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Ana Beatriz Figuerêdo Almeida - Medicina 2022.1 1 Neurologia: Órgãos sensoriais SP 2.1 – VAI VOLTAR... 1. ESTUDAR BIOELETROGÊSE. Bioeletrogênese: Propriedade de certas células (neurônios e células musculares) gerar e alterar a diferença de potencial elétrico através da membrana. Existem potenciais elétricos através das membranas de praticamente todas as células do corpo. Algumas células, como as células nervosas e as dos músculos, geram impulsos eletroquímicos que se modificam, com grande rapidez, em suas membranas, e esses impulsos são usados para transmitir sinais por toda a membrana dos nervos e músculos. Ainda, em outros tipos de células, por exemplo, as células glandulares, os macrófagos e as células ciliadas, alterações locais dos potenciais de membrana também ativam muitas funções celulares. A concentração de potássio é maior na face interna da membrana da fibra nervosa, mas bastante baixa na sua face externa. Vamos então assumir que a membrana, nesse instante, é permeável aos íons potássio e a mais nenhum outro íon. Por causa do alto gradiente de concentração do potássio, de dentro para fora, existe forte tendência para que um maior número de íons potássio se difunda para fora através da membrana. Quando o fazem, eles levam cargas elétricas positivas para o exterior, criando assim eletropositividade da face externa da membrana e eletronegatividade na interna, por causa dos ânions negativos que permanecem no interior, não se difundindo para fora com o potássio. Em cerca de um milissegundo, a diferença de potencial entre as partes interna e externa, chamada potencial de difusão, passa a ser suficientemente grande para bloquear a difusão efetiva do potássio para o exterior, apesar do alto gradiente de concentração dos íons potássio. Nas fibras nervosas normais de mamíferos, a diferença de potencial é cerca de 94 milivolts, com negatividade na face interna da membrana. A Figura B mostra o mesmo fenômeno que a Figura A, só que dessa vez com alta concentração de íons sódio fora da membrana e baixa quantidade de íons sódio dentro. Esses íons têm também carga positiva. Nesse instante, a membrana é muito permeável aos íons sódio, mas impermeável a todos os outros íons. A difusão dos íons sódio, positivamente carregados, para a parte interna cria potencial de membrana com polaridade oposta à da figura A, com negatividade externa e positividade interna. Novamente, o potencial de membrana aumenta o suficiente, dentro de milissegundos, para bloquear a difusão efetiva dos íons sódio para dentro; entretanto a esse tempo nas fibras nervosas de mamíferos, o potencial fica em torno de 61 milivolts, positivo dentro da fibra. Desse modo, nas duas partes da figura, vê-se que as diferenças entre as concentrações iônicas nos dois lados de membrana seletivamente permeável podem, sob condições apropriadas, criar potencial de membrana. A Equação de Nernst Descreve a Relação do Potencial de Difusão com a Diferença de Concentração de Íons através de uma Membrana. O valor do potencial de difusão, em toda a membrana, que se opõe exatamente ao da difusão efetiva de um íon em particular através da membrana é conhecido como potencial de Nernst para esse íon. A grandeza do potencial de Nernst é determinada pela proporção entre as concentrações desse íon específico nos dois lados da membrana. Quanto maior essa proporção, maior será a tendência para que o íon se difunda em uma direção, e, por conseguinte, maior o potencial de Nernst necessário para evitar difusão efetiva adicional. A equação de Nernst, pode ser usada para o cálculo do potencial de Nernst para qualquer íon univalente na temperatura normal do corpo de 98,6 ºF (37 ºC). Quando se usa essa fórmula, assume-se, em geral, que o potencial no líquido extracelular, por fora da membrana, permanece no potencial zero, e o potencial de Nernst é o potencial no lado interno da membrana. Também o sinal do potencial é positivo ( +) se o íon, difundindo-se de dentro para fora, for íon negativo, e negativo (−) se o íon for positivo. Dessa maneira, quando a concentração dos íons positivos de potássio na parte interna for 10 vezes maior que na parte externa, o log de 10 é 1, de modo que o potencial de Nernst é calculado como –61 milivolts no lado interno da membrana. A Equação de Goldman Utiliza-se para Calcular o Potencial de Difusão quando a Membrana é Permeável a Vários Íons Diferentes. Quando a membrana é permeável a vários íons diferentes, o potencial de difusão que se desenvolve depende de três fatores: (1) a polaridade das cargas elétricas de cada íon; (2) a permeabilidade da membrana (P) para cada íon; e (3) as concentrações (C) dos respectivos íons no lado interno (i) e no lado externo (e) da membrana. Assim, a seguinte fórmula, referida como equação de Goldman, ou como equação de Goldman-Hodgkin-Katz, dá o potencial calculado do lado interno da membrana quando dois íons Ana Beatriz Figuerêdo Almeida - Medicina 2022.1 2 positivos univalentes, sódio (Na +) e potássio (K+), e um íon univalente negativo, cloreto (Cl −), estão envolvidos. A partir da equação de Goldman vários pontos-chave tornam-se evidentes. ➜ Primeiro, os íons sódio, potássio e cloreto são os íons mais importantes envolvidos no desenvolvimento dos potenciais de membrana nas fibras musculares e nervosas, bem como nas células neuronais do sistema nervoso. O gradiente de concentração de cada um desses íons, através da membrana, ajuda a determinar a voltagem do potencial de membrana. ➜ Segundo, o grau de importância de cada um desses íons na determinação da voltagem é proporcional à permeabilidade da membrana para cada íon em particular. Isto é, se a membrana tiver permeabilidade zero para os íons potássio e cloreto, o potencial de membrana passa a ser totalmente dominado pelo gradiente de concentração dos íons sódio, e o potencial resultante será igual ao potencial de Nernst para o sódio. O mesmo acontece para cada um dos outros dois íons, se a membrana só for seletivamente permeável para um ou para outro. ➜ Terceiro, gradiente positivo de concentração iônica de dentro para fora da membrana causa eletronegatividade no lado de dentro da membrana. A razão para esse fenômeno é que o excesso de íons positivos se difunde de fora quando sua concentração é maior dentro do que fora. Essa difusão leva cargas positivas para fora, mas deixa os ânions negativos não difusíveis na parte interna, criando, assim, eletronegatividade na parte interna. O efeito oposto ocorre quando existe gradiente para íon negativo. Isto é, o gradiente de íon cloreto, da parte externa para a parte interna, causa eletronegatividade dentro da célula porque o íon cloreto, com cargas negativas, se difunde para2 dentro, deixando os íons positivos não difusíveis do lado de fora. ➜ Quarto, como explicado adiante, a permeabilidade dos canais de sódio e potássio passa por rápidas alterações durante a transmissão dos impulsos nervosos, enquanto a permeabilidade dos canais de cloreto não tem grandes alterações durante esse processo. Dessa forma, rápidas alterações da permeabilidade do sódio e do potássio são primariamente responsáveis pela transmissão de sinais nos neurônios. O método para medir o potencial de membrana é simples na teoria, mas, em geral, complicado na prática, em razão das pequenas dimensões da maioria das fibras. Enquanto o eletródio está na face externa da membrana, o registro do potencial é zero, que é o potencial do líquido extracelular. Então, conforme o eletródio registrador passa através da área de variação da voltagem na membrana celular (chamada de camada do dipolo elétrico), o potencial diminui abruptamente para –90 milivolts. Ao se mover o microeletródio para o centro da fibra, o potencial permanece no nível constante de –90milivolts, mas volta de novo a zero no instante em que passa através da membrana para o lado oposto da fibra. Para criar um potencial negativo no lado interno da membrana, só devem