Série Questões Discursivas - Direito Constitucional _ Jusbrasil

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13 de Março de 2023
Série Questões Discursivas - Direito Constitucional
Concurso para provimento de cargos de Advogado da União de 2ª
Categoria (Edital 1/2015)
Publicado por Elder Fogaça há 6 anos  5.359 visualizações
Questão Discursiva: "Determinado estado da federação edi-
tou lei que torna o exercício da acupuntura uma exclusividade
dos médicos. Dada a existência de relevante controvérsia doutri-
nária sobre a aplicação dessa lei, o Conselho Federal de Medi-
cina (CFM) ajuizou no Supremo Tribunal Federal (STF) ação
declaratória de constitucionalidade (ADC) pedindo que o tribu-
nal declare sua constitucionalidade."
Com base na jurisprudência do STF e nas normas constitucio-
nais, redija um texto dissertativo acerca da viabilidade da ADC
apresentada. Em seu texto, aborde:
https://fogacaelder.jusbrasil.com.br/
https://fogacaelder.jusbrasil.com.br/
1. A finalidade da ADC e a presunção de constitucionalidade das
normas;
2. A legitimidade do CFM para ajuizar ADC;
3. O objeto da ADC;
4. A relevante controvérsia sobre a aplicação da norma objeto
da referida ADC como requisito para sua propositura.
Introdução acerca do panorama sobre o exercício da
atividade de acupuntor
De início, registre-se que a prática, o ensino e as pesquisas sobre
acupuntura, que é uma área tradicional da medicina chinesa, no
Brasil, não encontra obstáculos legais à sua realização e, seu
exercício em nosso país, existe a várias décadas. Porém, carece
de regulamentação em nível federal.
Isso, entretanto, não foi óbice ao Ministério do Trabalho e Em-
prego que reconhece a acupuntura enquanto "ocupação profissi-
onal" (o que não se confunde com "profissão"), encontrando,
portanto, correspondência no Catálogo Brasileiro de Ocupações
(CBO). No caso do profissional de acupuntura, segundo o CBO,
a classificação é a seguinte: 3221-05: Acupunturista ou Técnico
em Acupuntura; 2236-50: Fisioterapeuta Acupunturista; 2251-
05: Médico Acupunturista; 2515-55: Psicólogo Acupunturista
(cuidado em relação a esta última).
Ademais, cabe registrar, ainda, não existir no Brasil legislação
federal que proíba a prática da acupuntura por quem não seja
médico, tampouco existe lei no sentido de a considerar como
atividade privativa de médicos. Note que, a Lei 12.842/13 que
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/1035484/lei-12842-13
dispõe sobre o exercício da Medicina não prevê no rol dos inci-
sos componentes do art. 4º que a acupuntura é atividade priva-
tiva de médico. Tanto é assim que a própria Resolução CFM nº
1.455/, que reconhecia a acupuntura como especialidade médica
consta revogada.
Sobre o tema, destacam-se os seguintes julgados da Corte Su-
prema: RE 750.384 e RE 753.475, nos quais se mantiveram os
vetos à prática de acupuntura por psicólogos. Isso porque, no
curso do ano de 2002, por meio de uma Resolução, o Conselho
Federal de Psicologia (CFP) houve por (mal) estabelecer que o
profissional de psicologia poderia, em seu trabalho, recorrer a
técnicas de acupuntura. Entretanto, consigne que a Lei 4.119/62
estabelece como função precípua do profissional psicólogo fazer
diagnósticos, e não diagnósticos clínicos, ademais de não poder
ser regulamentada por meio de resolução, uma vez que CFP não
tem legitimidade para legislar sobre o exercício das profissões,
matéria afeta à competência legislativa exclusiva da União nos
termos do art. 22, inc. XVI, da CRFB/88. Adscreva-se, ainda,
que tal entendimento não viola o disposto no art. 5º, inc. XIII,
da CRFB/88.
Posto isso, passemos ao que de fato nos interessa.
Direcionamento da Resposta
A inconstitucionalidade (formal subjetiva) da norma editada
pelo ente federativo é, de plano, constatada, posto que a compe-
tência legislativa para tanto é exclusiva da União (CRFB/88, art.
22, inc. XVI). Ademais, a acupuntura não se insere no rol das
atividades privativas de médico, segundo a Lei 12.842/13.
