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1 Extensão de Cabo Delgado Departamento de Ciências, Tecnologia, Engenharia e Matemática Curso de Licenciatura em Ensino de Química Com Habilitações em Gestão de Laboratório TEXTO DE APOIO (DIDÁCTICA DE QUIMICA IV) Ano Académico: 2022 Nível: 4º Ano Semestre: 1º Elaborado por: Mestre Jorge Ernesto CONCEITOS E CONTEXTOS DA QUÍMICA Tópicos: Preconcepções dos alunos Processo de conhecimento Processo de Ensino-aprendizagem da Química Natureza da Química como disciplina escolar Diferentes teorias sobre a natureza do conhecimento científico Algumas ideias comuns sobre Ciência Situações típicas Relações entre Ciência, Tecnologia e Sociedade Origens do movimento Ciência, Tecnologia e Sociedade O enfoque CTS na educação O enfoque CTS no ensino de Química 1. CONCEITOS FUNDAMENTAIS 1.1. Preconcepções dos alunos Segundo uma visão construtivista, um dos aspectos mais importantes para a definição de uma estratégia de ensino-aprendizagem é o estudo das concepções alternativas que os estudantes apresentam em várias áreas da ciência. A identificação correcta destas concepções alternativas apresenta problemas que demandam investigação de vários aspectos. No processo de identificação são usados vários métodos de investigação tais como entrevistas estruturadas ou semi-estruturadas, questionários de múltipla escolha e questionários com respostas em aberto. 2 Para responder as questões o que e como ensinar os conceitos científicos, é preciso primeiro fazer um diagnóstico do conhecimento inicial dos estudantes, isto é, das pré-concepções. Estas pré-concepções podem depender de vários factores tais como nível cognitivo, faixa etária, sexo, nível sócio - económico e cultura. Segundo a visão construtivista, o conhecimento das concepções apresentadas por crianças são fundamentais para o estudo dos mecanismos essenciais que proporcionam uma mudança conceitual, isto é, quais processos são os responsáveis pela assimilação dos novos conceitos, substituindo os antigos. 1.2. Processo de conhecimento Os materialistas explicam que o processo de conhecimento começa com a observação viva ou seja a percepção da realidade do seu meio ambiente “aparência externa”, segue-se depois o pensamento que permite a penetração teórica das coisas e fenómenos e termina com a aplicação prática dos conhecimentos adquiridos. Com isto quer dizer que este processo ocorre em três (3) etapas: a) Etapa do conhecimento sensitivo: ocorre a observação viva/percepção para aquisição do conhecimento. Na observação viva predomina a actividade dos órgãos de sentido, onde teremos a sensação, percepção e representação. Através da sensação o Homem conhece a qualidade dos objectos, fenómenos e processos, mas só pode representar completa e objectivamente esses fenómenos, objectos e processos depois de uma percepção. Na observação o professor deve dirigir ou orientar a atenção dos alunos tanto para as características mais importantes, como também para as menos importantes, isto permite melhor entendimento dos alunos. A observação pode ser feita: Natureza e sociedade; Aulas experimentais; Meios didácticos: modelos, filmes, fotos, etc. 3 b) Etapa do conhecimento lógico Ocorre o pensamento. Pensamento é a forma superior da actividade humana que permite ao Homem penetrar na essência mais profunda dos objectos, fenómenos e processos. O pensamento permite o Homem reflectir sobre: Relação entre os objectos por meio de operações mentais. A essência dos objectos, fenómenos e processos. O pensamento é caracterizado por cinco (5) operações mentais: Análise: consiste na decomposição ao nível mental de todas as qualidades de um objecto ou fenómeno em partes; Síntese; Abstracção: é a operação mediante a qual se separa as características essenciais nos grupos de objecto ou fenómeno; Comparação; Generalização. Durante esta fase, o professor deve: Dirigir a atenção dos alunos para particularidades principais: qualidades, características e relações entre objectos ou fenómenos; Permitir aos alunos formularem oralmente as suas conclusões para desenvolvimento da linguagem e do pensamento abstracto. c) Etapa de verificação prática Consiste na experimentação. Nesta fase do processo, confirma-se ou nega-se as hipóteses apresentadas como explicação provisória de um facto científico, isto é, aceita-se ou nega-se o pensamento abstracto. A experimentação é a fonte do saber, onde os alunos adquirem a certeza da relação objectiva existente entre os fenómenos ou objectos na natureza. 