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A justiça no Brasil Império

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DESCRIÇÃO
A Justiça no Império do Brasil, sua relação com a constituição da
Justiça no passado colonial, a ascensão do Império brasileiro e o
processo de consolidação de hierarquias sociais e justiça nacional.
PROPÓSITO
Compreender um período da história do Brasil a partir do Direito,
discutindo a construção das leis, de acordo com conjunturas políticas e
históricas específicas.
PREPARAÇÃO
Seria interessante ter em mãos o Dicionário do Brasil Joanino: 1808-
1821 e um Dicionário do Brasil Imperial. É possível encontrá-los online.
OBJETIVOS
MÓDULO 1
Reconhecer as origens da Justiça e as principais instituições
implementadas no Império, a partir da vinda da família real
MÓDULO 2
Reconhecer a construção das leis e da Constituição no Império e o
ideal de Justiça
MÓDULO 3
Identificar as características dos códigos penais do Império brasileiro
MÓDULO 4
Reconhecer a trajetória jurídica do fim da escravidão no Brasil
INTRODUÇÃO
O Império do Brasil foi formado a partir de uma herança portuguesa de
instituições. Grande parte dela chegou ao Brasil junto com a família
real, em 1808. Compreender a forma como se construíram as
instituições do Império, principalmente a Justiça, é fundamental para
entender a dinâmica da administração do Império e da sociedade
existente, principalmente em seu controle.
Um ponto importante é a principal característica do sistema político
implantado no Brasil a partir de 1822: a escravidão. Com a
escravização de homens e mulheres, a economia imperial
fundamentou-se, cresceu e entrou em crise. Ao mesmo tempo, a
Justiça tratou de organizar leis a fim de controlar uma população
escravizada, que constantemente se rebelava. Além disso, foi pela
Justiça que a escravidão começou a ser discutida, reduzindo-se sua
influência sobre a economia e a sociedade.
Discutiremos nos próximos quatro módulos diferentes aspectos da
Justiça do Império, desde a chegada da família real, que trouxe uma
bagagem institucional até então inédita nas Américas, a formação do
Império a partir da Constituição de 1824, os códigos criminais e a
identificação de crimes e punições. Por fim, conheceremos as leis que
mediaram o fim da escravidão no Brasil.
Com esse conteúdo será possível compreender a história do Império
brasileiro por meio das instituições e como elas também
fundamentaram a economia, a sociedade, a moralidade e a política.
MÓDULO 1
 Reconhecer as origens da Justiça e as principais instituições
implementadas no Império, a partir da vinda da família real
Assista ao vídeo com o professor Rodrigo Rainha sobre a vinda de D.
João VI para o Brasil.
CHEGADA DA FAMÍLIA REAL
A construção da Justiça no Brasil Império teve como base o passado
colonial e as leis portuguesas. No entanto, o período entre a chegada
da Corte ao Brasil e a Independência, cerca de 14 anos, pode ser visto
como uma transição, reconstrução e transformação de instituições,
saberes, hierarquias e justiça.
Fonte: Desconhecido / Wikimedia commons / Domínio público
 Embarque da Família Real Portuguesa, Brasil, século XIX.
A chegada da família real em 1808 impactou profundamente a
organização desse território que, mais tarde, seria o Império do Brasil.
 COMENTÁRIO
Em 1808, sob a ameaça de Napoleão Bonaparte e com o apoio dos
ingleses, a Corte portuguesa foi transferida de Lisboa para o Rio de
Janeiro, ocasionando importantes mudanças. As mais importantes
foram a abertura dos portos, que terminou com o “pacto colonial”
permitindo ao Brasil negociar livremente, não mais como uma colônia
exclusivamente com Portugal; e a elevação do Brasil à categoria de
Reino Unido. Ambas as medidas são representativas para entender por
que iniciamos em 1808 e não em 1822 a data oficial da formação do
Império.
É essencial pensar na Justiça do Império a partir de 1808 e as
mudanças proporcionadas pela Corte no que se refere à administração,
ordem e justiça, quando era preciso construir nas Américas um assento
jurídico e administrativo semelhante ao existente na metrópole, apesar
das peculiaridades coloniais ainda fortes e arraigadas ao território e à
sua população.
