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APG 08 - CONSTIPAÇÃO E DOENÇA HEMORROIDÁRIA

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Júlia Morbeck – @med.morbeck 
 
Objetivos 
1- Rever a morfofisiologia do reto e ânus; 
2- Estudar a epidemiologia, fatores de risco, 
etiologia, fisiopatologia, manifestações clínicas e 
diagnóstico da constipação intestinal e doença 
hemorroidária. 
Reto e ânus 
↠ O reto mede aproximadamente 15 cm de 
comprimento e se situa anteriormente ao sacro e cóccix 
(TORTORA, 14ª ed.). 
↠ O reto é um tubo muscular reto que inicia na 
terminação do cólon sigmoide e termina no canal anal 
(SEELY, 10ª ed.). 
↠ O revestimento mucoso do reto é feito por epitélio 
colunar simples, e a túnica muscular é relativamente 
espessa, se comparada com o resto do trato digestório 
(SEELY, 10ª ed.). 
 
↠ Os últimos 2 a 3 cm do trato digestório correspondem 
ao canal anal. Ele inicia no terminal inferior do reto e 
termina no ânus (abertura externa do trato digestório) 
(SEELY, 10ª ed.). 
↠ A túnica mucosa do canal anal é disposta em pregas 
longitudinais chamadas colunas anais, que contêm uma 
rede de artérias e veias (TORTORA, 14ª ed.). 
↠ A camada de músculo liso do canal anal é ainda mais 
espessa que no reto e forma o esfincter anal interno no 
terminal superior (SEELY, 10ª ed.). 
↠ O músculo esquelético forma o esfincter anal externo 
no terminal inferior do canal (SEELY, 10ª ed.). 
 A abertura do canal anal para o exterior, o chamado ânus, é 
guardada pelo músculo esfíncter interno do ânus composto por 
músculo liso (involuntário) e pelo esfíncter externo do ânus composto 
por músculo esquelético (voluntário). Normalmente, estes esfíncteres 
mantêm o ânus fechado, exceto durante a eliminação das fezes 
(TORTORA, 14ª ed.). 
↠ O epitélio da parte superior do canal anal é colunar 
simples, e o da parte inferior é estratificado pavimentoso 
(SEELY, 10ª ed.). 
 As veias retais que abastecem o canal anal podem tornar-se 
mais alargadas ou inflamadas em uma condição chamada hemorroida 
(SEELY, 10ª ed.). 
↠ O canal anal é uma zona de transição epitelial na qual 
o epitélio simples prismático do intestino muda 
abruptamente para epitélio estratificado pavimentoso 
perto da linha pectinada. Na extremidade mais inferior do 
canal anal, a mucosa se funde com a pele verdadeira que 
circunda o ânus (MARIEB, 7ª ed.). 
REFLEXO DA DEFECAÇÃO 
↠ Os movimentos peristálticos em massa empurram o 
material fecal do colo sigmoide para o reto. A distensão 
resultante da parede retal estimula os receptores de 
estiramento, que iniciam um reflexo de defecação que 
resulta na defecação, a eliminação das fezes do reto por 
meio do ânus (TORTORA, 14ª ed.). 
↠ O reflexo de defecação ocorre do seguinte modo: 
em resposta à distensão da parede retal, os receptores 
enviam impulsos nervosos sensitivos para a medula 
espinal sacral. Impulsos motores da medula viajam ao 
longo dos nervos parassimpáticos de volta para o colo 
descendente, colo sigmoide, reto e ânus. A contração 
resultante dos músculos longitudinais retais encurta o reto, 
aumentando assim a pressão em seu interior. Esta 
pressão, junto com contrações voluntárias do diafragma 
e dos músculos abdominais, além do estímulo 
parassimpático, abrem o músculo esfíncter interno do 
ânus (TORTORA, 14ª ed.). 
↠ O músculo esfíncter externo do ânus é controlado 
voluntariamente. Se for voluntariamente relaxado, a 
defecação ocorre e as fezes são expelidas através do 
ânus; se for voluntariamente contraído, a defecação pode 
ser adiada 
 Contrações voluntárias do diafragma e dos músculos abdominais 
auxiliam na defecação ao aumentar a pressão no interior do abdome, 
APG 08 – “INTESTINO PRESO” 
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Júlia Morbeck – @med.morbeck 
 
que empurra as paredes do colo sigmoide e do reto para dentro 
(TORTORA, 14ª ed.). 
Potenciais de ação da medula espinal sacral ascendem ao encéfalo, 
onde o tronco encefálico e o hipotálamo inibem ou facilitam a atividade 
reflexa na medula espinal. Além disso, os potenciais de ação ascendem 
para o cérebro, onde a consciência de necessidade de defecar é 
realizada. O esfíncter anal externo é composto por músculo 
esquelético e está sob controle cerebral consciente. Se o esfíncter é 
relaxado voluntariamente, as fezes são expelidas. Por outro lado, um 
aumento na contração do esfíncter anal externo evita a defecação 
(SEELY, 10ª ed.). 
Se a defecação não ocorrer, as fezes voltam para o colo sigmoide 
até que a próxima onda de peristaltismo em massa estimule os 
receptores de estiramento, novamente produzindo a vontade de 
defecar. Em crianças, o reflexo de defecação provoca esvaziamento 
automático do reto, porque o controle voluntário do músculo esfíncter 
externo do ânus ainda não se desenvolveu (TORTORA, 14ª ed.). 
O número de defecações em um determinado período de tempo 
depende de vários fatores, como a dieta, a saúde e o estresse. A 
variação normal de atividade intestinal vai de 2 ou 3 defecações por 
dia a 3 ou 4 defecações por semana (TORTORA, 14ª ed.). 
Constipação intestinal 
 Apresenta diferentes significados para diferentes pacientes, 
dependendo do que cada um considera padrão normal de defecação. 
O paciente pode estar querendo dizer que as fezes são muito 
pequenas, muito duras, muito difíceis de serem expelidas, ou que as 
evacuações são pouco frequentes, ou, ainda, que persiste sensação 
de evacuação incompleta após a defecação (DANI; PASSOS, 2011). 
↠ A definição mais recente de constipação é baseada 
nos critérios de Roma III, publicados em 2006. Essa 
definição é baseada apenas em critérios clínicos, que 
incluem evacuações infrequentes e/ou dificultosas e/ou 
alterações na consistência das fezes (endurecidas ou em 
cíbalos) (ZATERKA; EISIG., 2016). 
 
