades de implementação e manutenção de um programa que visa a identifi car e desenvolver competências. refl etir sobre a gestão de competências em sua interface com aspectos de natureza social e organizacional. inTrOdUÇãO Este capítulo apresenta a discussão sobre o tema “competências” e procu- ra esclarecer seus principais conceitos e abordagens, permitindo uma reflexão crítica acerca da sua importância, aplicabilidade, dificuldades e necessidades no cotidiano do gestor contemporâneo. É importante lembrar que o tema não é recente, mas que o interesse por estratégias com este perfil vem ganhando espaço e destaque nos meios acadêmico e empresarial. Uma das explicações possíveis para esta relevância encontra respaldo na constatação de que o treinamento tradicional já não responde mais às neces- sidades de formação das pessoas, às expectativas das empresas em termos de novas habilidades e atitudes mais condizentes com a realidade organizacional e às exigências de um mercado mais competitivo. O que se observa nos dias de hoje é que as organizações contemporâneas têm sido levadas à modernização e/ou adequação ao novo contexto produtivo por diferentes caminhos. Seja pela via tecnológica, seja pela via gerencial, múltiplos mecanismos e/ou ferramentas são utilizados, em um esforço vol- tado à eficácia na utilização dos recursos produtivos visando, em última ins- tância, à melhor adequação das pessoas ao trabalho. Por meio da construção Ver mAteriAL No cD 176 parte iii – competências e liderança de modelos que reconhecem a definição de competências como possibilidade concreta de proporcionar ganhos organizacionais, é possível, dentro desta ló- gica, recompensar o esforço dos indivíduos. Nesse sentido, a gestão de competências visa aproximar os objetivos or- ganizacionais e pessoais (profissionais). Esta diferenciação facilita a compre- ensão dos principais tipos de competências: o organizacional e o pessoal. Uma outra ênfase para este “ganho” é a busca do autodesenvolvimento como estratégia de aprendizagem contínua baseada em um perfil proativo. Neste caso, a vantagem não é monetária, mas não deixa de envolver o reco- nhecimento. As core competences, ou competências essenciais da organização, são res- ponsáveis pela atuação da empresa no mercado, estimulando a construção de um diferencial competitivo baseado na(s) especialidade(s) e especificidade(s) de cada organização. As competências pessoais conduzem à necessidade cres- cente de formar e valorizar o profissional para oferecer respostas mais rápidas às demandas do mercado e da empresa por meio de uma postura aberta à inovação, baseada em um perfil criativo e flexível, e do preparo para trabalhar e estimular o desenvolvimento das pessoas com quem se trabalha. HiSTóriCO: SUrgiMEnTO E EVOLUÇãO dO dEBaTE SOBrE O COnCEiTO No fim da Idade Média, a expressão competência era associada basica- mente à linguagem jurídica. Dizia respeito à faculdade atribuída a alguém ou a uma instituição para apreciar e julgar certas questões. Conforme Isambert- Jamati (apud Brandão; Guimarães, 1999), [...] os juristas declaravam que determinada corte ou indivíduo era com- petente para um dado julgamento ou para realizar certo ato. Por exten- são, o termo veio a designar o reconhecimento social sobre a capacidade de alguém pronunciar-se a respeito de determinado assunto. Mais tarde, o conceito de competência passou a ser utilizado de forma mais genérica para qualificar o indivíduo capaz de realizar determinado trabalho. No contexto gerencial, o conceito de competência começou a ser construí- do com Richard Boyatizis. Segundo Wood e Payne (1998, p. 23), “Boyatizis foi a primeira pessoa a usar o termo competência. Seu livro The Competent Manager: a Model for Effective Performance iniciou o debate acerca do tema competências”. Entretanto, é a partir do entendimento das transformações de natureza produtiva e social que atingiram as economias industrializadas na década de 1980 que se pode compreender a relevância dos estudos sobre competências para as organizações. Em termos históricos, pensar o surgimento da lógica das competências encontra eco no que Rodrigues e Barbosa (2004) observam como resposta à redefinição nos parâmetros de competitividade, onde a esfera empresarial es- timulou o desenvolvimento, sendo recompensada com a oferta de concepções e modelos “inovadores” de gerenciamento. 177Gestão de competências O “discurso” das competências surgiu como uma prática gerencial de im- portância significativa e com diferentes perspectivas teóricas. Uma perspectiva de análise presente na argumentação de inúmeros teóricos (Chandler, 1987, 1997; Penrose, 1962; Selznick, 1962) trabalha a noção de competências em uma lógica que valoriza os recursos e as capacidades – considerando-os determi- nantes para o desenvolvimento organizacional. Essa discussão encontra respaldo nas obras de Andrews (2001), Barney (1991, 1997) e Wernerfelt (1997). Outra dimensão presente no campo das competências amplia a ideia de recurso por meio da incorporação da dinâmica dos processos de sua criação e utilização.1 A demonstração mais visível destas transformações pode serobserva- da no redimensionamento do Estado. Se o período pós-guerra demonstrou a força de políticas keynesianas e “um aparente ciclo virtuoso de crescimento inesgotável” (Drache, 1996, p. 47), o modelo de inspiração “thatcheriano” de fins dos anos 19702 trouxe consigo um formidável esforço de reconstrução e reaparelhamento do aparato público, conforme preconiza Barbosa (2000). Este autor observa que a inspiração na prestação de serviços com ênfase no cliente/cidadão levou ao questionamento da eficiência do Estado, de seu su- perdimensionamento e inserção em setores produtivos tidos como de interes- se privado. Isso fez com que, em meio a uma crescente onda de privatizações de empresas públicas e a um desenvolvimento tecnológico sem precedentes, o Estado também discutisse suas atribuições no âmbito da regulamentação e do monitoramento das relações de trabalho. Em meio a esta autêntica transformação, as organizações empresariais foram submetidas a uma pressão ambiental até então nunca vista. Se a marca que acompanhou o período posterior a 1945 foi o ambiente estável e a redu- zida necessidade de transformações de natureza estrutural e administrativa, a explosão contingencial3 nos anos 1970 evidenciou a necessidade de ajustes. Esses ajustes encontraram respaldo na reformulação das empresas frente ao novo arranjo produtivo e econômico, trazendo mudanças profundas: que- bra do modelo clássico de relacionamento, pela terceirização de atividades e downsizing gerencial; melhoria na qualidade e produtividade, por meio de abordagens de qualidade; ênfase em processos que privilegiam o cliente, via reengenharia; valorização do indivíduo e de sua capacidade, investindo em programas de remuneração variável e em mecanismos antecipatórios na ges- tão de recursos humanos. Em todas as dimensões mencionadas, a equação que balanceia redução de custos e busca de alternativas de receita passou a ser efe- tivamente ser o ponto central de qualquer ação e/ou prática organizacional. Este quadro de grandes transformações veio acompanhado de impactos significativos na manutenção de empregos formais. Soma-se a isso a redução de empregos intermediários devida aos avanços tecnológicos e a tendência de polarização dos postos de trabalho restantes, divididos entre empregos quali- ficados com alto grau de intelectualização e empregos precários e parciais. Nesse ponto insere-se a discussão sobre os efeitos da contemporaneidade sobre os indivíduos. Este aspecto pode ser observado, por exemplo, no discurso sobre empregabilidade4 e sua ligação à busca de capacitação que enfatiza o indiví- duo, principalmente pelo desenvolvimento de competências.5 Com o foco direcio- nado para o indivíduo, até mesmo a remuneração passa a ser tratada de maneira específica, isto é, em conformidade com os resultados alcançados por ele. 178 parte iii – competências e liderança Isso acaba por impor novas exigências de conhecimentos, ou seja, uma formação mais ampla, com mais conhecimento, alta capacidade de raciocínio e comunicação e reconhecidas habilidades para resolução de problemas. Mesmo que esta discussão possa trilhar a clássica dicotomia qualificação versus desqualificação6, é indiscutível que as atuais tendências forcem uma modificação em múltiplas direções, mas que mantêm uma forte interligação: de um lado, as exigências organizacionais, de maximização do resultado e aumento de sua capacidade competitiva; de outro, a pressão sobre o trabalho e, consequentemente, sobre o empregado, obrigado a buscar um reposiciona- mento acerca de seu papel. Por causa disso, a adoção do conceito de competência ganhou força e pode ser vista à luz de diferentes concepções e abordagens. Panorama conceitual sobre competências7 Le Boterf (2003) observa que a noção de competência, que se desenvol- veu em um contexto de alto desemprego e de busca crescente de competitivi- dade nos anos 1980, refere-se à capacidade de combinar recursos incorporados à pessoa (conhecimentos, habilidades, qualidade, experiências, capacidades cognitivas, recursos