ser transportados para o exterior suficientes íons positivos para desenvolver a camada do dipolo elétrico na própria membrana. Todos os íons que permanecem dentro da fibra nervosa podem ser positivos ou negativos. Por essa razão, a transferência de um número inacreditavelmente pequeno de íons através da membrana pode estabelecer o “potencial de repouso” normal de –90 milivolts dentro da fibra nervosa. Também, número igualmente pequeno de íons positivos, movendo-se de fora para dentro da fibra pode inverter o potencial de –90 milivolts para o máximo de +35 milivolts, dentro de apenas 1/10.000 de segundo. POTENCIAL DE REPOUSO DE MEMBRANA DOS NEURÔNIOS O potencial de repouso das membranas das fibras nervosas mais calibrosas, quando não estão transmitindo sinais nervosos, é de cerca de –90 milivolts. Isto é, o potencial dentro da fibra é 90 milivolts mais negativo do que o potencial no líquido extracelular, do lado de fora da fibra. ➜ Transporte Ativo dos Íons Sódio e Potássio Através da Membrana — A Bomba de Sódio-Potássio (Na+-K+). Todas as membranas celulares do corpo contêm uma bomba de Na+-K+ potente, que transporta continuamente íons sódio para fora da célula, e íons potássio para dentro da célula. Deve ser notado que essa é uma bomba eletrogênica, porque mais cargas positivas são bombeadas para fora que para dentro (três íons Na+ para fora, a cada dois íons K+ para dentro), deixando déficit real de íons positivos na parte de dentro; isso gera o potencial negativo, no lado de dentro das membranas celulares. A bomba de Na+-K+ produz também grande gradiente de concentração para o sódio e para o potássio, através da membrana nervosa em repouso. ➜ Vazamento do Potássio e do Sódio, através da Membrana da Célula Nervosa. A figura mostra a proteína de canal, algumas vezes conhecida por “domínio de duplo poro”, canal de potássio ou canal de “vazamento” de potássio (K+), na fibra nervosa, por onde o potássio pode vazar mesmo na célula em repouso. Esses canais de vazamento de K+ podem também vazar quantidades mínimas de íons sódio, porém são muito mais permeáveis aos íons potássio que aos íons sódio, em geral, cerca de 100 vezes mais permeáveis. Esse diferencial na permeabilidade é um fator-chave na determinação do nível do potencial de repouso normal da membrana. Ana Beatriz Figuerêdo Almeida - Medicina 2022.1 3 ORIGEM DO POTENCIAL DE REPOUSO NORMAL DA MEMBRANA ➜ Contribuição do Potencial de Difusão do Potássio. Admitindo que o único movimento iônico através da membrana é o de difusão dos íons potássio, como demonstrado pelos canais abertos entre os símbolos de potássio (K+) dentro e fora da membrana. Devido à alta proporção dos íons potássio dentro e fora, 35:1, o potencial de Nernst correspondente a essa proporção é de –94 milivolts, porque o logaritmo de 353 é 1,54 que, multiplicado por –61 milivolts, resulta em –94 milivolts. Portanto, se os íons potássio fossem os únicos fatores causadores do potencial de repouso, o potencial de repouso, dentro da fibra, seria igual a –94 milivolts. ➜ Contribuição da Difusão do Sódio através da Membrana Nervosa. A Figura mostra a adição da pequena permeabilidade da membrana nervosa aos íons sódio, causada pela difusão diminuta dos íons sódio, pelos canais de extravasamento de Na +-K+. A proporção entre os íons sódio através da membrana, de dentro para fora, é de 0,1, o que corresponde ao potencial calculado de Nernst no lado de dentro da membrana de +61 milivolts. Também mostrado na Figura é o potencial de Nernst para a difusão do potássio, que é de –94 milivolts. Pode-se observar que se a membrana for muito permeável ao potássio, mas apenas levemente permeável ao sódio, é lógico que a difusão do potássio contribuirá muito mais para o potencial de membrana do que para a difusão do sódio. Na fibra nervosa normal, a permeabilidade da membrana ao potássio é cerca de 100 vezes maior do que a permeabilidade ao sódio. Ao usar esse valor na equação de Goldman, será obtido o potencial do lado de dentro da membrana de –86 milivolts que se aproxima do potencial de potássio mostrado na figura. ➜ Contribuição da Bomba de Na+-K+. A bomba Na+-K+ adicionalmente para o potencial de repouso. Na figura ocorre um bombeamento contínuo de três íons sódio para o exterior para cada dois íons potássio bombeados para o lado interno da membrana. O bombeamento de mais íons sódio para fora do que íons potássio para dentro produz perda contínua de cargas positivas pelo lado interno da membrana, criando um grau adicional de negatividade (em torno de –4 milivolts adicionais) no lado interno, além da produzida pela difusão. Por essa razão, o potencial de membrana efetivo, com todos esses fatores atuantes ao mesmo tempo, é de cerca de –90 milivolts. Em resumo, os potenciais de difusão causados pela difusão do sódio e do potássio atuando isoladamente produziriam potencial de membrana de cerca de –86 milivolts, quase todo determinado pela difusão do potássio. Então, –4 milivolts adicionais são somados ao potencial de membrana pela bomba eletrogênica contínua de Na+-K+, resultando no potencial de membrana efetivo de –90 milivolts. POTENCIAL DE AÇÃO DOS NEURÔNIOS Os sinais nervosos são transmitidos por potenciais de ação, que são rápidas alterações do potencial de membrana que se propagam com grande velocidade por toda a membrana da fibra nervosa. Cada potencial de ação começa por uma alteração súbita do potencial de membrana normal negativo para um potencial positivo, terminando com retorno quase tão rápido para o potencial negativo. Para conduzir o sinal nervoso, o potencial de ação se desloca ao longo da fibra nervosa até sua extremidade final. Ana Beatriz Figuerêdo Almeida - Medicina 2022.1 4 ➜ Estágio de Repouso. O estágio de repouso é o potencial de repouso da membrana, antes do início do potencial de ação. Diz-se que a membrana está “polarizada” durante esse estágio, em razão do potencial de membrana de −90 milivolts negativo existente. ➜ Estágio de Despolarização. A esse tempo, a membrana fica subitamente muito permeável aos íons sódio, permitindo que grande número de íons sódio, positivamente carregados, se difunda para o interior do axônio. O estado normal de “polarização” de –90 milivolts é, de imediato, neutralizado pelo influxo dos íons sódio com carga positiva, com o potencial aumentando rapidamente para valor positivo, um processo chamado despolarização. Nas fibras nervosas de maior calibre, o grande excesso dos íons sódio positivos que se deslocam para o interior da fibra faz com que o potencial de membrana “ultrapasse” (overshoot) rapidamente o nível zero e torne-se positivo. Em algumas fibras delgadas, bem como em muitos neurônios do sistema central, o potencial de membrana simplesmente se aproxima do nível zero, não o ultrapassando para chegar ao estado positivo. ➜ Estágio de Repolarização. Em alguns décimos de milésimos de segundo após a membrana ter ficado muito permeável aos íons sódio, os canais de sódio começam a se fechar, e os canais de potássio se abrem mais que o normal. Então, a rápida difusão dos íons potássio para o exterior restabelece o potencial de repouso negativo da membrana que é referido como repolarização da membrana. OS CANAIS DE SÓDIO E POTÁSSIO REGULADOS PELA VOLTAGEM O agente necessário para provocar a depolarização e a repolarização da membrana nervosa durante o potencial de ação é o canal de sódio regulado pela voltagem. O canal de potássio regulado pela voltagem também tem participação importante por aumentar a rapidez da repolarização da membrana. Esses dois canaisregulados pela voltagem atuam de forma adicional com a bomba de Na+-K+ e com os canais de vazamento de Na+-K+. ➜ Ativação e Inativação do Canal de Sódio Regulado pela Voltagem. O canal de sódio é regulado pela voltagem em três estados distintos. Esse canal tem duas comportas — uma perto da abertura externa do canal, referida como comporta de ativação, e a outra perto da abertura interna do canal, referida como comporta de