1. 3. Processo de Ensino-aprendizagem da Química A Química é uma ciência que estuda as propriedades da matéria e os processos envolvidos na sua transformação. 4 Em Moçambique, tal como em muitos Países, a Química é uma disciplina curricular leccionada no Ensino Secundário Geral (ESG). E como disciplina escolar a escolha do conteúdo deve respeitar: Ciência Pura “Química”: os conteúdos devem representar o conhecimento adquirido na disciplina; Aluno: os conteúdos devem respeitar as necessidades, interesses e o nível de desenvolvimento das capacidades dos alunos; Sociedade: os conteúdos devem respeitar e considerar as exigências da sociedade na actualidade. Portanto, para ser professor de Química é necessário passar por uma formação profissional, onde dois campos importantes são tratados de forma separados, mas formam uma unidade para o exercício eficiente da actividade docente: a) Conhecimento Científico da Química: é o conjunto de conhecimentos científicos da Química como ciência que foram incorporados no Programa de Ensino da Química. O professor de Química deve possuir conhecimentos científicos destes conteúdos e eles devem ser Correctos, Actualizados e Actuantes. b) Conhecimento Psico-Pedagógico: é o conjunto das diferentes bases psicológicas e teorias pedagógicas que se aplicam para a realização da actividade docente de Química. Neste caso o mais importante não é só conhecer tais teorias, modelos e métodos de ensino, mas sim como utilizá-los para levar de forma eficiente (poupando tempo e esforço) os conteúdos dos programas de ensino aos alunos. É importante saber que o conhecimento psico-pedagógico vai ser utilizado pelo professor para tratar a matéria de ensino prescrita nos programas de ensino, de modo que seja cientificamente correcto, duradouro e aplicável. Em termos práticos, para o trabalho eficiente de um professor de Química deve sempre: 1. Consultar diferentes literaturas (não é livro do aluno): para buscar conhecimentos científicos Correctos e Exactos sobre os diferentes conteúdos da 5 matéria de ensino. O ideal é que cada conteúdo seja identificado e consultado em três (3) diferentes fontes bibliográficas. 2. Identificar conceitos chaves de cada unidade e aula: para defini-los e estudar formas metodológicas de articulá-los. Caso um conceito seja tratado de forma repetitiva em diferentes classes “em forma de espiral” deve-se identificar os aspectos antigos e novos. 3. Estudar propostas metodológicas para tratamento do conteúdo da matéria de ensino: explorar melhores propostas para que o conteúdo do programa de ensino seja para o aluno Acessível “não difícil de entender e de articular com o conhecimento anterior”, Duradouro “que dure todo sempre, ano e se possível a vida inteira” e Aplicável “num contexto da sala de aula para obter nota ou fora da sala para resolver problemas práticos da vida”. 4. Estudar melhores instrumentos de avaliar o aluno: expor o aluno a diferentes formas de recolha de dados da avaliação onde se explora as diferentes facetas do aluno: testes, práticas, experiências, trabalho de pesquisa, actividades pedagógicas, etc. As diferentes formas de recolha de dados da avaliação têm que ter diferentes pesos e deverão ser utilizados para atribuição da nota final do aluno ao longo do semestre ou ano. NOTA: Caso estes quatro aspectos sirvam de guia para actividade docente, pode- se alcançar os objectivos Instrucionaise Educacionais de ensino e deste modo aumentar significativamente a qualidade de ensino de Química. 1.4. Natureza da Química como disciplina escolar Quando se pergunte a um professor de uma das disciplinas das Ciências Naturais ou Matemática o que lecciona é frequente dizer-se que a disciplina X, Y ou Z é difícil ou é “um bicho-de-sete-cabeças”. Tais avaliações derivam muita das vezes das dificuldades encaradas pela pessoa para assimilação dos conteúdos da disciplina – derivadas do modo de trabalho do professor, forma de estudo do aluno, natureza da própria disciplina ou pelos três aspectos atrás referidos em conjunto. 