emocionais, etc.) e recursos presentes no meio (bancos de dados, redes de especialistas, redes documentares, etc.). Em uma linha mais preocupada com os resultados efetivos da competên- cia, Boyatizis (1982) afirma que as competências são características subjacen- tes ao indivíduo que o levam a resultados efetivos e/ou a uma performance superior no trabalho. O modelo de Boyatizis baseia-se na explicitação de 21 atributos que norteiam a construção de um perfil ideal de gestor. O Quadro 10.1 sintetiza esse construto. Boyatizis centralizou seu trabalho em “compor- tamentos observáveis”, baseados numa concepção behaviorista. Seu mode- lo prevê, ainda, aspectos psicológicos relacionados a três fatores: motivação; auto-imagem e papel social; e habilidades. Em outra abordagem, Sanchez (2001) afirma que competência é a ha- bilidade de uma organização de sustentar uma coordenação de recursos e ca- pacidades de forma a alcançar suas metas. O autor ressalta os três elementos essenciais desse conceito: A coordenação de recursos e capacidades. A intenção de direcionar recursos e capacidades para propósitos específi cos. o direcionamento da organização para o alcance das metas. Barbosa (2003), por sua vez, considera que o modelo de competência esta ria afeito à busca de respostas para problemas ligados à remuneração ten- do em vista sua aproximação com a gestão da produção. A noção de compe- tência surgiria da necessidade de reformulação do conceito de qualificação. Essa linha argumenta que as competências técnicas não seriam suficientes 179Gestão de competências para um novo desenho produtivo, resgatando a ideia de que seriam neces- sárias atitudes críticas e reflexivas voltadas para o trabalho em geral, e não, somente para uma única ocupação. É possível também observar as competências a partir do desenvolvimen- to de conceitos, habilidades e atitudes;8 como indicativo de capacitação, se- gundo apregoa Zarifian (2001); enquanto práticas de trabalho e capacidade de mobilizar recursos, desenvolvido também por Zarifian (2001); como busca de resultados, conforme apregoa Boyatizis (1982); e enquanto interação e/ ou relacionamento com outras pessoas, na linha argumentativa de Sandberg (1996). Esta construção inicial permite o surgimento de muitas abordagens. O quadro 10.2 apresenta uma breve sistematização dos diversos conceitos liga- dos à questão das competências e suas respectivas ênfases. É possível observar ainda, pelo trabalho de alguns autores, que a noção de competência surge como parte de um discurso empresarial, com ausência da ideia de relação social, sendo uma espécie de contraponto ao conceito de qualificação presente na sociologia do trabalho francesa, conforme preconiza- do por Hirata (1994). A competência ganha força no espaço educacional na medida em que surge a necessidade de reformulação do conceito de qualificação. De um modo geral, esta linha, mais próxima da formação profissional, argumenta QUadrO 10.1 aS 21 COMPETênCiaS dE BOYaTiziS 1. Metas e gestão pela ação 1. orientação eficiente 2. produtividade 3. Diagnóstico e uso de conceitos 4. preocupação com impactos (proativo) 2. Liderança 5. Autoconfiança 6. uso de apresentações orais 7. pensamento lógico 8. conceitualização 3. recursos Humanos 9. uso de poder socializado 10. otimismo 11. Gestão de grupo 12. Autoavaliação e senso crítico 4. direção de Subordinados 13. Desenvolvimento de outras pessoas 14. uso de poder unilateral 15. espontaneidade 5. Foco em outros clusters 16. Autocontrole 17. objetividade perceptual 18. Adaptabilidade 19. preocupação com relacionamentos próximos 6. Conhecimento especializado 20. memória 21. conhecimento especializado fonte: Adaptado de Wood e payne (1998). 180 parte iii – competências e liderança QUadrO 10.2 COnCEiTOS dE COMPETênCiaS autor Conceito ênfase* 1. Boyatizis “competências são aspectos verdadeiros ligados à naturezaformação, (1982, p. 23) humana. são comportamentos observáveis que determinam, comportamento, em grande parte, o retorno da organização.” resultado. 2. Boog “competência é a qualidade de quem é capaz de apreciar e Aptidão, valores e (1991, p. 16) resolver certo assunto, fazer determinada coisa; significa formação. capacidade, habilidade, aptidão e idoneidade.” 3. spencer “A competência refere-se a características intrínsecas ao formação e Junior e spencer indivíduo que influencia e serve de referencial para seu resultado. (1993, p. 9) desempenho no ambiente de trabalho.” 4. sparrow “competências representam atitudes identificadas como estratégias, ação e e Bognanno relevantes para a obtenção de alto desempenho em um trabalho resultado. (1994, p. 3) específico, ao longo de uma carreira profissional ou no contexto de uma estratégia corporativa.” 5. moscovici “o desenvolvimento de competências compreende os aspectos Aptidão e ação. (1994, p. 26) intelectuais inatos e adquiridos, conhecimentos, capacidades, experiência, maturidade. uma pessoa competente executa ações adequadas e hábeis em seus afazeres, em sua área de atividade.” 6. cravino “As competências se definem mediante padrões de Ação e resultado. (1997, p. 161) comportamento observáveis. são as causas dos comportamentos, e estes, por sua vez, são a causa dos resultados. É um fator fundamental para o desempenho.” 7. parry “um agrupamento de conhecimentos, habilidades e atitudes resultado, (1996, p. 48) correlacionados que afeta parte considerável da atividade de formação. alguém, que se relaciona com o desempenho, que pode ser medido segundo padrões preestabelecidos e que pode ser melhorado por meio de treinamento e desenvolvimento.” 8. sandberg “A noção de competência é construída a partir do significado formação e (1996, p. 411) do trabalho. portanto, não implica exclusivamente a aquisição interação. de atributos.” 9. Bruce “competência é o resultado final da aprendizagem.” Aprendizagem (1996, p. 6) individual e autodesenvolvi- mento. 10. Boterf “competência é assumir responsabilidades frente a situações mobilização e ação. (1997a, p. 267) de trabalho complexas buscando lidar com eventos inéditos, surpreendentes, de natureza singular.” 11. magalhães e “conjunto de conhecimentos, habilidades e experiências que Aptidão e rocha (1997, p. 14) credenciam um profissional a exercer determinada função.” formação. 12. perrenoud “A noção de competência refere-se a práticas do quotidiano que formação e ação. (1998, p. 1) se mobilizam através do saber baseado no senso comum e do saber a partir de experiências.” 13. Durand “conjunto de conhecimentos, habilidades e atitudes formação e (1998, p. 3) interdependentes e necessárias à consecução de determinado resultado propósito.”** (Continua) 181Gestão de competências QUadrO 10.2 COnCEiTOS dE COMPETênCiaS (continuação) autor Conceito ênfase 14. Dutra e “capacidade da pessoa gerar resultados dentro dos objetivos Aptidão, resultado, silva (1998, estratégicos e organizacionais da empresa, traduzindo-se pelo formação. p. 3) mapeamento do resultado esperado (output) e do conjunto de conhecimentos, habilidades e atitudes necessários para o seu alcance (input).” 15. ruas “É a capacidade de mobilizar, integrar e colocar em ação Ação e resultado. (1999, p. 10) conhecimentos, habilidades e formas de atuar (recursos de competências) a fim de atingir/superar desempenhos configurados na missão da empresa e da área.” 16. fleury e “competência: um saber agir responsável e reconhecido, que Ação e resultado. fleury implica mobilizar, integrar, transferir conhecimentos, recursos, (2000, p. 21) habilidades que agreguem valor econômico à organização e valor social ao indivíduo.” 17. Hipólito “o conceito de competência sintetiza a mobilização, a integração e formação, (2000, p. 7) a transferência de conhecimentos e capacidades em estoque, deve resultado, adicionar valor ao negócio, estimular um contínuo questionamento perspectiva do trabalho e a aquisição de responsabilidades por parte dos dinâmica. profissionais e agregar valor em duas dimensões: valor econômico para a organização e valor social para o indivíduo.” 18. Davis “As competências descrevem de forma holística a aplicação de Ação e resultado. (2000, p. 1 e 15) habilidades, conhecimentos, habilidades de comunicação no ambiente de trabalho [...]. são essenciais para uma participação mais efetiva e para incrementar padrões competitivos. focaliza-se na capacitação e aplicação de conhecimentos e habilidades de forma integrada no ambiente de trabalho.” 19. Zarifian “A competência profissional é uma combinação de conhecimentos, Aptidão, ação, (2001, p. 66) de saber-fazer, de experiências e comportamentos que se exerce resultado. em um contexto preciso. ela é constatada quando de sua utilização em situação profissional a partir da qual é passível de avaliação. compete, então, à empresa identificá-la, avaliá-la, validá-la e fazê-la evoluir.” 