Buscar

6-Alimentação de crianças e adolescentes_ necessidades nutricionais e cultura alimentar contemporânea

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 122 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 122 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 9, do total de 122 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

ALIMENTAÇÃO DE 
CRIANÇAS E ADOLESCENTES: 
NECESSIDADES NUTRICIONAIS 
E CULTURA ALIMENTAR 
CONTEMPORÂNEA
Programa de Pós-Graduação EAD
UNIASSELVI-PÓS
Autoria: Ana Paula Silva
CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI
Rodovia BR 470, Km 71, no 1.040, Bairro Benedito
Cx. P. 191 - 89.130-000 – INDAIAL/SC
Fone Fax: (47) 3281-9000/3281-9090
Reitor: Prof. Hermínio Kloch
Diretor UNIASSELVI-PÓS: Prof. Carlos Fabiano Fistarol
Equipe Multidisciplinar da Pós-Graduação EAD: 
Carlos Fabiano Fistarol
Ilana Gunilda Gerber Cavichioli
Cristiane Lisandra Danna
Norberto Siegel
Julia dos Santos
Ariana Monique Dalri
Marcelo Bucci
Revisão Gramatical: Equipe Produção de Materiais
Diagramação e Capa: 
Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI
Copyright © UNIASSELVI 2019
Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri
 UNIASSELVI – Indaial.
SI586a
Silva, Ana Paula
Alimentação de crianças e adolescentes: necessidades nutri-
cionais e cultura alimentar contemporânea. / Ana Paula Silva. – Indaial: 
UNIASSELVI, 2019.
122 p.; il.
ISBN 978-85-7141-338-2
ISBN Digital 978-85-7141-339-9
1. Crianças - Nutrição. - Brasil. 2. Adolescentes – Nutrição. – Bra-
sil. II. Centro Universitário Leonardo Da Vinci.
CDD 612.3
Impresso por:
Sumário
APRESENTAÇÃO ..........................................................................05
CAPÍTULO 1
História da Alimentação ............................................................... 7
CAPÍTULO 2
Alimentação na Contemporaneidade ........................................ 43
CAPÍTULO 3
A Importância de Uma Boa Alimentação na
Infância e na Adolescência ......................................................... 87
APRESENTAÇÃO
Em conformidade com os princípios do saber-fazer da Uniasselvi, este livro 
busca embasar o acompanhamento da disciplina Alimentação de crianças e ado-
lescentes: necessidades nutricionais e cultura alimentar contemporânea a 
partir de informações, reflexões e atividades que abordam o tema estudado de uma 
maneira holística e consistente em relação aos estudos clássicos, às pesquisas 
mais atuais e às normas que orientam a alimentação de crianças e adolescentes. 
No primeiro capítulo “História da alimentação”, os alunos conhecerão o 
campo de estudos da alimentação e ao final deste, os acadêmicos estarão aptos 
a refletir como a alimentação se constitui como processos culturais e sociais di-
versos. Partindo da mesma perspectiva, eles poderão analisar como o hábito de 
comer foi se transformando ao longo da história ocidental e como a globalização 
afetou a prática de consumo de alimentos.
No segundo capítulo “Alimentação na contemporaneidade”, os acadêmi-
cos são convidados a refletir acerca da fome, um mal que afetou 815 milhões 
de pessoas, 11% da população global (ONU, 2017). O conteúdo deste capítulo é 
baseado em dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e da 
Organização das Nações Unidas (ONU) e convoca os alunos a discutirem sobre 
problemas e dilemas que abarcam o consumo de alimentos no mundo contem-
porâneo. Partindo do problema da desigualdade na distribuição e consumo de 
alimentos, é inserida a noção de insegurança alimentar. Em continuidade, explo-
ra-se a classificação dos alimentos em in natura/ minimamente processados, in-
gredientes culinários, processados e ultraprocessados, destacando especialmen-
te os malefícios dos ultraprocessados. Por fim, discutem-se as contradições que 
envolvem o uso de agrotóxicos na produção de alimentos. 
 
No terceiro capítulo “A importância de uma boa alimentação na infância 
e na adolescência”, trazemos informações e discussões a respeito da alimen-
tação de crianças e adolescentes, do nascimento à adolescência. São tratados 
aspectos como as recomendações básicas para cada faixa etária, a necessidade 
e a pertinência da adoção de políticas públicas, as doenças mais frequentes de-
correntes da má nutrição e as algumas ações possíveis para a promoção de uma 
vida saudável. 
Ao término desta disciplina o acadêmico terá construído um bom repertório 
cultural sobre a alimentação na contemporaneidade, sendo capaz de fazer rela-
ções entre alimentação, consumo, saúde e sustentabilidade; estará capacitado a 
pensar ações que visem a uma boa alimentação contribuindo para a criação de 
hábitos mais saudáveis entre crianças e adolescentes.
CAPÍTULO 1
História da Alimentação
A partir da perspectiva do saber-fazer, são apresentados os seguintes 
objetivos de aprendizagem:
� conhecer o campo de estudos da alimentação;
� identificar de que forma a alimentação constituiu processos culturais, 
econômicos e sociais diversos ao longo da história humana;
� analisar a historicidade das formas de aquisição, produção, circulação e 
consumo de alimentos;
� expressar a importância dos saberes culinários para diferentes épocas e 
culturas.
8
Alimentação de crianças e adolescentes: necessidades nutricionais e 
cultura alimentar contemporânea
9
História da Alimentação Capítulo 1 
1 CONTEXTUALIZAÇÃO
Este capítulo versa sobre a história da alimentação, um ramo do campo mais 
amplo que envolve os estudos da alimentação, cuja abordagem inclui diferentes dis-
ciplinas, como agronomia, antropologia, arqueologia, biologia, economia, geografia, 
nutrição, medicina e sociologia. Como vários outros assuntos que fugiam do campo 
da história política, a alimentação começou a ser abordada pelos historiadores so-
mente no século XX, a partir da obra do botânico suíço Adam Maurizio, publicada 
em 1926, que abordou sistemas alimentares da espécie humana desde a Pré-histó-
ria, superando as narrativas tradicionais sobre discursos e saberes botânicos, mé-
dicos e gastronômicos. Desde então, em diferentes países, surgiram histórias das 
alimentações nacionais, com destaque para Inglaterra, Estados Unidos e França, 
mas também para países latino-americanos, como México, Colômbia, Chile, Vene-
zuela e o Brasil, com destaque para a importante obra História da alimentação no 
Brasil, de Luís da Câmara Cascudo (1967-1968).
A obra do célebre historiador francês Fernand Braudel, Civilização material, 
economia e capitalismo (1979), aborda a alimentação na longa duração a partir do 
conceito de cultura material, que abrange aspectos elementares da vivência huma-
na, como, além do consumo de alimentos, a moradia e o vestuário. Neste âmbito, 
a alimentação se destaca como aspecto essencial das estruturas da vida cotidiana. 
Em 1996, veio a lume o importante livro de quase mil páginas organizado por Je-
an-Louis Flandrin e Massimo Montanari, História da alimentação, que busca adotar 
uma perspectiva universal (embora não consiga se desvencilhar totalmente do eu-
rocentrismo) a respeito de diferentes épocas e culturas alimentares. Outra enciclo-
pédia importante é Cambridge World History of Food, editada por Kenneth F. Kiple e 
Kriemhild Coneè Ornelas no ano 2000. No Brasil, destaca-se o livro “Comida e so-
ciedade: uma história da alimentação”, do historiador Henrique Carneiro, de 2003. 
Com base nessas obras de referência e em outros estudos monográficos, o 
propósito neste capítulo é propiciar uma visão ao mesmo tempo sintética e abran-
gente a respeito de processos e transformações históricas da relação dos seres 
humanos com os alimentos, da Pré-história ao tempo presente, evidenciando e pro-
blematizando as formas históricas de obtenção, circulação e consumo de alimentos.
2 TRANSFORMAÇÕES HISTÓRICAS 
DO ATO DE COMER
A alimentação atende à necessidade fundamental de garantia da nossa so-
brevivência enquanto espécie, mas sabemos que o consumo de alimentos vai 
10
Alimentação de crianças e adolescentes: necessidades nutricionais e 
cultura alimentar contemporânea
além da satisfação de uma necessidade biológica. As práticas alimentares dizem 
muito a respeito da cultura dos povos e integram o rol de elementos que distan-
ciam os seres humanos dos outros animais, tendo assumido ao longo da história 
complexos significados econômicos,linguísticos, sociais, políticos, médicos, reli-
giosos e até sexuais. 
Claramente não é por acaso que a viagem de recém-casados é chamada 
“lua de mel”, que algo muito simples é considerado “mamão com açúcar” e que se 
diz “devorar” um livro quando a leitura é realizada com grande interesse e afinco 
ou “digerir” uma notícia quando ela não corresponde às nossas melhores expec-
tativas. O ato de comer constitui um componente essencial da reprodução da vida 
cotidiana, gera tanto solidariedades quanto conflitos, povoa o imaginário popular, 
desafia o intelecto de acadêmicos dos mais variados campos de pesquisa e ocu-
pa lugar central em nossa constituição psíquica. 
Os hábitos alimentares vêm passando por transformações desde os primór-
dios da humanidade. Há dúvidas sobre quando exatamente cada alimento pas-
sou a fazer parte da alimentação humana, mas se sabe que desde a pré-história 
os hominídeos eram onívoros, isto é, comiam tanto vegetais quanto animais, mui-
to embora acredite-se que durante milhões de anos tenha prevalecido uma dieta 
composta por frutas, folhas e grãos coletados da natureza. 
O domínio progressivo do fogo, iniciado há cerca de meio milhão de anos, 
foi um feito de grande importância. Como destacou o antropólogo Claude Lévi-
-Strauss (1964), a passagem gradual do cru ao cozido marcou, além do desen-
volvimento das primeiras formas de cocção de alimentos e de modificações no 
processo de digestão e absorção das proteínas, a transição da condição biológica 
para a social dos seres humanos. 
As formas de aquisição de carne foram alvo de intenso debate 
entre os pesquisadores. Discutiu-se se e até que ponto os primeiros 
hominídeos, australopitecos e homo habilis, eram caçadores ativos 
ou meros ladrões de carniça. 
De todo modo, vestígios arqueológicos encontrados no oriente africano, 
datados entre 2,5 e 1,5 milhões de anos, indicam o consumo de animais de várias 
espécies e o desenvolvimento de instrumentos rudimentares de pedra lascada 
destinados à caça e ao preparo das presas. No Paleolítico Médio (200.000-
11
História da Alimentação Capítulo 1 
40.000 a.C.), a caça passaria por um processo notável de aprimoramento, mas 
continuaria sendo uma prática ocasional, feita por pequenos grupos e voltada a 
animais de grande porte, como ursos, rinocerontes e elefantes. 
