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3 História das Teorias Morais

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HISTÓRIA DAS TEORIAS MORAIS
As concepções morais costumam ser divididas em três categorias, cujo critério de distinção se baseia na maneira pela qual cada um concebe o soberano bem, ou seja, a regra da moralidade.
Utilitaristas 
Seu princípio, sua característica comum, reside no fato que situam o soberano bem do homem no prazer/no gozo fazendo, por conseguinte, do prazer, o critério do bem e do mal: é bom o que permite gozar; é mau o que impede o gozar ou faz sofrer.
As teorias utilitaristas se diferenciam entre si segundo a maneira pela qual elas entendem que deva ser o prazer.
Hedonismo 
Teve como expoentes Górgias, Cálicles e Aristipo de Cilene. Professa que é indispensável, necessário aproveitar o prazer toda vez que ele se nos ofereça. Um prazer perdido não retorna. A regra é o gozo imediato.
Epicurismo/do jardim 
Teve como principal expoente Epicuro, discípulo de Nausífanes, que foi discípulo de Demócrito. Epicuro, visto como a alma desta escola, ainda mais que seu método e sua dogmática, era descrito como uma fina, distinta e atraente personalidade, sendo louvado por seu desinteresse, brandura, bondade e profunda concepção de amizade. Todas as máximas por ele ditas se transformavam em dogmas. Porém, seus textos acabaram se perdendo e maior fonte para se conhecer o epicurismo é um de seus discípulos, Lucrécio Caro. 
Epicuro renovou o atomismo, teoria segundo a qual o átomo é desprovido de uma qualidade, distinguindo-se um dos outros apenas pela forma, peso e semelhantes. 
Repele este sistema do gozo imediato. Professa que, no próprio interesse do gozo/prazer, é necessário escolher entre os diversos prazeres, escolhendo-se aqueles que não são acompanhados de nenhuma dor, aqueles que não ameaçam privar-nos de um prazer maior, preferindo os prazeres calmos aos prazeres violentos, eliminando qualquer procura de prazeres artificiais. Em suma, Epicuro visa mais a alcançar um estado de tranquilidade (ataraxia), de paz, que desenvolver uma atividade prazerosa.
Utilitarismo
Bentham tentou dar um caráter científico ao epicurismo e torná-lo menos austero (rídigo). O fim, para ele, é a obtenção da maior quantidade possível de prazer – uma maior quantidade de prazer, para uma sociedade, por exemplo, seria aquela que atingisse o maior número de pessoas. Mas, para chegar a isto, convém construir uma espécie de aritmética de prazeres, que permite escolher, entre os prazeres que se apresentam, aqueles que são superiores por sua intensidade, certeza, proximidade, duração, pureza, alcance e fecundidade. Essa aritmética dos prazeres também pode ser chamada de moral do interesse pessoal.
Stuart Mill adota a teoria de Bentham, estipulando, entretanto, que é necessário levar em consideração não somente como queria Bentham, a quantidade de prazer, mas também sua qualidade. Ainda, quando há conflito entre o interesse geral e o interesse particular, é sempre o interesse particular que deverá ser sacrificado. Por isso alguns nomeiam o utilitarismo de Stuar Mill como moral do interesse geral.
Sentimentais/altruístas
Situam o soberano bem, a regra da moralidade, na cultura e no progresso dos sentimentos desinteressados ou altruístas, e das inclinações sociais. São as principais:
Morais da benevolência e da simpatia
Segundo Hutcheson, é o sentimento que nos leva ao conhecimento do dever. É ele que está no princípio dos juízos que não cessamos de fazer sobre as pessoas e as coisas, em virtude de uma regra de benevolência, que é a sua lei essencial. Por isso, a verdadeira bondade resulta necessariamente da obediência a uma inclinação desinteressada que se exprime em nós sob a forma do senso moral, ou seja, só cumprimos com a verdadeira bondade quando obedecemos à nossa própria inclinação de bondade expressa em nosso senso moral. É através da observância do nosso senso moral nessa execução de uma moral desinteressada que encontramos a verdadeira felicidade, pois sempre que somos benevolentes, praticamos a benevolência com nossos semelhantes, fazendo uso de sentimentos altruístas, desinteressados, encontramos a felicidade. Assim, é possível colocar esta ideia como uma moral absolutista. 
Adam Smith prefere basear a moral na simpatia pela qual nos comunicamos com os sentimentos que nos parecem inspirar as ações de outrem. O verdadeiro princípio da moral: trabalhar para desenvolver em si a simpatia desinteressada (que não nos trás qualquer tipo de satisfação) que nos faz gozar da felicidade de outrem, favorecendo-a e partilhando-a, e que nos incita a agir de maneira a merecer sempre da parte do próximo a simpatia mais pura e mais universal. Com isto é possível esperar uma reciprocidade: se eu fico feliz por outro, posso esperar que ele também fique feliz por mim e aja de acordo com isto.
Moral da humanidade 
Segundo Augusto Comte, a humanidade tem uma existência mais real do que o indivíduo. O indivíduo deve, então, sacrificar-se para a eclosão do Grande Ser coletivo. Toda a moral é assim dirigida pelo princípio de que só vale moralmente aquilo que contribui para a unificação moral do gênero humano.
