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1 Louyse Jerônimo de Morais Introdução O apêndice é um resquício embrionário, que em outros mamíferos tem função fundamental, mas para os humanos, não. Trata-se de um “mini” intestino, medindo alguns centímetros, com uma luz diminuta, e que contém mucosa, submucosa, muscular e serosa, com função secretória e sendo colonizado por bactérias. Ele tem alça fechada e drena para o ceco. O ponto tradicional de localização do apêndice é o ponto de McBurney, sendo o ponto da projeção cutânea mais provável de achar o apêndice de alguém. A tendência da dor de uma apendicite é se localizar nessa região, que envolve a fossa ilíaca direita. Sobre as diferentes localizações que o apêndice pode ocupar, vale ressaltar, por exemplo, que gestantes têm o ceco mais para cima, tem gente com má rotação intestinal, em que o ceco vai para a esquerda etc. Então, a clínica pode variar em função da localização do ceco e, consequentemente, do apêndice. Além disso, a grosso modo, um lado do apêndice está fixado no ceco, o outro lado fica balançando e pode apontar para qualquer parte do abdome. Isso significa, também, que o paciente pode sentir dor na região lombar, no flanco etc. Em termos estatísticos, em cerca de metade dos casos, o apêndice está no ponto de McBurney. Na outra metade, por outro lado, a dor é em outro lugar. A apendicite é uma condição muito comum de abdome agudo. Quando você pegar um abdome agudo inflamatório, se apendicite não for a primeira opção diagnóstica, obrigatoriamente, deve ser a segunda hipótese. Então, sempre pense em apendicite em situações de abdome agudo inflamatório. Fisiopatologia Todo o processo fisiopatológico começa por uma obstrução, uma vez que o apêndice tem fundo cego. Isso pode ocorrer por fecálito, hiperplasia linfoide, neoplasia, áscaris etc. A causa mais comum é o fecálito. Sequência de eventos A luz do apêndice é rica em bactérias, mas esse órgão também secreta, então, se houver obstrução, ocorre distensão e proliferação bacteriana importante. • Bactérias mais envolvidas: B. fragilis, E. coli. Lembrando que a inflamação é polimicrobiana. o Bacteroides fragilis é um anaeróbio estrito, já a E. coli pode se comportar como aeróbio ou anaeróbio. Como é uma alça muito pequena e está obstruída, a tensão aumenta cada vez mais, gerando inflamação. A grande forma de irrigação do intestino é de fora para dentro. Os vasos mesentéricos margeiam as alças intestinais e mandam ramos perfurantes. Então, qualquer situação de aumento da pressão intraluminal dificulta o sangue entrar. Dessa forma, após 12h, pode evoluir com diminuição do suprimento arterial e necrose da parede do apêndice. Em 48h, pode acontecer a grande complicação da apendicite, que é a perfuração. Essa é a complicação fisiopatológica mais comum. Clinicamente, a perfuração pode causar: 1) abscesso [perfuração tamponada pelo omento e/ou mesentério] e 2) peritonite difusa. A partir da perfuração, vem as duas consequências clínicas supracitadas, sendo que, das duas, o mais comum é o abscesso. • Perfil epidemiológico da apendicite: homens jovens. • Idoso, criança, imunodebilitado: o omento não é tão redondo, então não consegue chegar lá e tamponar, espalhando muito mais. Por conta disso, o prognóstico é pior nessas pessoas. Inicialmente, ocorre distensão do peritônio visceral, que contém neurônios com fibras amielinizadas, ou seja, não conduzem impulso nervoso corretamente. Não se consegue, portanto, localizar a dor, inicialmente, manifestando-se como um desconforto a esclarecer. A dor vai ser representada de acordo com o desenvolvimento embrionário do órgão. Como o apêndice vem do intestino médio, é representado no meio da barriga. Em resumo, começa como uma dor vaga, mesogástrica ou periumbilical e visceral. O desconforto 2 Louyse Jerônimo de Morais dura cerca de 12h. Quando ocorre necrose da parede do apêndice, chega no peritônio parietal, que é inervado por neurônios mielinizados. Então, consegue- se conduzir o estímulo nervoso corretamente. A dor migra para a fossa ilíaca direita. Quando chega lá, é porque tem uma peritonite localizada. Uma das formas de avaliar é através do sinal de blumberg. Clínica • Dor [mesogastro, migra em 12h para FID] • Anorexia, náusea, vômito, febre baixa. • A leucocitose não chama muita atenção. • Quando complica: plastrão ou abscesso palpável, peritonite difusa. Manifesta-se com um quadro mais toxigênico, febre alta e leucocitose importante. A manifestação clínica é muito característica. Então, o diagnóstico é eminentemente clínico. Sinais clássicos • Sinal de Blumberg: descompressão brusca dolorosa. • Sinal de Rovsing: dor na FID após compressão da FIE. • Sinal de Dunphy: dor na FID que piora com a tosse. • Sinal do obturador: dor hipogástrica com