Foi apenas no Paleolítico Superior (40.000-10.000 a.C.) que se disseminaram 
práticas de caça especializada, direcionada ao abate de manadas de renas, 
cavalos, bisões, auroques e mamutes. Tais caçadas demandavam a colaboração 
de muitos indivíduos. Acredita-se que famílias e grupos de famílias, que vivam 
separadamente a maior parte do ano, reuniam-se periodicamente para a 
realização das caçadas, as quais envolviam uma logística considerável, desde 
o fabrico de utensílios e a instalação de armadilhas, passando pela a realização 
do abate, o corte da carne, a distribuição e a estocagem, chegando até o 
tratamento e manufatura de peles, ossos e tripas. Esses processos, retratados 
com frequência nas pinturas rupestres (Figura 1), geraram formas de integração 
social, divisão sexual do trabalho e o desenvolvimento de mecanismos para a 
troca de informações. 
FIGURA 1 – PINTURA DE UM BISÃO EM UMA CAVERNA EM ALTAMIRA, ESPANHA
FONTE: Lockard (2014, p. 14)
Muitas pinturas rupestres representavam animais caçados ou temidos, 
sugerindo uma autoconsciência.
12
Alimentação de crianças e adolescentes: necessidades nutricionais e 
cultura alimentar contemporânea
Tão importante quanto a passagem da coleta para a caça em si, foi o 
desenvolvimento gradual de técnicas de armazenagem, trituração, secagem, 
defumação, desidratação, reidratação e cozimento de alimentos variados, tanto 
de origem animal quanto vegetal. Este movimento foi acompanhando por um 
notável crescimento demográfico e pela expansão da espécie humana a partir da 
África para os diversos rincões do planeta, incluindo, evidentemente, o continente 
americano (Figura 2). 
FIGURA 2 – MAPA DAS MIGRAÇÕES ORIGINÁRIAS DO HOMO SAPIENS PELO GLOBO
FONTE: Lockard (2014, p. 11)
No período Mesolítico (10.000-8.000 a.C.), com o derretimento das geleiras 
e o surgimento de florestas, houve uma maior diversificação alimentar. O porte da 
fauna reduziu, passando a prevalecer animais medianos e pequenos como cervos, 
javalis e cabritos. A captura das presas se tornou relativamente mais 
difícil, em compensação, muitas dezenas de espécies provenientes 
de hábitats e ecossistemas distintos puderam ser explorados. Não 
apenas vegetais, como legumes, oleaginosas e pequenos frutos, foram 
integrados à dieta, como também peixes, moluscos e aves bastante 
diversificados. 
A disponibilidade variável de recursos naturais gerou movimentos 
adaptativos distintos, de modo que alguns grupos mantiveram circuitos 
sazonais de ocupação e deslocamento no interior de determinados 
perímetros territoriais, enquanto outros iniciaram processos de 
“revolução neolítica”, 
por meio da qual 
a humanidade 
desenvolveu 
técnicas de criação 
de animais e 
cultivo sistemático 
de alimentos. Em 
outras palavras, 
trata-se do momento 
em que o homo 
sapiens inventou 
a agricultura e a 
pecuária.
13
História da Alimentação Capítulo 1 
sedentarização, dando origem às primeiras civilizações na Antiguidade. Nesta 
época, há cerca de 10 mil anos, teve início a chamada “revolução neolítica”, por 
meio da qual a humanidade desenvolveu técnicas de criação de animais e cultivo 
sistemático de alimentos. Em outras palavras, trata-se do momento em que o homo 
sapiens inventou a agricultura e a pecuária.
FIGURA 3 – MAPA DAS ORIGENS DA AGRICULTURA COM A INDICAÇÃO 
EM INGLÊS DAS PLANTAS E SUAS RESPECTIVAS ORIGENS
FONTE: Lockard (2014, p. 19)
As causas dessa revolução também foram bastante debatidas entre os espe-
cialistas. Alguns estudiosos acreditam que o desequilíbrio entre o crescimento das 
populações e a oferta natural de alimentos foi o fator decisivo, mas há pesquisas 
demonstrando que, no Oriente Médio, por exemplo, a revolução foi precedida por 
uma fase importante de aclimatação de plantas e desenvolvimento da caça, su-
gerindo um movimento, não de reação à escassez de recursos silvestres, mas de 
aprimoramento técnico e desenvolvimento civilizacional. 
Segundo Fernand Braudel (2005), a agricultura se organizou desde o princí-
pio em torno de certas plantas dominantes que marcaram profundamente a orga-
nização da vida material e até psíquica das populações a ponto de poderem ser 
denominadas “plantas de civilização”. Ao longo da história, três delas se destaca-
riam, trigo, arroz e milho, que até hoje disputam a maior parte das terras aráveis 
do globo. 
14
Alimentação de crianças e adolescentes: necessidades nutricionais e 
cultura alimentar contemporânea
A agricultura surgiu em vales férteis irrigados por grandes rios como o Jordão 
(Jericó), o Nilo (Egito), Eufrates e Tigre (Mesopotâmia), Amarelo e Yangtzé (Chi-
na) e Indo (Ásia Meridional). Nessas regiões despontaram alguns dos pilares de 
nossa alimentação, com a cultura de cereais, como o trigo (a planta cultivada mais 
antiga de todas), o centeio e a cevada. Esse processo histórico esteve associado 
a profundas transformações econômicas, com a produção de excedentes para o 
comércio e a concentração desigual de recursos; tecnológicas, com a criação de 
cerâmicas, mós de pedra, enxada, a roda, o arado, a charrua pesada, sistemas de 
irrigação, fornos para pão e assados diversos; religiosas, com o advento de uma 
série de crenças e rituais em torno da água, da fertilidade do solo e da colheita; e 
políticas, estando diretamente associada ao advento do Estado. 
O domínio sobre a produção de alimentos não é um acontecimento único, pre-
so a um único tempo e espaço, mas um processo plural, que se espalhou por di-
ferentes regiões do globo, em diferentes ritmos e épocas. É digno de destaque o 
cultivo do arroz, a partir de 2000 a.C., nos atuais Vietnã, Laos e Camboja,alastran-
do-se, mais tarde, pelo vale do Níger, na África, e em terras inundadas na China. 
Na América, o milho seria a base de numerosas civilizações já a partir do ter-
ceiro milênio a.C., muito antes de Astecas e Incas formarem seus impérios. Tubér-
culos em infindáveis variedades, como batata, batata-doce e mandioca, também 
distinguiriam a produção agrícola pré-colombiana, sustentando suas populações 
antes da chegada dos europeus. Ao cacau, além de seu uso culinário, seria atri-
buído valor monetário, circulando como dinheiro entre os astecas. Há indícios re-
motos do consumo de bebidas à base de cacau, como o xocoalt, que daria origem 
ao chocolate.
A pecuária também foi uma conquista essencial. Desde os primórdios, os 
animais seriam usados não apenas para a alimentação, mas também para tração 
e transporte. Entre muitos outros êxitos civilizacionais, a Mesopotâmia se notabi-
lizou pela criação dos primeiros rebanhos bovinos, ovinos e caprinos a partir de 
4.500 a.C. Por volta de 3.000 a.C., dromedários e camelos seriam domesticados 
no Egito, assim como cavalos no Oriente Médio e em diversas partes da Europa. 
Na América pré-colombiana, não existiam nem animais de porte suficiente para 
tração, nem rebanhos para corte, exceto por aves comestíveis, como o peru. A 
principal região pecuarista seria a andina, onde se deu a domesticação de lha-
mas, alpacas e vicunhas, usadas para transporte e obtenção de lã. 
Ainda na Antiguidade houve uma notável sofisticação das práticas sociais 
em torno da alimentação. A comensalidade sedimentou laços familiares e de ami-
zade, assumiu lugar importante na ritualística religiosa, constituiu um momento 
privilegiado para a tomada de decisões políticas e de festejo após casamentos e 
êxitos militares. Já nessa época, refeições eram feitas à mesa. Os mesopotâmi-
15
História da Alimentação Capítulo 1 
cos consideravam um ato de grande hostilidade a recusa em partilhar alimentos e 
realizavam banquetes regados a cerveja que ilustravam as delícias da vida divina. 
Além disso, ao menos desde o segundo milênio a.C., existiam tabernas nas quais 
indivíduos se encontravam para comer e beber. Tais estabelecimentos normal-
mente eram geridos por mulheres e frequentados por homens, os quais ocasio-
nalmente cometiam excessos decorrentes do consumo de álcool ou aproveitavam 
o espaço para a realização de conspirações políticas. 
O conhecidíssimo Código de Hamurabi (1772 a.C.), sexto rei da Babilônia, 
contém diversas medidas para regulamentar o funcionamento das tabernas, proi-
bindo a entrada de certas sacerdotisas, arbitrando o recebimento de cevada como 
pagamento pela cerveja e prescrevendo punições em caso de transgressões, es-
pecialmente para as taberneiras. Também havia banquetes reais, nos quais um 
grupo seleto de pessoas era convidado para celebrar, por exemplo, a inauguração 
de palácios e a chegada de uma delegação estrangeira. Tratava-se de um mo-
mento importante de aproximação entre o monarca e o povo (ou parte dele). 
No Antigo Egito, a comida assumiu um caráter cultural essencial. Diversos 
registros associam a longevidade e a boa saúde a uma alimentação farta. Asse-
gurar à população uma quantidade suficiente de víveres era visto pelos sábios 
como condição essencial para garantir a ordem social. Um homem de barriga va-
zia era tido como um desordeiro em potencial. A famosa crença dos egípcios na 
vida após a morte compreendia a realização de oferendas alimentares. Orações 
fúnebres eram acompanhadas de pão, cerveja e carnes. No túmulo de uma mu-
lher da segunda dinastia (3.700 a.C.) foram encontrados cereais cozidos, pães 
feitos de cevada, queijo, peixe e rins de carneiro cozidos. 
Na tumba de um arquiteto egípcio do século XIV a.C. havia um recipiente 
de madeira com sal de cozinha, pedaços de pão, carnes de boi e de aves, peixe 
seco, alho, cebolas, tâmaras, uvas, abacates, zimbro e cominho. Mesmo sendo 
ligados a pessoas privilegiadas, esses vestígios oferecem um panorama interes-
sante acerca das modalidades da produção alimentar egípcia e mostram que os 
habitantes do vale do Nilo tinham diante de si, ainda que com graus variados de 
acesso, alimentos bastante diversificados e equilibrados em termos de nutrientes. 