inativação. Quando o potencial de membrana é –90 milivolts (membrana normal em repouso), a comporta de ativação está fechada, impedindo a entrada, por menor que seja, de íons sódio para o interior da fibra, por esses canais de sódio. ➜ Ativação do Canal de Sódio. Quando o potencial de membrana se torna menos negativo que durante o estado de repouso, aumentando de –90 milivolts até zero, ele atinge a voltagem (em geral, de cerca de −70 a −50 milivolts), o que provoca alteração conformacional abrupta da comporta de ativação, fazendo com que o canal fique totalmente aberto. Durante esse estado ativado, os íons sódio podem entrar pelo canal, aumentando a permeabilidade da membrana ao sódio por 500 a 5.000 vezes. ➜ Inativação do Canal de Sódio. O mesmo aumento da voltagem4 que faz com que a comporta seja ativada também faz com que essa comporta seja inativada. A comporta é desativada em poucos décimos de milésimos de segundo após ter sido ativada. Isto é, a alteração conformacional que provoca o fechamento da comporta de ativação é um processo mais lento que a alteração conformacional que abre a comporta de ativação. Assim, após o canal de sódio ter permanecido aberto por alguns décimos de milésimos de segundo, o canal é inativado e se fecha, e os íons sódio não podem atravessar a membrana. Nesse momento, o potencial de membrana começa a retornar ou se aproximar de seu estado normal de repouso, que é o processo de repolarização. Outra característica importante do processo de inativação do canal de sódio é que a comporta inativada só vai reabrir quando o potencial de membrana retornar ou se aproximar do potencial de repouso na condição original. Por essa razão, usualmente não é possível para o canal de sódio voltar a abrir sem que a fibra nervosa seja primeiro repolarizada. ➜ O Canal de Potássio Regulado pela Voltagem e sua Ativação. Ao longo do estado de repouso, a comporta do canal de potássio está fechada, e os íons potássio são impedidos de passar por esse canal para o exterior. Quando o potencial de membrana aumenta de −90 milivolts para zero essa variação da voltagem provoca a abertura conformacional da comporta, permitindo aumento da difusão de potássio para fora, por meio desses canais. Entretanto, devido ao pequeno retardo na abertura dos canais de potássio, em sua maioria eles só abrem exatamente no mesmo momento em que os canais de sódio estão começando a se fechar em função de sua inativação. Assim, a redução da entrada de sódio na célula e o aumento simultâneo da saída de potássio da célula fazem com que o processo de repolarização seja acelerado, levando à Ana Beatriz Figuerêdo Almeida - Medicina 2022.1 5 completa recuperação do potencial de repouso da membrana em poucos décimos de milésimos de segundo. RESUMO DOS EVENTOS CAUSADORES DO POTENCIAL DE AÇÃO Durante o período de repouso, antes que o potencial de ação se inicie, a condutância para os íons potássio é cerca de 50 a 100 vezes maior que a condutância para os íons sódio. Essa disparidade é causada pelo maior vazamento dos íons potássio que dos íons sódio pelos canais de vazamento. Todavia, com o desencadeamento do potencial de ação, o canal de sódio instantaneamente é ativado, permitindo aumento de até 5.000 vezes da condutância do sódio. Então, o processo de inativação fecha os canais de sódio em fração de milissegundo. O desencadeamento do potencial de ação causa também a regulação pela voltagem da abertura dos canais de potássio, fazendo com que ela ocorra mais lentamente, em fração de milissegundo após a abertura dos canais de sódio. Ao final do potencial de ação, o retorno do potencial de membrana ao estado negativo faz com que os canais de potássio se fechem novamente, voltando a seu estado original, mas, de novo, somente após retardo adicional de um milissegundo ou mais. Durante a parte inicial do potencial de ação, a proporção entre as condutâncias do sódio e potássio aumenta por mais de 1.000 vezes. Por isso, muito mais íons sódio fluem para o interior da fibra do que os íons potássio para o exterior. Essa é a causa de o potencial de membrana ficar positivo no início do potencial de ação. Em seguida, os canais de sódio começam a se fechar, e os canais de potássio a se abrir, de modo que a proporção entre as condutâncias varia para o predomínio da condutância do potássio, aumentando em muito a condutância do potássio e reduzindo a condutância do sódio. Esse deslocamento permite uma perda muito rápida dos íons potássio para o exterior, mas, praticamente, fluxo nulo de íons sódio para o interior. Em consequência, o potencial de ação rapidamente retorna ao seu nível basal. ➜ ÍONS CÁLCIO: A membrana de quase todas as células do corpo contém a bomba de cálcio semelhante à bomba de sódio, e o cálcio, em algumas células, junto com (ou no lugar do) sódio, causa a maior parte do potencial de ação. Como a bomba de sódio, a bomba de cálcio transporta os íons cálcio do interior da membrana celular para o exterior (ou para o retículo endoplasmático da célula), criando gradiente iônico de cálcio de cerca de 10.000 vezes. Esse processo deixa concentração celular de íons cálcio em torno de 10−7 molar, em contraste com a concentração externa de cerca de 10−3 molar. Além disso, existem canais de cálcio regulados pela voltagem. Visto que a concentração do íon cálcio é mais de 10.000 vezes maior no líquido extracelular que no líquido intracelular, existe imenso gradiente de difusão para o fluxo passivo de cálcio para a célula. Esses canais são ligeiramente permeáveis aos íons sódio e aos íons cálcio, mas sua permeabilidade para os íons cálcio é cerca de 1.000 vezes maior que para os íons sódio, nas condições fisiológicas normais. Quando o canal se abre, em resposta a estímulo que despolariza a membrana celular, os íons cálcio fluem para o interior da célula. A principal função dos canais de cálcio regulados pela voltagem é a de contribuir para a fase de despolarização do potencial de ação, em algumas células. Todavia, a regulação dos canais de cálcio é lenta, levando 10 a 20 vezes mais tempo que a ativação dos canais de sódio. Por essa razão, eles com frequência são chamados canais lentos, em contraste com os canais de sódio, chamados canais rápidos. Por isso, a abertura dos canais de sódio produz despolarização mais prolongada, enquanto a dos canais de sódio promove o início dos potenciais de ação. Os canais de cálcio são muito numerosos no músculo cardíaco e no músculo liso. Na verdade, em alguns tipos de músculo liso, os canais rápidos de sódio são bastante raros, de modo que o potencial de ação ocorre quase exclusivamente pela ativação dos lentos canais de cálcio. 2. ENTENDER OS ESTÍMULOS QUE DESENCADEIAM O MECANISMO OLFATIVO E GUSTATIVO E COMO SÃO IDENTIFICADOS (ESTRUTURAS DA LÍNGUA E NARIZ). MECANISMO GUSTATIVO A gustação é principalmente função dos botões gustatórios presentes na boca, mas é comum a experiência de que a olfação também contribui intensamente para a percepção do paladar. Além disso, a textura do alimento, detectada pelos sensores de tato da boca, e a presença de substâncias no alimento que estimulam as terminações dolorosas, tais como a pimenta, alteram sensivelmente a experiência do paladar. A importância do paladar reside no fato de que ele permite à pessoa selecionar substâncias específicas, de acordocom os seus desejos e frequentemente de acordo com as necessidades metabólicas dos tecidos corporais. As identidades das substâncias químicas específicas, que excitam os diferentes receptores gustatórios não são completamente conhecidas. Os estudos psicofisiológicos e neurofisiológicos identificaram pelo menos 13 receptores químicos prováveis nas células gustatórias, como descrito a seguir: dois receptores para sódio, dois receptores para potássio, um receptor para cloreto, um receptor para adenosina, um receptor para inosina, dois receptores para doce, dois receptores para amargo, um receptor para glutamato e um receptor para o íon hidrogênio. Ana