Moral da piedade
Para Schopenhauer, o mundo é mau, uma vez que tem uma tendência para um fim ilusório, esforço vão, vontade frustrada, e afinal, pena e dor. O ideal será então o de matar em nós toda vontade e todo desejo, fontes de sofrimento, e, por conseguinte, renunciar ao egoísmo pelo exercício de uma piedade universal e profunda, que nos inspirará acima de tudo a justiça e a caridade.
Moral da solidariedade 
Para Léon Bourgeois, o sentimento da solidariedade é o que liga toda a sociedade, nos liga, em extensão e profundidade, aos outros homens. Assim, é ele que deve inspirar nossa conduta e determinar quais ações devemos praticar para que aconteça uma justiça exata e para que nós nos devotemos ao bem da humanidade.
Moral da honra 
Para Vigni, a honra, tal qual como a concebe a sociedade e conforme os ditames da consciência, pode ser um princípio moral. Assim, é possível utilizar “nada fazer contra a honra” como regra sempre aplicável e suscetível de levar até o heroísmo a conduta humana, de modo que se estaria praticando o bem, de qualquer forma.
Racionais
Entendem que o soberano bem consiste na perfeição de nossa natureza racional e, portanto, exigem que a razão sirva de regra da moralidade. Assim, situam o soberano bem na obediência ao dever conhecido pela razão, “obedece-se ao dever porque ele é racional”. O princípio comum das teorias racionais pode ser entendido de maneiras diversas:
Eudemonismo racional 
Aristóteles insiste na felicidade que traz a atividade especulativa da razão. A felicidade deve resultar, para nós, do progresso e da perfeição da atividade mais nobre de nossa natureza, qual seja, o exercício da inteligência, na sua forma mais alta, qual seja, a contemplação da verdade, e do objeto mais inteligível, que é Deus. Necessariamente, a felicidade se acrescentará a esta atividade contemplativa, como, à juventude, a sua flor.
Moral estoica 
Zenão de Citium, fundador do estoicismo, resume sua doutrina na máxima “devemos seguir a natureza, ou seja, a razão, pois é a razão que distingue o homem do animal”. A razão nos mostra que não há senão uma sabedoria, que consiste em aceitar a ordem universal, que não depende de nós, e portando nos faz renunciar aos desejos, que gerem a inquietação e a discórdia. É unicamente assim que o homem poderá eximir-se das paixões, identificando-se com a razão universal (que pode ser chamada de Deus ou Destino). A apatia ou a serenidade perfeita é, então, o ideal do sábio e apático seria o nome da beatitude, do santo, do sacro. A virtude, deste ponto-de-vista, não é mais do que o reino da razão e, como tal, identifica-se com o bem, que é a própria razão, pois ele é ordem e perfeição. Como, por outro lado, ela se resume na vontade de agir sempre segundo a razão, não poderá comportar graus: esta vontade, com efeito, é ou não é. A virtude é, então, perfeita e completa ao mesmo tempo: daí se segue que quem possua uma única virtude, possui necessariamente a todas, e quem não possui umavirtude que seja, não tem absolutamente virtude alguma.
Moral  formal
Kant afirma que a vontade boa é a que realiza o dever simplesmente porque é dever, sem recorrer a nada exterior a ele (como felicidade, satisfação do sentimento, mandamento divino). Por exemplo, não se deve usar um cinto de segurança apenas quando a polícia está próxima, pelo medo de uma multa, mas sempre, pelo simples dever de fazê-lo. Por conseguinte, o nível de nosso ato não consiste jamais em que o ato seja bom em si mesmo, que agrade a Deus ou que nos proporcione satisfação de consciência, mas unicamente que é o dever. Todo o resto, não apenas não é moral, como vicia fundamentalmente a moralidade, transformando o imperativo categórico (superior, obedecido, por puro respeito da lei) em um imperativo hipotético (obedecido se tu queres ser feliz, se tu queres ser estimado, entre outros). Esta moral se apresenta, então, como puramente formal, pois só leva em conta a intenção (ou forma da moralidade) e não o conteúdo/matéria da atividade moral. 
Em razão deste caráter que Kant reconhece três máximas, puramente formais também, como regras da atividade moral: 
· “Age sempre segundo uma máxima tal que possas querer ao mesmo tempo que ela seja uma lei universal.”
· “Age de tal sorte que mantenhas sempre a vontade livre, em ti e no próximo, como um fim e não como um meio.”
· “Age sempre com a ideia de tua vontade como legisladora universal”. 
Elas não determinam materialmente nenhum dever, apenas estipulam a forma da atividade moral, ou seja, as intenções graças às quais toda atividade, qualquer que seja a sua matéria, será moral. Tal concepção moral exige, evidentemente, para ter sentido, as ideias de liberdade, de Deus e de vida futura, uma vez que o dever supõe a liberdade moral e evoca as sanções do além-túmulo (Kant era Pietista). Mas estas ideias são postuladas pela moral, quer dizer, não é a moral que se apoia na metafísica, mas a metafísica que se apoia na moral, motivo pelo qual se pode definir a moral kantiana como moral formal.

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