Além disso, os egípcios desenvolveram incontáveis utensílios de mesa e culiná-
ria, como panelas, frigideiras, travessas, tigelas, taças, bandejas, jarros e ânforas 
para armazenar vinho e cerveja. Embora utilizassem os dedos para comer, eles 
também criaram facas de metal, colheres, conchas e escumadeiras.
As circunstâncias enfrentadas pelos hebreus foram bastante distintas. As refe-
rências bíblicas à terra prometida, como aquela onde correria leite e mel, denotam a 
busca incessante desse povo por um território onde houvesse uma oferta satisfató-
ria de recursos alimentícios. A promessa divina de alimentos incluiria também cere-
16
Alimentação de crianças e adolescentes: necessidades nutricionais e 
cultura alimentar contemporânea
ais, vinhas, figueiras, romãzeiras e oliveiras. O interessante, no entanto, é que toda 
a penúria enfrentada foi seguida por numerosas regras alimentares, que impuseram 
uma série de proibições e prescrições para o consumo de alimentos. Parte da reve-
lação que, segundo a tradição, foi feita a Moisés no Monte Sinai incluiu a definição 
de animais impuros, que não poderiam ser ingeridos sob hipótese alguma. Note-se 
o teor do Levítico 20, 25: “Fareis, pois, diferença entre os animais limpos e imundos, 
e entre as aves imundas e as limpas; e as vossas almas não fareis abomináveis por 
causa dos animais, ou das aves, ou de tudo o que se arrasta sobre a terra; as quais 
coisas apartei de vós, para tê-las por imundas”. Fonte: <https://bibliaportugues.com/
leviticus/20-25.htm>. Acesso em: 12 nov. 2018.
Para os judeus, os alimentos impuros ou imundos seriam basicamente aque-
les que não respeitavam, por seus comportamentos e atributos físicos, os desíg-
nios divinos. O caso mais conhecido é o do porco, mas aves, como avestruzes, 
cisnes, pelicanos, como também tartarugas, diferentes espécies de lagartos, 
crustáceos, entre muitos outros animais, foram interditados. Seguindo-se lógica 
semelhante, animais castrados também foram proibidos. Alimentos derivados ou 
fermentados, embora pudessem ser consumidos no cotidiano, não deveriam ser 
utilizados na celebração da Páscoa, por exemplo, em razão de terem sua natu-
reza original alterada. Os alimentos que seguem as regras descritas no Torá são 
denominados Kosher. Uma hipótese para explicar a construção de todo esse re-
pertório restritivo seria o seu papel como elemento de afirmação identitária, algo 
importante para um povo que lutava continuamente pela sobrevivência. 
http://www.conquistesuavida.com.br/noticia/alimentacao-kosher-
o-que-e-e-como-funciona_a7979/1.
O mundo grego, originalmente formado por pequenas comunidades agrícolas 
(genos), deu lugar a cidades-estados independentes entre si (polis), que chegaram 
ao seu esplendor nos séculos V e IV a.C. Vinhas e oliveiras tinham uma presença 
marcante na paisagem e seus frutos eram vastamente consumidos in natura ou 
na forma de azeite (entregue como prêmio em competições atléticas nas famosas 
ânforas panatenaicas) e vinho (a bebida principal da Grécia), mas é possível dizer 
que os cereais eram a base da alimentação dos gregos. Os romanos, inclusive, 
referiam-se a eles como “comedores de cevada”. Há diversos vestígios materiais, 
mitológicos e textuais da alimentação grega na Antiguidade, mas os escritos 
de Hipócrates (460-377 a.C.) apresentam um panorama particularmente rico a 
respeito dos alimentos utilizados no período no período clássico. 
17
História da Alimentação Capítulo 1 
Em seu conhecido tratado Do Regime, Hipócrates explica formas de preparo, 
da moagem ao cozimento, da cevada e de outros cereais, como trigo e milhete, 
utilizados para a confecção de pães e bolos. Também são enumeradas favas de 
diferentes tipos, como grão-de-bico,lentilhas, ervilhas e grãos, como gergelim 
e papoula, cujo valor nutricional era destacado pelo “pai da medicina”. Além de 
bovinos, suínos e ovinos, os gregos também comiam carne de cachorro, mas o 
consumo de proteína animal ocorria majoritariamente em rituais de sacrifício aos 
deuses. Peixes de rios e de mar eram apreciados, assim como alguns moluscos. 
Mel, queijos, hortaliças, frutas, como pera, maçã e figo, tinham lugar de destaque, 
assim como alho e cebola. Um aspecto de destaque é a existência de refeições 
públicas. A vida cívica, o exercício da cidadania, passava pela participação de 
grandes banquetes coletivos, que serviam para prolongamento de discussões de 
cunho político. Havia ainda um rito festivo conhecido como symposion, no qual 
aquele que bebia era tomado pelo vinho e encarnava divindades como Eros e 
Dionísio, cujo sentido foi imortalizado na obra do filósofo Platão do século IV a.C. 
pesquise a respeito das festas dionisíacas na Grécia Antiga.
Os romanos, assim como os gregos, tinham uma cultura sacrificial. A carne, 
embora fosse relativamente escassa no cotidiano, estava no centro de todas as 
refeições festivas e o seu consumo era mediado por sacrifícios às divindades. 
A partilha essencial era da carne, não do pão. Do ponto de vista dos produtos 
alimentares, os romanos diferenciavam basicamente fruges, produtos da terra 
cultivada (cereais e leguminosas), dos pecudes, animais criados por sua carne 
(cordeiros, cabritos, leitões, frangos). A transformação do meio natural em lavoura 
era tida como sinal de civilização. O ato de comer era marcado por dois tipos 
de refeições especiais, a cena e o prandium. A primeira ocorria geralmente em 
uma tarde de inverno, reunindo homens vestidos de togas ou túnicas largas e 
levava de duas a três horas. A segunda reunia grupos sociais bem definidos 
(famílias, amigos da mesma faixa etária, vizinhos, corporação profissional) para 
compartilhar alimentos por ocasião de alguma festividade. 
Contudo, em Roma nunca foi incorporado algo como o symposion. Eles 
não acreditavam na possessão dionisíaca nem em nada do gênero associado 
à comensalidade, embora a embriaguez fosse comum em celebrações. Para 
escravos, camponeses, a plebe das cidades e os soldados em campanha, a 
alimentação cotidiana era pouco variada e composta basicamente por alimentos 
frios. Alimentos quentes e diversificados era um luxo usufruído pelos patrícios, a 
18
Alimentação de crianças e adolescentes: necessidades nutricionais e 
cultura alimentar contemporânea
classe dominante romana. As atividades militares, fundamentais no mundo latino, 
impactavam diretamente na alimentação. O cultivo de trigo nos latifúndios estava 
diretamente vinculado ao sortimento de pão aos soldados, que também recebiam 
uma porção de sal como pagamento. Daí, inclusive, nasceu a palavra salário.
A ascensão do cristianismo e a desintegração do Império Romano do 
Ocidente no século V de nossa era trouxe mudanças importantes. A sociedade 
medieval seria caracterizada por condições sociais e status bem marcados entre a 
população. Durante algum tempo perduraria uma categoria mista de camponeses-
guerreiros, mas, entre os séculos VIII e IX, a oposição entre os estilos de vida de 
camponeses e membros da nobreza se acentuaria progressivamente. A atividade 
militar seria concentrada nas mãos de uma elite privilegiada, o que serviria de 
legitimação para os seus privilégios. Com o tempo, ganharia força a concepção 
de que o Criador teria atribuído aos corpos sociais três funções específicas e 
complementares: sacerdócio, guerra e trabalho. 
Aos bellatores, membros da nobreza, caberia garantir a proteção contra os 
inimigos, aos oratores, a transmissão dos fundamentos da fé católica e a garantia 
da salvação dos fiéis e, finalmente, aos laboratores, o seu próprio sustento e dos 
demais membros da sociedade. Uma série de obrigações e restrições foi imposta 
aos trabalhadores rurais, que produziam os cereais, mas tinham que pagar pelo 
uso dos moinhos pertencentes aos senhores feudais. Além de serem excluídos 
da prática da caça, a eles caberia basicamente alimentos in natura ou cozidos 
em água, enquanto os nobres prefeririam assados e grelhados. A carne de porco 
e seus derivados, como toucinho e banha, eram importantes complemento à 
subsistência das famílias camponesas. 
Não obstante, a fome seria uma ameaça constante e uma realidade 
frequente naquele período. A Idade Média seria um período de extrema carência 
alimentar. A ideologia cristã amenizava a situação pregando o jejum como 
manifestação de humildade, um valor a ser exaltado. A principal tentação a ser 
combatida era certamente a gula. Segundo São Bento, “amar o jejum” era um dos 
instrumentos principais para as boas obras (COSTA, 2012, p. 43). Por outro lado, 
alguns mosteiros e abadias concentraram grandes porções de terra, convertendo-
se em importantes centros produtores de alimentos. A vida monástica chegou 
a ser sinônimo de boa comida e fartura. Monges e freiras se notabilizaram pela 
confecção de pães, doces e bebidas alcoólicas destiladas e fermentadas.
Na mesma época, o império muçulmano se expandiu desde a Península 
arábica, incorporando vastos territórios da Ásia, África e Europa. O Islã imprimiu 
sua marca em vários aspectos da vida dos lugares onde se estabeleceu, 
incluindo evidentemente as práticas alimentícias. Os laticínios (leite, manteiga, 
queijo, iogurte e kaymak, nata fervida levemente temperada de sal) tinham lugar 
19
História da Alimentação Capítulo 1 
destaque em sua dieta, especialmente entre os pobres. A exemplo da 
tradição judaica, a islâmica também incluiu distinções entre o puro e o 
impuro. A carne de porco também fora vedada, assim como o consumo 
de bebidas fermentadas. 