Assim, as mudanças operadas desde 1808, a fim de formar um novo
projeto administrativo colonial nas américas, não pode ser descartado
para a compreensão da Justiça, que teve início junto com o Império,
em 1822. Além disso, a chegada da Corte à colônia provocou a
“interiorização da metrópole”, de acordo com Maria Odila Leite da Silva
Dias, transformando a cidade do Rio de Janeiro no principal ambiente
de difusão de novos modos europeus, abrigando também instituições e
cargos públicos até então inexistentes. (LEITE apud VAINFAS; NEVES,
2008, p. 429).
A vinda da Corte afetou a continuidade do processo da colonização da
América portuguesa, uma vez que ocorreu a transposição de uma
estrutura social, cultural e política portuguesa, alterada com a
Independência, o Império e a Constituição em 1824. Os eventos de
1808 podem ser vistos como um tipo de ruptura política e institucional
que, entre vários efeitos, proporcionou a eliminação de alguns órgãos
administrativos, alteração de outros e manutenção da organização
judiciária de matriz europeia, herdada da experiência colonial.
A mudança, a priori, fez da cidade do Rio de Janeiro o novo centro de
poder, onde se instalaria uma estrutura administrativa que subordinaria
as demais províncias, ao mesmo tempo que ligaria, ou formaria, o
Império luso-brasileiro.
Fonte: Jacques Arago / Wikimedia commons
 Mapa da cidade do Rio de Janeiro, em 1820, então capital do Reino
de Portugal, com a transferência da Corte para o Brasil, Jacques Arago,
Arquivo Nacional.
 ATENÇÃO
Importante mencionar que o Rio de Janeiro era a sede da colônia
desde 1763, quando o Marquês de Pombal a transferiu de Salvador.
O desenrolar dos acontecimentos, com tratados, conflitos e tensões
entre os diferentes grupos sociais presentes na América portuguesa e a
Corte, culminou na ruptura definitiva entre Portugal e Brasil e a
formação do Império do Brasil.
Fonte: Filipe I de Portugal / Wikimedia commons / Domínio público
 Ordenações Filipinas, Filipe I de Portugal, 1603.
No entanto, ainda que tenham ocorrido alterações significativas a partir
de 1824, no que se refere à Justiça no Império (ano da promulgação da
Constituição), é preciso entender a estrutura inserida pela vinda da
Corte para pensar nas permanências e mudanças operadas a partir da
Independência.
Importante mencionar que as Ordenações Filipinas eram as leis que
regiam a colônia e a metrópole, vigentes em Portugal desde os tempos
da União Ibérica. Após a Independência e quando inexistia um código
criminal, era a partir delas que se julgavam os crimes cometidos no
Império.
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CONSTITUIÇÃO
Convocada pelo imperador D. Pedro I e com fortes influências do
pensamento iluminista Europeu, marcou uma importante tensão
nesse momento.
Desse modo, a organização jurídica da colônia era herdeira e derivava
da existente na metrópole. No entanto, na América portuguesa existiam
leis especiais, que, apesar de originárias em Portugal, tinham eficácia
apenas nos limites da colônia, diferentemente das leis gerais que eram
aplicadas à metrópole.
LEIS ESPECIAIS
Aplicadas apenas nos limites da colônia.

LEIS GERAIS
Aplicadas na metrópole.
 VOCÊ SABIA
Uma das características fundamentais da Coroa portuguesa era regrar
e difundir o regramento de suas colônias. Durante o período em que
Portugal administrou o Brasil, herdamos o código e, por sua
funcionalidade e difusão, foi mantido por todo o período colonial.
Ações empreendidas pelo Marquês de Pombal, secretário de Estado do
rei D. José, fizeram parte do processo de racionalização dos
mecanismos de controle das colônias.
Nesse período, Portugal aproximou-se do chamado despotismo
esclarecido, termo clássico e controverso, mas que explica que
Pombal tinha as funções de gerar uma engrenagem administrativa e
racional para manter o Impérioportuguês eficiente.
Fonte: Marquês de Pombal / Wikimedia commons / Domínio público
 Panfleto da época do Marquês de Pombal indicando o modo de
receber o pagamento por denúncias anônimas, 1771.
Foi Pombal quem organizou a estrutura de impostos, definiu
regimentos do funcionamento de áreas agrícolas e ainda atuou na
recuperação das cidades portuguesas após a tragédia do maremoto de
Lisboa.