20. Becker, “competências referem-se a conhecimentos individuais, formação e Huselid e ulrich habilidades ou características de personalidade que influenciam desempenho. (2001, p. 156) diretamente o desempenho das pessoas.” fonte: Bitencourt, 2001. * esta coluna foi elaborada visando a auxiliar a possibilidade de complementar os conceitos apresentados pelos diferentes autores. ** Durand teve como base o trabalho de pestalozzi, que considerava como chave para o aprendizado os “três Hs” – head, hand, heart (apud Brandão; Guimarães, 1999). que as competências técnicas não seriam suficientes para o novo contexto produtivo. Isso recupera a ideia de que seriam necessárias atitudes críticas e reflexi- vas, uma vez que a preparação deveria estar voltada para o trabalho em geral, e não, somente para uma única ocupação, ou seja, essa perspectiva procura 182 parte iii – competências e liderança integrar educação e trabalho. Isso significa dizer que há um desenvolvimento de competências gerais dos trabalhadores em detrimento de suas habilidades manuais.9 Por esta via, competência pode ser definida como “[...] capacidade pessoal de articular saberes com fazeres característicos de situações concretas de trabalho” (Barato, 1998, p. 13). Brandão e Aquino (2001) consideram que a gestão de competência pode ser visualizada como instrumento que faz parte de um mesmo movimento, quan- do a ênfase se recai sobre as pessoas como recursos determinantes do sucesso organizacional. Ela faz parte de um sistema maior de gestão organizacional que direciona recrutamento, seleção, treinamento, dentre outros, para capacitação e desenvolvimento das competências necessárias para atingir objetivos de uma organização. Ainda, deve ser vista como um processo circular e também deve estar em perfeita sintonia com a estratégia organizacional. Gallart e Jacinto (1995) definem competências como o conjunto de sa- beres postos em jogo pelos trabalhadores para resolver situações concretas de trabalho, configurando uma não dissociação entre competência e ação, com uma exigência de determinado conhecimento que oriente esta ação. Leiba-O’Sullivan (1999) faz uma distinção entre cross-cultural competen- cies dinâmicas e estáveis, discutindo a questão em torno da taxonomia tridi- mensional de Black e Mendenhall (1990). Essa taxonomia distingue as dimen- sões de automanutenção, relacionamentos e perceptiva. Todas as dimensões são importantes para o ajuste intercultural. Experiências organizacionais, por sua vez, trabalham a ideia de compe- tência naturalmente, considerando suas particularidades. Baladi (1999), por exemplo, ao descrever um novo gerenciamento de conhecimento e competên- cia na iniciativa da Ericsson Business Consulting, afirma que gerenciamento de conhecimento significa crescimento sistemático individual e da organização,na perseguição de negócios importantes. Nessa empresa, foi criada uma pla- taforma global, com práticas globais de gerenciamento de capital intelec tual, mudança de cultura, liderança, processos comuns, gestão de competência e gestão do conhecimento. Almada (2000) aborda o tema de novos requisitos em matéria de formação profissional da mão de obra, que surge como resultado da inovação tecnológica e das novas formas de organização do trabalho. Observa que a transformação pro- dutiva coloca a necessidade de que os países da América Latina construam uma nova cultura trabalhista e empresarial de competitividade, por meio da formação e do desenvolvimento de recursos humanos. Ao analisar o caso mexicano, afirma que governo e sociedade deram impulso à formação e à capacitação dos recursos humanos baseado no enfoque de competência. Considera que se constitui uma via eficaz para apoiar a formação e o desenvolvimento dos indivíduos e a produ- tividade e a competitividade das empresas. Afirma, ainda, que este enfoque base- ado na competência permite a definição de programas de capacitação flexíveis e modulares, e não somente com carreira em especialidades ou disciplinas. Isto é, permite a integração de competências de distintas naturezas. Kubr e Abell (1998) trabalham o conceito de competências identificando inicialmente o tipo de competência e o nível requerido para cada uma delas. Barra (s.r.) afirma que o conceito de competências tem um parênteses antro- 183Gestão de competências pológico que explica o homem como um ser incompleto, e que por isto mesmo deve transformar a natureza em meio de vida. Pujol (1999), por sua vez, define competência como a capacidade de uma pessoa para realizar uma atividade, aplicando de maneira integral e per- tinente os conhecimentos, destrezas e atitudes requeridas em uma determina- da gama de funções, em situações e contextos definidos. Esse mesmo autor faz uma diferenciação entre competências laborais e sociais, sendo a de primeiro tipo aquelas que mais se aproximam do espaço organizacional. Uma análise de algumas das várias correntes de estudos expressas aqui (americana, latino-americana, francesa, australiana) sobre a questão de compe- tências permite relacionar o conceito de competência aos aspectos apresentados no Quadro 10.3. O OLHar daS diFErEnTES aBOrdagEnS O amplo leque de conceitos que procuram definir as competências per- mite sua abordagem e tratamento por diferentes perspectivas. Conforme Velde (1996), existem concepções diferenciadas, por vezes contraditórias, sobre a noção de competências. Nesse contexto, nota-se um esforço generalizado no QUadrO 10.3 autores aspectos Boyatizis Junior (1982), parry (1996), Boog (1991), Becker (2001), spencer e spencer (1993), magalhães e rocha (1997), Hipólito (2000), Dutra e silva (1998), sandberg (1996) moscovici (1994), magalhães e rocha (1997), Dutra e silva (1998), Zarifian (2001) sparrow e Bognanno (1994), Durand (1998), cravino (1997), ruas (1999), moscovici (1994), Le Boterf (1997), perrenoud (1998), fleury e fleury (2000), Davis (2000), Zarifian (2001) Le Boterf (1997b) Boyatizis (1982), sparrow e Bognanno (1994), parry (1996), Becker, Huselid e ulrich (2001), spencer Junior e spencer (1993), cravino (1997), ruas (1999), fleury e fleury (2000), Hipólito (2000), Dutra e silva (1998), Davis (2000), Zarifian (2001) Hipólito (2000) Bruce (1996) sandberg (1996). Desenvolvimento de conceitos, habilidades e atitudes (formação) capacitação (aptidão) práticas de trabalho, capacidade de mobilizar recursos, fato que a diferencia do conceito de potencial (ação) Articulação de recursos (mobilização) Busca de melhores desempenhos (resultados) Questionamento constante (perspectiva dinâmica) processo de aprendizagem individual cuja responsabilidade maior deve ser atribuída ao próprio indivíduo (autodesenvolvimento) relacionamento com outras pessoas (interação) 184 parte iii – competências e liderança que se refere à formação de competências a partir de treinamento e educação, por vezes estimulados pelo governo (competence-based training), como é o caso das empresas inglesas e australianas. Contudo, essas iniciativas vêm provocando um debate sobre a sua efeti- vidade e mesmo importância no contexto competitivo e educacional, ou seja, a base desse esforço centraliza-se em um treinamento behaviorista que pri- vilegia a formação de atributos genéricos de competência reconhecidos por alguns como “[...] atomização do conhecimento e habilidades” (Velde, 1996) e que não fazem sentido para as pessoas. Pouca atenção tem sido conferida a abordagens mais abrangentes, que privilegiam a formação integral baseada no significado do trabalho ou em situações específicas vivenciadas pelas orga- nizações. Assim, o esforço tem sido conferido à predefinição de competência, que serve para confirmar o modelo de competência do pesquisador em vez das competências dos trabalhadores. A crítica que se faz a esse tipo de abordagem behaviorista centraliza-se no fato de que ela mais inibe do que contribui para o processo de formação e desen volvimento das pessoas e da organização. Há tendência à ênfase na rotina, nos aspectos visíveis e mais facilmente mensuráveis do trabalho, na repetição de práticas que foram bem-sucedidas no passado. Essas situações tendem a “engessar” os processos organizacionais e a inibir a criatividade das pessoas e das empresas. Destaca-se, neste sentido, a importância da articulação entre a estratégia da empresa e a formação e capacitação dos gestores, permitindo, dessa forma, não apenas um melhor desempenho, mas também a geração de novas perspec- tivas para ambos. Conforme LeBoterf (1997a, p. 22), [...] o que de fato irá diferenciar a competência de uma empresa ou de uma unidade (divisão, departamento, serviço) não é a competência de seus membros. O diferencial não depende tanto de seus elementos, mas da qualidade da combinação ou articulação entre seus elementos. Quinn (1996) refere-se, ainda, à combinação dessas competências (orga- nizacional e gerencial) como o meio de promover the knowledge-based service activities, que é “o coração de uma empresa inteligente”, ou seja, as atividades não podem simplesmente ser duplicadas pelos competidores. Por essa razão, a real vantagem competitiva sustentável deriva-se, normalmente, de um con- junto de habilidades, fatores ligados à experiência da empresa, capacidade de inovação, know-how, compreensão do mercado, dados e informações distribu- ídas e acessíveis. No que se refere à gestão de competências (voltadas às pessoas), a di- ferença entre competence e competency parece ser relevante (Quadro 10.4). Esse esclarecimento identifica não somente a diferença entre terminologia e conceitos, mas também aborda noções e concepções específicas que orientam as práticas e os processos de trabalho. A diferença básica refere-se à ênfase na pessoa (processo intrínseco) ou no cargo (processo extrínseco). 