↠ Além disso, de acordo com esses critérios, a 
constipação deve ser diferenciada da síndrome do 
intestino irritável com constipação. Essa diferenciação, 
embora nem sempre fácil, se faz principalmente pelos 
sintomas de dor ou desconforto no abdome que 
caracterizam a síndrome do intestino irritável (ZATERKA; 
EISIG., 2016). 
 A utilização dos Critérios de Roma tem sido muito criticada, pois 
consideram constipação intestinal funcional e síndrome do intestino 
irritável como distúrbios distintos. Estudos recentes realizados nos EUA 
demonstraram que é impossível distinguir síndrome de intestino 
irritável e constipação intestinal funcional através dos critérios de Roma 
III. Além do mais, a classificação ficou muito detalhada, dificultando sua 
utilização na prática clínica (DANI; PASSOS, 2011). 
↠ A constipação intestinal não deve ser entendida como 
uma doença. É, ao mesmo tempo, um sintoma e um sinal, 
nem sempre isolados, que podem acompanhar várias 
doenças funcionais ou orgânicas, digestivas ou de outros 
sistemas, com características individuais e, portanto, 
abordagens diagnósticas e terapêuticas particulares 
(QUILICI et. al., 2019). 
CARACTERÍSTICAS FÍSICAS DAS FEZES 
TAMANHO: O calibre das fezes não pode ser dimensionado 
adequadamente devido à deformação do bolo fecal pelas estruturas 
constituintes da região anorretal e pela força da gravidade durante o 
ato da defecação. Pacientes constipados relatam fezes finas como um 
lápis, ou volumosas, ou fragmentadas em vários tamanhos, como fezes 
de cabra (DANI; PASSOS, 2011). 
COMPRIMENTO: Noventa por cento das pessoas normais esvaziam 
apenas o reto quando defecam; os outros 10% esvaziam o cólon, 
desde a flexura esplênica até o ânus (DANI; PASSOS, 2011). 
PESO FECAL: O peso normal das fezes pode variar de 35 a 450 gramas 
por evacuação, nos homens, e de 5 a 335 gramas, nas mulheres 
(DANI; PASSOS, 2011). 
CONSISTÊNCIA: A consistência das fezes pode ser determinada 
objetivamente através da força necessária para fazer passá-las por 
um tubo fino, ou observando-se a profundidade de penetração de um 
objeto no bolo fecal (DANI; PASSOS, 2011). 
FREQUÊNCIA: É, sem dúvida, o parâmetro mais fácil de quantificar e o 
de maior aplicação clínica. A grande maioria das pessoas normais, em 
váriasamostras da população geral, evacua 1 vez/dia, e raramente 
alguém evacua menos de 5 vezes/semana. Entretanto, essa 
frequência pode ser alterada por inúmeros fatores, tais como cultura, 
hábitos alimentares, atividade física, educação e fatores emocionais 
(DANI; PASSOS, 2011). 
Uma maneira prática de se avaliarem não só́ as características das 
fezes, mas também a correlação com o tempo de trânsito, é a 
utilização da Escala de Bristol para o formato das fezes (DANI; 
PASSOS, 2011). 
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Júlia Morbeck – @med.morbeck 
 
 
EPIDEMIOLOGIA 
↠ É considerada uma das queixas mais frequentes nos 
consultórios médicos, acometendo cerca de 20% da 
população mundial. É mais comum entre mulheres e 
idosos, representando para este um sintoma preocupante 
(GARCIA et. al., 2016). 
↠ No Brasil, um estudo populacional recente realizado na 
cidade de Pelotas (RS) demonstrou prevalência de 26,9% 
de constipação intestinal, definida de acordo com os 
critérios de Roma III, em um grupo de 2.946 indivíduos. A 
constipação foi mais frequente nas mulheres (37%) e 
entre as pessoas de nível socioeconômico mais baixo 
(ZATERKA; EISIG., 2016). 
↠ Há evidências prévias na literatura do aumento da 
prevalência de constipação associado com baixo status 
socioeconômico. Tal fato talvez possa ser explicado pela 
influência dos padrões sociais em favorecer maior 
comportamento de risco, como alimentação inadequada 
e inatividade física, em indivíduos de classes 
desfavorecidas (DANTAS, 2019). 
↠ Ao analisar a prevalência e os fatores associados a 
constipação intestinal em mulheres adultas, residentes em 
município do interior do nordeste brasileiro, verificou-se 
prevalência de 35,4% que esteve associada a fatores 
clínicos, como a presença de hemorroidas, dor e ardor 
na evacuação, e a disfunção sexual (DANTAS, 2019). 
Aspectos biomecânicos envolvidos na evacuação podem contribuir 
para maior prevalência de constipação em mulheres, a exemplo de 
lesão de músculos e nervos do assoalho pélvico que pode ocorrer 
durante o parto vaginal, por exemplo. Alterações da musculatura do 
assoalho pélvico predispõem a problemas como incontinência urinaria, 
disfunção sexual e constipação 
Os autores descrevem que queixas como dor, esforço e necessidade 
de estimulação para evacuação, comuns em pacientes constipados 
(laxativos, manobras digitais ou enemas) expressaram correlação 
significativa com a presença de hemorroidas, e isso acontece por se 
tratar de veias varicosas presentes no reto, que podem ser agravadas 
pelo esforço durante as evacuações 
FATORES DE RISCO 
↠ Alguns fatores podem ser os responsáveis pela maior 
prevalência da constipação intestinal em determinadas 
populações, dentre os quais se destacam idade, sexo, 
hábitos dietéticos, inatividade física/sedentarismo e fatores 
socioeconômicos (GARCIA et. al., 2016). 
IDADE 
↠ A prevalência da constipação aumenta com a idade, 
estimando-se que pode afetar até 20% das pessoas com mais 
de 65 anos (ZATERKA; EISIG., 2016). 
↠ A constipação no idoso não parece ser consequência de 
alterações intestinais secundárias ao processo de 
envelhecimento, mas, sim, da maior frequência de fatores de 
risco para a constipação nessa faixa etária, como o baixo nível 
de atividade física, o uso de medicamentos com efeitos 
constipantes e a doença de Parkinson (ZATERKA; EISIG., 2016). 
SEXO 
↠ A associação epidemiológica entre sexo feminino e maiores 
taxas de prevalência de constipação intestinal é amplamente 
relatada na literatura (GARCIA et. al., 2016). 
↠ Alguns autores afirmam que a constipação intestinal em 
mulheres parece ser mais frequentes por motivos relacionados 
com as alterações da gravidez e o parto (GARCIA et. al., 2016). 
↠ Outro fator importante diz respeito às diferenças 
comportamentais entre os sexos. Desde a infância, o cuidado 
por parte das meninas em utilizar banheiros desconhecidos 
pode contribuir para que estas se tornem mais propensas a 
ignorar o reflexo evacuatório normal (GARCIA et. al., 2016). 
HÁBITOS DIETÉTICOS 
↠ A constipação tem sido um problema que prevalece em 
diferentes culturas, associada a hábitos alimentares que incluem 
alimentos industrializados, altamente refinados, 
consequentemente pobres em fibras vegetais (GARCIA et. al., 
2016). 
↠ A baixa ingestão de líquidos tem sido associada à 
constipação intestinal pela observação de que esse fato se 
relaciona a um trânsito intestinal lento e à diminuição da 
exoneração fecal (GARCIA et. al., 2016). 
 Os estudos clínicos que investigaram o papel da ingestão de 
líquidos na constipação apresentam resultados conflitantes (ZATERKA; 
EISIG., 2016). 
 