Beatriz Figuerêdo Almeida - Medicina 2022.1 6 Para análise mais prática da gustação, as capacidades dos receptores gustatórios mencionados foram agrupadas em cinco categorias gerais chamadas sensações primárias da gustação. São elas: azeda, salgada, doce, amarga e “umami”. A pessoa pode perceber centenas de diferentes gostos. Acredita-se que eles sejam combinações das sensações gustatórias elementares, da mesma forma como as cores que vemos são combinações das três cores primárias. ➜ Gosto Azedo: O gosto azedo é causado pelos ácidos, isto é, pela concentração do íon hidrogênio, e a intensidade dessa sensação é aproximadamente proporcional ao logaritmo da concentração do íon hidrogênio (isto é, quanto mais ácido o alimento, mais forte se torna a sensação de azedo). ➜ Gosto Salgado: O gosto salgado é provocado por sais ionizados, principalmente pela concentração de íons sódio. A qualidade do gosto varia ligeiramente de um sal para outro porque alguns sais provocam outras sensações gustatórias além do salgado. Os cátions dos sais, em especial o sódio, são os principais responsáveis pelo gosto salgado, mas os ânions também contribuem, mesmo que em menor grau. ➜ Gosto Doce: O gosto doce não é induzido por categoria única de substâncias químicas. Alguns tipos de substâncias que provocam este gosto são: açúcares, glicóis, álcoois, aldeídos, cetonas, amidos, ésteres, alguns aminoácidos, algumas proteínas pequenas, ácidos sulfônicos, ácidos halogenados, e sais inorgânicos de chumbo e berílio. Deve- se ressaltar que a maioria das substâncias que induzem o gosto doce é orgânica. É especialmente interessante o fato de que pequenas alterações na estrutura química, tais como a adição de radical simples, podem frequentemente mudar a substância de doce para amarga. ➜ Gosto Amargo: O gosto amargo, assim como o gosto doce, não é induzido por tipo único de agente químico. Nesse caso, novamente as substâncias que provocam o gosto amargo são quase exclusivamente substâncias orgânicas. Duas classes particulares de substâncias destacam-se como indutoras das sensações de gosto amargo: (1) substâncias orgânicas de cadeia longa, que contêm nitrogênio; e (2) alcaloides. Os alcaloides incluem muitos dos fármacos utilizados como medicamentos, como quinina, cafeína, estricnina e nicotina. Algumas substâncias que inicialmente têm gosto doce induzem no final um gosto amargo. Essa característica ocorre com a sacarina, o que torna o uso dessa substância questionável para algumas pessoas. O gosto amargo, quando ocorre em alta intensidade, faz com que frequentemente a pessoa ou o animal rejeite o alimento. Essa reação é, sem dúvida, função importante da sensação de gosto amargo porque muitas toxinas letais, encontradas em plantas venenosas são alcaloides, e quase todos esses alcaloides provocam gosto amargo intenso, não raro, seguido pela rejeição do alimento. ➜ Gosto Umami: Umami, uma palavra japonesa que significa “delicioso”, designa a sensação de gosto prazerosa que é qualitativamente diferente do azedo, do salgado, do doce ou do amargo. Umami é o gosto predominante dos alimentos que contêm l-glutamato, tais como caldos de carne e queijo amadurecido, e alguns fisiologistas o consideram como categoria separada, a quinta categoria de estímulo primário do paladar. O receptor gustatório para o l-glutamato pode estar relacionado a um dos receptores sinápticos para o glutamato que também são expressos nas sinapses neuronais do cérebro. Entretanto, os mecanismos moleculares precisos responsáveis pelo gosto umami ainda não estão esclarecidos. LIMIAR PARA O GOSTO O limiar para a estimulação do gosto azedo pelo ácido clorídrico é de, aproximadamente, 0,0009 M; para a estimulação do gosto salgado pelo cloreto de sódio é de 0,01 M; para o gosto doce pela sacarose é de 0,01 M; e para o gosto amargo pela quinina é de 0,000008 M. Deve-se ressaltar que a sensibilidade para o gosto amargo é muito maior do que para todos os outros gostos, o que era esperado, pois essa sensação tem função protetora importante contra muitas toxinas perigosas presentes nos alimentos. BOTÃO GUSTATÓRIO E SUA FUNÇÃO O botão gustatório tem diâmetro de aproximadamente 1/30 milímetro e comprimento de cerca de 1/16 milímetro. O botão gustatório é composto por cerca de 50 células epiteliais modificadas, algumas das quais são células de suporte, chamadas células de sustentação e outras são células gustatórias. As células gustatórias são continuamente substituídas pela divisão mitótica das células epiteliais que as envolvem, assim, algumas células gustatórias são células jovens. Outras são células maduras, que se encontram próximas ao centro do botão; elas rapidamente se fragmentam e morrem. A expectativa de vida de cada célula gustativa é de aproximadamente 10 dias nos mamíferos inferiores, mas é desconhecida em seres humanos. Ana Beatriz Figuerêdo Almeida - Medicina 2022.1 7 As extremidades externas das células gustatórias estão dispostas em torno do minúsculo poro gustatório. Do ápice de cada célula gustatória, muitas microvilosidades, ou pelos gustatórios, projetam-se para fora, através do poro gustatório, aproximando-se da cavidade da boca. Essas microvilosidades proveem a superfície receptora para o gosto. Entrelaçada, em torno dos corpos das células gustatórias, encontra-se uma rede de ramificações dos terminais das fibras nervosas gustatórias, estimuladas pelas células receptoras gustatórias. Algumas dessas fibras se invaginam para dentro das pregas das membranas da célula gustatória. São encontradas muitas vesículas abaixo da membrana plasmática próxima das fibras. Acredita-se que essas vesículas contenham a substância neurotransmissora, que é liberada pela membrana plasmática, excitando as terminações das fibras nervosas em resposta ao estímulo gustatório. LOCALIZAÇÃO DOS BOTÕES GUSTATÓRIOS Os botões gustatórios são encontrados em três tipos de papilas da língua, como descrito a seguir: (1) grande quantidade de botões gustatórios está localizada nas paredes dos sulcos que circundam as papilas circunvaladas, que formam uma linha em V na superfície posterior da língua; (2) uma quantidade moderada de botões gustatórios se localiza nas papilas fungiformes na superfície plana anterior da língua; e (3) uma quantidade moderada de botões gustatórios se encontra nas papilas foliáceas, localizadas nas dobras, ao longo das superfícies laterais da língua. Nas papilas filiformes não encontramos botões gustatórios. Botões gustatórios adicionais estão localizados no palato, e alguns poucos nas papilas tonsilares, na epiglote e até mesmo no esôfago proximal. Os adultos têm de 3.000 a 10.000 botões gustatórios, e as crianças têm uma quantidade um pouco maior. Acima de 45 anos de idade, muitos botões gustatórios degeneram, fazendo com que a sensação gustatória diminua na idade adulta. ESPECIFICIDADE DOS BOTÕES GUSTATÓRIOS PARA UM ESTÍMULO ➜ Gustatório Primário: Estudos utilizando microeletródios, colocados em botões gustatórios isolados, mostraram que cada botão gustatório frequentemente responde, sobretudo, a umdos cinco estímulos gustatórios primários quando a substância identificada está em baixa concentração. Entretanto, em altas concentrações, a maioria dos botões pode ser excitada por dois ou mais dos estímulos gustatórios primários, assim como por outros poucos estímulos gustatórios que não se encaixam nas categorias “primárias”. MECANISMO DE ESTIMULAÇÃO DOS BOTÕES GUSTATÓRIOS ➜ Potencial Receptor: A membrana da célula gustatória, como a maioria das outras células sensoriais receptoras, tem carga negativa no seu interior em relação ao exterior. A aplicação de substância nos pelos gustatórios causa perda parcial desse potencial negativo — isto é, as células gustatórias são despolarizadas. Na maioria das vezes, a redução do potencial, dentro de faixa extensa, é aproximadamente proporcional ao logaritmo da concentração da substância estimulatória. Essa alteração no potencial elétrico da célula gustatória é