a rotação interna da coxa direita flexionada. • Sinal do Psoas: dor à extensão da coxa direita com o paciente em decúbito esquerdo. Diagnóstico • Clínico: história clássica em homem - adolescente e adulto jovem. o Dúvida: idoso, criança, mulheres, obesos, gestantes. o Na gestante, a principal complicação não obstétrica é a apendicite. • Imagem: TC [padrão-ouro] ou USG/RM [para crianças e gestantes] Tratamento • Simples [< 48h de evolução e sem complicações]: ATB profilático + apendicectomia [aberta ou vídeo] • Suspeita de complicação: > 48h ou massa palpável. o Peritonite difusa: ATB terapêutico [7 a 10 dias] + cirurgia de urgência. o Sem peritonite difusa: exame de imagem para avaliar se tem ou não abscesso [que pode estar escondido]. ▪ Sem complicação: trata igual apendicite simples. ▪ Fleimão: parede espessada, com coleção líquida em volta, “meio do caminho para virar abscesso”; ATB por 7 a 10 dias +/- colono [após 4 a 6 semanas] +/- cirurgia [após 6 a 8 semanas]. Deve-se esperar o processo esfriar para poder operar o doente. Chamamos isso de apendicectomia de intervalo. ▪ Abscesso: acima de 4 cm; ATB 7 a 10 dias + drenagem percutânea guiado por USG ou TC +/- colono [após 4 a 6 semanas] +/- cirurgia após 6 a 8 semanas. Quando e por que se indica colonoscopia após 4 a 6 semanas na presença de fleimão? Quando o paciente tiver mais que 40 anos de idade, para fazer diagnóstico diferencial com câncer. Existe uma corrente, hoje em dia, que fala a favor do tratamento clínico da apendicite, apenas com antimicrobianos, embora exista um risco de recorrência. As pessoas operam porque a cirurgia é simples, tem morbimortalidade baixa e recorre se não operar. QUESTÕES 1. Homem, 26 anos, com febre, dor abdominal e perda de apetite há 12h. Exames laboratoriais mostram discreta leucocitose. TC do abdome abaixo. A hipótese mais provável é: a. Doença inflamatória intestinal b. Apendicite aguda c. Diverticulite de Meckel d. Apendagite epiploica aguda 2. Um paciente de 15 anos de idade foi ao PS com quadro de dor abdominal há 36h, a princípio mesogástrica, que se localizava em fossa ilíaca direita. No exame físico abdominal, defesa e dor à percussão na FID. Com base nesse caso, assinale a melhor conduta: 3 Louyse Jerônimo de Morais a. USG de abdome b. TC de abdome c. Alta hospitalar, com prescrição de ATB d. Apendicectomia por laparotomia mediana e. Apendicectomia por incisão de McBurney 3. Durante a avaliação de um paciente jovem com dor em FID, são sinais clínicos que nos levarão à suspeita de apendicite aguda, exceto: a. Sinal de Dunphy b. Sinal do obturador c. Sinal de McBurney d. Sinal de Rovsing 4. Paciente de 62 anos, com dor em FID há 3 dias, associada à distensão abdominal. Nega febre. Exame físico com dor localizada, porém sem evidente contratura. A conduta correta é: a. Exame de sangue e imagem tomográfica b. Exame de sangue e laparotomia imediata c. Observaçãode 8 horas no pronto- socorro d. Exame de sangue e imagem de ultrassonografia e. Sem exame e laparotomia 5. Homem de 37 anos refere dor abdominal em FID há 12 dias, acompanhada de febre de até 38°C, perda de apetite e queda do estado geral. Procurou serviço de urgência por duas vezes e há 6 dias foi iniciado ciprofloxacino devido à hipótese de infecção urinária. Retorna hoje ao PS devido à persistência do quadro. Ao exame clínico, REG, febril, FC 90, PA 130x80 mmHg; tórax sem alterações. Abdome flácido, massa palpável de cerca de 10 cm na fossa ilíaca e flanco direito, dor localizada na região da massa. Sem sinais de irritação peritoneal. Toque retal sem alterações. Exames laboratoriais mostram Hb = 14,6 g/dL, leuco 26,57 mil/mm³, PCR 324 mg/dL, creatinina 1,37 mg/dL, ureia 51 mg/dL, demais exames normais. Realizada TC de abdome. Qual é o melhor tratamento? a. Laparotomia exploradora e apendicectomia b. Apendicectomia por incisão de McBurney c. Drenagem da coleção por laparotomia mediana d. Drenagem percutânea da coleção 6. O sinal de Dunphy é caracterizado pelo aumento da dor abdominal nos pacientes com apendicite aguda em qual dessas situações? a. Quando o paciente urina b. Quando o paciente evacua c. Quando o paciente se alimenta d. Quando o paciente dorme e. Quando o paciente tosse 7. Rapaz de 24 anos com queixa de dor de início periumbilical incaracterística, depois migrando para a FID, acompanhado de náuseas, anorexia e febre de 38°C, informa que tem 24h do início do quadro. Qual é o exame complementar de imagem a ser solicitado e qual dos seguintes diagnósticos é mais provável? a. USG de abdome e apendicite aguda b. TC de abdome a apendicite crônica c. Nenhum exame de imagem e apendicite aguda d. TC de abdome e pancreatite aguda e. TC de abdome e intussuscepção GABARITO: B, E, C, A, D, E, C
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