185Gestão de competências Observa-se que as competências são entendidas e/ou construídas a partir de atributos (aplicação das competências). Assim, existem diversas classifica- ções, sendo que as mais divulgadas e conhecidas são as abordagens de Katz (1974), Parry (1996), Durand (1998) e Zarifian (1996). No primeiro caso, as competências são compreendidas tomando-se como base a análise de compe- tências técnicas, humanas e conceituais. Para Parry (1996) e Durand (1998), a análise dos conhecimentos, habilidades e atitudes apresenta-se como foco. Para Zarifian (1996), as competências são compreendidas fundando-se em competências sobre processos, competências técnicas, competências sobre a organização, competências de serviço e competências sociais. Moscovici (1994) e Swieringa e Wierdsma (1992) sugerem “[...] mode- los orientadores simplificados”. Assim, acredita-se que a noção de competên- cia deva ser uma construção individual das empresas baseada em alguns con- ceitos genéricos simplificados.A complexidade na elaboração de construtos voltados à gestão de competências pode dificultar a compreensão do processo e desviar o foco da atenção, isto é, o construto é uma abstração utilizada para estimular e estruturar a gestão de competências (meio), e não, o produto des- sa análise (fim). Conforme Moscovici (1994), a competência pode ser analisada sob o prisma da competência técnica e da competência interpessoal, ambas funda- mentais para o desenvolvimento do ser humano. Entretanto, destaca-se que, em relação à primeira, os conhecimentos e as técnicas não asseguram um desempenho adequado e de qualidade. As características pessoais determi- nam o comportamento humano dando-lhe cunho altamente diferenciado do funcionamento da máquina, por exemplo. Quanto ao segundo, refere-se à ha- bilidade de lidar eficazmente com relações interpessoais, de lidar com outras pessoas de forma adequada às necessidades de cada uma e às exigências da situação. QUadrO 10.4 COMParaÇãO EnTrE CompEtEnCy E CompEtEnCE Competency Competence origem estados unidos inglaterra Noção conjunto de conhecimentos, habilidades e atitudes resultados, produtos Abordagem Soft Hard propósito identificar desempenhos superiores identificar padrões mínimos (processo educacional) (desempenho no trabalho) foco A pessoa (características pessoais) o cargo (expectativas ligadas à função) Ênfase características pessoais (input, learning e tarefas e resultados (output, workplace development of competency) performance) público-alvo Gerentes Nível operacional fonte: Bitencourt, 2001. 186 parte iii – competências e liderança Neste contexto, dois componentes da competência interpessoal assumem importância capital: a percepção e a habilidade propriamente dita. A primeira refere-se a uma visão acurada da situação interpessoal, enquanto a segunda engloba várias habilidades, entre as quais, flexibilidade perceptiva e compor- tamental que “[...] significa procurar ver vários ângulos ou aspectos da mesma situação e atuar de forma diferenciada, não rotineira, experimentando no- vas condutas percebidas como alternativas de ação” (Moscovici, 1994, p. 37). Desenvolve-se, concomitantemente, a capacidade criativa para soluções ou propostas menos convencionais, com resultados duplamente compensadores: da resolução dos problemas e da autorrealização pelo próprio ato de criação, altamente gratificante para as necessidades do ego (estima) na hierarquia de Maslow. A competência interpessoal é, portanto, resultante de percepção acura- da realista de situações interpessoais e de habilidades específicas comporta- mentais (Moscovici, 1994). Referindo-se à questão do desenvolvimento de competências, Swieringa e Wierdsma (1992) contribuem para essa reflexão destacando as três dimensões principais que consideram o saber, saber fazer e o saber agir: a) O saber – Refere-se ao conhecimento. Implica questionamentos e esforços voltados à informação que possa agregar valor ao trabalho. O conhecimen- to é o que se deve saber para desenvolver com qualidade aquilo que lhe é atribuído (conhecimento acerca das ferramentas de qualidade, de sistemas de custos, de segmentação de mercados, de atendimento aos clientes, de sistematização e organização das informações, etc) (Ruas, 1998). b) O saber fazer – Refere-se a habilidades. Centraliza-se no desenvolvimento de práticas e na consciência da ação tomada. As habilidades são o que se deve saber para obter um bom desempenho (habilidade para motivar, orientar e liderar uma equipe em torno de metas e objetivos; habilidade para negociar com clientes, com fornecedores e clientes internos; habilida- de para planejar, para avaliar desempenhos, etc.). c) O saber agir – Refere-se a atitudes. Busca um comportamento mais condi- zente com a realidade desejada. Neste momento realiza-se a união entre discurso e ação. Deve-se saber agir para se poder empregar adequadamen- te os conhecimentos e habilidades (iniciativa e empreendedorismo, confia- bilidade, espírito inovador, flexibilidade para considerar opiniões diferen- tes das suas, flexibilidade para reconhecer erros, disposição para aprender, persistência, etc.) (Ruas, 1998). Na realidade, as dimensões saber, saber fazer e saber agir estão inter-rela- cionadas e por vezes se confundem. Trata-se de uma análise múltipla de dimen- sões que se referem ao indivíduo, ao grupo e à organização, uma vez que estes conceitos podem ser amplamente analisados sob os diferentes prismas citados. Um aspecto fundamental para o desenvolvimento de competências re- fere-se à apropriação do conhecimento (saber) em ações no trabalho (saber agir). Destaca-se que é neste momento que o desenvolvimento de competên- cias agrega valor às atividades e à organização, isto é, o conhecimento, se não 187Gestão de competências for incorporado às atitudes e manifestar-se por meio de ações ou práticas no trabalho, não trará benefícios à organização nem estimulará o desenvolvi- mento das pessoas. Esta ideia básica de relacionar o conhecimento às práticas organizacionais refere-se ao aprender a aprender.10 O trabalho apresentado por Sandberg (1996, p. 20) critica o conceito tra- dicional de competências enquanto um conjunto de conhecimentos, habilidades e atitudes, ou seja, como aquisição de atributos (abordagem racionalista): Através da análise de competências, eu estou cada vez mais convencido de que os aspectos essenciais da competência humana não podem ser re- duzidos a uma lista externa de atributos relacionados ao trabalho. Para o autor, o desenvolvimento de competências deve ser compreendido com base nas práticas organizacionais, focalizando sua análise no enriquecimen- to de experiências e vivências (abordagem interpretativa). “Mais especificamen- te, nós destacamos que o desenvolvimento de competências envolve a mudança na estrutura e no significado das práticas de trabalho” (Sandberg; Dall’Alba, 1996, p. 411). A questão, então, refere-se não apenas a o que constitui compe- tências (what), mas também a como as competências são desenvolvidas (how). Em suma, Sandberg (2000) propõe a “[...] compreensão do significado do tra- balho” como a primeira fase para a definição de competências. Para o autor, [...] o desenvolvimento desse conjunto de conhecimentos e habilidades envolve a mudança na compreensão do trabalho. Então, para a definição da visão de competência parte-se da compreensão ou da forma como os gestores enxergam competências (way of seeing).11 Pode-se pensar em tratar a questão em nível de “visão compartilhada de competências” como uma etapa posterior de análise e construção, o que sugere um trabalho mais unificado. Nesse contexto, as competências se desen- volvem por meio da interação entre as pessoas no ambiente de trabalho. LeBoterf (1997a), por sua vez, situa a competência valendo-se de três eixos principais que consideram a formação pessoal (biografia, socialização), a formação educacional e a experiência profissional. Ressalta, ainda, os as- pectos referentes à responsabilidade e à legitimidade na construção da noção de competências. A responsabilidade implica o domínio do metier e o engaja- mento responsável na atividade, enquanto a legitimidade associa-se ao reco- nhecimento por parte de superiores, pares e subordinados em relação a sua capacidade de agir e de responder às situações que surgem (Ruas, 2000). Ruas (2000) trata a questão de competências em termos de recursos de competên- cias, destacando a importância da articulação. As propostas de Sandberg (1996) e de Boterf (1997a) resgatam aspectos importantes que contribuem para a reflexão do tema, que são destacados na Figura 10.1. Conforme a Figura 10.1, os aspectos voltados à interação entre as pes- soas, ao significado da competência e à experiência são o foco da abordagem apresentada por Sandberg (1996). Paralelamente, a ênfase atribuída por Le Boterf (1997) centraliza-se na questão da articulação, da legitimação e da for- mação. Assim sendo, as abordagens se complementamda seguinte forma: 188 parte iii – competências e liderança A interação entre as pessoas propicia uma melhor articulação referente às diretri- zes e aos níveis organizacionais. A identifi cação do signifi cado da competência permite a sua legitimação. A experiência relaciona-se diretamente à formação, no sentido de capacitação, o que implica visão pessoal, educacional e profi ssional. Portanto, a competência pode ser explicada com base em sua concepção, em redes de trabalho e em recursos de competência. CrÍTiCaS E rEFLExõES aCErCa da gESTãO dE COMPETênCiaS Alguns pontos observados pelos autores, seja por reflexões conceituais, seja pela aplicabilidade de modelos de competências nas empresas, evidenciam a necessidade de se observar com muito cuidado as práticas existentes. FigUra 10.1 análise de competências. fonte: elaborado a partir de sandberg (1996) e Boterf (1997a). 