Essas reformas ampliaram os cargos e a extensão do controle sobre as
regiões coloniais e dinamizou a administração colonial, permitindo
haver ascensão de diversos setores da economia e governança,
de acordo com Maria Fernanda Martins (2014, p. 690). Isso permite
entender as negociações e tensões existentes com a vinda da família
real a fim de manter hierarquias e privilégios, agora em terras coloniais.
Ainda de acordo com essa autora, a instalação da Corte portuguesa no
Brasil provocou uma singular e profunda alteração na estrutura
administrativa luso-brasileira (MARTINS, 2014, p. 694).
Entre essas alterações estavam a assinatura de inúmeros decretos,
concessão de alvarás, ordens régias a fim de que fosse possível, a
partir de 1808, a formação de uma estrutura política, econômica e
institucional que permitisse a existência da Corte. Essas ações
interferiram no aparato eclesiástico, militar, fiscal e econômico.
A partir dessas alterações será possível entender continuidades e
rupturas institucionais, principalmente relacionadas à Justiça no Império
do Brasil.
ORIGENS DA JUSTIÇA
BRASILEIRA
A respeito da Justiça, houve a criação de um conjunto de instituições
políticas e jurídico-administrativas, muitas já existentes em Portugal e
que espelhavam o espírito da monarquia. A estrutura do Judiciário
recebeu atenção especial, uma vez que antes de 1808 a estrutura era
genérica, como pouco ordenamento, existindo variedade de cargos que
se concentravam em esfera municipal, sem uma centralidade
organizativa.
Uma dessas instituições existentes na colônia eram os Tribunais de
Primeira Instância, o Tribunal da Relação na Bahia e o Tribunal da
Relação no Rio de Janeiro, por meio dos quais poderiam ocorrer
sobreposição de funções judiciais, administrativas e policiais, estando a
última instância na metrópole, em Lisboa.
A Relação da Bahia foi criada em 1609 para ser o local onde seria
interposto recurso, tendo para isso um promotor de justiça e mais 10
desembargadores.
A do Rio de Janeiro foi criada em 1751 e em 1808 transformou-se na
Casa da Suplicação do Brasil, julgando os recursos da Relação da
Bahia e tornando-se a última instância, ampliando sua estrutura e a
quantidade de desembargadores que teriam o mesmo alcance da Casa
de Suplicação de Lisboa.
ALARGAMENTO DO APARELHO
DE JUSTIÇA
Essa mudança foi resultado do processo de alargamento do aparelho
da Justiça na colônia após a chegada da família real, causando um
impacto futuro na forma como a justiça seria organizada no período
imperial. No entanto, esse alargamento passa também por um
processo de reaproveitamento das instituições existentes e de
adaptações, que estavam mais voltadas para criar uma jurisdição na
colônia, agora sede da Corte, do que a formação de aparelhos
independentes.
 EXEMPLO
A Casa da Suplicação instalada no Rio de Janeiro é um exemplo desse
tipo de instituição que, ao ser criada, deixara a colônia independente no
que se referia às ações da Justiça.
A mudança do Tribunal da Relação do Rio de Janeiro para a Casa da
Suplicação do Brasil ocorreu em 10 de maio de 1808, nos moldes do
que seria um Superior Tribunal de Justiça.
E qual foi o impacto dessa mudança?
Essa mudança fez com que, na colônia, houvesse a última instância da
Justiça, o que antes acontecia em Portugal, acelerando o fim dos
processos deste lado do Atlântico, já que não precisariam ser
mandados para Lisboa.
Apesar da criação da Casa da Suplicação, que tendia para a
racionalização da administração pública, o Tribunal da Relação da
Bahia permaneceu subordinado à Casa.
Outros tribunais foram criados depois disso:

1812
Tribunal da Relação de São Luís
1821
Tribunal da Relação de Pernambuco

No período Joanino, também ocorreu a ampliação do número de
comarcas e ouvidorias, aumentando, portanto, as nomeações para
novos cargos de fiscalização e justiça, entre eles os juízes de fora e os
que exerciam os cargos de escriturários, escrivães, amanuenses, entre
outros.
Houve também a instalação de novas juntas de justiça nas capitanias
do Rio Grande de São Pedro e Mato Grosso, reorganização da junta de
São Paulo e a recriação do cargo de juiz de sesmaria, responsável pela
delimitação e mediação das sesmarias (terrenos abandonados
pertencentes a Portugal e entregues para ocupação, primeiro no
território português e, depois, na colônia, o Brasil, que perdurou de
1530 até 1822).