6 A natureza ou opinião de ciência que o professor possui sobre a ciência que forma base de estruturação da matéria da disciplina que lecciona afecta a forma como é leccionada a disciplina. Efectivamente, se o professor vê os conteúdos da matéria como: Verdades irrefutáveis (não podem ser desafiadas por alunos); Verdades transitórias (válidas porque existem elementos para os suportar); Correntes de opiniões nos circuitos científicos (paradigmas); ou Aquilo que as pessoas fazem para reflectir o mundo que os rodeia. Cada uma destas opiniões afecta o posicionamento do professor face à matéria de ensino (apresentada no programa de ensino) e o posicionamento do professor quando os alunos são expostos à matéria de ensino. 1.4.1. Diferentes teorias sobre a natureza do conhecimento científico Descrevem-se as seguintes teorias sobre o conhecimento científico: simples inductivismo, falsificanismo (Karl Popper), restauração de programas (Lakatos), mudança de paradigmas (Thomas Kuhn), teoria anarquista (Paul Feyerabends). Cada uma das teorias incorpora elementos que são usados consciente ou inconscientemente para julgar o conhecimento dos alunos, os conhecimentos apresentados nos programas de ensino e nos livros escolares. a) Teoria inductivismo Ciência como conhecimento comprovado. A ciência começa da observação que conduz a teoria. O critério da verdade sobre uma determinada afirmação é uma cuidadosa observação e experimentação determinando assim a objectividade da ciência. b) Teoria falsificanismo (Karl Popper) Ciência como conjunto de hipóteses propostas para explicar problemas associados com a natureza. Hipóteses falsificáveis são propostas pelos cientistas como soluções para os problemas encontrados. Cada hipótese é testada e criticada, eliminando as falsas e as verdadeiras tornam- se teorias ou leis. 7 A Ciência progride, deste modo, através da tentativa e do erro e através de conjunturas e refutação das hipóteses falsas. c) Teoria de restauração de programas (Lakatos) Ciência como um conjunto de teorias e regularidades organizadas e estruturadas. Os programas de pesquisa serão progressivos e degenerativos, dependendo da sua capacidade de liderar ou persistentemente falhar a descoberta científica ou descoberta de um novo fenómeno. Um cientista que faz parte de um determinado programa não pode opor-se às ideias do programa e deve defendê-lo dos ataques de paradigmas rivais. d) Teoria mudança de paradigmas (Thomas kuhn) A Ciência evolui como uma sucessão de revoluções, de rupturas, de alterações, mais ou menos rápidas e de substituições dos diferentes paradigmas. A ciência progride não através da falsificação de hipóteses, mas sim através de mudança de paradigma quando o novo substituir o antigo que se mostrou inconsistente em face de novas evidências. Kuhn identificou quatro (4) fases da ciência: pré-ciência, ciência normal (paradigma), crise e revolução e nova ciência (novo paradigma). Paradigmas rivais competem pela sua existência e somente as coerentes persistem. e) Teoria anarquista (Paul Feyerabends) Não existe tal coisa chamada “Método Científico”. Esta teoria está contra qualquer tentativa de definição do método científico para fazer ciência, pois todas as tentativas até aqui feitas falharam atribuir regras adequadas para guiar a actividade dos cientistas. A ideia básica de Feyerabends é de que a complexidade da história das ciências não pode ser resumida a pequenos procedimentos metodológicos para explicar ciência. Ciência é aquilo que os cientistas fazem e o que os cientistas fazem é reflectirem de forma cuidada o mundo que os rodeia. 8 1.4.2. Algumas ideias comuns sobre Ciência À luz das teorias abordadas anteriormente, resumem-se as seguintes ideias comuns: Ciência é conhecimento comprovado, bem estruturado e organizado; Diferentes teorias e leis da ciência são derivados de rigorosas observações de factos e realização de experiências para comprovar a veracidade de algumas hipóteses formuladas a partir do que podemos ver, provar, tocar, ouvir, etc. Portanto, opiniões pessoais, preferências ou especulações imaginativas não têm lugar na ciência, ela é objectiva, portanto o conhecimento científico é confiável por ser um conhecimento objectivo comprovado. 