189Gestão de competências Uma primeira constatação é a dificuldade em articular de maneira con- sensual competências e escopo remuneratório. Some-se a isso a possibilidade de direcionamento dos modelos desenvolvidos aos quadros gerenciais e supe- riores das empresas. Este aspecto traz à tona reflexões acerca da lógica das competências: ora, se ela se volta ao indivíduo reconhecendo sua efetiva contribuição aos resultados organizacionais, como isto não se traduz em salários e/ou benefí- cios pecuniários? Por outro lado, se existe a contrapartida monetária, esta não poderia desviar o foco do desenvolvimento de competências para a questão da remuneração? (“visão mercenária”) Alguns aspectos considerados relevantes para a reflexão crítica e o de- bate do tema das competências gerenciais podem ser listados para balizar o que foi dito anteriormente. As principais críticas são apontadas por Beardwell e Holden (1994), Fletcher (1997), Jubb e Robotham (1997), Wood e Payne (1998), Kohn (1993), conforme a síntese a seguir: a) A maneira como as competências são definidas – o conceito de competência possui diferentes significados e contradições. Prevalece a ênfase na construção de atributos (visão estática) e falta a visão processual (perspectiva dinâmica). b) A tendência a “viver no passado” – o mapeamento de competências é ba- seado na necessidade do momento, não existindo uma preocupação com a construção de competências necessárias no futuro. c) A qualidade dos atributos de competências – os desenhos de competência são geralmente superficiais e pobres. Representam muitos atributos (quan- tidade) e não questionam a sua qualidade. d) A identificação da efetividade gerencial e a falta de atenção para as “quali- dades soft”– a finalidade dos construtos de competência volta-se para defi- nir atributos de comportamentos gerenciais que sejam efetivos. Mas o que é um padrão gerencial efetivo? Tendo em vista a dificuldade de aferir as- pectos ligados a atitudes, muitos modelos simplificam a questão ignorando essa dificuldade e privilegiando atributos que sejam menos significativos mas fáceis de mensurar. e) A natureza genérica das competências – o predomínio de listas de compe- tências genéricas ilustra essa questão. Essas listas são desprovidas de um contexto (context independent) e/ou não refletem a necessidade da diversi- dade no próprio contexto organizacional. f) Burocracia e custo – existe a predominância de formalismo voltado à con- firmação de competências, e não, ao seu desenvolvimento. g) Falta de orientação futura – retrata a falta de questionamento sobre a im- portância e a articulação de competências com a visão estratégica de RH, ou seja, a falta de uma visão integrada em que as competências relacionam-se aos processos de novos padrões de seleção, treinamento e desenvolvimen- to, planejamento e sucessão de carreira, recompensa e reconhecimento, acompanhamento e avaliação. h) O “sentir-se competente” – as pessoas buscam o sucesso, ou seja, precisam sentir-se competentes. A crítica refere-se à falta de espaço para a aprendi- zagem a partir do erro ou experiências de insucesso. 190 parte iii – competências e liderança i) A questão de fazer a diferença – refere-se à falta de sentido ou significado atribuído ao link entre competências e trabalho. Quando se percebe o sig- nificado do trabalho (meaningfully), desperta-se o sentimento intrínseco de motivação que faz com que as pessoas pensem no seu trabalho como algo único e que faz a diferença. j) “Cenário skinneriano” – representado pela equação estímulo/resposta, ou melhor, “faça isso e tenha aquilo”. Essa situação retrata a visão limitada de competências enquanto um processo manipulador e pouco construtivo, desprovido de características que promovam o desenvolvimento ge rencial. k) A questão do feedback – existe a tendência a se avaliar padrões pessoais, e não, as atividades propriamente ditas. “Não elogie as pessoas somente pelo que elas fazem. Faça elogios o mais específicos possíveis”, aconselha Kohn (1993, p. 108). Observa-se uma tendência em oferecer feedback positivo e poucas críticas construtivas. No intuito de minimizar ou evitar essas dificuldades, torna-se necessário uma revisão sobre o que é realmente importante para as pessoas e para as organizações no intuito de se (re)estabelecer um processo mais reflexivo e crí- tico em que se busca respostas para algumas questões cruciais (ver Questões para Reflexão). Considerando-se essas questões, destaca-se a importância de se estabele- cer um link entre estratégias, processos e desenvolvimento de pessoas quando se pensa em gestão de competências. Bitencourt (2000, p. 230), nesse sentido, destaca que a gestão de competências refere-se ao processo contínuo e articulado de formação e desenvolvimento de conheci- mentos, habilidades e atitudes onde o indivíduo é responsável pela constru- ção e consolidação de suas competências (autodesenvolvimento) a partir da interação com outras pessoas no ambiente de trabalho, familiar e/ou em outros grupos sociais (escopo ampliado), tendo em vista o aprimoramento de sua capacitação, podendo, dessa forma, adicionar valor às atividades da organização, da sociedade e a si próprio (autorrea lização). Assim, é possível acreditar que o gerenciamento de competências pode ser feito de uma forma mais autêntica e consciente, privilegiando-se uma vi- são mais dinâmica e estratégica voltada à qualidade de recursos e aos atribu- QUESTõES Para rEFLExãO 1 o que é competência? 2 Quais são os resultados esperados com o desenvolvimento de competências? 3 como esses resultados podem ser aferidos? 4 Quais são as práticas formais e informais que podem estimular o desenvolvimento de competências? essas práticas são restritas a treinamento e desenvolvimento? 5 como se articula a visão estratégica da organização (core competence) com a aplica- ção das competências gerenciais? Encerra aqui o trecho do livro disponibilizado para esta Unidade de Aprendizagem. Na Biblioteca Virtual da Instituição, você encontra a obra na íntegra. Dica do professor A gestão estratégica de competências não é algo novo, mas ultimamente vem ganhando força nos debates sobre administração. Neste vídeo, daremos dicas sobre o conceito de competência e como fazer uma eficaz gestão das competências organizacionais. Além disso, trataremos dos novos desafios na área. Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar. https://fast.player.liquidplatform.com/pApiv2/embed/cee29914fad5b594d8f5918df1e801fd/47173e00cf3607b5efd4185d0172cfe5 Na prática A gestão estratégica por competências vem ganhando terreno nas organizações. Muitas, ainda que empiricamente, vem investindo nessa área do conhecimento para contar com profissionais cada vez mais qualificados e aptos para enfrentar os desafios da competitividade. Veja alguns exemplos que coadunam com essa ideia e nos fazem ter certeza que essa ferramenta chegou para ficar. Treinamentos e concessões por parte da empresa, de estímulos para o estudo e formação profissional. Valorizaçãodas pessoas, oportunidades de crescimento profissional. Saiba + Para ampliar o seu conhecimento a respeito desse assunto, veja abaixo as sugestões do professor: Alinhando estratégia e competências Este artigo procura responder às seguintes questões: qual a relação entre competências organizacionais e estratégias competitivas nas empresas? Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar. Conheça o modelo de gestão por competências Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar. Gestão por competências em organizações de governo Essa publicação consiste numa das várias iniciativas da ENAP que visam disponibilizar instrumentos para o aumento da capacidade de governo na formulação e implementação de políticas públicas. Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar. http://www.scielo.br/pdf/rae/v44n1/v44n1a12.pdf https://blog.solides.com.br/conheca-o-modelo-de-gestao-por-competencias/ http://repositorio.enap.gov.br/bitstream/1/383/1/livro_gestao_competencias.pdf Gestão estratégica Apresentação Em um mercado complexo e em constante evolução, as organizações precisam que todos os setores estejam envolvidos na formulação e implementação de estratégias, para, assim, garantirem sua sobrevivência. A gestão estratégica surge para auxiliar nesse processo através da definição de objetivos, do estudo do ambiente competitivo e da própria empresa, da avaliação de estratégias, da implantação e do acompanhamento. Em busca de um maior monitoramento e controle, a empresa poderá, também, aliar a gestão estratégica à governança corporativa, a fim de obter melhores resultados. Nesta Unidade de Aprendizagem, você vai estudar a gestão estratégica, analisando suas principais características. Ainda, você verá os benefícios proporcionados pela relação entre a gestão estratégica e a governança corporativa. Bons estudos. Ao final desta Unidade de Aprendizagem, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Definir gestão estratégica.• Identificar as principais características da gestão estratégica.• Relacionar gestão estratégica e governança corporativa.• Infográfico Você sabia que a gestão estratégica tem como objetivo garantir o crescimento, a continuidade e a sobrevivência da empresa, podendo ser ainda mais eficaz quando combinada com a governança corporativa? A governança corporativa contribui para que os investidores tenham acesso às informações e ao conhecimento da organização por meio de seus relatórios, rotinas e práticas, para que tomem suas decisões e invistam conscientemente nas empresas. No Infográfico a seguir, você vai conhecer os princípios básicos da governança corporativa que contribuem para uma gestão estratégica eficaz. Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar. https://statics-marketplace.plataforma.grupoa.education/sagah/6403a6d0-5918-411f-808b-2b7aed057d57/c787cff9-c932-4db9-90d0-4fef6f93bc6f.png Conteúdo do livro Você sabia que a gestão estratégica auxilia as organizações na busca pelo sucesso? Orientar a empresa por meio de uma gestão estratégica é uma das melhores ações táticas para conduzi-la a bons resultados. Diante das inúmeras opções que os consumidores têm diariamente, é necessário desenvolver um posicionamento estratégico para a criação de valor ao invés de centralizar-se somente em minimizar custos finais para os clientes. No capítulo Gestão estratégica, da obra Planejamento estratégico, você vai estudar a gestão estratégica, analisando suas características e relacionando-a à governança corporativa. Boa leitura. PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO Arianne Guazzelli Gestão estratégica Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Definir gestão estratégica. Identificar as principais características da gestão estratégica. Relacionar gestão estratégica e governança corporativa. Introdução O mercado está cada vez mais competitivo e dinâmico. Assim, a gestão estratégica é uma premissa para que as empresas consigam lidar com as adversidades do ambiente, uma vez que visa administrar os recursos no intuito de atingir os objetivos previamente definidos pela organização, traçando planos estratégicos que passam toda a estrutura organizacional. Outra maneira de sobreviver às adversidades do mercado e, além disso, al- cançar o sucesso é aliar a gestão estratégica à governança corporativa por meio de um sistema de controle que promova relacionamentos e com- promisso entre todos os interessados, incluindo líderes e colaboradores. Neste capítulo, estudaremos o conceito de gestão estratégica, apon- taremos as suas características fundamentais e, por fim, consideraremos a sua relação com a governança corporativa. Evolução histórica da gestão estratégica A gestão estratégica surgiu como disciplina infl uenciada pela economia e pela sociologia, sendo considerada uma evolução da Teoria das Organizações, de Max Weber (1864–1920). Conquistou notoriedade nos âmbitos empresarial e acadêmico a partir da década de 1950, embora o seu progresso tenha ocorrido somente nos anos seguintes, entre 1960 e 1970. O propósito central dessa ação tática que auxilia as organizações na busca pelo sucesso é integrar ambiente, empresa e estratégia de maneira sinérgica, ou seja, de forma que conversem entre si (BHALLA et al., 2009). A gestão estratégica é um modelo sistemático para a administração de mudanças e inclui: posicionamento da empresa por intermédio de planejamento e estratégias organizacionais; resposta estratégica rápida para administrar problemas; gestão sistemática da resistência durante a implementação da estratégia. Stead e Stead (2008) afirma que a gestão estratégica nasceu com a definição de políticas empresariais. Nesse contexto, a empresa era percebida como um sistema que empregava recursos econômicos com eficiência e governava as ações funcionais com o propósito de gerar lucro. Por outro lado, Porth (2011) defende que a gestão estratégica surgiu como um fragmento presente no pla- nejamento estratégico, atualmente conhecido como uma das suas principais ferramentas. Segundo o autor, o planejamento foi assimilado pela gestão, que unificou os dois procedimentos no mesmo processo. Na gestão estratégica, é necessário relacionar diversos aspectos em um planejamento estratégico adequado para não apenas minimizar os custos finais, mas também para criar valores e cumprir com os objetivos da organização. Por meio dela, desenvolve-se um posi- cionamento para a criação de valores em vez de focar-se somente em minimizar os custos finais para os clientes. Para que isso ocorra, uma série de aspectos devem ser analisados e relacionados com vistas a atingir os objetivos previamente definidos pela organização. Ainda, a gestão estratégica pode ser definida como um procedimento cruzado de elaboração, implementação e avaliação das deliberações quali- ficadoras das empresas cujo objetivo é determinar a missão da organização, atingi-la e, também, criar valor para os produtos ou serviços oferecidos aos clientes. Esse processo enfatiza diversas indagações indispensáveis sobre o caráter da empresa: Qual é o negócio da empresa? Em que a empresa deseja transformar-se? Qual é o público-alvo da empresa? O que cria valor para os seus clientes atuais e em potencial? Gestão estratégica2 Fundamentado nas respostas a essas questões, o processo de gestão estratégica auxilia a determinar a direção futura da organização com o intuito de gerar valor para os clientes e, por conseguinte, para a empresa como um todo (PORTH, 2011). Segundo Grant (2002), a gestão estratégica abrange um profundo relacionamento entre o intuito da empresa, os resul- tados que ela alcança e as demais variáveis relativas aos seus ambientes interno e externo. Assim, para realizar um bom desenvolvimento da gestão, é necessárioidentificar as relações entre sistema de gestão, estratégia ele- gida, estruturas do momento, capacidades e recursos disponíveis. Ademais, a gestão estratégica também poder ser entendida a partir do seu foco em assuntos que envolvem sustentabilidade nas vantagens competitivas ou a procura por essa espécie de vantagem (BOWMAN; SINGH; THOMAS, 2006). A gestão estratégica também pode ser conceituada como um processo contínuo que abrange os esforços dos líderes para harmonizar a totalidade da empresa em relação aos seus ambientes interno e externo a fim de criar vantagens competitivas. Tais vantagens oferecem à organização a oportu- nidade de usufruir das oportunidades que se apresentam e minimizar as ameaças já presentes no ambiente. Todavia, para a criação dessas vantagens competitivas, a gestão deve iniciar-se com base nas perspectivas sobre o que a organização é e o que ela pretende tornar-se, pois somente com o conhecimento das suas competências distintivas é que as estratégias, em todos os níveis, podem ser constituídas com vistas a cumprir com os objetivos corporativos em harmonia com o ambiente externo. Assim, a gestão estratégica exige a determinação da missão e dos propósitos da empresa nos âmbitos tanto do ambiente interno quanto do externo (STEAD; STEAD, 2008). Formada por análises, definições, atividades empreendidas para con- ceber e sustentar vantagens competitivas, Dess, Lumpkin e Eisner (2007) explicam que a gestão estratégica deve tornar-se um processo e a orien- tação para todas as atividades executadas pela empresa. De acordo com o entendimento desses autores, há dois princípios que residem no cerne dessa espécie de gestão: A execução contínua de três processos — análise, decisão e ação. A natureza de investigar por que algumas empresas possuem um me- lhor desempenho do que as demais, o que reporta às já comentadas vantagens competitivas. 