 
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Júlia Morbeck – @med.morbeck 
 
INATIVIDADE FÍSICA 
 
↠ O exercício físico proporciona movimentos no intestino 
grosso e mudanças hormonais, que provocam efeitos 
mecânicos no intestino, facilitando o peristaltismo. Além disso, a 
atividade física é responsável também por melhorar o tônus 
muscular pélvico e abdominal, facilitando a expulsão do bolo 
fecal (GARCIA et. al., 2016). 
FATORES SOCIOECONÔMICOS 
↠ A literatura aponta para algumas evidências de que o 
consumo de fibras e alimentos saudáveis em geral é baixo na 
população como um todo, mas é ainda menor entre aqueles 
indivíduos pertencentes às classes menos favorecidas (GARCIA 
et. al., 2016). 
ETIOPATOGENIA 
↠ Do ponto de vista etiopatogênico, podemos classificar 
a constipação intestinal em três grupos: (DANI; PASSOS, 
2011). 
• primária; 
• secundária ou orgânica; 
• idiopática ou funcional. 
PRIMÁRIA 
↠ Também chamada de constipação intestinal simples, é 
aquela provocada por situações inerentes aos hábitos de 
vida do paciente ou por outras circunstâncias, geralmente 
banais. Neste caso, a anatomia do órgão está preservada 
(DANI; PASSOS, 2011). 
Ingestão alimentar inadequada 
↠ Os guias atuais recomendam dietas ricas em fibra 
como tratamento de primeira linha para a constipação 
funcional, apesar de pequena evidência que suporte essa 
conduta. Como retêm água, caso das fibras solúveis, 
aumentam o volume e a hidratação das fezes, 
favorecendo sua eliminação, além de estimularem a 
proliferação da microbiota com formação de produtos 
fermentados, ajudando o cólon nos seus movimentos de 
propulsão (QUILICI et. al., 2019). 
Alterações comportamentais 
↠ Para a maioria das pessoas, a evacuação ocorre 
aproximadamente em um mesmo horário, em geral após 
alguma refeição, pelo movimento de propulsão do cólon 
graças ao reflexo gastrocólico. Esse horário não necessita 
obrigatoriamente depender do momento da alimentação, 
podendo ser estabelecido de acordo com conveniências 
individuais. Não é incomum que a sensação da vontade 
de evacuar seja despertada em locais ou horários 
inadequados e, como sua progressão depende de ação 
voluntária, nem sempre há condições para que ocorra a 
eliminação do conteúdo retal. Obrigações profissionais 
e/ou sociais impedem que essa sequência seja exercida, 
reprimindo-se o reflexo voluntariamente, abortando a 
evacuação, o que redireciona o bolo fecal de volta para 
o sigmoide, desaparecendo o desconforto retal da 
presença de fezes nesse local. A repressão repetitiva é 
acompanhada da perda da sensibilidade retal à sua 
distensão pelo bolo fecal, chegando a desaparecer por 
completo. A história identifica que o reflexo passou a 
ocorrer em intervalos cada vez maiores, graças à 
negação repetida das evacuações no momento 
apropriado (QUILICI et. al., 2019). 
↠ A postura física do indivíduo durante a evacuação é 
fundamental, ao utilizar as pernas como alavanca, na 
flexão do tronco sobre o abdome, como observado na 
posição de cócoras, para um eficaz desempenho das 
forças musculares envolvidas (QUILICI et. al., 2019). 
 
↠ Um fator negativo que contribui para a constipação é 
a desconcentração no momento da evacuação. Muitos 
doentes aproveitam esse tempo para leitura, rever suas 
agendas de trabalhoou compromissos, fumar, fazer 
telefonemas, enfim, psicologicamente distantes, 
comprometendo sua efetiva participação nos 
mecanismos voluntários da evacuação . Para muitos, essa 
associação chega a criar condicionamentos com bom resultado, não 
devendo, portanto, ser desestimulada. No entanto, quando se pretende 
reabituar o funcionamento intestinal regular, esse comportamento 
certamente pode interferir na sua correção (QUILICI et. al., 2019). 
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Júlia Morbeck – @med.morbeck 
 
Gravidez 
↠ A mulher grávida pode ficar constipada por dois 
motivos: alterações hormonais e compressão extrínseca 
que o útero gravídico faz sobre o intestino (DANI; 
PASSOS, 2011). 
Alteração por trânsito lento 
↠ Caracteriza-se por um tempo prolongado para o 
deslocamento das fezes do ceco até o reto, na ausência 
de lesões intraluminares ou dilatações de algum dos seus 
segmentos. As bases fisiopatológicas para explicar a 
inércia colônica continuam mal esclarecidas (QUILICI et. al., 
2019). 
 Pesquisas que analisaram a atividade propulsora das ondas de 
propagação em portadores de trânsito lento confirmaram que as de 
grande, como também as de baixa amplitude, apresentam-se em 
frequência significativa reduzida, comparadas com as de indivíduos 
sadios. Diminuição dos marca-passos intestinais (células de Cajal) e 
comprometimento de neurotransmissores gastrentéricos podem vir a 
ser responsabilizados pela hipomotilidade do cólon (QUILICI et. al., 2019). 
Alteração do assoalho pélvico 
↠ Na disfunção do assoalho pélvico, a dificuldade 
encontra-se localizada na passagem do conteúdo do reto 
para o exterior, por uma falha do relaxamento 
esfincteriano ou do músculo puborretal (anismo) durante 
a evacuação. Na evacuação obstruída, a hipótese mais simplista 
refere-se ao incompleto relaxamento do músculo puborretal ou sua 
contração paradoxal, como também do músculo esfincteriano, no 
momento que antecede a passagem do bolo fecal do reto para o 
canal anal e deste para o exterior . Hipertonia esfincteriana 
também está relacionada com constipação intestinal 
(QUILICI et. al., 2019). 
 
SECUNDÁRIA OU ORGÂNICA 
↠ A constipação intestinal é ocasionada por uma doença 
sistêmica, por iatrogenia ou, então, por problemas 
psicossociais. As situações mais frequentes são: doenças 
do colón, doenças neurológicas, distúrbios endócrinos, 
medicamentos e distúrbios psiquiátricos (DANI; PASSOS, 
2011). 
 