A duração e o rigor do jejum eram maiores entre os muçulmanos do que 
nas outras religiões monoteístas. Durante o Ramadã não se pode comer nem 
beber enquanto perdurar a luz do sol. Em compensação, refeições noturnas 
fartas assumem um caráter festivo, ajudando a resistir às privações. No deserto, 
consumiam-se laticínios, um pouco de carne e tâmaras. Nas regiões de clima 
menos árido, as refeições incluíam carne de carneiro, cereais, laticínios, legumes 
e frutas. Por outro lado, em ambientes inóspitos, gafanhotos e lagartos assados 
chegavam a ser consumidos. Base de certos refrigerantes na atualidade, a noz 
de cola, usada como afrodisíaco e em tratamentos medicinais diversos, era muito 
valorizada em função de sua ação estimulante e redutora de apetite, propriedades 
importantes em longas expedições militares ou comerciais através do deserto do 
Saara. No processo de expansão havia grande intercâmbio com as populações 
submetidas, implicando variedades regionais marcantes. Ao mesmo tempo, traços 
das culturas pregressas, incorporadas pelos árabes, como persas e beduínos, se 
faziam presentes, não apenas nos alimentos consumidos, mas em técnicas de 
conservação, preparo e intercâmbio. 
Nas Américas, as sociedades indígenas desenvolveram práticas e 
regras alimentares bastante variadas. Como já mencionado, havia uma 
diversidade de plantas alimentícias absolutamente extraordinária. Além 
de milho, batata, mandioca e cacau, itens como amendoim, abóbora, aba-
caxi, guaraná, mamão, mate, tomate, tabaco e feijão, desconhecidos en-
tre os europeus, foram domesticados e cultivados em várias regiões do 
continente, por diversas culturas. A proficiência de astecas, que desenvol-
veram canteiros flutuantes em áreas alagadiças (chinampas) para amplia-
rem a área cultivada, e incas, que realizaram uma integração produtiva de 
diferentes planos ecológicos, é particularmente digna de destaque. 
Os andinos desenvolveram a integração do que John Murra (1998) 
chamou “arquipélagos verticais”, nos quais diferentes grupos tratavam 
de produzir de forma especializada em lotes adequados, conforme clima 
e solo, a determinadas culturas (regiões elevadas eram destinadas à 
criação de animais e ao cultivo detubérculos mediante o emprego de 
terraços agrícolas, enquanto nos vales quentes se plantavam milho, 
algodão, coca, entre outros) e realizando, ao final, uma distribuição em 
conformidade com uma lógica de complementaridade e reciprocidade. 
Que desenvolveram 
canteiros flutuantes 
em áreas alagadiças 
(chinampas) para 
ampliarem a área 
cultivada.
“arquipélagos 
verticais”, nos 
quais diferentes 
grupos tratavam de 
produzir de forma 
especializada em 
lotes adequados, 
conforme clima e 
solo, a determinadas 
culturas (regiões 
elevadas eram 
destinadas à criação 
de animais e ao 
cultivo de tubérculos 
mediante o emprego 
de terraços 
agrícolas, enquanto 
nos vales quentes 
se plantavam milho, 
algodão, coca, 
entre outros) e 
realizando, ao final, 
uma distribuição 
em conformidade 
com uma lógica de 
complementaridade 
e reciprocidade.
20
Alimentação de crianças e adolescentes: necessidades nutricionais e 
cultura alimentar contemporânea
FIGURA 4 – INCAS PLANTAM E COLHEM BATATAS. FERRAMENTAS: 
PAU DE FURAR E ENXADA. CODEX PERUANO DO SÉCULO XVI
FONTE: Braudel (2005, p. 148-149)
FIGURA 5 – PANORAMA DOS TERRAÇOS AGRÍCOLAS DE 
PÍSAC, NO VALE SAGRADO DOS INCAS, PERU
FONTE: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Imp%C3%A9rio_Inca>. Acesso em: 19 nov. 2018.
Além do consumo de vegetais, é importante lembrar que a caça e a pesca 
eram traços marcantes de variadas culturas indígenas. Aves silvestres, roedores, 
pequenos primatas e até baleias eram caçadas, sem contar os variadíssimos 
tipos de pescados. Portanto, o consumo de proteína animal era parte integrante 
da dieta indígena, que também incluía carne humana. 
21
História da Alimentação Capítulo 1 
O canibalismo ritual ameríndio sul-americano foi notabilizado por relatos 
como os do viajante alemão Hans Staden, que caiu prisioneiro entre os 
tupinambás no século XVI. Entre os povos da região mesoamericana, os astecas, 
por exemplo, costumavam consumir em banquetes partes cozidas dos corpos 
dos prisioneiros de guerra ou de escravos sacrificados. Tais práticas já foram 
explicadas de variadas formas pela bibliografia, que indicou entre as motivações 
vingança, transferência das qualidades dos mortos ou mais simplesmente a 
carência nutricional. O consumo de insetos é também bastante conhecido. No 
território que veio a ser o Brasil, o consumo de formigas ou do bicho da taquara, 
por exemplo, era muito comum.
As civilizações orientais eram relativamente menos carnívoras. Os japoneses 
são famosos por terem se formado como uma sociedade majoritariamente 
ictiófaga, comedora de peixe. O consumo de laticínios e ovos era muito reduzido e 
não havia criação de gado de corte. Já os chineses consumiam tradicionalmente 
uma variedade um pouco maior de proteína animal, incluindo, assim como os 
gregos, carne de cachorro. Criações mais extensivas se restringiriam aos suínos. 
Embora outros povos reivindiquem a invenção do produto, os chineses são 
bastante conhecidos pela criação do macarrão. Há vestígios arqueológicos de 
macarrão chinês com a idade de quatro mil anos, muito anterior à célebre viagem 
do navegante veneziano Marco Polo, que teria levado amostras de pasta no século 
XIII para a Península Itálica. Embora a ingestão de carne não seja tão incomum 
quanto se imagina, indianos são famosos pelo seu vegetarianismo. Religiões 
importantes, como o jainismo, hinduísmo e o budismo, pregaram o respeito aos 
seres vivos, estimulando o consumo de cereais e frutos. Um conjunto de crenças 
associadas à reencarnação e à transcendência espiritual tradicionalmente 
rejeitaram o consumo de carne. 
 
A transição da Idade Média para a Modernidade, na passagem do século 
XV para o XVI, foi perpassada por grandes transformações históricas que 
incluíram o estreitamento do intercâmbio entre as diferentes regiões do globo 
e a mundialização de alimentos antes concentrados localmente. Esse aspecto 
será explorado de forma mais detida na próxima seção deste capítulo, mas 
cabem algumas considerações preliminares a respeito do quadro geral. Além 
de transformações na cadeia global de produção, circulação e consumo de 
alimentos, mudanças locais no ritmo e na forma do trabalho produtivo (da 
escravidão ao trabalho assalariado), o crescimento dos centros urbanos, a 
passagem da agricultura de subsistência para uma agricultura mercantil, o 
surgimento de manufaturas, o aumento da mineração, o cercamento dos campos, 
entre outros processos correlacionados, alteraram o número, os horários e o 
local de realização das refeições, como também separaram progressivamente 
produtores e consumidores, ampliando-se a quantidade de açougues, mercearias 
e quitandas. O advento da impressa deu novo sentido aos livros de culinária e 
22
Alimentação de crianças e adolescentes: necessidades nutricionais e 
cultura alimentar contemporânea
o desenvolvimento da produção manufatureira disseminaria o uso de talheres, 
sobretudo, facas e colheres. O garfo, inventado na Baixa Idade Média em 
Bizâncio, permaneceu artigo de luxo até o século XIX. De todo modo, comer com 
as mãos na modernidade passaria a ser um tabu.
FIGURA 6 – TALHERES COM CABO DE MARFIM DO SÉCULO XVII
FONTE: Braudel (2005, p. 183)
O século XVIII trouxe uma nova onda de transformações. O Iluminismo, 
as Independências dos Estados Unidos e do Haiti e a Revolução Francesa 
romperam com a antiga ordem absolutista e aristocrática na Europa, trouxeram 
crise aos sistemas coloniais remanescentes e reconfiguraram profundamente 
o quadro geopolítico internacional. A ideologia burguesa associada aos ideais 
de liberdade e igualdade se opuseram à opulência do modo de vida cortesão, 
incluindo os complexos rituais alimentares da realeza, retratados, por exemplo, 
no filme Maria Antonieta, de Sofia Coppola (2006). A fome e a crise social se 
transformaram no grande medo das elites aristocráticas. Na falta de pão, não 
havia brioches para todos, apesar do que propôs a princesa alienada. Por outro 
lado, nos anos seguintes, a ampliação da produção industrial, a partir da Grã-
Bretanha, e o desenvolvimento de técnicas mais avançadas de cultivo inundaram 
o mercado de produtos, criando novos itens de consumo e tornando alimentos 
outrora restritos ao consumo de luxo, como açúcar de cana e café, acessíveis ao 
padrão de consumo da classe trabalhadora dos grandes centros urbanos. 
Na centúria seguinte, a Revolução Industrial se expandiu e a indústria 
agroalimentar alcançou o primeiro plano da produção capitalista mundial. Cabe 
destaque para os avanços nas técnicas de conservação dos alimentos. Em 1804, 
o francês Nicolas Appert inventou o sistema de conservas em potes de vidro 
hermeticamente fechados. Isto revolucionou a indústria alimentícia, tornando 
possível o armazenamento por período mais prolongado, além de facilitar o 
transporte. Em 1851, foi patenteado o primeiro refrigerador; em 1864, foi criado o 
processo de pasteurização para a eliminação de contaminações microbiológicas; 
23
História da Alimentação Capítulo 1 
em 1876, o primeiro navio frigorífico entrou em funcionamento, transportando 
carne da Argentina para a Europa. 
Essas inovações atingiram o ápice no século XX, quando os consumidores de 
média e baixa renda passaram a ter acesso a geladeiras, fogões a gás, liquidifica-
dores e, mais recentemente, micro-ondas. Evidentemente, a industrialização tam-
bém trouxe inúmeras consequências negativas, ampliando o desequilíbrio econômi-
co entre pessoas e países ricos e pobres, a contaminação ambiental com resíduos 
e embalagens, o uso de aditivos químicos, agrotóxicos e transgênicos. 
A produção de gado de corte atingiu dimensões estratosféricas, trazendo 
degradação ambiental direta, com aumento das pastagens, e indireta, com a 
ampliação do cultivo da soja e cerais diversos para alimento dos rebanhos. 
Confinamentos, o emprego de hormônios e antibióticos acarretaram uma 
série de problemas para a saúde dos animais e dos consumidores. Ao mesmo 
tempo,alergias e intolerâncias alimentares, especialmente a glúten, lactose e 
frutose, consumidos desde os primórdios da humanidade, têm crescido de forma 
avassaladora, refletindo o alto consumo de alimentos processados, geneticamente 
modificados e cultivados à base de herbicidas, aliado ao estresse e a uma piora 
na qualidade de vida da população. 