Fonte: Jsobral / Wikimedia commons / CC BY-SA 3.0
 Intendência Geral de Polícia da Corte e do Estado do Brasil.
Além da mudança estratégica no que se refere à Justiça e suas
instâncias, a chegada da Corte promoveu também a criação de
instituições até então inexistentes. Uma delas foi a Intendência Geral
da Polícia da Corte e do Estado do Brasil. Tal órgão, criado em abril
de 1808, tinha como objetivo organizar as tropas na Corte, controlar a
ordem e administrar obras públicas.
A Intendência tinha funções que variavam entre uma ideia de governo
municipal, política ou força militar, além de funções administrativas.
Seguido à criação desse órgão, veio o cargo de Intendente Geral da
Polícia, importante para a construção de uma ideia de ordem.
O intendente era o responsável pela manutenção do que consideravam
ser a “urbanidade” e a “civilidade”, que também estavam relacionadas
às obras públicas e à repressão a ações violentas, ou o que se
consideravam ações culturais ligadas aos africanos e fortemente
reprimidas durante todo o Império.
A partir dos relatos daqueles que ocupavam o cargo, é possível
entender o funcionamento da polícia e o que se entendia por ordem e
justiça no Império.
CARACTERIZAÇÃO DA JUSTIÇA
NO IMPÉRIO
A Justiça militar também sofreu impacto com a chegada da família real.
Já em 1808, foi criado o Conselho Supremo Militar e de Justiça, que
representava a segunda instância da Justiça militar, tendo duas seções:
O CONSELHO DE JUSTIÇA (FUNÇÃO DE
TRIBUNAL MILITAR)
O CONSELHO MILITAR (RESPONSÁVEL
POR QUESTÕES BUROCRÁTICAS
No que se refere às finanças da nova Corte, em 1808, ocorreu a
criação da Real Junta do Comércio, Agricultura, Fábricas e Navegação,
com muitas competências. Entre elas, podemos enumerar:
Shutterstock.com
A responsabilidade das matrículas dos comerciantes, falências
comerciais, consulados.
Shutterstock.com
A emissão de pareceres sobre atividades relativas a comércio,
agricultura, navegação e fábrica, das atividades de importação e
exportação, dos consulados comerciais, das companhias de seguro.
Shutterstock.com
Supervisão das estradas, pontes e canais.
Ainda com sede na Corte e em 1808, ocorreu a criação do Real Erário,
que substituiria a Junta de Fazenda do Rio de Janeiro. O Erário tinha a
função de administração, arrecadação e distribuição.
Fonte: Governo Imperial de Portugal / Wikimedia commons / Domínio
público
 Nota de Portugal para 20.000 réis, Governo Imperial de Portugal,
1799.
Fonte: Arquivo Nacional / Wikimedia commons / Domínio público
 Primeira página do estatuto do Banco do Brasil, assinado por D.
João VI, 12 de outubro de 1808
O Conselho da Fazenda Real também foi criado na mesma ocasião e
seria responsável pelos negócios envolvendo os armazéns reais, a
exploração de minas e minérios e demais impostos e tributos.
Por fim, a fundação do Branco do Brasil, também em 1808, é de
extrema importância, uma vez que, por meio dele, seria possível
financiar os gastos do Estado, obter crédito para a instalação e
manutenção da Corte e assim continuou funcionando até 1829.
Outras instituições criadas de modo semelhante às existentes emPortugal foram a Mesa do Desembargo do Paço e a Mesa da
Consciência e Ordens, a partir de um decreto de abril de 1808. Essas
instituições tinham um caráter consultivo, encarregando-se a primeira
de questões de justiça e a segunda das eclesiásticas, ambas
demandando atenção do soberano. Confira os detalhes de cada uma
delas.
MESA DO DESEMBARGO DO PAÇO
Foi criada por D. João II em Portugal em um período de reforço do
poder real; no período joanino, seria a responsável pela confirmação
das concessões de sesmarias.
MESA DA CONSCIÊNCIA E ORDENS
Estava relacionada aos assuntos da expansão da religião cristã nas
áreas descobertas, sendo criada em meados do século XVI, prevendo
a organização religiosa do Império português.