1.5. Situações típicas São os mesmos conteúdos com características específicas tratados com frequência no PEQ. Elas fornecem ao professor uma visão mais ampla sobre a matéria/conteúdos de Química e dão a oportunidade para a busca de metodologias adequadas para o tratamento dos conteúdos do Programa de Ensino de Química (PEQ). As situações típicas estão ligadas com o objecto de estudo da Química e com linhas gerais. 1.5.1. Relação entre linhas gerais e situações típicas As linhas gerais são conteúdos macros e as situações típicas são especificidades dos conteúdos (nível de abordagem de acordo com a classe e o tipo de ensino, se é técnico ou geral) para o ensino de Química. 1.5.2. Características das situações típicas Devem mostrar extensão e a limitação no tratamento do conteúdo; Devem dar uma visão dos conteúdos a abordar nas salas de aulas; Constituem a base para a formulação dos objectivos; Podem não ter uma fronteira rígida entre as situações típicas. 1.5.3. Situações típicas no ensino de Química 9 Diversos autores enfatizam a necessidade de estimular o aluno a pensar sobre a realidade, sobre o mundo a sua volta. Para que isso se torne uma virtude evidente, é necessário estimular e desenvolver cada vez mais o uso da razão e a capacidade de um raciocínio criterioso, o desenvolvimento do senso crítico. O pensamento está ligado à busca e produção do significado das coisas e factos, enquanto que o conhecimento é o processo de busca da verdade. Ser um bom investigador significa ter atitudes e procedimentos investigativos que proporcionem melhores respostas às indagações que se faz. Para tanto, é preciso saber observar bem, perguntar, elaborar hipóteses, argumentar bem, sustentar posições e rever posições quando isso se fizer necessário. As pessoas que sabem escutar os pontos de vista e argumentos alheios mostram que sabem ser dialógicas e, portanto, boas investigadoras. Pensar o que já se pensou em outro momento, ou pensar de novo o mesmo pensamento, significa tornar-se alguém reflexivo. Adquirir o hábito de retomar um pensamento, de rever nossos pontos de vista, é aprimorar o que já pensamos a respeito de algo em meio à sociedade imediatista em que vivemos. As pessoas que têm o hábito de reflectir sobre suas convicções evitam afirmações e atitudes impensadas. Ser pessoas críticas, isto é, que colocam em crise seus pensamentos pode fazer a diferença no momento de tomar uma decisão. Assim, os nossos pontos de vista podem ser trocados, avaliados e revistos, num processo dialógico que contribui a ser bons investigadores. É preciso aprender a ter pensamentos, e, por conseguinte, atitudes rigorosas. Isto significa ser sistemático, ordenar os pensamentos para não pô-los a perder devido à precipitação das nossas acções. Pensar com rigor não é ser rígido, fechado, é antes aceitar e cuidar das mediações que fazemos através de nossos pensamentos. Ser pessoas profundas, isto é, que passam da superfície na análise dos factos e situações. São as nossas análises que vão nos dar nossos pontos de vista.Se elas forem superficiais, seremos pessoas superficiais, artificiais. É preciso ir aos fundamentos, às raízes, realizar um pensamento radical para compreender qualquer coisa. 10 1.5.4. Relações entre Ciência, Tecnologia e Sociedade A Ciência só se ocupa dos factos e estes são objectivos, portanto, a Ciência nada tem a ver com os valores. A Ciência estuda o que as coisas são, e não como deveriam ser. Estas afirmações são bastante características da concepção herdada. O processo científico é indissociável do tecnológico. Ao falarmos de Ciência, nos referimos indirectamente à Tecnologia, e vice-versa. 