Doenças do cólon 
↠ Qualquer condição que provoque estreitamento 
anatômico ou bloqueio mecânico do lúmen intestinal pode 
produzir constipação intestinal (DANI; PASSOS, 2011). 
 Devemos lembrar sempre que a constipação intestinal, 
sobretudo se acompanhada de hemorragia, pode ser o primeiro 
sintoma de câncer do colón ou do reto (DANI; PASSOS, 2011). 
↠ As lesões extraluminais e, em certos casos, até 
extraintestinais, como cistos ovarianos, miomas, tumores 
da próstata, dependendo do tamanho, podem ocasionar 
constipação intestinal por compressão extrínseca, ao 
passo que hérnias, vólvulos e invaginação o fazem por 
obstrução intestinal (DANI; PASSOS, 2011). 
↠ As lesões luminais em geral ocupam espaço, reduzindo 
a luz do órgão, produzindo, dessa forma, constipação 
intestinal (DANI; PASSOS, 2011). 
↠ Qualquer lesão, quer seja do reto ou do ânus, que 
provoque dor durante a evacuação pode gerar 
obstipação, pois a pessoa evita evacuar. Se esse bloqueio 
voluntário do reflexo da evacuação se prolonga, pode 
condicionar o indivíduo a não evacuar. As lesões que mais 
frequentemente ocasionam esse problema são 
abscessos, fissuras, prolapsos, retocele e tumores. Em 
algumas circunstâncias, pode ocorrer estenose anorretal, 
sobretudo após operações nessa região, dificultando a 
evacuação (DANI; PASSOS, 2011). 
Doenças neurológicas 
↠ As lesões do sistema nervoso, tanto central quanto 
periférico, frequentemente produzem constipação 
intestinal (DANI; PASSOS, 2011). 
↠ A doença de Chagas constitui uma das causas mais 
frequentes de constipação intestinal em nosso meio. 
Caracteriza-se por destruição dos plexos neuronais da 
musculatura lisa do intestino, especialmente o plexo de 
Auerbach. Os segmentos acometidos tornam-se atônicos 
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Júlia Morbeck – @med.morbeck 
 
e muito dilatados. Pode ocorrer acúmulo de material fecal 
em todo o cólon. Há casos de pacientes que passam 20 
ou mais dias sem evacuar (DANI; PASSOS, 2011). 
 
Constipação induzida por medicamentos 
↠ A utilização rotineira de determinados medicamentos 
pode constituir-se na única etiologia da constipação. 
Agindo diretamente sobre a musculatura dos diferentes 
segmentos ou sua inervação, muitos dos casos de 
constipação se iniciam ou pioram com o uso de algum 
medicamento, potencialmente constipante. É importante 
investigar esse aspecto na população idosa, por se tratar 
de faixa etária na qual a utilização de múltiplos fármacos 
é mais comum, embora, obviamente, sua repercussão 
sobre o intestino independa de idade (QUILICI et. al., 2019). 
 
 Laxativos de ação irritante, acessíveis sem prescrição médica, 
também são uma das causas iatrogênicas da constipação intestinal. 
Entre os compostos por produtos naturais, de elevado consumo, na 
suposição de sua inocuidade, alguns atuam igualmente por irritação, 
estimulando as terminações nervosas dos plexos intestinais, levando, 
por uso prolongado, à sua dessensibilização, por vezes de forma 
irreversível (QUILICI et. al., 2019). 
Distúrbios endócrinos e metabólicos 
↠ Constipação intestinal pode ser a queixa principal de 
inúmeros distúrbios endócrinos e metabólicos. Assim, 
pacientes com pseudo-hipoparatireoidismo apresentam, 
em geral, constipação intestinal grave como único 
sintoma, que desaparece com a normalização da calcemia 
(DANI; PASSOS, 2011). 
↠ Constitui, também, queixa frequente nos casos de 
infiltração mixedematosa, feocromocitoma e 
glucagonoma. Cerca de 15% dos diabéticos são 
constipados. Nesse caso, o mecanismo provável é a 
neuropatia autonômica (DANI; PASSOS, 2011). 
↠ Os distúrbios metabólicos geram, quase sempre, uma 
diminuição de água no organismo, além de redução no 
peristaltismo. Dessa forma, evoluem com obstipação 
intestinal (DANI; PASSOS, 2011). 
 
 Provavelmente ocorre em decorrência de alterações 
neurológicas nos cólons, que levam ao aumento do tempo de trânsito 
colônico e à ausência do reflexo gastrocólico. Outros achados incluem 
a diminuição do tônus do esfíncter anal e o aumento do limiar de 
percepção para a sensação retal, que podem contribuir para a 
constipação intestinal e para a presença de incontinência fecal 
(ZATERKA; EISIG., 2016). 
Distúrbios psiquiátricos 
↠ Pacientes que sofrem de depressão, ansiedade e, 
sobretudo, aqueles com distúrbios psiquiátricos mais 
sérios (psicose, neurose, anorexia nervosa, entre outros) 
geralmente apresentam, entre suas queixas, constipação 
intestinal. Nesses casos, é preciso atenção especial, pois, muitas 
vezes, a queixa é constipação intestinal, mas, na verdade, o paciente 
não se sente satisfeito com a evacuação, quer seja quanto ao volume 
de fezes, quer seja na consistência, ou até mesmo na sensação da 
evacuação em si (DANI; PASSOS, 2011). 
↠ Nos pacientes com anorexia nervosa, a reduzida 
ingesta de água e alimentos é a causa da constipação 
intestinal (DANI; PASSOS, 2011). 
 
 
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Júlia Morbeck – @med.morbeck 
 