FIGURA 7 – EXPORTAÇÕES DE GADO
24
Alimentação de crianças e adolescentes: necessidades nutricionais e 
cultura alimentar contemporânea
FONTE: <https://www.beefpoint.com.br/exportacao-de-gado-vivo-cresce-sob-
a-mira-de-entidades-de-defesa-animal/>. Acesso em: 19 nov. 2018.
Nos países periféricos ou em desenvolvimento, a desnutrição aumentou, assim 
como a obesidade entre as sociedades ocidentais. O mundo atual tem que conviver 
com o enorme paradoxo de produzir uma quantidade praticamente diretamente pro-
porcional de alimentos e de famintos. Superabundância e fome caminham juntos. 
Os Estados Unidos, principal potência do mundo ocidental após a Segunda Guerra 
Mundial, adotou e disseminou pelo mundo, com o apoio de estratégias publicitá-
rias agressivas, um modelo alimentar que promoveu a substituição de carboidratos 
complexos presentes em amidos, por exemplo, por carboidratos simples como açú-
cares e gorduras, alastrando redes de fast food e a oferta de refrigerantes. 
A partir de 1986, o consumo de refrigerantes superaria o de água no país. A 
primeira reação foi em prol da estética, não da saúde. A obsessão com a forma fí-
sica e padrões estéticos trouxe o aumento de distúrbios alimentares, como bulimia 
e anorexia, quando não, aumentou a adoção de dietas da moda, desprovidas de 
coerência, embasamento, continuidade e acompanhamento. Existe, como sabe-
mos, um novo contraponto em andamento. O número de indivíduos preocupados 
com a questão da alimentação saudável tem crescido significativamente, desde o 
advento de formas mais radicais do vegetarianismo, como o movimento vegano, 
que propaga um comportamento ético mais abrangente perante os direitos dos 
animais, até consumidores médios procurando reduzir a ingestão de alimentos 
processados e adotar crescentemente orgânicos em sua dieta cotidiana.
Atividade de Estudo
1 Analise as consequências do domínio do fogo sobre o ato de comer.
2 Quais foram as mudanças ocorridas no Paleolítico no que se re-
fere à prática da caça?
3 Quais foram as mudanças gerais ocorridas no período mesolítico?
https://www.beefpoint.com.br/exportacao-de-gado-vivo-cresce-sob-a-mira-de-
https://www.beefpoint.com.br/exportacao-de-gado-vivo-cresce-sob-a-mira-de-
25
História da Alimentação Capítulo 1 
4 Explique as razões pelas quais o advento da agricultura e da pecu-
ária é compreendido como uma revolução (a revolução neolítica).
5 É possível considerar os povos das Américas inferiores em rela-
ção aos mesopotâmicos ou chineses por terem desenvolvido a 
agricultura mais tarde?
6 Marque verdadeiro ou falso. Depois, assinale a alternativa com a 
sequência correta:
( ) Os mesopotâmicos, além da agricultura, desenvolveram for-
mas elaboradas de comensalidade e regras de conduta incor-
poradas em sua legislação escrita.
( ) A crença dos egípcios na vida após a morte compreendia a 
realização de oferendas alimentares. A partir delas é possível 
saber que os egípcios já utilizavam talheres para comer. 
( ) Os hebreus enfrentaram rígidas carências alimentares, o que 
fez com que sua cultura alimentar não apresentasse nenhum 
tipo de restrição alimentar. 
( ) Na Grécia, consumia-se azeite, vinho e diversos cerais, como 
cevada, trigo e milho.
( ) Os romanos seguiam absolutamente todos os costumes gregos.
( ) Após a ascensão do cristianismo, foram eliminadas todas as 
distinções sociais e a população passou a ter os mesmos direi-
tos de acesso aos alimentos.
( ) O império muçulmano foi particularmente pobre em termos 
culinários, sendo caracterizado pela imitação das culturas do-
minadas.
a) ( ) V – V – F – F – V – V – F.
b) ( ) V – F – F – F – F – F – F.
c) ( ) V – F – F – V – V – F – V.
d) ( ) F – V – V – V – V – V – V.
e) ( ) F – F – V – V – F – F – F.
7 Compare a importância do trigo para os mediterrânicos, do arroz 
para os asiáticos e do milho para os indígenas.
8 Quais as principais mudanças trazidas pela modernidade para o 
ato de comer?
9 Avalie a importância da Revolução Industrial para o consumo de 
alimentos.
10 A produção de cerais e a criação de gado de corte movimentam 
a economia, criam empregos e propiciam alimentos para a so-
ciedade. No entanto, vários grupos identificam problemas nesses 
setores produtivos na forma como eles se sustentam atualmente. 
Elenque dois desses problemas.
26
Alimentação de crianças e adolescentes: necessidades nutricionais e 
cultura alimentar contemporânea
3 GLOBALIZAÇÃO DA ALIMENTAÇÃO
O termo globalização tem sido utilizado desde os anos 1980 para designar 
o aprofundamento da integração cultural e econômica entre diferentes partes do 
planeta no mundo contemporâneo, marcado pela formação de blocos econômicos, 
pelo “encurtamento” das distâncias e pela velocidade inédita da circulação de 
informações. No entanto, muitos pesquisadores têm observado a existência de 
diversas globalizações ao longo da história, isto é, a formação de sistemas de 
interação, intercâmbio e integração entre populações e territórios espalhados 
por diferentes regiões do mundo. O Mediterrâneo, conhecido pela tríade pão, 
azeite e vinho, Mare Nostrum dos romanos, configurou o epicentro de diversas 
globalizações pré-modernas no Ocidente, articulando desde a Antiguidade o Egeu 
dos gregos ao Egito, Pérsia e outras regiões orientais. Paralelamente, uma série 
de rotas comerciais terrestres e marítimas conectou a China à Ásia central e ao 
próprio Mediterrâneo, configurando o que a partir do século XIX foi denominado 
Rota da Seda, que nasceu há mais de 4 mil anos a partir de caminhos abertos 
por pastores nômades. Tecidos, cerâmicas, porcelanas e metais preciosos tinham 
destaque nas trocas comerciais, mas alimentos como azeite, chás, cerais, carnes 
salgadas e defumadas, sal e vinhos circulavam bastante pelas vias mercantis. 
FIGURA 8 – ROTAS COMERCIAIS DA ANTIGUIDADE TARDIA
FONTE: Lockard (2014, p. 233)
27
História da Alimentação Capítulo 1 
Com a emergência do Islã, o Saara constituiu um outro eixo fundamental da 
globalização articulado ao Mediterrâneo. As especiarias – termo genérico utilizado 
desde o século XIV para designar produtos diversos de origem vegetal destinados 
a temperar alimentos diversos, bem como conservar e disfarçar a má qualida-
de da carne – representam um capítulo à parte na história da alimentação, elo 
fundamental entre globalizações pré-modernas e modernas. Na Europa, desde a 
Antiguidade Clássica, usavam-se plantas aromáticas, como açafrão, anis, man-
jerona, louro e coentro. A partir do século XI, observou-se a introdução gradativa 
no continente europeu de especiarias asiáticas, como canela, cravo, cardamomo, 
gengibre e pimenta-do-reino, pela ação de mercadores muçulmanos, que também 
introduziram a laranja e o açúcar de cana, cujo cultivo passou a ser realizado no 
Egito, em Chipre e na Sicília. 
A partir daquela mesma época, pouco a pouco, as cidades-estados italianas, 
com destaque para Gênova e Veneza, ampliaram suas atividades no comércio a 
longa distância conectando uma vasta rede mercantil entre a Península Ibérica 
à Ásia. Entre outras mercadorias, o açúcar e as especiarias asiáticas, bastan-
te lucrativas nos mercados de luxo dos grandes centros europeus, aguçaram a 
rivalidade entre genoveses e venezianos. Os primeiros foram responsáveis por 
introduzir a produção de cana no sul de Portugal e nas ilhas atlânticas da Madei-
ra, marcando o início da transferência do epicentro das atividades do nascente 
sistema capitalista europeu do Mediterrâneo para o Atlântico. Esse deslocamento 
resultaria efetivamente do fechamento das rotas terrestres para a Ásia em decor-
rência da queda de Constantinoplaem 1453. Como aprendemos na escola, daí 
nasceu o impulso para as grandes navegações no final do século XV.
Os capitais italianos foram essenciais para o expansionismo atlântico ibérico. 
Os portugueses foram pioneiros, atravessando, em 1488, com Bartolomeu Dias, o 
Cabo das Tormentas, porta de entrada para a Ásia via périplo africano, completado 
por Vasco da Gama dez anos depois. Consequentemente, foram restabelecidas as 
trocas mercantis com a Ásia e instalados entrepostos comerciais em vários pontos 
da costa da África com as chamadas feitorias. Diante do êxito lusitano, o mercador 
genovês Cristóvão Colombo conseguiria, após várias tentativas, convencer os reis 
da Espanha a respaldar juridicamente e financiar sua expedição que pretendia atra-
vessar o Atlântico na direção do Ocidente para ligar a Europa à Ásia. 
Em 1492, Colombo chegou ao território que mais tarde seria denominado 
América. Aqui teve início a primeira fase da globalização moderna da alimenta-
ção, marcada pela aceleração e multiplicação sem precedentes do intercâmbio 
de gêneros alimentícios, como também pela amplificação do caráter mercantil 
da produção agrícola internacional. Houve uma verdadeira revolução nos hábi-
tos alimentares mundiais. Uma gama enorme de alimentos até então restritos a 
determinadas regiões ou macrorregiões seriam mundializados, gerando uma in-
28
Alimentação de crianças e adolescentes: necessidades nutricionais e 
cultura alimentar contemporânea
terdependência planetária inédita, sustentando o aumento da população global e 
o desenvolvimento do sistema capitalista. Nesse processo, formas ancestrais de 
produção, distribuição e consumo de alimentos foram desestruturadas. 