chamada potencial receptor para a gustação. O mecanismo pelo qual a maioria das substâncias estimulatórias interage com as vilosidades gustatórias, para iniciar o potencial receptor se dá por meio da ligação da substância à molécula receptora proteica, localizada na superfície da célula receptora gustatória, próxima da membrana das vilosidades ou sobre elas. Essa interação resulta na abertura de canais iônicos, que permitem a entrada de íons sódio e hidrogênio, ambos com carga positiva, despolarizando a célula, que normalmente tem carga negativa. Então, a substância estimulatória é deslocada da vilosidade gustatória pela saliva, removendo, assim, o estímulo. O tipo do receptor proteico em cada vilosidade gustatória determina o tipo de gosto que é percebido. Para os íons sódio e hidrogênio, que provocam as sensações gustatórias salgada e azeda, respectivamente, as proteínas receptoras abrem canais iônicos específicos, nas membranas apicais das células gustatórias, ativando, assim, os receptores. Entretanto, para as sensações gustatórias doce e amarga, as porções das moléculas proteicas receptoras, que se projetam através da membrana apical, ativam substâncias transmissoras que são segundos mensageiros nas células gustatórias e esses segundos mensageiros produzem alterações químicas intracelulares, que provocam os sinais do gosto. GERAÇÃO DOS IMPULSOS NERVOSOS PELOS BOTÕES GUSTATÓRIOS Na primeira aplicação do estímulo gustatório, a frequência de descarga das fibras nervosas, que se originam nos botões gustatórios, aumenta até atingir o pico em fração de segundos, mas, então, se adapta nos próximos poucos segundos, retornando a nível mais baixo, constante e assim permanecendo durante a vigência do estímulo. Por isso, o nervo gustatório transmite sinal forte e imediato e sinal contínuo, mais fraco, que permanece durante todo o tempo em que o botão gustatório está exposto ao estímulo. Ana Beatriz Figuerêdo Almeida - Medicina 2022.1 8 MECANISMO OLFATIVO A olfação é o menos conhecido de nossos sentidos, em parte devido ao fato de que o sentido da olfação é um fenômeno subjetivo que não pode ser estudado facilmente em animais inferiores. Outro problema complicador é que o sentido da olfação é pouco desenvolvido nos seres humanos em comparação com os animais inferiores. MEMBRANA OLFATÓRIA A membrana olfatória se situa na parte superior de cada narina. Medialmente, a membrana olfatória se invagina ao longo da superfície do septo superior; lateralmente, ela se dobra sobre a concha nasal superior e mesmo sobre pequena porção da superfície superior da concha nasal média. Em cada narina, a membrana olfatória tem área de superfície de aproximadamente 2,4 centímetros quadrados. AS CÉLULAS OLFATÓRIAS SÃO AS CÉLULAS RECEPTORAS PARA A SENSAÇÃO DO OLFATO As células olfatórias são na realidade neurônios bipolares derivados originalmente, do sistema nervoso central. Existem por volta de, 100 milhões dessas células no epitélio olfatório, intercaladas entre as células de sustentação. A superfície apical das células olfatórias forma um botão, do qual se projetam de 4 a 25 pelos olfatórios (também chamados cílios olfatórios), medindo 0,3 micrômetro de diâmetro e até 200 micrômetros de comprimento, para o muco que recobre a superfície interna da cavidade nasal. Esses cílios olfatórios formam denso emaranhado no muco, e são esses cílios que respondem aos odores presentes no ar que estimulam as células olfatórias, como será mais discutido a seguir. Entre as células olfatórias na membrana olfatória, encontram-se muitas pequenas glândulas de Bowman secretoras de muco, na superfície da membrana olfatória. ESTIMULAÇÃO DAS CÉLULAS OLFATÓRIAS ➜ Mecanismo de Excitação das Células Olfatórias: A porção das células olfatórias que responde ao estímulo químico olfatório é o cílio olfatório. As substâncias odorantes, ao entrarem em contato com a superfície da membrana olfatória, inicialmente se difundem no muco que recobre o cílio. Em seguida, se ligam às proteínas receptoras, na membrana de cada cílio. Cada proteína receptora é na realidade uma longa molécula que atravessa a membrana por cerca de sete vezes, dobrando-se em direção ao seu interior e ao seu exterior. A molécula odorante liga-se à porção extracelular da proteína receptora. A porção intracelular da proteína receptora, no entanto, está acoplada a uma proteína G, que é formada por combinação de três subunidades. Quando o receptor é estimulado, a subunidade alfa se separa da proteína G e ativa a adenilil ciclase, a que está ligada na face intracelular da membrana ciliar, próxima ao receptor. A adenilil ciclase ativada, por sua vez, converte muitas moléculas de trifosfato de adenosina em monofosfato de adenosina cíclico (AMPc). Por fim, o AMPc ativa outra proteína de membrana próxima, o canal iônico de sódio, o qual se “abre”, permitindo que grande quantidade de íon sódio atravesse a membrana em direção ao citoplasma da célula receptora. Os íons sódio aumentam o potencial elétrico intracelular, tornando-o mais positivo, e excitando, assim, o neurônio olfatório e transmitindo os potenciais de ação pelo nervo olfatório para o sistema nervoso central. A importância desse mecanismo de ativação dos nervos olfatórios reside no fato de que ele amplifica muito o efeito excitatório, mesmo de substância odorante fraca. Resumindo: (1) a ativação da proteína receptora pela substância odorante ativa o complexo da proteína G que, por sua vez; (2) ativa muitas moléculas de adenilil ciclase, que se encontram do lado intracelular da membrana da célula olfatória, levando a que; (3) muitas moléculas de AMPc sejam formadas; e, finalmente, (4) o AMPc induz a abertura de número muitas vezes maior de canais de sódio. Portanto, mesmo pequena concentração de substância odorante específica inicia o efeito cascata que abre quantidade extremamente grande de canais de sódio. Esse processo explica a sensibilidade extraordinária dos neurônios olfatórios às quantidades extremamente pequenas de substâncias odorantes. Além do mecanismo químico básico, pelo qual as células olfatórias são estimuladas, muitos fatores físicos afetam o grau de estimulação. Primeiro, apenas as substâncias voláteis que podem ser aspiradas para dentro das narinas podem ser percebidas pelo olfato. Segundo, a substância estimulante deve ser pelo menos pouco hidrossolúvel, de modo que possa atravessar o muco e atingir os cílios olfatórios. Terceiro, é útil que a substância seja pelo menos ligeiramente lipossolúvel, provavelmente porque constituintes lipídicos do cílio constituem fraca barreira para odorantes não lipossolúveis. Ana Beatriz Figuerêdo Almeida - Medicina 2022.1 9 ➜ Potenciais de Membrana e Potenciais de Ação nas Células Olfatórias: O potencial de membrana intracelular das células olfatórias nãoestimuladas, medido por microeletródios, é, em media, de −55 milivolts. Nesse potencial, a maioria das células gera potenciais de ação contínuos com frequência muito baixa, variando de um a cada 20 segundos, até dois ou três por segundo. A maioria das substâncias odorantes induz a despolarização da membrana da célula olfatória, reduzindo o potencial negativo da célula do nível normal de −55 milivolts para −30 milivolts ou menos — isto é, a voltagem passa a ser mais positiva. Paralelamente, o número de potenciais de ação aumenta para 20 a 30 por segundo, que é frequência alta para as fibras do nervo olfatório. Em ampla faixa, a frequência dos impulsos do nervo olfatório é aproximadamente proporcional ao logaritmo da força do estímulo, o que demonstra que os receptores olfatórios obedecem aos princípios da transdução de modo semelhante aos outros receptores sensoriais. ➜ Rápida Adaptação dos Sentidos Olfatórios: Aproximadamente, 50% dos receptores olfatórios se adaptam em cerca do primeiro segundo de estimulação. Em seguida, eles se adaptam muito pouco e lentamente. Além disso, todos nós sabemos, por experiência própria, que as sensações de olfação se adaptam quase até