3Gestão estratégica Além disso, os teóricos também indicam quatro atributos fundamentais para a gestão estratégica: desenvolver-se com vistas a atingir as metas globais da empresa; englobar diversos stakeholders no processo de tomada de decisão; incorporar concepções de longo e curto prazos; abranger o reconhecimento de trade-offs entre eficiência e efetividade. A gestão estratégica desenvolve as percepções de estratégia empresarial presentes no dia a dia das organizações, uma vez que incorpora as análises dos ambientes interno e externo para aumentar a utilização de recursos com o intuito de alcançar os objetivos definidos. Dessa maneira, a gestão estra- tégica proporciona um modelo de desenvolvimento de habilidades para que as empresas se precipitem às mudanças em vez se serem surpreendidas por imprevistos. Além disso, auxilia a desenvolver capacidades específicas para tratar incertezas futuras por meio da determinação de atividades para efetivar as metas da empresa (BRACKER, 1980). Fundamentados no que aprendemos até aqui, percebemos que há muitas definições possíveis para o conceito de gestão estratégica, visto que o planeja- mento estratégico é um campo de estudos em expansão, de modo que existem divergências e níveis relativamente baixos de produção acadêmica ainda hoje (BOYD; FINKELSTEIN; GOVE, 2005). Nos dias atuais, a gestão estratégica é uma das áreas mais ágeis no que tange a desenvolvimento teórico e prático, tendo em vista a criação de vários modelos de análise de mercado a partir da década de 1960, como o modelo SWOT (do inglês strengths, weaknesses, opportunities e threats), a matriz BCG, a curva de experiência e a análise de portfólio, além de relevantes conceitos, como os de análise de conduta, desem- penho, estrutura econômica, competências essenciais, distintivas e sistemas de planejamento estratégico (MINTZBERG; AHLSTRAND; LAMPEL, 2010). Dess, Lumpkin e Eisner (2007) corroboram ao afirmar que essa área é uma das mais relevantes atualmente, pois é capaz de criar um conjunto de atividades gerenciais que garantam aos líderes da organização conservá-la integrada ao seu meio e no caminho mais adequado para o seu progressivo desenvolvimento, proporcionando que os objetivos e a missão empresariais sejam alcançados. Gestão estratégica4 É importante recordarmos que gestão estratégica e planejamento estratégico não são sinônimos, isto é, não compartilham o mesmo conceito, já que são distintos um do outro. Entretanto, a gestão deve estar em total harmonia com o planejamento, pois é preciso pensar nele, que é o pilar de sustentação de toda e qualquer organização, antes de implantar-se o processo de gestão estratégica. Principais características da gestão estratégica De acordo com Hunger e Wheelen (2002), a gestão estratégica apresenta três elementos indispensáveis ao seu desenvolvimento: análise sistemática do ambiente, formulação e implementação da estratégia. Os líderes da empresa devem realizar um estudo sistemático do ambiente externo, examinando a existência de forças e fraquezas, com o objetivo de mapear oportunidades e ameaças que possam recair sobre o ambiente interno. Esses elementos, que correspondem às mencionadas forças, fraquezas, oportunidades e ameaças, são analisados com o auxílio da matriz SWOT, sendo reconhecidos como fatores estratégicos, indispensáveis para o futuro da empresa. A gestão estratégica organiza os atributos que os vários setores têm a dar para a organização, de modo a guiar a integração dos esforços exprimidos pelos diversos especialistas distribuídos pela empresa. Essa gestão impossibilita o individualismo de cada setor, pois entende que os objetivos são de todos para todos. Contudo, ainda podemos constatar tal individualismo em certos setores quando simplesmente ignoram as necessidades e os interesses do coletivo, que inclui clientes, acionistas, fornecedores, entre outros, pois se preocupam apenas com o conjunto de interessados que lideram, denominados stakeholders. Além de integrar esforços para criar vantagens competitivas, a gestão estratégica possibilita uma visão temporal mais propícia à sobrevivência corporativa, tanto a curto quanto a longo prazo (MILLER; DESS, 2011). Em síntese, essa forma de gestão caracteriza-se por analisar o que foi pla- nejado pela organização e o que de fato é implementado para, assim, assegurar que os propósitos definidos sejam conquistados da maneira mais coerente possível. Para isso, é necessário que a organização realize a análise, a formu- lação e a implementação da estratégia. Posto isso, nos próximos parágrafos comentaremos com maiores detalhes cada uma dessas três etapas e os diversos níveis que integram o processo de formulação da estratégia. 5Gestão estratégica Análise estratégica Indispensável à criação de uma estratégia que esteja em concordância com todo o processo, a análise estratégica ocorre em três partes: objetivos estratégicos; ameaças e oportunidades; fraquezas e forças. Nesse contexto, o desenvolvimento da missão, da visão e dos valores guia os esforços dos líderes e colaboradores em uma mesma direção. Os objetivos estratégicos, por sua vez, possuem dois focos distintos nas empresas: o alvo a atingir e o elemento concentrador que permite que a empresa chegue a esse alvo. Lembremos que as finalidades sempre devem ser consideradas de acordo com as circunstâncias enfrentadas pela empresa no momento. O estudo das forças, fraquezas, oportunidades e ameaças, que se concentra na matriz SWOT, é composto pela relação das forças e fraquezas internas em função das oportunidades e ameaças do ambiente externo. Dessa reflexão, resulta o sucesso da gestão estratégica. Por exemplo, novos clientes são recursos externos que podem colaborar com o crescimento da organização, motivo pelo qual são interpretados como oportunidades. Entretanto, esse mesmo ambiente que oferece oportunidades para a empresa pode apresentar ameaças, como no caso de concorrência. Assim, para desenvolver estratégias atrativas, os líderes precisam conheceros limites e as capacidades da organização. Ademais, é durante a análise estratégica que nascem forças, como mão de obra extremamente qualificada, mas também fraquezas, como sistemas de informação ultrapassados (MILLER; DESS, 2011). Formulação da estratégia Uma análise estratégica apropriada serve como base para a formulação da estratégia, que acontece em quatro níveis: de negócios, funcional, empresarial e internacional. Esses níveis partem do pressuposto de que as organizações se compõem de negócios e os negócios, de funções. Na hipótese de uma empresa que possui negócios em dois países ou mais, desenvolve-se o nível internacional (MILLER; DESS, 2011). Gestão estratégica6 Nível de negócios É considerado o nível mais relevante, pois é o momento em que a organização intenta elevar a sua presença no mercado e ultrapassar as concorrentes. Uma organização com diversos itens no mercado deve estudar em qual setor de negócios cada um dos seus bens ou serviços se situará. Assim, se a estratégia abranger mais do que um dos itens ou mercados, esses bens ou serviços po- dem estar presentes nas mesmas unidades estratégicas de negócios (strategic business unit [SBU]). Caso ela não ampare, as ações sobre esses itens devem ser distribuídas em diferentes unidades estratégicas de negócios. O caso dos negócios individuais é um dos exemplos mais simples, pois esse tipo de negócio concentra a gestão estratégica em um só ponto (MILLER; DESS, 2011). Nível funcional As vantagens competitivas que tornam a ascensão do negócio ou da área de negócios provável dependem da imagem e do valor que a empresa entrega ao seu público-alvo. Esse valor precisará ser expandido em funções conhecidas como primárias. Já as secundárias, como a administração de sistemas de informação e recursos humanos, também geram valor aos consumidores, contudo de maneira indireta se comparadas às funções primárias (MILLER; DESS, 2011). Nível empresarial Uma organização cresce por meio da inserção de áreas de negócios, ou seja, em função da multiplicidade de negócios. Dessa forma, as estratégias mais atraentes com vistas a diversifi car os setores de atuação são aquelas nas quais a organização focaliza os seus conhecimentos nas áreas problemáticas ou restritas. Trata-se de setores onde o conhecimento está presente apenas em um pequeno grupo e geralmente não é transmitido, o que origina a denominação competências fechadas. Em uma organização cujas forças são competências fechadas, pode haver uma excelente oportunidade de diversifi cação de negócios. As estratégias presentes no nível empresarial, com apoio na diversificação, são desenvolvidas de forma mais adequada quando contam com a análise dos requisitos para sucesso a nível dos negócios, que se encontra na criação de valor para o consumidor no nível funcional. Assim, a formulação da estratégia deve conjugar-se de maneira restrita com os três níveis descritos para, desse modo, aumentar a própria eficácia (MILLER; DESS, 2011). 