Notemos o quadro a seguir sobre centros de origem e a diversidade das 
principais culturas, organizado por Patrícia Goulart Bustamante com os dados da 
International Plant Genetic Resources Institute (IPGRI), que sintetiza as informa-
ções já inseridas e acrescenta outras:
QUADRO 1 – CENTROS DE ORIGEM E A DIVERSIDADE DAS PRINCIPAIS CULTURAS
Cultura Centro de origem/diversidade
Abacaxi América Central, América do Sul
Abóbora América Central, América do Sul
Alface Mediterrâneo
Algodão Ásia Central, América Central, América do Sul
Alho Ásia Central
Amendoim América do Sul
Arroz África Ocidental e Sudoeste da Ásia
Aveia Ásia Menor, Mediterrâneo
Azeitona Ásia Menor, Mediterrâneo
Banana Etiópia, Sudoeste da Ásia
Batata Andes
Berinjela China e África
Beterraba Ásia Menor
Brócolis Mediterrâneo
Cacau América Central
Café Etiópia
Cana-de-açúcar Índia, Sudoeste da Ásia, China
Cebola Etiópia, Ásia Central, Ásia Menor
Cenoura Ásia Central, Ásia Menor
Cevada Etiópia, Ásia Menor
Coco Sudoeste da Ásia
Couve-flor Mediterrâneo
Ervilha Ásia Menor, Ásia Central
Espinafre Ásia Central
Feijão América Central
Laranja China, Sudeste da Ásia
Limão Índia
Maçã Ásia Central
Mamão Ásia Central, Andes
Manga Índia
Melancia Ásia Central
Milho América Central, Andes
Morango Sul do Chile
29
História da Alimentação Capítulo 1 
FONTE: BUSTAMANTE (2000, p. 87-88)
Nabo Mediterrâneo
Pepino Índia, Malásia
Pêssego China
Repolho Ásia Menor, Mediterrâneo
Sisal América Central
Tabaco América Central
Tomate América Central, Andes
Trigo Etiópia, Ásia Menor
Uva Ásia Central, Ásia Menor
Atualmente, o símbolo máximo da culinária italiana é a 
macarronada com molho de tomate. Mas nem o macarrão, nem 
o tomate são originários da Península Itálica, nem mesmo do 
Mediterrâneo. Pesquise quando o consumo de pasta com molho de 
tomate se popularizou na Itália.
Cada um desses alimentos, hoje cultivados em diferentes rincões mundo afo-
ra, tiveram uma história particular de expansão. O milho, apoiado por sua notável 
produtividade, foi introduzido logo no século XVI. Embora tenha levado duzentos 
anos para se consolidar, acabou por se espalhar e assumindo importância em regi-
ões da Península Ibérica, Itália, França, Balcãs, na Europa, norte do Congo e Be-
nim, na África, na Índia, Birmânia, Japão e China. 
A batata teria difusão um pouco mais lenta e encontraria maior resistência em 
regiões da Ásia e em países muçulmanos, mas na virada do século XVIII ganha-
ria plenamente a Europa. Do outro lado do Atlântico, a paisagem começaria a ser 
alterada mais velozmente. Nos séculos XV e XVI, as ilhas Atlânticas – Canárias, 
Madeira, Açores, Cabo Verde, São Tomé e Príncipe – haviam servido de laboratório 
para a montagem de um sistema de colonização baseado na produção de cana-de-
-açúcar com base no trabalho escravo de nativos e africanos. Mercadoria de luxo 
com alto potencial lucrativo, a produção de açúcar seria iniciada na ilha de Hispa-
niola logo em 1505, quatro anos depois chegaram os primeiros escravos da África 
para se somarem aos trabalhadores indígenas, cuja população entrava em declínio 
acelerado. Na falta de metais preciosos, principal alvo do mercantilismo, o açúcar 
despontaria como a grande aposta do colonialismo ibérico em terras americanas. 
Na América portuguesa, após uma fase de escambo com os indígenas, teve 
início o plantio de cana em meio à necessidade de garantir a posse do território. 
Em 1532, Martim Afonso de Sousa instalou o primeiro engenho do Brasil na vila de 
30
Alimentação de crianças e adolescentes: necessidades nutricionais e 
cultura alimentar contemporânea
São Vicente. Nos anos seguintes, o cultivo se espalhou pelo litoral de outras capi-
tanias, prosperando especialmente no Nordeste, em Pernambuco e na Bahia, mas 
também no Rio de Janeiro, na região de Campos dos Goitacazes. Além de açúcar, 
produziam-se quantidades importantes de cachaça, também chamada jeribita, mui-
to consumida localmente, mas também exportada, especialmente para a África, na 
região de Angola, onde era trocada por trabalhadores escravizados. 
Os livros didáticos perpetuaram a ideia errônea de que a história econômica do 
Brasil colonial seria baseada em ciclos, sendo o do açúcar o segundo deles, prece-
dido pelo do pau-brasil e sucedido pelo do ouro, porém, a historiografia demonstra 
que a produção canavieira nunca cessou, atingindo maior faturamento do que a mi-
neração ao longo do século XVIII, muito embora a competição internacional tenha 
aumentado enormemente. 
Nos primeiros dois séculos de colonização, o império espanhol não represen-
tou grande competidor, apesar de sua incursão precoce no ramo açucareiro. A ex-
ploração de ouro e prata na Mesoamérica e nos Andes concentrou a maior parte 
os esforços hispânicos, relegando a produção de açúcar do Caribe espanhol a se-
gundo plano. Os luso-brasileiros se beneficiaram do domínio que detinham sobre o 
tráfico transatlântico de escravos e de condições ambientais vantajosas, ultrapas-
sando rapidamente os concorrentes castelhanos. Até o século XVII, os portugue-
ses praticamente monopolizaram o mercado internacional de açúcar. O panorama 
mudou após as invasões holandesas. Depois que foram expulsos, em 1654, os fla-
mengos fizeram parcerias com franceses e ingleses, transferindo para as Antilhas 
todo o conhecimento técnico e logístico que tinham acumulado no Brasil. 
FIGURA 9 – ENGENHO DE ITAMARACÁ, DO PINTOR HOLANDÊS 
FRANS POST PARA O MAPA DE GASPAR BARLAEUS, 1647
FONTE: <http://bit.ly/2W53iYw>. Acesso em: 19 nov. 2018.
Martinica e Saint-Domingue (Haiti), do lado francês, Barbados e Jamaica, 
do lado britânico, se tornariam grandes produtores de açúcar e melaço de cana, 
31
História da Alimentação Capítulo 1 
abalando as saídas baianas e pernambucanas. Contudo, a elasticidade do 
mercado e conflitos bélicos entre as metrópoles dos rivais caribenhos impediram 
uma retração uniforme das exportações brasileiras, que mantiveram médias 
bastante competitivas ao menos até meados do século XIX, quando explodiram 
as exportações cubanas.
Os circuitos agroexportadores e a extração de metais preciosos no Novo 
Mundo geraram mercados internos cujo abastecimento mobilizou tanto culturas 
originárias das Américas quanto plantas e animaistrazidos de fora para 
aclimatação local. Pouco se menciona, mas São Paulo se destacou pela produção 
de trigo, no século XVII, com base na escravização de indígenas. Enquanto a 
população local consumia principalmente mandioca, milho e feijão, o planalto 
paulista, “celeiro do Brasil” na acepção de John Manuel Monteiro (1994), produzia 
farinha de trigo para o mercado do litoral, especialmente o Rio de Janeiro. 
FIGURA 10 – INDÍGENA DO MÉXICO CULTIVANDO TRIGO TRANSPLANTADO 
PARA A AMÉRICA PELOS ESPANHÓIS UTILIZANDO UTENSÍLIOS EUROPEUS
FONTE: Braudel (2005, p. 152)
32
Alimentação de crianças e adolescentes: necessidades nutricionais e 
cultura alimentar contemporânea
O gado bovino também foi cedo introduzido na colônia, crescendo 
em virtude do mercado para a carne, o couro e a tração de carroças e 
moendas. A riqueza da região açucareira, a abundância de pastagens e 
o relevo sem grandes barreiras tornaram o Nordeste o primeiro grande 
sítio pecuarista brasileiro, com bovinos de origem indiana. Os pampas 
do Sul logo seriam palco de uma segunda onda pecuarista, despontan-
do a partir de missões jesuíticas nas proximidades do território que viria a ser o 
Uruguai. No início do século XVI, o rebanho luso-brasileiro já alcançava cerca de 
1,5 milhão de cabeças. Em fins do século XVIII, o Rio Grande do Sul comerciali-
zaria aproximadamente 13 arrobas de charque. Esse número chegaria a 600 mil 
arrobas no início do Oitocentos. 
Essa atividade foi alavancada pela descoberta de metais preciosos em Minas 
Gerais, fenômeno que efetivamente formou uma rede interna de abastecimento, 
ramo até então bastante desconexo, preso ao litoral e ainda muito dependente 
de importações. A fundação de vilas e cidades e o enorme fluxo migratório para a 
região das minas mobilizou comerciantes itinerantes conhecidos como tropeiros, 
que vendiam alimentos, especialmente charque do sul, e animais de carga que 
serviam para o transporte dos minérios e de artigos diversos para as regiões por-
tuárias. O charque, junto à farinha de mandioca, constituiu a base da alimentação 
dos escravos. 
O caso luso-brasileiro é representativo da configuração interconectada as-
sumida por outros sistemas coloniais. No império britânico, as colônias do Norte 
do território, que deram origem aos Estados Unidos, a chamada Nova Inglaterra 
e, em um segundo momento, as colônias do Meio cresceram comercialmente for-
necendo carne bovina e suína, cereais (trigo, aveia e milho), peixes secos, frutas 
e mantimentos diversos para as Índias Ocidentais produtoras de açúcar, obtendo 
preferencialmente melaço para a fabricação de rum que seria destinado à impor-
tação de escravos para serem vendidos no Sul. Com efeito, rum e cachaça cum-
priam o mesmo papel no circuito do infame comércio de cativos. 
O café assumiria um lugar de destaque nessa história, mas um pouco mais 
tarde. Originário da Etiópia, a planta circulou bastante pelo mundo árabe, sendo 
cultivado com maior profusão no Iêmen a partir do século XV. Não por acaso, a ci-
dade portuária iemenita, Moca, hoje dá nome a uma das principais variedades do 
grão. Estimulante, a bebida serviria de substituto do álcool, proibido pela religião 
muçulmana, mediando a sociabilidade masculina em estabelecimentos especia-
lizados para o seu consumo. No início do século XVII, a bebida começou a ser 
apreciada no mundo ocidental, penetrando primeiro em Veneza, via Istambul. 
Na década de 1640, o produto começaria a ser consumido na França, berço 
dos famosos cafés europeus, daí se espalhando gradualmente para outros paí-
O charque, 
junto à farinha 
de mandioca, 
constituiu a base 
da alimentação dos 
escravos.