a extinção em torno de 1 minuto após entrar em ambiente fortemente odorífico. Por causa disso, a adaptação psicológica é muito maior do que o grau de adaptação dos receptores e é quase certo que a maior parte da adaptação adicional ocorre no sistema nervoso central, o que parece ser verdadeiro também para a adaptação das sensações gustatórias. O mecanismo neuronal, postulado para o fenômeno da adaptação, é o seguinte: grande número de fibras nervosas centrífugas trafega das regiões olfatórias do encéfalo, em direção posterior, ao longo do trato olfatório e terminam próximas às células inibitórias especiais, no bulbo olfatório, as células granulares. Tem sido postulado que, após o início do estímulo olfatório, o sistema nervoso central desenvolve rapidamente forte feedback inibitório, de modo a suprimir a transmissão dos sinais olfatórios através do bulbo olfatório. ➜ Natureza Afetiva da Olfação: A olfação, mais ainda do que a gustação, tem a qualidade afetiva de ser agradável ou desagradável, e por isso, a olfação é provavelmente mais importante do que a gustação para a seleção dos alimentos. De fato, a pessoa que previamente ingeriu alimento que o desagradou, em geral, sente náuseas com o odor desse alimento na segunda ocasião. Inversamente, bom perfume pode ser potente estimulante das emoções humanas. Além disso, em alguns animais inferiores, os odores são os principais estimulantes dos impulsos sexuais. ➜ Limiar para a Olfação: Uma das principais características da olfação é a quantidade-minuto do agente estimulante no ar que pode provocar sensação olfatória. Por exemplo, a substância metilmercaptano pode ser percebida quando apenas 25 trilionésimos de um grama estão presentes em cada mililitro de ar. Em razão desse limiar extremamente baixo, essa substância é misturada com gás natural para dar ao gás um odor que pode ser detectado, mesmo quando pequenas quantidades de gás vazam de um gasoduto. ➜ Graduações de Intensidades da Olfação: Embora as concentrações limiares das substâncias que evocam a olfação sejam extremamente baixas para muitas substâncias odorantes (se não a maioria), concentrações somente 10 a 50 vezes maiores que o limiar evocam a intensidade máxima da olfação. Esse intervalo de discriminação da intensidade contrasta com a maioria dos outros sistemas sensoriais, em que os limites de discriminação de intensidade são enormes — por exemplo, 500.000 para um no caso do olho e 1 trilhão para um no caso do ouvido. Essa diferença poderia ser explicada pelo fato de que a olfação está mais relacionada com a detecção da presença ou ausência de substâncias odorantes do que com a detecção quantitativa de suas intensidades. Ana Beatriz Figuerêdo Almeida - Medicina 2022.1 10 3. COMPREENDER A CONDUÇÃO DESSES ESTÍMULOS (VIAS NEUROLÓGICAS SENSITIVAS) TRANSMISSÃO DOS SINAIS GUSTATÓRIOS PARA O SISTEMA NERVOSO CENTRAL A figura mostra as vias neuronais para a transmissão dos sinais gustatórios, da língua e região da faringe, até o sistema nervoso central. Impulsos gustatórios, oriundos dos dois terços anteriores da língua, passam, inicialmente, pelo nervo lingual e, então, pelo ramo corda do tímpano do nervo facial e, por fim, pelo trato solitário, no tronco cerebral. Sensações gustatórias, que se originam das papilas circunvaladas, na parte posterior da língua, e de outras regiões posteriores da boca e garganta, são transmitidas pelo nervo glossofaríngeo para o trato solitário, mas em nível mais posterior. Por fim, poucos sinais gustatórios são transmitidos da base da língua e de outras partes da região faríngea pelo nervo vago para o trato solitário. Todas as fibras gustatórias fazem sinapse nos núcleos do trato solitário no tronco cerebral. Esses núcleos contêm os neurônios de segunda ordem que se projetam para pequena área do núcleo ventral posteromedial do tálamo, situada ligeiramente medial às terminações talâmicas das regiões faciais do sistema da coluna dorsal-lemnisco medial. Do tálamo, neurônios de terceira ordem se projetam para a extremidade inferior do giro pós-central no córtex cerebral parietal, onde eles penetram na fissura silviana e na área insular opercular. Esta área se situa pouco mais lateral, ventral e rostral à área para os sinais táteis da língua, na área somática cerebral I. Fica evidente, por essa descrição das vias gustatórias, que elas cursam paralelamente às vias somatossensoriais da língua. Reflexos Gustatórios São Integrados no Tronco Cerebral Do trato solitário, muitos sinais gustatórios são transmitidos pelo interior do tronco cerebral diretamente para os núcleos salivares superior e inferior e essas áreas transmitem os sinais para as glândulas submandibular, sublingual e parótidas, auxiliando no controle da secreção da saliva, durante a ingestão e digestão dos alimentos. Rápida Adaptação da Gustação Todos estão familiarizados com o fato de que as sensações gustatórias se adaptam rapidamente, em geral de modo quase completo, em cerca de um minuto de estimulação contínua. É claro também, pelos estudos eletrofisiológicos das fibras nervosas gustatórias, que a adaptação dos botões gustatórios é responsável por não mais do que metade dessa rápida adaptação do gosto. Portanto, o grau final de adaptação, que ocorre na sensação gustatória, quase com certeza é de responsabilidade do sistema nervoso central, embora os mecanismos dessa adaptação não sejam conhecidos. De qualquer maneira, é um mecanismo diferente do da maioria dos outros sistemas sensoriais, que se adaptam essencialmente em nível dos receptores. TRANSMISSÃO DOS SINAIS OLFATÓRIOS PARA O SISTEMA NERVOSO CENTRAL As porções olfatórias do encéfalo estão entre as primeiras estruturas cerebrais desenvolvidas nos animais primitivos, e muitas das estruturas restantes do encéfalo se desenvolveram ao redor dessas estruturas olfatórias iniciais. De fato, parte do encéfalo que originalmente estava envolvida com a olfação evoluiu mais tarde, dando origem a estruturas encefálicas basais que controlam as emoções e outros aspectos do comportamento humano; este é o sistema chamado sistema límbico. Transmissão dos Sinais Olfatórios para o Bulbo Olfatório As fibras nervosas olfatórias, que se projetam posteriormente do bulbo são chamadas nervo cranial I ou trato olfatório. Entretanto, na realidade, tanto o trato quanto o bulbo olfatórios são protuberâncias anteriores do tecido cerebral da base do encéfalo; a dilatação bulbosa, na sua terminação, o bulbo olfatório, fica sobre a placa cribriforme que separa a cavidade encefálica da parte superior da cavidade nasal. Aplaca cribriforme tem várias perfurações pequenas por meio das quais uma quantidade de pequenos nervos passa com trajeto ascendente, da membrana olfatória, na cavidade nasal, para entrar no bulbo olfatório, na cavidade craniana. Há uma estreita relação entre as células olfatórias, na membrana olfatória e o bulbo Ana Beatriz Figuerêdo Almeida - Medicina 2022.1 11 olfatório, mostrando os curtos axônios das células olfatórias, que terminam em múltiplas estruturas globulares dentro do bulbo olfatório, chamadas glomérulos. Cada bulbo tem muitos milhares desses glomérulos, cada um dos quais recebe aproximadamente 25.000 terminações axônicas, provenientes das células olfatórias. Cada glomérulo também é sítio para terminações dendríticas de cerca de 25 células mitrais grandes e de cerca de 60 células em tufo pequenas, cujos corpos celulares residem no bulbo olfatório superiores ao glomérulo. Esses dendritos fazem sinapses com os neurônios das células olfatórias, e as células mitrais e em tufo enviam axônios pelo trato olfatório, transmitindo os sinais olfatórios para níveis superiores no sistema nervoso central. Algumas pesquisas têm mostrado que glomérulos diferentes respondem a diferentes odores. É possível que glomérulos específicos sejam a verdadeira pista para a análise dos diferentes sinais olfatórios, transmitidos para o sistema nervoso central. As Vias Olfatórias Primitivas e Mais Novas para o