IDIOPÁTICA OU FUNCIONAL 
↠ Nesta situação, não há nenhuma alteração estrutural 
ou metabólica, nem qualquer alteração na rotina diária do 
paciente que possa justificar o sintoma. Geralmente, o 
problema é crônico, muitas situações remontam à 
infância, e responde mal ao tratamento convencional. Do 
ponto de vista fisiopatológico, pode ser dividida em três 
subgrupos: (DANI; PASSOS, 2011). 
• constipação intestinal com trânsito normal; 
• constipação intestinal com trânsito lento; 
• obstrução anorretal. 
Constipação intestinal com trânsitonormal 
↠ É a forma mais comum na prática clínica. Neste caso, 
o trânsito colônico e a frequência das evacuações são 
normais. Entretanto, os pacientes consideram-se 
constipados. Sentem dificuldade para evacuar e/ou 
apresentam fezes endurecidas (DANI; PASSOS, 2011). 
 De acordo com vários autores, grande parte dos pacientes com 
constipação com trânsito colônico normal preenche os critérios 
diagnósticos para a síndrome do intestino irritável. Nesses casos, a 
constipação é acompanhada pelos sintomas de dor ou desconforto no 
abdome e pode se alternar com períodos de diarreia. Também é 
frequente a presença de distensão abdominal (ZATERKA; EISIG., 2016). 
Constipação intestinal com trânsito lento 
↠ Também chamada inércia colônica, caracteriza-se por 
um prolongado tempo no trânsito das fezes através do 
cólon. Esta lentidão do trânsito pode ser devida a uma 
disfunção da musculatura colônica (miopatia), ou na 
inervação intrínseca (neuropatia) (DANI; PASSOS, 2011). 
↠ Estas alterações acarretarão uma diminuição na 
peristalse normal, em decorrência de uma redução no 
número e amplitude das contrações que são 
responsáveis pelo movimento de massa. A ausência ou 
diminuição destes movimentos resulta em prolongada 
permanência do bolo fecal no interior do cólon, sobretudo 
ascendente (DANI; PASSOS, 2011). 
↠ Outro mecanismo possível é a incoordenação da 
atividade motora no cólon distal, acarretando uma barreira 
ou resistência ao trânsito normal (DANI; PASSOS, 2011). 
 A inércia colônica caracteriza-se pela constipação crônica e 
grave, em que os pacientes relatam que permanecem mais de 10 dias 
sem evacuar e só o fazem com uso de laxantes. Essa condição é de 
difícil manejo e apresenta-se como um grande desafio. São pacientes, 
em sua maioria do sexo feminino, com início da constipação na infância 
ou adolescência, cuja orientação dietética não surtiu efeito (ZATERKA; 
EISIG., 2016). 
 A inércia colônica caracteriza-se pelo grande prolongamento do 
tempo de trânsito colônico, que pode ser explicado pelos achados de 
diminuição dos plexos mioentéricos e das células de Cajal nos cólons 
desses pacientes. Essas alterações são similares às observadas no 
megacólon, o que leva ao questionamento se esse, distúrbio deve 
ainda ser considerado funcional ou se deveria ser incluído no grupo 
das neuropatias associadas com constipação (ZATERKA; EISIG., 2016). 
Obstrução da via de saída 
↠ Nesta situação, existe uma falência do mecanismo de 
coordenação da evacuação. Este defeito funcional tem recebido 
vários nomes: obstrução da via de saída, defecação obstrutiva, 
disquesia anorretal, anismus; dissinergia do assoalho pélvico. Esta pletora 
de nomes expressa o nosso desconhecimento dos mecanismos 
envolvidos neste importante distúrbio (DANI; PASSOS, 2011). 
↠ Do ponto de vista prático, o que ocorre é uma 
contração da musculatura da pelve, em vez de 
relaxamento, durante a evacuação, resultando em 
acúmulo do bolo fecal na região retossigmoidiana (DANI; 
PASSOS, 2011). 
DIAGNÓSTICO 
↠ O estudo diagnóstico de pacientes portadores de 
constipação intestinal deve ser realizado em três planos: 
• orgânico; 
• funcional; 
• psicológico. 
ORGÂNICO 
Quadro clínico 
↠ A anamnese cuidadosa, como em toda a 
Gastrenterologia, é fundamental. O ponto-chave da história 
é saber a respeito do início dos sintomas (DANI; PASSOS, 
2011). 
↠ Na anamnese é importante avaliar os sintomas 
específicos da constipação, a forma das fezes, a 
frequência das evacuações e a época da vida em que 
esses sintomas se iniciaram (ZATERKA; EISIG., 2016). 
Nos pacientes que apresentam constipação intestinal devido a doenças 
congênitas, tais como meningocele etc., o sintoma existe, em geral, 
desde o nascimento. Constipação intestinal de início recente sugere 
doença orgânica, e, nesse caso, devem-se ter sempre em mente 
patologias malignas. História de sintomas há mais de 2 anos é mais 
tranquilizadora. Algumas vezes, o início dos sintomas coincide com 
problemas emocionais. Indagar sempre sobre os hábitos alimentares, 
incluindo a qualidade e a quantidade de alimentos consumidos no dia a 
dia. Verificar, também, se o paciente pratica esportes, e com que 
frequência (DANI; PASSOS, 2011). 
8 
 