1.5.4.1. Origens do movimento Ciência, Tecnologia e Sociedade O movimento Ciência, Tecnologia e Sociedade (CTS) apresenta duas origens distintas, uma chamada tradição americana e a outra, tradição europeia. A tradição europeia partiu, inicialmente para a institucionalização académica na Europa; atribuiu a ênfase aos factores sociais antecedentes; deu atenção primordial à ciência e, secundariamente, à tecnologia; assumiu um carácter teórico e descritivo; e o seu marco explicativo centrou-se nas ciências sociais - sociologia, psicologia, antropologia. A tradição americana, por sua vez, apresentou nas suas origens a institucionalização administrativa e académica nos Estados Unidos; sempre deu ênfase às consequências sociais da ciência e da tecnologia; ao contrário da tradição europeia, manteve a atenção voltada à tecnologia e, secundariamente, à ciência; destacando um carácter prático e valorativo; e o seu marco de avaliação se prende à ética, à teoria da educação, entre outras. Actualmente, os estudos CTS constituem uma diversidade de programas multidisciplinares, os quais, enfatizando a dimensão social da ciência e da tecnologia, compartilham de um núcleo semelhante, nomeadamente: A crítica à concepção herdada de ciência como uma actividade pura e neutra; O rechaço da concepção de tecnologia simplesmente como ciência aplicada e neutra; A promoção da participação pública na tomada de decisões. O movimento surgiu a partir da crítica aos modelos de gestão e políticas de Ciência e Tecnologia. Os campos de actuação do movimento CTS são bastante amplos e abrangem uma série de grupos da sociedade. 11 Podemos distinguir basicamente três grandes campos de actuação do movimento: a) O campo da investigação: compreendendo o meio académico, onde os estudos CTS têm promovido uma visão socialmente mais contextualizada da Ciência e da Tecnologia. Entendemos esse campo como sendo o movimento teórico. b) O campo das políticas públicas: os estudos CTS têm defendido a criação de diversos mecanismos democráticos que facilitem a participação pública em processos de tomada de decisões sobre questões relativas às políticas em C&T. Principalmente após a segunda guerra mundial, quando os avanços científicos e tecnológicos mal utilizados trouxeram consequências avassaladoras para a humanidade. Aqui, CTS é entendido como um movimento prático, que requer a participação da sociedade. c) O campo educacional: é onde podem se tornar mais reais as possibilidades do movimento CTS. O ensino de ciências na perspectiva da educação CTS, em qualquer nível de ensino, visa à alfabetização científica e tecnológica dos cidadãos promovendo uma percepção mais ampla da ciência e da tecnologia, a partir das actividades dirigidas para esse fim e o confronto com o contexto social em que estão inseridas. 1.5.4.2. O enfoque CTS na educação Apesar de esse movimento não ter sua origem no contexto educacional, as reflexões nessa área vêm aumentado significativamente, por entender que a escola é um espaço propício para que as mudanças comecem a acontecer. Têm emergido por todo o mundo diferentes pontos de vista sobre o papel da escola, mas é inquestionável que essa escola, o que nela se ensina e a maneira como se ensina, tem sofrido modificações. O ensino de ciências vem acompanhando essa tendência de atribuir novas responsabilidades à escola. Dessa maneira, precisa passar da concepção puramente internalista para uma educação científica orientada numa visão mais externalista e racionalista da ciência. A interdisciplinaridade é uma das características mais marcantes do ensino com enfoque CTS. Visto que, para compreender um problema real ou entender 12 situações abertas que envolvem C&T, os conhecimentos puramente científicos não são suficientes. Trabalhar de modo interdisciplinar requer um objectivo em comum. Neste caso, educar o jovem para que se torne mais conhecedor e actuante em questões sociais que envolvem Ciência e Tecnologia. Actualmente é possível encontrar diversas concepções de ensino fundamentadas no enfoque CTS. As propostas de ensino podem ter simplesmente a ideia de contemplar interacções entre Ciência-Tecnologia-Sociedade como factor de motivação no ensino de ciências ou, ir até o outro extremo, onde a compreensão das interacções CTS é o mais importante e não os conteúdos científicos em si, atribuindo um papel secundário a eles no processo de ensino-aprendizagem. Um dos aspectos principais de todas as propostas educacionais com enfoque CTS parece ser a organização do currículo a partir de conteúdos de ciência e tecnologia articulados em torno de problemas sociais relevantes, principalmente, se estes problemas afectarem a comunidade local dos estudantes. Entre as diferentes propostas para a educação CTS, vale distinguir três modos de implantação, a saber: 1. Enxertos CTS em disciplinas científicas e tecnológicas: neste modo se mantém a estrutura disciplinar clássica do currículo e vão se enxertando temas específicos CTS naqueles conteúdos estudados rotineiramente. 