Sistema Nervoso Central O trato olfatório chega ao encéfalo na junção anterior entre o mesencéfalo e o prosencéfalo; aí, o trato se divide em duas vias, uma passando, em situação medial, para a área olfatória medial do tronco cerebral, e a outra passando lateralmente para a área olfatória lateral. A área olfatória medial representa o sistema olfatório primitivo, enquanto a área olfatória lateral é a aferência para (1) o sistema olfatório menos antigo; e (2) o sistema recente. ➜ O Sistema Olfatório Primitivo - A Área Olfatória Medial: A área olfatória medial consiste em grupo de núcleos, localizados na porção mediobasal do encéfalo, imediatamente anterior ao hipotálamo. Os mais conspícuos são os núcleos septais, localizados na linha média e que se projetam para o hipotálamo e outras partes primitivas do sistema límbico. Essa é a área encefálica mais relacionada ao comportamento básico. A importância da área olfatória medial é mais bem entendida quando se considera o que acontece com animais que tiveram suas áreas olfatórias laterais removidas, permanecendo somente o sistema medial. A remoção dessas áreas apenas dificilmente afeta as respostas mais primitivas da olfação, como lamber os lábios, salivação e outras respostas relacionadas à alimentação, provocadas pelo cheiro de comida ou por impulsos emocionais básicos associados à olfação. Ao contrário, a remoção das áreas laterais abole os reflexos olfatórios condicionados mais complexos. ➜ O Sistema Olfatório Menos Antigo - A Área Olfatória Lateral: A área olfatória lateral é composta principalmente pelo córtex pré-piriforme, córtex piriforme e pela porção cortical do núcleo amigdaloide. Dessas áreas, as vias neurais atingem quase todas as partes do sistema límbico, especialmente nas porções menos primitivas, como hipocampo, que parece ser o mais importante para o aprendizado relacionado ao gostar ou não de certos alimentos, de acordo com a experiência prévia com esses alimentos. Por exemplo, acredita-se que essa área olfatória lateral e suas muitas conexões com o sistema límbico comportamental fazem com que a pessoa desenvolva aversão absoluta para alimentos que tenham lhe causado náuseas e vômitos. Um aspecto importante da área olfatória lateral é que muitas vias neurais dela provenientes também se projetam diretamente, para a parte mais antiga do córtex cerebral, chamada paleocórtex, na porção anteromedial do lobo temporal. Essa é a única área de todo o córtex cerebral em que os sinais sensoriais passam diretamente para o córtex, sem passar primeiro pelo tálamo. ➜ A Via Mais Recente: Foi identificada uma via olfatória mais recente que passa pelo tálamo, para o núcleo talâmico dorsomedial e, então, para o quadrante posterolateral do córtex orbitofrontal. Estudos em macacos indicam que esse sistema mais novo provavelmente auxilia na análise consciente do odor. ➜ Resumo: Assim, parece ser o sistema olfatório primitivo o que participa nos reflexos olfatórios básicos, o sistema menos antigo o que fornece o controle automático, mas parcialmente aprendido, da ingestão de alimentos e aversão a alimentos tóxicos e pouco saudáveis, e o sistema recente, que é comparável à maioria dos outros sistemas sensoriais corticais, usado para a percepção e análise conscientes da olfação. Controle Centrífugo da Atividade no Bulbo Olfatório pelo Sistema Nervoso Central Muitas fibras nervosas que se originam nas porções olfatórias do encéfalo passam do encéfalo pelo trato olfatório em direção ao bulbo olfatório (isto é, “centrifugamente” do encéfalo para a periferia). Essas fibras nervosas terminam sobre grande quantidade de pequenas células granulares, localizadas entre as células mitrais e células em tufo no bulbo olfatório. As células granulares enviam sinais inibitórios para as células mitrais e em tufo. Acredita-se que esse feedback inibitório possa ser um meio de refinar a capacidade específica dos indivíduos distinguirem um odor de outro. 4. IDENTIFICAR AS PRINCIPAIS CAUSAS DE PERCA/DIMINUIÇÃO DE OLFATO E PALADAR. DISTÚRBIOS DO PALADAR ➜ Ageusia refere-se à perda completa da capacidade gustativa, hipogeusia à perda parcial desta capacidade e hipergeusia a uma capacidade gustativa aumentada. Ageusia é muito rara, dada a redundância da inervação dos recetores gustativos. ➜ O distúrbio gustativo mais comum é a disgeusia, no qual o estímulo gustativo é percebido de forma diferente do normal, normalmente como amargo ou metálico. Ana Beatriz Figuerêdo Almeida - Medicina 2022.1 12 Alucinações olfativas e gustativas têm sido descritas na epilepsia e esquizofrenia. Disgeusia para o doce por vezes reflete um primeiro sinal de tumor dos pulmões. Os botões gustativos diminuem com a idade e as papilas gustativas, que atingem seu clímax de desenvolvimento na puberdade, começam a atrofiar na mulher entre 40-45 anos e no homem aos 50 anos. ETIOLOGIA DOS DISTÚRBIOS DO PALADAR As principais causas de distúrbios do paladar são: 1) trauma encefálico; 2) infecções do tracto respiratório superior; 3) exposição a substâncias tóxicas; 4) causas iatrogénicas (procedimentos dentários, exposição a radiação); 5) fármacos; e 6) glossodinia ou Síndrome da Ardência Bucal. O trauma encefálico pode causar lesões em regiões do sistema nervoso central que são importantes no processamento dos estímulos gustativos (tálamo, tronco cerebral e lobos temporais). Além disso, a fratura dos ossos temporais ou mandíbula pode levar à lesão do nervo facial, enquanto que o nervo glossofaríngeo e o nervo vago estão relativamente protegidos profundamente no encéfalo. Contudo, até na laceração do nervo da corda do tímpano, há recuperação completa da percepção gustativa após vários meses, em 20% dos casos. Fármaco mais comuns envolvidos em distúrbios gustativos: os antihipertensivos, hipolipidemiantes, antihistamínicos, antibióticos, antidepressivos e ansiolíticos. Outras causas de distúrbios do paladar incluem: tumores, bulimia, hipotiroidismo, síndrome de Cushing, diabetes mellitus, doença hepática e higiene oral precária. DISTÚRBIOS DO OLFATO 1. Distúrbios quantitativos ➜ Anosmia refere-se à incapacidade de detectar odores e anosmia específica à incapacidade de detectar odores específicos, evidenciando a necessidade de receptores específicos para odores especifico. ➜ Anosmia funcionalrefere-se a uma capacidade olfativa significativamente reduzida, embora algumas sensações olfativas possam estar presentes. ➜ Hiposmia refere-se a uma capacidade olfativa reduzida e hiperosmia a uma capacidade olfativa aumentada. 2. Distúrbios qualitativos ➜ Fantosmia é a percepção de odores sem que haja um estímulo. ➜ Parosmia é a sensação distorcida do olfato, muitas vezes associada a uma sensibilidade olfativa reduzida. Pode ocorrer após infecções virais do trato respiratório superior, após traumas cranianos ou, raramente, pode ser causada por sinusite. O declínio da sensibilidade olfativa com a idade pode ser resultante de degeneração de células centrais e ser independente de modificações periféricas do aparelho olfativo. Porém, a capacidade regenerativa do epitélio olfatório declina com a idade. ETIOLOGIA DOS DISTÚRBIOS DO OLFATO Existem cinco grandes causas de distúrbios do olfato, sendo elas: 1) trauma; 2) infecções virais do trato respiratório superior; 3) causas nasais como rinite, sinusite e pólipos nasais; 4) distúrbios olfativos associados à idade ou doença neurológica como doença de Parkinson e de Alzheimer; e 5) causas neurossensoriais. O trauma, nomeadamente fraturas da base do crânio, doenças congénitas como a atresia de coana, ou cistos nasais podem afetar o fluxo aéreo e, deste modo, o olfato. Nas causas nasais, assume-se a existência de uma deficiência funcional relacionada com a inflamação ou alteração do acesso mecânico por obstrução ao epitélio olfativo. Além disso, a própria inflamação subjacente pode danificar o epitélio neurossensorial. Um dos principais sintomas da doença de Parkinson e da doença de Alzheimer é a diminuição da sensibilidade