 
Júlia Morbeck – @med.morbeck 
 
↠ Pacientes constipados apresentam, conforme 
mencionado, uma constelação de sintomas que incluem: 
sensação de evacuação incompleta, necessidade de 
esforço para evacuar; fezes endurecidas, às vezes 
cíbalos; necessidade de manobras manuais para facilitar a 
evacuação. Além disso, referem diminuição na frequência 
das evacuações (em geral, menos de 3 evacuações por 
semana), desconforto abdominal ou retal, meteorismo, 
flatulência, estufamento e dor abdominal (DANI; PASSOS, 
2011). 
ATENÇÃO: Se, além da constipação intestinal, o paciente se queixa de 
dor, é preciso definir claramente a sua natureza, intensidade e 
localização. Esta é mais comum nos quadrantes inferiores do abdome 
e pode ser consequente à distensão dos cólons por gases ou por 
contrações prolongadas. Outras vezes, a dor localiza-se nos 
hipocôndrios, com intensidade branda, quase constante. 
Frequentemente, melhora com a evacuação ou com a eliminação de 
gases (DANI; PASSOS, 2011). 
↠ Em alguns casos de constipação intestinal crônica, o 
paciente apresenta queixas gerais, como cefaleia, 
irritabilidade, distensão abdominal, anorexia, desânimo, 
entre outras (DANI; PASSOS, 2011). 
↠ A utilização da Escala de Bristol fornece importantes 
informações sobre o formato e a consistência das fezes 
e correlaciona-se muito bem com o tempo de trânsito 
intestinal (DANI; PASSOS, 2011). 
 Também devem ser buscados os sinais e sintomas de alarme, 
que podem indicar neoplasia: emagrecimento maior que 10% do peso 
corporal em menos de seis meses, história familiar de câncer de cólon, 
febre, hematoquezia, anemia ou início recente de constipação depois 
dos 50 anos de idade (ZATERKA; EISIG., 2016). 
Exame físico 
↠ Embora frequentemente normal, um minucioso 
exame físico, incluindo exame neurológico, deve ser 
sempre realizado no sentido de excluir doença orgânica 
que possa ser responsável pela constipação intestinal 
(DANI; PASSOS, 2011). 
A boca deve ser examinada, verificando-se o estado dos dentes e 
buscando-se lesões na cavidade oral que possam interferir com a 
alimentação (DANI; PASSOS, 2011). 
O exame do abdome pode revelar distensão, hérnias, massas palpáveis 
ou sinais de fecaloma. Este deve ser pesquisado em todo paciente 
constipado, inclusive naqueles com incontinência fecal. O toque retal, 
portanto, não pode ser omitido (DANI; PASSOS, 2011). 
A ausência de sensações cutâneas ao redor do ânus pode indicar 
lesão neurológica. A inspeção da região perianal permite identificar 
escoriações na pele, hemorroidas, fístulas, fissuras, doenças 
sexualmente transmissíveis, e, em crianças com incontinência fecal, 
procurar sempre trauma consequente a abuso sexual (DANI; PASSOS, 
2011). 
O toque retal fornece informações sobre o tônus dos esfíncteres, o 
calibre do canal anal e a presença de lesões como abscessos, tumores 
e fístulas (DANI; PASSOS, 2011). 
Exames laboratoriais e de imagem 
↠ É consenso que, para a maior parte dos pacientes 
constipados, não é necessário solicitar uma bateria de 
exames laboratoriais e de imagem antes de iniciar o 
tratamento empírico. De acordo com as recomendações 
da Sociedade Americana de Gastroenterologia (AGA) 
publicadas em 2013, na ausência de outros sinais e 
sintomas acompanhando a constipação, deve ser 
solicitado apenas um hemograma completo para esses 
pacientes (ZATERKA; EISIG., 2016). 
 Os autores não recomendam a realização rotineira de outros 
exames laboratoriais, como provas de função tireoidiana, dosagem de 
cálcio sérico e glicemia, a não ser quando a avaliação clínica for 
sugestiva de doenças orgânicas (ZATERKA; EISIG., 2016). 
↠ A colonoscopia deve ser solicitadapara os pacientes 
com os sinais de alarme; para aqueles com mais de 50 
anos que não foram submetidos a exames para 
rastreamento do câncer colorretal após o início da 
constipação e para pacientes com constipação refratária 
ao tratamento clínico (ZATERKA; EISIG., 2016). 
↠ O enema opaco pode ser solicitado para os pacientes 
chagásicos com o objetivo de identificar o megacólon. 
Esse exame também pode ser solicitado nos casos de 
constipação intestinal refratária, pois fornece informações 
sobre as medidas e alterações anatômicas dos cólons que 
não são obtidas com a colonoscopia (ZATERKA; EISIG., 
2016). 
FUNCIONAL 
↠ Considera-se que os testes funcionais devem ser 
solicitados nos casos de constipação refratária ao 
tratamento clínico convencional (fibras e laxantes) 
(ZATERKA; EISIG., 2016). 
↠ O raciocínio clínico baseia-se na identificação de duas 
condições principais: a evacuação obstruída ou a inércia 
colônica. Os principais testes funcionais são: (ZATERKA; 
EISIG., 2016). 
• estudo do tempo de trânsito colônico; 
• defecografia; 
• manometria anorretal; 
• teste de expulsão do balão. 
9 
 
 
Júlia Morbeck – @med.morbeck 
 
Estudo do tempo de trânsito colônico 
↠ O método mais utilizado para a determinação do 
tempo de trânsito colônico é a ingestão de cápsulas 
contendo marcadores radiopacos. Existem variações da 
técnica. A mais simples consiste na realização de uma 
radiografia simples do abdome após cinco dias da ingestão 
dos marcadores. Se houver retenção de mais que 20% dos 
marcadores, considera-se que o paciente apresenta trânsito lento 
(ZATERKA; EISIG., 2016). 
↠ Além disso, dependendo do local de acúmulo dos 
marcadores radiopacos nos cólons, o estudo pode 
diferenciar pacientes com trânsito lento envolvendo todo 
o cólon (inércia colônica) e aqueles com trânsito lento 
segmentar. A retenção dos marcadores no reto e no 
sigmoide sugere evacuação obstruída (ZATERKA; EISIG., 
2016). 
 
Manometria anorretal, teste de expulsão do balão e 
defecografia 
↠ A defecografia, a manometria anorretal e o teste de 
expulsão do balão são utilizados para o diagnóstico da 
evacuação obstruída (ZATERKA; EISIG., 2016). 
↠ O teste de expulsão do balão consiste na introdução 
de um balão no reto, e a seguir solicita-se ao paciente 
para expeli-lo (ZATERKA; EISIG., 2016). 
↠ A manometria anorretal permite a medida das 
pressões de repouso e contração voluntária do canal anal. 
Fornece informações sobre os padrões manométricos 
durante a tentativa de expulsão do balão e também sobre 
a sensibilidade e complacência retal (ZATERKA; EISIG., 
2016). 
↠ A defecografia é o estudo da dinâmica da evacuação. 
Na técnica utilizando raio X, o contraste baritado de 
consistência semelhante à das fezes é introduzido no reto. 
O paciente permanece sentado em uma cadeira 
apropriada e é solicitado que evacue o contraste, quando 
são realizadas radiografias da pelve. Por esse exame, é 
possível identificar várias alterações que podem contribuir 
para o quadro de constipação, como a retocele, a 
enterocele e a contração paradoxal do músculo 
puborretal (ZATERKA; EISIG., 2016). 
Doenças Hemorroidárias 
↠ A doença hemorroidária ocorre quando há congestão, 
dilatação e aumento dos corpos cavernosos do canal anal 
(plexos hemorroidários) formando grandes emaranhados 
vasculares, submucosos ou subcutâneos, flexíveis, que se 
enchem de sangue, denominados mamilos 
hemorroidários (QUILICI et. al., 2019). 
A vascularização da região anorretal é constituída por uma rica rede 
de arteríolas e vênulas que se comunicam diretamente, formando os 
corpos cavernosos e chamados de plexos hemorroidários, um interno 
e outro externo no canal anal (DANI; PASSOS, 2011). 
Plexo hemorroidário interno: Localiza-se no espaço submucoso do 
canal anal, acima da linha pectínea (sentido proximal), sendo formado 
por uma rede de vasos sanguíneos calibrosos. É vascularizado pelos 
três ramos terminais da artéria retal superior, dois à direita (um anterior 
e outro posterior) e um lateral esquerdo. Drena para o sistema portal 
pela veia retal superior, tributária da veia mesentérica inferior (DANI; 
PASSOS, 2011). 
Plexo hemorroidário externo: Situa-se no espaço subcutâneo do canal 
anal, abaixo da linha pectínea (sentido distal), sendo vascularizado pelos 
ramos terminais das artérias retais inferiores, e drena para a circula- 
ção sistêmica (veia cava inferior), pelas veias retais inferiores, tributárias 
das veias pudendas e ilíacas internas. Ambos os plexos se comunicam, 
por apresentarem anastomoses arteriovenosas entre si (DANI; 
PASSOS, 2011). 
 