2. Enxertos de disciplinas CTS no currículo: também se mantém a estrutura geral do currículo, porém, abre-se espaço para a inclusão de uma nova disciplina CTS, com carga horária própria. 3. Replaneamento geral do currículo em torno de CTS: neste modo se refaz toda a estrutura disciplinar do currículo em função de temas e conteúdos CTS. Os conteúdos são organizados de modo não-disciplinar, mas em torno das temáticas CTS. Esses modos de implantação vêm ocorrendo em todo o mundo, alguns em graus mais avançados, outros não. A maioria no nível de ensino médio, mas também a nível superior existem iniciativas desse tipo. Nos casos CTS actuais o inconveniente da falta de motivação não existe, visto que as polémicas são actuais e até vivenciadas pelos alunos. Mas há outro porém: 13 as informações são muito abundantes e isso pode gerar dificuldades na focalização do tema que se quer estudar. Com o devido tratamento das informações esses casos podem ser bem aproveitados em sala de aula. 1.5.4.3. O enfoque CTS no ensino de Química O ensino de Química, como um fragmento do ensino das Ciências clássicas, ainda apresenta uma abordagem excessivamente disciplinar e de ciência pura, de forma que as aprendizagens que são geradas, quando o são, carecem de significação para os alunos. Uma possível solução para esse problema vem sendo encontrada na aproximação do ensino com a vida quotidiana. O enfoque CTS tem como marca a contextualização do ensino, embora não se reduza somente a isso. Ao promover o estudo de situações reais, extraindo conceitos científicos e utilizando-os para a compreensão da realidade e dos fenómenos, o ensino de Química com enfoque CTS motiva os alunos a estudarem a Ciência. No enfoque CTS além de estudar os fenómenos relacionados à ciência Química, os aspectos tecnológicos – que hoje são praticamente indissociáveis dos científicos – e sociais daquele conhecimento e da situação que lhe deu origem são levados em consideração. A disciplina Química deve contribuir, assim como todas as outras, para uma visão mais global do mundo e de como nos situamos nele. Certamente todos os conteúdos de Química explicam uma parcela do conhecimento químico que há no mundo, em níveis mais ou menos aprofundados. Mas falta aos alunos a habilidade de relacionar os conteúdos puramentecientíficos e técnicos àquilo que ele vê, ouve, observa. A solução para esse disparate está no estudo de conceitos a partir de uma situação real e no desenvolvimento de um pensamento criterioso e cuidadoso, próprios de um pensamento crítico. E é preciso ir mais além, porque não basta apenas saber a que se aplica aquele conhecimento, é preciso compreender todo o contexto da situação, portanto, implicações sociais, económicas, políticas, educacionais... Somente através de um trabalho assim, interdisciplinar, chegaremos a formar o jovem de acordo com as orientações oficiais. 14 O ensino de Química baseado somente nos conceitos científicos, sem o envolvimento de situações reais, torna a disciplina desmotivadora para o aluno. O enfoque CTS constitui-se numa ferramenta importante para o professor destacar a importância dos conceitos ensinados e construir com o aluno considerações mais amplas das aplicações e implicações de Ciência e Tecnologia em nossa sociedade. O enfoque CTS tem se utilizado de metodologias como casos simulados, fóruns de debate e estudo investigativo para desenvolver posturas admitidas como positivas em relação à Ciência, Tecnologia e Sociedade. No ensino de Química estas estratégias metodológicas podem ser tranquilamente utilizadas, visto que a ciência Química envolve muitas controvérsias e está intimamente ligada à assuntos comuns aos alunos.
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