7Gestão estratégica Nível internacional No desenvolvimento da estratégia, as empresas mais complexas não apresentam desafi os apenas nos níveis de negócios, funcional e empresarial. Para atuar em outros países, cujas características socioculturais e político-econômicas são diferentes das do seu país de origem, as multinacionais encaram desafi os que ultrapassam o nível nacional. Nesse contexto, para alcançar certa fl exibilidade nos mercados locais, algumas organizações concedem autonomia completa às suas unidades de negócio espalhadas pelo mundo, estratégia conhecida como multinacional, segundo a qual cada unidade é a única incumbida pelo mercado que integra. Por outro lado, há a estratégia global, que objetiva aproveitar ao máximo as forças da organização por meio da centralização das operações. Ademais, existem também as estratégias híbridas, criadas com o intuito de aproveitar o melhor de ambas as estratégias, sejam elas globais ou multinacionais (MILLER; DESS, 2011). Implementação da estratégia A implementação da estratégia remete ao modo de converter as estratégias pretendidas em estratégias realizadas e é composta por integração, estrutura organizacional, controle e liderança. Para a concepção integral de uma estratégia, são indispensáveis diversas formas de integração, sendo que uma delas é a união dos elementos presentes no âmbito interno da empresa, ação indispensável à implementação da estratégia pretendida. Outra expressão de integração consiste em unir funções a negócios, negócios a organizações e operações internacionais a multinacionais. Entretanto, o mais difícil é unir as metas de curto prazo às de longo prazo, presentes na missão e na visão da empresa. Para a implementação de uma estratégia na organização, alguns pontos são fundamentais, tais como a delegação de responsabilidades e a presença de canais de comunicação, pois apoiam os líderes no desenvolvimento da estrutura organizativa. É necessário controlar esse processo por causa de dois motivos basilares: para conservar os esforços focados nas mesmas metas e para proceder com as modificações sempre que necessário, isto é, quando surgirem imprevistos. Os instrumentos utilizados pelos líderes para efetivar esse controle e estimular ou reprimir determinadas atitudes dos funcionários podem ser prêmios ou compensações, regras explícitas ou a própria cultura da empresa. Nesse contexto, os gestores são os arquitetos da estrutura organizativa e os engenheiros dos sistemas de controle da empresa são, em síntese, a principal força de implementação da estratégia. Gestão estratégica8 A cultura da organização é utilizada para transportar as visões e ajustar as ideias, de maneira a motivar os comportamentos e os pensamentos dentro da empresa. Assim, a ética é um elemento indispensável e cuja responsabili- dade recai sobre os líderes, já que é um dos elementos mais importantes da cultura da organização, sendo imprescindível à sua sobrevivência no mercado (MILLER; DESS, 2011). A gestão estratégica é bastante eficiente na conscientização dos colaboradores da organização no que tange às suas responsabilidades enquanto funcionários e pode interferir de modo positivo na elevação da produtividade e da competitividade do negócio. Além disso, a gestão é capaz de auxiliar os líderes na destinação correta de recursos, no aumento da rentabilidade e na minimização de desperdícios. Portanto, é na gestão estratégica que a empresa deve basear-se para melhorar de forma contínua o seu negócio e, assim, garantir sobrevivência no mercado, tanto a curto quanto a longo prazo. Gestão estratégica e governança corporativa Como já mencionamos, a gestão estratégica organiza as características presen- tes em inúmeras áreas da empresa a fi m de aproveitá-las para gerar vantagem competitiva, de modo a confi gurar-se como a base para a integração dos esforços desenvolvidos pelos diversos especialistas presentes na empresa. Mas, afi nal, o que é a governança corporativa? A governança corporativa é definida como o sistema pelo qual as empresas são dirigidas, monitoradas e incentivadas, abrangendo os relacionamentos entre donos, conselho de administração, diretoria e órgão de controle. Essas condutas fazem com que as informações perpassem a organização e transfor- mem as suas concepções, bem como as recomendações práticas e objetivas de acordo com os interesses de preservação e otimização do valor da empresa, o que colabora com a sua sustentabilidade e longevidade (INSTITUTO BRA- SILEIRO DE GOVERNANÇA CORPORATIVA, 2015). Silva (2006) afirma que a governança cuida dos interesses dos acionistas em conexão com os relacionamentos com a direção executiva e os conselhos de administração, mas também pode influenciar outras partes interessadas, seja elas externas, tais como fornecedores, clientes, governo, sociedade, ou internas, como no 9Gestão estratégica caso de colaboradores e terceirizados. Lameira (2007), por seu turno, tece aressalva de que a governança corporativa gera uma maior dificuldade decisória, pois a pessoa ou o grupo enfrenta dificuldades na escolha de uma alternativa de ação ao defrontar-se com um motivo. Conforme o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (2015), a governança corporativa se forma com base nos seguintes atributos: Transparência — visa expor às partes interessadas as informações que sejam do seu proveito, não somente por determinação legal. Equidade — o apoio é constituído pelo tratamento pautado em princí- pios de justiça e isonomia por parte de todos os stakeholders, sejam eles sócios, diretores ou outros. Logo, é preciso atentar aos seus direitos, deveres, desejos e expectativas. Prestação de contas — aqueles que ocupam o lugar da governança cor- porativa (sócios, diretores, conselho de administração, etc.) necessitam efetivar a prestação de contas de forma clara, precisa, compreensível e apropriada. A importância dessa prática reside no fato de que, assim, a governança pode responder pelas suas ações ou omissões frente aos interessados, além de ser solicitada a agir com precaução, diligência, cautela e responsabilidade. Responsabilidade corporativa — os encarregados pela governança de- vem cuidar da efetividade, da exequibilidade e dos aspectos econômico- -financeiros da empresa com foco em reduzir externalidades negativas dos negócios e operações, além de aumentar as impressões positivas, atentando ao modelo de negócios, aos diversos capitais (financeiro, manufaturado, intelectual, humano, social, ambiental, reputacional, etc.) a curto, médio e longo prazo. Assim, a governança corporativa atua como ferramenta da gestão es- tratégica, tendo em vista que entre os seus principais atributos estão a transparência, a responsabilidade corporativa, a prestação de contas e a equidade, além de possuir a excelência como uma das suas diretrizes. A transparência possibilita que os acionistas conquistem mais confiabilidade nos relatórios exibidos pelos líderes no mercado. A prestação de contas, por sua vez, minimiza a propensão do uso incorreto de recursos e esti- mula a boa administração deles. Já a equidade assegura que os acionistas Gestão estratégica10 possuam direitos iguais. Por fim, a responsabilidade corporativa visa impedir a administração incorreta, posto que responsabiliza os líderes que procedem de má fé pelos seus atos administrativos. Fundamentada nesses atributos, a governança propõe-se a apresentar informações com qualidade e confiabilidade superiores. As organizações podem equiparar a governança corporativa à gestão es- tratégica e averiguar os resultados positivos no tangente à administração de recursos e na conquista de investidores. Por meio dessa forma de governança, é possível negociar com investidores, pois a organização compromete-se a prestar contas e a ser transparente, o que torna o negócio atrativo aos investidores. Contudo, a organização que introduz a governança corporativa assume os custos da sua implantação, embora possa procurar investidores que aceitem uma taxa de retorno de investimento mais baixo. Afinal, a empresa enfatiza as suas boas condutas e defende os acionistas publicamente. Com isso, obtém um rendimento maior, dada a economia no custo de captação de recursos e no endividamento menor, uma vez que o valor empreendido para procurar investidores no mercado é mais baixo do que a busca por financiamentos ou empréstimos em instituições financeiras. A gestão empresarial corresponde ao processo geral de tomada de decisões em uma organização, ao passo que a governança corporativa é o conjunto de regras e práticas que garantem que a organização cumpre, de fato, com os seus deveres frente aos stakeholders. Na negociação competitiva, tanto a empresa quanto o investidor pos- suem interesses: a organização no sentido de ter um acionista com custo menor e o investidor ao realizar um investimento de menor risco. Assim, o modelo de gestão que emprega a governança corporativa protege o direito dos acionistas, de forma que as organizações a utilizam como uma das suas estratégias para captar e manter investidores por um custo mais baixo (ROMANA, 2014). 11Gestão estratégica Uma organização que emprega a governança corporativa dispõe de mais credibilidade perante investidores. Para iniciar essa forma de governança, alguns dispositivos possíveis são a criação de diretorias temáticas (finanças, comercial, fiscal, etc.), a instauração de um conselho administrativo ou consultivo, entregas de relatórios periódicos, ferramentas de gestão, auditorias independentes, entre outros. Para saber mais sobre essas práticas, sugerimos a leitura de “3 práticas de governança corporativa essenciais às empresas”, da revista Exame, disponível no link a seguir. https://goo.gl/z7UjYW BHALLA, A. et al. Exploring alternative strategic management paradigms in high-growth ethnic and non-ethnic family firms. Small Business Economics, v. 32, n. 1, p. 77-79, 2009. Disponível em: <https://link.springer.com/article/10.1007/s11187-007-9064-z>. Acesso em: 16 out. 2018. BOWMAN, E. H.; SINGH, H.; THOMAS, H. The domain of strategic management: history and evolution. In: PETTIGREW, A.; THOMAS, H.; WHITTINGTON, R. (Org.). Handbook of strategy and management. Londres: Sage, 2006. BOYD, B. 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