10 
 
 
Júlia Morbeck – @med.morbeck 
 
EPIDEMIOLOGIA 
↠ A DH é a patologia proctológica mais comum nos 
adultos. A prevalência exata é difícil de estabelecer, isto 
porque muito dos doentes que sofrem desta patologia 
não procuram ajuda médica. O pico de incidência é entre 
os 45-65 anos, sendo raro o seu aparecimento antes dos 
20 anos (GUEDES et. al., 2021). 
↠ Conforme o DATASUS percebe-se que entre 2009 
e 2019 foram registrados, no Brasil, um valor total de 
116.266.071 casos de doença hemorroidária. O ano de 2014 
obteve o maior registro de DH, com um total de 
11.908.127,61 (10,24%), seguido por 2019 com 11.126.525,84 
(9,57%) (SOUZA et. al., 2020). 
↠ Comparou-se também a relação de DH entre os 
sexos. Houve uma predominância no sexo feminino com 
66.108.447,53 dos casos, representando cerca de 57% 
do valor total. Provavelmente essa prevalência se resulta 
devido às hemorróidas serem extremamente comuns 
durante a gravidez. O desenvolvimento dessa patologia 
está fortemente relacionado ao efeito direto das 
alterações hormonais, metabólicas e mecânicas durante o 
curso da gestação (SOUZA et. al., 2020). 
↠ O constrangimento causado pela patologia é algo 
ininterrupto na vida dos doentes, devido ao estigma que 
existe em torno da doença, considerada pela população 
como algo não higiênico (GUEDES et. al., 2021). 
FATORES DE RISCO 
↠ A obstipação crônica é vista como o principal fator de 
risco para o desenvolvimento de DH. Um aumento crônico 
na pressão intra-abdominal, em combinação com a 
ausência de válvulas nas veias retais, limita a drenagem 
venosa durante a evacuação, resultando numa dilatação 
anormal do plexo hemorroidário interno. O ingurgitamento 
vascular permanente leva à degeneração do tecido 
conjuntivo com consequente deslizamento hemorroidário 
(GUEDES et. al., 2021). 
↠ Condições como dieta pobre em fibra alimentar e 
estilo de vida sedentário propiciam o aparecimento e/ou 
agravamento da obstipação, por conseguinte, aumentam 
o risco de desenvolvimento de patologia hemorroidária 
(GUEDES et. al., 2021). 
↠ Fatores como o envelhecimento e doenças que 
afetam o colágeno correlacionam-se à DH, por 
comprometimento do tecido conjuntivo (GUEDES et. al., 
2021). 
↠ Existe ainda uma relação entre diarreia crônica e DH, 
explicada pelo facto de haver uma contração anal 
prolongada na tentativa de manter a continência, evitando 
perdas fecais involuntárias. A pressão anal em repouso 
elevada contribui para a diminuição do retorno venoso e 
por sua vez ingurgitamento hemorroidário, originando um 
círculo vicioso fisiopatológico para a DH. Além disso, a 
frequência e características do trânsito fecal diarreico 
pode adicionalmente gerar trauma local, culminando em 
erosões superficiais da mucosa e, subsequentemente, 
retorragias (GUEDES et. al., 2021). 
ETIOPATOGENIA 
↠ A natureza da doença hemorroidária não é, ainda, 
completamente conhecida. Vários fatores etiopatogênicos 
são importantes: (QUILICI et. al., 2019). 
• Dificuldade do esvaziamento sanguíneo do canal 
anal no ato defecatório, com congestão e 
dilatação dos corpos cavernosos 
• Prolapso anormal do plexo hemorroidário, 
durante a evacuação, por deficiência de sua 
fixação pela musculatura longitudinal da 
submucosa (músculo de Treitz).• Excessivo esforço defecatório e/ou 
endurecimento das fezes. 
• Presença das comunicações arteriovenosas, 
muito calibrosas, na submucosa do canal anal 
facilitando o aumento e a dilatação dos corpos 
cavernosos. 
• Hiperatividade do esfíncter anal interno com 
hipertonia ocasionando distensão dos corpos 
cavernosos. 
• Hiperplasia vascular: A presença de hiperplasia 
dos corpos cavernosos do canal anal que poderá 
ocasionar sua dilatação e aumento. 
 Na etiopatogenia da doença hemorroidária, deve-se 
considerar também seus fatores desencadeantes e agravantes, como 
os relacionados com hábitos defecatórios errôneos, a constipação 
intestinal, o abuso de laxativos, a diarreia crônica, a gravidez (pelo 
aumento da pressão intra-abdominal) e a posição bípede do ser 
humano (QUILICI et. al., 2019). 
 É rara a sua remissão e, uma vez manifestada, sua evolução 
pode ser progressiva se não houver um tratamento adequado (QUILICI 
et. al., 2019). 
CLASSIFICAÇÃO 
↠ A classificação mais utilizada está relacionada com a 
localização do mamilo hemorroidário no canal anal e com 
a presença ou não de seu prolapso (DANI; PASSOS, 2011). 
11 
 
 
Júlia Morbeck – @med.morbeck 
 
↠ Os mamilos podem ser: internos, externos ou mistos 
no canal anal. Apresentam consistência amolecida e forma 
abaulada. Devido à ramificação arterial da retal superior, 
pode haver três mamilos internos, de localização anterior 
direita, posterior direita e lateral esquerda, denominados 
principais, e os demais, quando existentes, são ditos 
secundários (DANI; PASSOS, 2011). 
 A mais utilizada está relacionada à localização do mamilo 
hemorroidário no canal anal (DANI; PASSOS, 2011). 
 
 
Mamilo hemorroidário interno 
↠ É o mamilo situado acima da linha pectínea, na parte 
interna ou proximal do canal anal. Ele é subclassificado, de 
acordo com a presença ou a ausência de seu prolapso 
para fora do canal anal, em: (QUILICI et. al., 2019). 
• 1º grau: é o mamilo hemorroidário interno que 
não prolaba pelo canal anal à evacuação ou aos 
esforços. 
 
• 2º grau: quando ele prolaba através do canal anal 
durante o esforço evacuatório, exteriorizando-
se pelo ânus, porém retornando 
espontaneamente após cessado esse esforço. 
 
• 3º grau: o mamilo prolaba à evacuação e/ou aos 
esforços e não retorna espontaneamente, 
necessitando ser recolocado digitalmente para o 
interior do canal anal. 
 
• 4º grau: mamilo interno permanentemente 
prolabado pelo canal anal, sem possibilidade de 
ser recolocado para o interior do canal anal. 
 
12 
 
 
Júlia Morbeck – @med.morbeck 
 
Mamilo hemorroidário externo 
↠ É o mamilo localizado abaixo da linha pectínea, no 
anoderma (porção externa ou distal do canal anal). 
Caracteriza-se por um abaulamento de consistência mole, 
indolor e, às vezes, de coloração vinhosa (QUILICI et. al., 
2019). 
 