33
História da Alimentação Capítulo 1 
ses. Os holandeses, que estavam encontrando dificuldades no Atlântico, foram 
os primeiros a abocanharem o negócio na Europa, introduzindo o cultivo em larga 
escala em Java, atual Indonésia, no final daquele século. Em 1718, o arbusto foi 
aclimatado na América, a começar pela colônia holandesa do Suriname. Pouco 
tempo depois, o Caribe despontaria como região produtora, ocupando paisagens 
não desbravadas pela cana. 
A cafeicultura dependia de menos investimentos do que o açúcar, que ne-
cessitava de uma estrutura de engenho bastante dispendiosa, o que permitiu que 
outros grupos se envolvessem no cultivo. Em Saint-Domingue, que se tornou a 
maior produtora mundial tanto de café quanto de açúcar em fins do século XVIII, 
ganhou corpo uma grande rivalidade entre brancos produtores de açúcar e negros 
livres produtores de café. Mais um ingrediente do verdadeiro barril de pólvora que 
se tornou aquela sociedade, na qual cerca de 90% da população era composta de 
trabalhadores escravizados. O colapso da economia haitiana, após a Revolução 
(1791-1804), abriu uma enorme brecha no mercado internacional. Brasil e Cuba 
seriam os principais beneficiados dessa brecha, expandindo suas produções de 
açúcar e café com base na exploração em larga escala de trabalhadores escravos 
trazidos, em grande parte, ilegalmente da África. 
Após a década de 1830, ficaria marcada uma vantagem competitiva brasilei-
ra nas exportações cafeeiras e cubana nas açucareiras. O café havia começado a 
ser plantado nas cercanias da cidade do Rio de Janeiro no século XVIII, expandin-
do-se rumo ao Vale do Paraíba fluminense, que contava com condições especial-
mente propícias para o cultivo da planta, com uma enorme fronteira agrícola a ser 
aberta e uma rede de caminhos abertos no período da mineração já que se tratava 
de uma região de trânsito entre Minas Gerais e o Rio de Janeiro. Cuba assumiria 
vantagem na economia açucareira, que se expandiu da jurisdição de Havana em 
direção a Matanzas e Santa Clara. A segunda região das Américas a possuir uma 
malha ferroviária, após os Estados Unidos, foi justamente a ilha espanhola, que a 
implantou na década de 1830 para agilizar o escoamento do açúcar. Os índices 
das exportações cafeeiras e açucareiras atingiriam níveis inéditos, inundando os 
mercados dos países industrializados esses estimulantes, antes artigos de luxo, 
agora compatíveis com o padrão de consumo da classe trabalhadora europeia e 
norte-americana. Suportar o trabalho extenuante nas fábricas passaria pelo con-
sumo de grandes quantidades de açúcar e café. 
Autores como Harriet Friedmann e Philip McMichael têm se valido do concei-
to de “regime alimentar” para enquadrar as relações agrícolas internacionais de 
produção e consumo, bem como as relações entre Estado e mercado, nos perío-
dos de hegemonia das nações britânicas e norte-americana. Trata-se de uma “es-
trutura regulamentada de produção e consumo de alimentos em escala mundial” 
(FRIEDMANN, 1993). Em outras palavras, a agricultura comercial em escala glo-
34
Alimentação de crianças e adolescentes: necessidades nutricionais e 
cultura alimentar contemporânea
bal não obedece a uma ordem “natural” de relações entre oferta e demanda, mas 
é resultado de uma série de manobras de forças políticas e pressões econômicas 
que se articulam para garantir a lucratividade da produção e o consumo massivo 
de determinados produtos ao redor do planeta. Identificam-se três regimes ali-
mentares ao longo da história do capitalismo: o regime alimentar imperial, estabe-
lecido (1870-1930), que combinou o envio de produtos tropicais das colônias para 
a Europa e a importação de grãos, especialmente trigo, por parte dos territórios 
coloniais; o regime alimentar intensivo, determinado pelos Estados Unidos (1950-
1970), que redirecionou com grande apoio da publicidade os fluxos de alimen-
tos excedentes estadunidenses para os territórios pós-coloniais sobre sua área 
de influência após a Segunda Guerra Mundial; e o regime alimentar corporativo 
(1980-2000), também centrado nos Estados Unidos, que promoveu a “revolução 
do supermercado” mediante o controle do mercado pelas grandes corporações, 
interessadas no consumo de determinadas marcas. 
A diferença da era dos regimes alimentares do períodoanterior (colonialismos 
dos séculos XVI-XVIII) reside especialmente na existência de um preço mundial 
para gêneros de primeira necessidade, começando pelo trigo. Nos dizeres de Mc-
Michael (2016, p. 41 ), “no final das contas, um regime alimentar envolve a submis-
são de rotas internacionais de produtos alimentícios a um preço de mercado admi-
nistrado”, gerando degradação ambiental desenfreada, concentração, espoliação e 
dependência. Como exemplo dos efeitos dos regimes alimentares, pode-se men-
cionar o fato de que cerca de dois milhões de camponeses mexicanos produtores 
de milho perderam suas terras nos anos 1990 em razão das exportações a baixo 
custo fundamentadas por altos subsídios do governo dos Estados Unidos e pelo 
uso de agrotóxicos. Outro caso é o dos pequenos agricultores incapazes de atender 
às rígidas certificações sanitárias e tecnológicas, como, no Brasil, as do S.I.F. (Ser-
viço de Inspeção Federal), que, embora importantes em termos gerais para a pre-
servação da saúde dos consumidores, inibem a circulação, por exemplo, de queijos 
e outros derivados do leite produzidos artesanalmente, garantindo o mercado para 
os grandes produtores de laticínios em grandes cadeias de supermercados, que 
não necessariamente apresentam qualidade superior. 
Como já sugerido na seção anterior, todo esse movimento a um só tempo 
impositivo, excludente, prejudicial ao meio ambiente e à saúde da população tem 
sido problematizado não apenas pelos acadêmicos, mas por vários setores da 
sociedade. A globalização não constitui exatamente uma grande “aldeia” onde as 
pessoas livremente trocam e conhecem outras culturas. Trata-se, sobretudo, de 
processo histórico prenhe de conflitos, desigualdades e aproximações forçadas, 
no qual a alimentação ocupa lugar central. 
35
História da Alimentação Capítulo 1 
Atividade de Estudo:
1 Aponte uma diferença entre as globalizações alimentares pré-
moderna e moderna. 
2 Explique a importância da chegada dos europeus à América para 
a história da alimentação. 
3 Compare a inserção do açúcar e do café no circuito comercial do 
Atlântico.
4 Qual foi o problema identificado pelos autores na configuração 
dos regimes alimentares?
5 Assista ao documentário O mineiro e o queijo, disponível no 
YouTube, e explique os problemas enfrentados pelos pequenos 
produtores de laticínios de Minas Gerais.
6 Assista ao documentário Corporation, também disponível no 
YouTube, e explique a forma como é retratada a atuação da 
grande empresa de produtos químicos norte-americana do ramo 
do agronegócio. 
4 SABERES CULINÁRIOS ATRAVÉS 
DA HISTÓRIA
O ato de preparar ou confeccionar os alimentos em geral é definido pela 
palavra de origem latina culinária, mas, atualmente, em função da proliferação 
de cursos de formação superior na área e da elevação do status da profissão de 
cozinheiro, fala-se mais em gastronomia (da junção do grego gaster ou gastros, 
estômago, com gnomos, conhecimento) do que em culinária. Alguns autores 
sustentam que a gastronomia, como ramo do saber, vai muito além da preparação 
do alimento em si, representando o estudo da relação entre cultura e alimento. 
Como prática, visa não só saciar a fome, mas proporcionar prazer, agradando 
todos os sentidos. 
De todo modo, entre a culinária e a gastronomia, o certo é que o preparo de 
alimentos é uma das atividades mais significativas e multifacetadas da história da 
humanidade: ao alimentar o corpo, deixam-se marcas inapagáveis na memória, 
mobilizam-se afetos, sensibilidades e sentimentos dos mais profundos. 
36
Alimentação de crianças e adolescentes: necessidades nutricionais e 
cultura alimentar contemporânea
Tente se lembrar de uma das primeiras e mais significativas 
lembranças gastronômicas de sua vida. Qual é a sensação ao 
recuperar essa memória? 
Saberes e práticas culinárias vêm sendo transmitidos de variadas formas 
ao longo da história. As sociedades que desenvolveram formas de escrita 
produziram livros de culinária como forma de registro, compilação e divulgação de 
conhecimentos e técnicas de preparação dos alimentos. 
FIGURA 11 – MÃE MEXICANA ENSINANDO SUA FILHA A FAZER 
UMA TORTILHA DE MILHO. CÓDICE FLORENTINO
FONTE: <http://andanzas-ciencia-cultura.blogspot.com/2015/02/
nixtamalizacion-del-maiz.html>. Acesso em: 20 nov. 2018.
Os mais antigos datam dos séculos V e IV a.C. Muito frequentemente, além 
da listagem por escrito de ingredientes, proporções, quantidades, forma e tempo 
de cozimento, técnicas e formas de utilização de utensílios e tecnologias especiais, 
37
História da Alimentação Capítulo 1 
tais livros são acrescidos de fontes visuais, desde gravuras até fotografias nos 
mais recentes, que enriquecem muito a percepção sobre costumes, usos e gostos 
de uma época. Como sabemos, os gostos por sabores e odores dos alimentos 
também são históricos. Portanto, respondem a uma série de estímulos culturais e 
econômicos e sofrem transformações com o passar do tempo.
A criação de escolas de gastronomia é um fenômeno relativamente recente, 
datando em sua maioria do século XIX. Durante muito tempo, a formação 
profissional se deu por uma relação entre mestres e aprendizes no cotidiano das 
cozinhas de restaurantes, estalagens, tavernas, palácios e em casernas militares. 
Inclusive, existe uma clara relação entre a hierarquia militar e a organização das 
cozinhas profissionais no Ocidente. Atualmente, ganha fôlego um cosmopolitismo 
gastronômico, isto é, tende-se a valorizar as culinárias regionais das mais diversas 
partes do mundo. Não obstante, a França continua sendo a grande referência em 
termos de técnicas, terminologias e as formas de organização na cozinha. 
Um grande marco da projeção internacional francesa foi a criação, em 1895, 
da escola Le Cordon Bleu, referência à Ordem dos Cavaleiros do Santo Espírito, 
cuja honraria era representada por um cordão azul. Além do que, atribui-se ao 
chef francês Georges-Auguste Escoffier (1847-1935) a organização do “sistema 
de brigada”, no qual existem responsabilidades muito claras para os membros 
da equipe de uma cozinha profissional. No Brasil, desde o final da década de 
1990, as escolas de gastronomia em nível técnico e superior têm crescido país 
afora, explorando-se o potencial turístico e aproveitando-se o aumento do poder 
de consumo da população nos anos 2000. 