No que toca à análise dos mecanismos de preservação e prote-
ção do texto constitucional, há ter em mente que tanto a ADC
como ADI tem natureza jurídica ambivalente ou dúplice Escla-
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/26872264/artigo-4-da-lei-n-12842-de-10-de-julho-de-2013
https://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/23373458/recurso-extraordinario-re-750384-df-stf
https://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/23361548/recurso-extraordinario-re-753475-df-stf
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10639039/artigo-22-da-constitui%C3%A7%C3%A3o-federal-de-1988
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10719227/inciso-xvi-do-artigo-22-da-constitui%C3%A7%C3%A3o-federal-de-1988
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/155571402/constitui%C3%A7%C3%A3o-federal-constitui%C3%A7%C3%A3o-da-republica-federativa-do-brasil-1988
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10641516/artigo-5-da-constitui%C3%A7%C3%A3o-federal-de-1988
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10730602/inciso-xiii-do-artigo-5-da-constitui%C3%A7%C3%A3o-federal-de-1988
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/155571402/constitui%C3%A7%C3%A3o-federal-constitui%C3%A7%C3%A3o-da-republica-federativa-do-brasil-1988
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/155571402/constitui%C3%A7%C3%A3o-federal-constitui%C3%A7%C3%A3o-da-republica-federativa-do-brasil-1988
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10639039/artigo-22-da-constitui%C3%A7%C3%A3o-federal-de-1988
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10719227/inciso-xvi-do-artigo-22-da-constitui%C3%A7%C3%A3o-federal-de-1988
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/1035484/lei-12842-13
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/155571402/constitui%C3%A7%C3%A3o-federal-constitui%C3%A7%C3%A3o-da-republica-federativa-do-brasil-1988
reça-se. Uma vez proclamada a constitucionalidade da norma,
julgar-se-á improcedente a ação direta de inconstitucionalidade
ou procedente eventual ação declaratória. Do igual maneira,
proclamada a inconstitucionalidade da norma, julgar-se-á pro-
cedente a ação direta ou improcedente eventual a ação declara-
tória (art. 24 da Lei 9.868/93). Assim, entre ADI (ou ADin) e
ADC há um caráter de fungibilidade.
Dito isso, toda lei ou ato normativo federal autônomo (e não re-
gulamentar), no atual sistema jurídico, é presumida constitucio-
nal. Tal presunção de constitucionalidade, no entanto, é relativa
(juris tantum). A presunção da constitucionalidade também é
conhecida como "privilégio do legislador", podendo ser anali-
sada sob um viés formal e outro material. Do ponto de vista for-
mal, a lei ou ato normativo federal não depende de confirmação
constitucional, vigorando, assim, até decisão em contrário.
Já do ponto de vista material, por outro lado, recorrendo aos
ensinamentos de DIMOULIS (2016; p. 153), a presunção de
constitucionalidade é uma regra que distribui o ônus da argu-
mentação, isso porque, em nome do princípio democrático, a
autoridade que cria os atos normativos é legitimada para tanto
e, por isso, a comprovação de constitucionalidade da norma
cabe à autoridade que questiona a sua validade.
Dentro desse contexto, sabedores do fato de que essa presunção
relativa de constitucionalidade pode levar ao constante debate
acerca de sua validade, podemos inferir a finalidade da Ação
Declaratória de Constitucionalidade. Assim, tal ação tem por
fim transformar a presunção relativa em presunção absoluta
(jure et de jure) de constitucionalidade. Ou seja, a finalidade da
ação consiste em confirmar em caráter de definitividade a cons-
titucionalidade da lei ou ato normativo federal; outrossim, con-
firmando, por um lado, a obrigatoriedade-supremacia da Cons-
tituição, e, de outro, confirmar a validade da lei ou ato norma-
tivo questionado.
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/155571402/constitui%C3%A7%C3%A3o-federal-constitui%C3%A7%C3%A3o-da-republica-federativa-do-brasil-1988
Portanto, a precípua função da ADC é promover a segurança ju-
rídica acerca da constitucionalidade da norma oriunda da ne-
fasta incerteza ou insegurança jurídica sobre sua legitimidade,
cuja decisão é vinculante em relação aos órgãos do Poder Judi-
ciário (exceto quanto ao pleno do STF) e à Administração Pú-
blica(CRFB, art. 102, § 2º). Por intermédio da procedência da
ADC, aquela presunção relativa transforma-se em absoluta,
portanto.
Analisando a legitimidade ativa ad causam, percebe-se pela re-
dação do art. 103, caput, alterado pela EC 45/2004, os legitima-
dos a propror Ação Declaratória de Constitucionalidade são: I- o
Presidente da República; II - a Mesa do Senado Federal; III - a
Mesa da Câmara dos Deputados; IV - a Mesa da Assembleia Le-
gislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal; V - o Go-
vernador de Estado ou do Distrito Federal; VI - o Procurador-
Geral da República; VII - o Conselho Federal da Ordem dos Ad-
vogados do Brasil; VIII - partido político com representação no
Congresso Nacional; IX - confederação sindical (às entidades
sindicais de composição heterogênea não se reconhece também
tal legitimidade) ou entidade de classe de âmbito nacional. Por-
tanto, são os mesmos para propor ADI.