Mamilo hemorroidário misto 
↠ Na existência concomitante de mamilos internos e 
externos, a doença hemorroidária é classificada como 
mista (QUILICI et. al., 2019). 
 
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS 
↠ A enfermidade hemorroidária pode ser assintomática 
e só diagnosticada ao exame físico. Porém, a maioria dos 
enfermos apresenta diferentes sintomas e sinais 
(ZATERKA; EISIG., 2016). 
SANGRAMENTO 
↠ É o principal sinal, além de ser o mais frequente e, às 
vezes, o primeiro a se manifestar. O sangue pode ser 
observado somente no papel higiênico durante a higiene 
anal e/ou gotejando ou ocorrendo em jato no vaso 
sanitário durante e/ou imediatamente após a evacuação 
(ZATERKA; EISIG., 2016). 
 Caracteriza-se pela sua cor vermelho rutilante. Está associado à 
passagem de fezes endurecidas pelo canal anal (as quais podem 
traumatizar o mamilo hemorroidário) ou ao tipo de higiene anal utilizado 
pelo paciente (p. ex., uso de papel higiênico) (ZATERKA; EISIG., 2016). 
 
↠ Esse sangramento costuma ser intermitente e a 
principal causa da consulta médica. Ele é, em geral, 
esporádico e ocorre em crises curtas de dias, pouco 
volumoso e relacionado com a evacuação. Essa perda 
sanguínea, discreta e contínua, quando frequente, pode 
acarretar anemia ferropriva. A enterorragia volumosa é 
rara (ZATERKA; EISIG., 2016). 
PROLAPSO 
↠ Caracteriza-se pela exteriorização do mamilo 
hemorroidário interno para fora do canal anal, durante o 
ato evacuatório ou durante as atividades físicas. Ele deve ser 
diferenciado da papila anal hipertrófica prolabada, do pólipo retal baixo 
que se exterioriza pelo canal anal e da procidência retal que se 
caracteriza pela protrusão de todas as camadas do reto para o exterior 
do ânus (no prolapso há apenas a exteriorização da mucosa retal) 
(ZATERKA; EISIG., 2016). 
EXSUDAÇÃO PERIANAL 
↠ Corresponde à umidade da pele perianal causada pela 
presença de muco nessa região, sobretudo decorrente 
da irritação da mucosa dos mamilos hemorroidários 
internos prolabados. Acompanha-se, em geral, pela 
dermatite e pelo prurido anal (ZATERKA; EISIG., 2016). 
DESCONFORTO ANAL 
↠ Durante ou após a evacuação pode haver pressão 
anal, definida pelo paciente como desconforto, porém, 
sem dor anal, porque a simples presença de doença 
hemorroidária não dói. A presença de dor no canal anal 
13 
 
 
Júlia Morbeck – @med.morbeck 
 
concomitante à doença hemorroidária ou é causada pelas 
suas complicações, como a trombose vascular 
(endoflebite), pelo hematoma ou pela presença 
concomitante de outras enfermidades dolorosas dessa 
região, como a fissura anal, a infecção perianal (criptite, 
papilite ou abscesso), as lesões inflamatórias ou as 
tumorais (ZATERKA; EISIG., 2016). 
 
DIAGNÓSTICO 
↠ É realizado por meio de anamnese pormenorizada dos 
sintomas e sinais anteriormente mencionados, além da 
avaliação dos hábitos evacuatórios e alimentares dos 
pacientes, o uso de laxativos, a existência de doenças 
anteriores ou de operações no trato digestivo 
(ZATERKA; EISIG., 2016). 
↠ Deve-se questionar, também, a existência de doenças 
gastrointestinais nos familiares (ZATERKA; EISIG., 2016). 
↠ Nas enfermidades agudas e dolorosas, como a 
trombose hemorroidária, o exame proctológico deve 
limitar-se ao mínimo necessário para confirmar o 
diagnóstico, sem agravar o sofrimento do paciente. 
(ZATERKA; EISIG., 2016). 
 O exame proctológico deve seguir a sequência: 
inspeção estática e dinâmica do canal anal, palpação, toque retal, 
anuscopia e retossigmoidoscopia (ZATERKA; EISIG., 2016). 
Diagnóstico diferencial 
Visto que para os leigos, sob a designação de “hemorroidas”, é 
incluída com frequência e erroneamente grande variedade de 
doenças anorretais, é importante que o médico proceda com 
especial cuidado e atenção ao diagnóstico diferencial da doença 
hemorroidária com as seguintes enfermidades: (ZATERKA; 
EISIG., 2016). 
• procidência retal; 
• papila anal hipertrófca; 
• hemangiomas perianais; 
• condiloma; 
• plicomas; 
• fissura anal; 
• processos infecciosos (criptites, papilites ou 
abscessos); 
• doenças inflamatórias; 
• tumores benignos ou malignos do canal anal; 
• tumores retais prolabados benignos. 
 
Referências 
TORTORA, Gerard J. Princípios de anatomia e fisiologia / 
Gerard J. Tortora, Bryan Derrickson; tradução Ana 
Cavalcanti C. Botelho... [et al.]. – 14. ed. – Rio de Janeiro: 
Guanabara Koogan, 2016. 
REGAN, J.; RUSSO, A.; VVANPUTTE, C. Anatomia e 
Fisiologia de Seely, 10a ed. Porto Alegre: AMGH, 2016 
MARIEB, E.; WILHELM, P.; MALLATT, J. Anatomia 
humana. São Paulo: Pearson Education do Brasil, 2014. 
DANI, Renato; PASSOS, Maria do Carmo 
F. Gastroenterologia Essencial, 4ª edição. Grupo GEN, 2011 
QUILICI, Flávio A.; SANTANA, Nelma Pereira de; 
GALVÃO-ALVES, José. A gastroenterologia no século 
XXI: manual do residente da Federação Brasileira de 
Gastroenterologia. Editora Manole, 2019. 
ZATERKA; EISIG. Tratado de Gatroenterologia da 
graduação à pós-graduação, 2ª edição.Atheneu, 2016. 
GARCIA et. al. Constipação intestinal: aspectos 
epidemiológicos e clínicos. Revista Saúde e Pesquisa, v. 9, 
n. 1, p. 153-162, 2016. 
DANTAS, A. A. G. Constipação intestinal e funcionalidade 
em mulheres adultas no interior do nordeste brasileiro. 
Dissertação de Pós-graduação, Universidade Federal do 
Rio Grande do Norte, 2019. 
SOUZA et. al. Análise epidemiológica sobre a doença 
hemorroidária e a hemorroidectomia no Brasil. 
Internacional Saúde única, 2020. 
GUEDES et. al. Hemorróidas: terapêuticas instrumentais 
não cirúrgicas. Dissertação de Mestrado, Universidade do 
Porto, 2021.

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