TABELA 1 – HIERARQUIA DA COZINHA PROFISSIONAL
38
Alimentação de crianças e adolescentes: necessidades nutricionais e 
cultura alimentar contemporânea
FONTE: <http://gasbasica.blogspot.com/2015/03/hierarquia-da-
cozinha-profissional.html>. Acesso em: 20 nov. 2018.
Sem negar a importância de livros e escolas, é possível dizer que a 
experiência, o convívio e a oralidade têm sido as vias de transmissão mais 
duradoras da arte de cozinhar. O ambiente familiar, o espaço da casa, foi 
o locus primordial da transmissão de conhecimentos culinários. Em diver-
sas regiões do mundo ocidental, um suporte importante para o registro e 
sistematização cotidiana de práticas culinárias foram os cadernos de recei-
tas, testemunhos eminentemente femininos. Como destaca Rogéria Du-
tra (2014, p. 5), esses cadernos, muitas vezes de autoria coletiva de avós, 
mães, tias e filhas, lidam com “um saber doméstico fortemente ancorado na 
prática”, constituindo uma “janela alternativa para a expressão individual das 
mulheres” e da cultura alimentar das sociedades nas quais se inscrevem. 
FIGURA 12 – LIVRO DE RECEITAS
FONTE: <https://oglobo.globo.com/ela/gastronomia/cadernos-de-receitas-do-sul-
de-minas-sao-tratados-como-tesouros-21144443>. Acesso em: 20 nov. 2018.
39
História da Alimentação Capítulo 1 
Em sua casa havia um livro de receitas? Se sim, quem o comple-
tava? Quem o consultava? Qual é a importância dele em sua casa? 
Certas atividades profissionais, como a dos tropeiros, mencionados 
anteriormente, por exemplo, formaram repertórios culinários riquíssimos, que 
influenciaram diversasculinárias regionais. Durante as longas jornadas que 
faziam transportando mantimentos, aqueles homens necessitavam consumir 
refeições com elevado teor calórico. Normalmente, o tropeiro mais experiente 
era responsável pelo preparo das refeições enquanto a tropa era arreada pelos 
demais. Logo de madrugada, o feijão era posto para cozinhar em um tripé de 
ferro e o toucinho era frito numa panela grande. Na parada do almoço, os homens 
comiam um composto de feijão, toucinho, farinha de mandioca, carne seca ou 
linguiça (quando havia), acompanhado de arroz, couve ou ora-pro-nóbis. Daí 
nasceu o famoso feijão tropeiro e uma tradição transmitida ao longo de várias 
gerações antes de chegar aos livros de receita e sites da internet. 
Efetue uma pesquisa sobre as origens de um prato típico de sua 
região, buscando saber a forma como os conhecimentos em torno de 
seu preparo foram registrados e transmitidos.
Efetivamente, a internet constitui um extraordinário veículo para a 
transmissão de saberes culinários. Uma infinidade de sites especializados contém 
uma torrente enorme de informações sobre técnicas de preparo, harmonização 
com bebidas e assim por diante. Cada vez mais, receitas escritas dão lugar a 
vídeos com cozinheiros profissionais e amadores demonstrando como fazer todo 
tipo de prato, das mais variadas origens, como os mais variados ingredientes. Os 
programas de culinária estão cada vez mais populares e ajudam na glamurização 
da profissão dos chamados chefs de cozinha. Ainda assim, é inegável que tais 
programas têm estimulado as pessoas a cozinharem mais e a ampliarem seu 
repertório gastronômico, o que é muito positivo. 
40
Alimentação de crianças e adolescentes: necessidades nutricionais e 
cultura alimentar contemporânea
Atividade de Estudo
1 Assista a dois programas distintos de culinária na televisão e es-
tabeleça um comparativo, identificando semelhanças e diferen-
ças quanto ao enfoque das formas de preparo e degustação dos 
alimentos. Por fim, efetue uma avaliação crítica, registrando suas 
impressões a respeito do papel desse tipo de produto cultural na 
transmissão de saberes culinários.
2 Encontre e analise um livro de culinária qualquer, identificando 
aspectos como: organização, forma de transmissão das informa-
ções e tipo de comida a que se dedica. 
ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
Ao longo do capítulo, vimos como em diferentes épocas e em diferentes 
culturas, os alimentos eram obtidos e consumidos; percebemos que os alimentos 
disseminados pelo globo nos dias atuais eram em grande parte bastante restritos 
a determinadas regiões até o início da Era Moderna; discutimos as implicações 
das globalizações alimentares e refletimos a respeito de algumas das principais 
formas de transmissão dos saberes culinários. 
A pretensão aqui não foi esgotar o assunto, mas apresentar uma breve, 
porém consistente, introdução a respeito do tema, indicando caminhos e 
levantando problemas. As transformações históricas que marcaram o acesso aos 
alimentos representam aspecto vital para o entendimento das forças que movem 
o consumo na atualidade. As reflexões aqui tecidas servirão de base para os 
demais capítulos, nos quais a alimentação no mundo contemporâneo e a questão 
específica das necessidades nutricionais de crianças e adolescentes em idade 
escolar serão enfrentados diretamente. 
REFERÊNCIAS
BRAUDEL, Fernand. Civilização material, economia e capitalismo – séculos 
XV – XVIII: as estruturas do cotidiano. v. 1. São Paulo: Martins Fontes, 2005.
CARNEIRO, Henrique. Comida e sociedade: uma história da alimentação. 7. ed. 
Rio de janeiro: Elsevier, 2003.
41
História da Alimentação Capítulo 1 
CASCUDO, Luís da Câmara. História da alimentação no Brasil. 3. ed. São 
Paulo: Global, 2004.
DUTRA, Rogéria Campos de Almeida. Registro, memória e transmissão 
cultural: os textos culinários e o caderno de receitas. Trabalho apresentado na 
29ª Reunião Brasileira de Antropologia, realizado entre os dias 3 a 6 de agosto 
de 2014, Natal, RN.
FRIEDMANN, H. The political economy of food: a global crisis. New Left 
Review, London, n. 197, pp. 27-59, 1993.
FLANDRIN, Jean-Louis; MONTANARI, Massimo. História da alimentação. 6. 
ed. São Paulo: Estação Liberdade, 1998.
KIPLE, Kenneth F.; ORNELAS Kriemhild Coneè. The Cambridge World History 
of Food. Cambridge: Cambridge University Press, 2008
LÉVI-STRAUSS, Claude. Mitológicas ll – do mel às cinzas. São Paulo: Cosac 
e Naify, 2005.
LÉVI-STRAUSS, Claude. Mitológicas I – o cru e o cozido. São Paulo: Cosac e 
Naify, 2004. 
LOCKARD, Craig. Societies, networks and transitions: a global history. 
Florence: Cengage Learning, Inc., 2014.
MCMICHAEL, Philip. Regimes alimentares e questões agrárias. Porto Alegre: 
São Paulo: Editora da UFRGS; Editora UNESP, 2016.
42
Alimentação de crianças e adolescentes: necessidades nutricionais e 
cultura alimentar contemporânea
CAPÍTULO 2
Alimentação na 
Contemporaneidade
A partir da perspectiva do saber-fazer são apresentados os seguintes 
objetivos de aprendizagem:
� compreender as relações entre fome e desigualdade social;
� entender como os alimentos ultraprocessados e os agrotóxicos são prejudiciais 
à vida planetária;
� diferenciar alimentos in natura, processados e ultraprocessados; 
� contribuir para a reflexão sobre práticas alimentares sustentáveis.
44
Alimentação de crianças e adolescentes: necessidades nutricionais e 
cultura alimentar contemporânea
45
Alimentação na Contemporaneidade Capítulo 2 
1 CONTEXTUALIZAÇÃO
Este capítulo é baseado, principalmente, no levantamento de dados recentes 
das Nações Unidas e do IBGE, além, claro, das contribuições dos principais 
especialistas. O foco é o esclarecimento a respeito dos problemas e dilemas 
que envolvem o consumo de alimentos no mundo contemporâneo. Parte-se do 
problema humano básico da falta de alimentos, que é inserido no leque mais 
amplo da noção de insegurança alimentar. Em seguida, explora-se a classificação 
dos alimentos em in natura / minimamente processados, ingredientes culinários, 
processados e ultraprocessados, destacando especialmente os malefícios 
dos ultraprocessados. Por fim, exploram-se os dilemas que envolvem o uso de 
agrotóxicos na produção de alimentos. 
2 A QUESTÃO DA FOME E DA MÁ 
NUTRIÇÃO NO BRASIL
FIGURA 1 – RETIRANTES, DE PORTINARI (1944)
FONTE: <http://www.portinari.org.br/>. Acesso em: 4 nov. 2018.
http://www.portinari.org.br/
46
Alimentação de crianças e adolescentes: necessidades nutricionais e 
cultura alimentar contemporânea
Somos muitos Severinos iguais em tudo na vida: na mesma 
cabeça grande que a custo é que se equilibra, no mesmo 
ventre crescido sobre as mesmas pernas finas e iguais 
também porque o sangue, que usamos tem pouca tinta. E se 
somos Severinos iguais em tudo na vida, morremos de morte 
igual, mesma morte severina: que é a morte de que se morre 
de velhice antes dos trinta, de emboscada antes dos vinte, de 
fome um pouco por dia (de fraqueza e de doença é que a morte 
severina ataca em qualquer idade, e até gente não nascida) 
(MELO NETO, 1974, p. 73).
Em uma linguagem objetiva, é possível definir a fome como a incapacidade 
de se consumir o total calórico correspondente ao gasto energético do organismo 
(ABRAMOVAY,1985). Todavia, esta definição literal é muito menos fiel à realidade 
do que representações artísticas como as de Portinari e Mello Neto que produzem 
sensibilidade e empatia em torno da questão humana da fome. 
Temos diante de nós um fenômeno social perene, que marcou de forma grave 
toda a história da humanidade. É causa de sofrimento irreparável e está associada 
a complexas variáveis de caris socioambiental, geopolítico e econômico. 
No entanto, o seu enquadramento como um problema humanitário a ser 
superado é relativamente recente. Até duzentos anos atrás, a fome era tratada 
como uma ocorrência natural, inevitável e até mesmo necessária. 
FIGURA 2 – THOMAS MALTHUS (1766-1884)
FONTE: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Thomas_Malthus>.

Continue navegando