No entanto, é de indagar se o Conselho Federal de Medicina
(CFM) pode ser considerado entidade de classe de âmbito naci-
onal. Antes, contudo, convém sublinhar o que é uma entidade
de classe de âmbito nacional para que, com isso, só assim saber
se o CFM é ou não entidade de classe.
Cabe ressaltar que, no julgamento da ADI 79, o pretório Excelso
consolidou sua interpretação acerca do que seja entidade de
classe de âmbito nacional, recorrendo-se analogicamente à lei
dos Partidos Políticos, exigindo da entidade de classe que pre-
tenda de âmbito nacional estar organizada em pelo menos
"nove" Estados. Assim, o CFM não é uma entidade de classe,
mas, sim, uma entidade de fiscalização profissional. A despeito
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/155571402/constitui%C3%A7%C3%A3o-federal-constitui%C3%A7%C3%A3o-da-republica-federativa-do-brasil-1988
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10688723/artigo-102-da-constitui%C3%A7%C3%A3o-federal-de-1988
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10687563/par%C3%A1grafo-2-artigo-102-da-constitui%C3%A7%C3%A3o-federal-de-1988
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/96987/emenda-constitucional-45-04
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/104080/lei-org%C3%A2nica-dos-partidos-pol%C3%ADticos-lei-9096-95
disso, o STF já fixou entendimento de que Conselhos de fiscali-
zação de classe não tem legitimidade para ajuizamento de ADI
ou ADC (vide ADPF 264).
Assim, o CFM não se insere no rol dos legitimados a propor a
presente Ação Declaratória, que, aliás, é rol taxativo. Quanto à
Ordem dos Advogados do Brasil, nota-se uma exceção entre os
conselhos de classe, em virtude de sua expressão menção no
texto constitucional (ADI 641; ADI 1997). Por isso, a ação apre-
senta pelo CFM é inviável por ilegitimidade ativa ad causam.
Quanto ao objeto, temos que, consoante o art. 102, I, a, da
Constituição Federal, a Ação Declaratória de Constitucionali-
dade somente pode ter por objeto lei ou ato normativa federal
autônomo. Diferentemente da ADI, não cabe ADC em relação a
lei ou a ato normativa estadual. Por mais esse motivo, conside-
rando que fora determinado estado da federação que editou lei
(estadual) que torna o exercício da acupuntura uma exclusivi-
dade dos médicos, tal não pode ser objeto de ADC, mostrando-
se inviável a ADC apresentada.
A legitimação para agir in concreto diz respeito à existência de
um estado de insegurança jurídica gerada por dúvidas ou con-
trovérsias sobre a validade da norma questionada. Como ensina
Gilmar Mendes (2017; p. 1284), "há de se configurar, portanto,
situação hábil a afetar a presunção de constitucionalidade, que é
apanágio da lei." Portanto, constitui pressuposto para proposi-
tura da ADC a existência de relevante controvérsia ou dúvida
sobre a legitimidade da norma.
Nessa senda, afigura-se indispensável, por exemplo, e existência
de relevante controvérsia judicial sobre a aplicação da norma.
Não basta para tanto mera controvérsia doutrinária acerca da
legitimidade da norma. Portanto, sendo requisito indispensável
a ser demonstrado pelo autor da ação, não se vislumbra a ad-
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/155571402/constitui%C3%A7%C3%A3o-federal-constitui%C3%A7%C3%A3o-da-republica-federativa-do-brasil-1988
https://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/14709521/acao-direta-de-inconstitucionalidade-adi-641-df
https://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/14757442/acao-direta-de-inconstitucionalidade-adi-1997-rj-stf
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10688723/artigo-102-da-constitui%C3%A7%C3%A3o-federal-de-1988
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10688695/inciso-i-do-artigo-102-da-constitui%C3%A7%C3%A3o-federal-de-1988
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10688111/alinea-a-do-inciso-i-do-artigo-102-da-constitui%C3%A7%C3%A3o-federal-de-1988
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/155571402/constitui%C3%A7%C3%A3o-federal-constitui%C3%A7%C3%A3o-da-republica-federativa-do-brasil-1988
missibilidade da ADC face à inexistência de relevante controvér-
sia ou dúvida qualitativa (não só quantitativa) sobre a validade
da norma. Tanto é assim que o próprio STF já asseverou que "“a
inexistência de pronunciamentos judiciais antagônicos culmina-
ria por converter a ação declaratória de constitucionalidade em
um inadmissível instrumento de consulta sobre a validade cons-
titucional de determinada lei ou ato normativo federal, desca-
racterizando, por completo, a própria natureza jurisdicional que
qualifica a atividade desenvolvida pelo Supremo Tribunal Fede-
ral” (ADC 8; ADI-MC 5316).
Diante disso, não deverá o STF conhecer da ação (ADC) pro-
posta pelo Conselho Federal de Medicina.
Disponível em: https://fogacaelder.jusbrasil.com.br/artigos/458230405/serie-questoes-
discursivas-direito-constitucional
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