olfativa. As causas neurossensoriais podem resultar de processos inflamatórios, doenças autoimunes, síndromes congênitas como a Síndrome de Kallamann ou agenesia do Bulbo Olfatório. Outras condições que alteram a função do sistema olfativo incluem alterações endócrinas como a gravidez, a diabetes, doença de Addison, assim como doença renal e hepática. De forma geral, as capacidades olfativas e gustativas diminuem com a idade e a anorexia fisiológica é comum na população idosa podendo, em certo grau, ser explicada pela diminuição do olfato, que implica também perda da função olfativa retronasal, afetando também, desta forma, a percepção dos sabores. Estudos efetuados em idosos com alterações do olfato sugerem uma diminuição na apreciação dos alimentos e no apetite, mudança na escolha de alimentos, baixo estado nutricional, diminuição do peso corporal e maior risco para doenças crônicas. Medicação como causa de distúrbio olfativo: Afetam mais a gustação que a olfação. Geralmente a olfação retorna com Ana Beatriz Figuerêdo Almeida - Medicina 2022.1 13 descontinuação da medicação, mas existem relatos de lesão permanente. Drogas que afetam a composição do muco podem alterar a olfação, como os beta-adrenérgicos, colinérgicos e agentes peptidérgicos. Diversas entidades nosológicas cursam com alterações olfatórias e gustativas, podendo ser congênitas ou adquiridas, sendo as mais citadas na literatura: doença nasal e sinusal obstrutiva, infecções de vias aéreas superiores, traumatismo cranioencefálico, envelhecimento, causa congênita, exposição a tóxicos, algumas medicações, neoplasias nasais ou intracranianas, alterações psiquiátricas, doenças neurológicas, iatrogenia e idiopática. As anormalidades do paladar e do olfato comprovaram ser um tema bem mais complexo do que se reconhecia anteriormente e também estão presentes em situações como deficiência de vitaminas (B6, B12, A) e de zinco ou de cobre, tabagismo, gravidez, anestesia geral, traumas dentários, arrinencefalia e desvios do septo nasal. 5. RELACIONAR A INTEGRAÇÃO DO OLFATO E PALADAR. O olfato e o paladar são sentidos químicos. Os sistemas neurais que intermedeiam estas sensações, os sistemas gustatório e olfatório, estão entre aqueles filogeneticamente mais antigos do encéfalo e ao perceberem substâncias químicas na cavidade oral e nasal trabalham conjuntamente. As sensações surgem pela interação de moléculas com os receptores da olfação e gustação. Como os impulsos se propagam para o sistema límbico (bem como para as áreas corticais superiores), certos odores e gostos podem desencadear intensas respostas emocionais ou afluxo de memórias. A importância do paladar reside no fato de que ele permite a um indivíduo selecionar substâncias específicas de acordo com os seus desejos e, frequentemente, de acordo com as necessidades metabólicas dos tecidos corpóreos A olfação, mais ainda que a gustação, tem a qualidade afetiva de ser agradável ou desagradável. Por isso, a olfação é, provavelmente, mais importante do que a gustação para a seleção de alimentos Sabe-se que a gustação é sobretudo uma função dos corpúsculos gustativos da boca, mas é experiência comum que o sentido do olfato contribui fortemente para a percepção do gosto. É imprescindível ressaltar a sua relação com a gustação, pois sem o olfato não sentimos de forma adequada o sabor dos alimentos, perdendo assim o apetite e o prazer com a alimentação. 6. APRESENTAR OS EXAMES COMPLEMENTARES QUE SÃO UTILIZADOS PARA AVALIAR CAVIDADE NASAL E ORAL. (CORRELAÇÃO ANATO-RADIOLÓGICA) A endoscopia nasal é útil no acesso à fenda olfatória, sendo em conjunto com a tomografia computadorizada os meios mais sensíveis para o diagnóstico de patologias derivadas da cavidade nasal, seios paranasais e encéfalo. A rinometria apresenta pouco valor diagnóstico, servindo apenas para ilustrar diminuições do fluxo respiratório. A ressonância nuclear magnética é útil para avaliação do bulbo olfatório, tratos olfatórios e causas intracranianas de distúrbios da olfação. ➜A endoscopia nasal é um exame indolor realizado para avaliação da cavidade nasal tanto em crianças como em adultos. Ele é realizado através da introdução, no nariz, de uma fibra ótica (rígida ou flexível) conectada à uma câmera nos orifícios nasais, para análise da mucosa e estruturas nasais. Todas as imagens são transmitidas para um monitor. É feita uma anestesia local, aplicada com spray para minimizar o desconforto. ➜ A tomografia dos seios face ou TC das cavidades paranasais é um exame de diagnóstico por imagem não invasivo e indolor, que utiliza radiação (raio-x) para adquirir as imagens, frequentemente sem o uso de contraste endovenoso. O tomógrafo é um aparelho que possui múltiplos detectores capazes de realizar o exame em segundos e gerar um detalhamento acurado dos ossos e tecidos de partes moles da face, assim como fazer reconstruções em vários eixos e de forma tridimensional (reconstrução 3D). ➜ A ressonância magnética (RM) é um estudo sem radiação que pode ser complementar na avaliação de doenças infecciosas ou inflamatórias avançadas e na avaliação de neoplasias, trazendo um detalhamento mais acurado dos tecidos moles da face. Como em todas as regiões da cabeça e pescoço, informações como idade do paciente, histórico de cirurgias, sintomas, doenças prévias e resultados de exames clínicos são essenciais para a interpretação dos estudos de imagem da forma mais adequada. 7. CARACTERIZAR OS IMPACTOS BIOPSICOSSOCIAIS DESENCADEADOS POR ALTERAÇÕES SENSORIAIS (TODOS OS ÓRGÃOS SENSORIAIS). A deficiência não é apenas sobre estruturas e funções do corpo - uma pessoa pode ter uma deficiência grave e outra uma deficiência leve com a mesma alteração corporal, somente em razão do contexto em que vivem. Por outro lado, a deficiência não é apenas restrita aos fatores ambientais, pois as funções do corpo também fazem diferença na experiência da deficiência - dor muito intensa e Ana Beatriz Figuerêdo Almeida - Medicina 2022.1 14 constante pode limitar a participaçãosocial independente do contexto. ➜ Modelo Médico: A deficiência é um impedimento físico, sensorial, intelectual ou mental do indivíduo e suas consequências pessoais e sociais. (Nagi) ➜ Modelo Social: A deficiência é uma construção social criada pelo ambiente que gera exclusão. (Upias) ➜ Modelo Biopsicossocial: A deficiência parte de uma condição de saúde que gera deficiência dentro de fatores contextuais. É uma integração dos modelos médico e social. (CIF – OMS) Decreto Legislativo nº 186, de 2008 e Decreto nº 6.949, de 25 de agosto de 2009. Pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais pessoas. CORRELAÇÃO DOS SENTIDOS DO OLFATO E PALADAR COM COMPORTAMENTOS SOCIAIS, NOMEADAMENTE ALIMENTARES Num estudo publicado em 2012, constatou-se que a maioria dos indivíduos com disfunção do olfato e paladar queixa-se sobretudo de dificuldades na confecção dos alimentos, falta de apetite e perda de interesse em comer. Além disso, cerca de 17 a 30% dos indivíduos que sofrem de distúrbios olfativos reportam diminuição da qualidade de vida e sintomas depressivos. Os indivíduos com distúrbios olfativos ficam, portanto, prejudicados no que diz respeito à ingestão de alimentos, higiene pessoal, segurança e vida sexual. Num estudo de 2013, demonstrou-se que estes pacientes recorrem ao uso excessivo de sal, adoçantes ou picantes de forma a tornar os pratos mais apelativos. Estudos demonstram que 3 a 20% dos pacientes refere que a perda olfativa os levou a comer mais, enquanto que 20 a 36% refere que passaram a comer menos. Isto significa que uma grande porcentagem dos pacientes apresentou dificuldades em manter o seu padrão alimentar habitual. Estudos efetuados em idosos com alterações do olfato sugerem uma diminuição na apreciação dos alimentos e no apetite, mudança na escolha de alimentos, baixo estado nutricional, diminuição do peso corporal e maior risco para doenças crónicas.
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