Na Corte nas Américas, essas instituições mantiveram-se com
estruturas semelhantes às existentes, no que se refere aos funcionários
e hierarquias. Essas instituições foram extintas em 1828, com a criação
do Supremo Tribunal de Justiça.
Desse modo, percebe-se o quanto a transmigração da Corte em 1808
causou impacto na configuração política e administrativa da América
portuguesa que, em 1822, se tornaria independente. Após a separação
definitiva de Portugal, o legado da presença da Corte pôde ser sentido
na forma como se estruturaram as instituições do Império,
principalmente as da Justiça.
Sendo assim, é fundamental compreender os momentos anteriores ao
Império para que a dimensão da Justiça a ser construída nessa nova
forma administrativa, inaugurada em 1822, seja apreendida.
VERIFICANDO O APRENDIZADO
1. AS PRINCIPAIS INSTITUIÇÕES JURÍDICAS
IMPLEMENTADAS NO BRASIL NO PERÍODO JOANINO
SÃO:
I – A CASA DE SUPLICAÇÃO.
II – SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA.
III – TRIBUNAL DA RELAÇÃO.
A(S) INSTITUIÇÃO(ÕES) CORRETA(S) É/SÃO:
A) Apenas a I.
B) Apenas a II.
C) Apenas a III.
D) Apenas I e II.
E) Apenas II e III.
2. A CHEGADA DA FAMÍLIA REAL AO BRASIL PODE
SER DESCRITA COMO UM MOMENTO CRÍTICO PARA A
HISTÓRIA DO PAÍS E, POR CONSEQUÊNCIA, DA
NOSSA JUSTIÇA. A AFIRMATIVA QUE MELHOR
DESCREVE ESSA MUDANÇA É:
A) A chegada da Corte modifica a economia, uma vez que as
mercadorias aqui produzidas não são mais exportadas para Portugal,
gerando aumento do lucro e a necessidade da criação de uma Justiça
voltada a regular as finanças.
B) A transformação jurídica ocorre em diversos níveis, desde a
mudança do status de colônia para tornar-se sede do Império, até a
implantação de órgãos e burocracias que só existiam antes na
metrópole.
C) A Corte pouco muda o processo jurídico brasileiro mantendo as
Ordenações Filipinas como principal base jurídica da colônia, com
manutenção e tribunais de relação e um tribunal de suplicação na
capital.
D) A mudança jurídica mais significativa ocorre no campo militar, com a
criação do Conselho Supremo Militar e de Justiça, que passaria a
regular todo o Exército e decisões militares nacionais.
E) A Corte no Brasil significou a possibilidade de um fortalecimento da
Igreja e a multiplicação de tribunais do Santo Ofício, não separando a
religião da Casa Real Portuguesa.
GABARITO
1. As principais instituições jurídicas implementadas no Brasil no
período Joanino são:
I – A Casa de Suplicação.
II – Supremo Tribunal de Justiça.
III – Tribunal da Relação.
A(s) instituição(ões) correta(s) é/são:
A alternativa "A " está correta.
O Tribunal da Relação é uma estrutura colonial presente no Rio de
Janeiro e em Salvador, depois ampliado. Já o Superior Tribunal de
Justiça é fundado após o período Joanino, já na Independência do
Brasil. Os tribunais de Relação são uma estrutura transplantada com a
Corte e que será multiplicado no Brasil no período Joanino.
2. A chegada da família real ao Brasil pode ser descrita como um
momento crítico para a história do país e, por consequência, da
nossa Justiça. A afirmativa que melhor descreve essa mudança é:
A alternativa "B " está correta.
São diversos os processos que marcam a mudança da Justiça no
Brasil com a chegada da família real. No entanto, a ideia de que são
ímpares é o problema da maior parte das afirmativas. A letra B chama
atenção ao fenômeno central: a ideia de a colônia ter se tornado uma
metrópole abre um conjunto de exigência de mudanças jurídicas.
MÓDULO 2
 Reconhecer a construção das leis e da Constituição no Império
e o ideal de Justiça
Assista ao vídeo Entre o direito canônico e o secular.
CASAMENTO DE TRADIÇÕES
A construção do Império passava pela determinação das leis que o
regeriam. No entanto, a Constituição não foi feita imediatamente e dois
anos se passaram entre a Independência e a promulgação desse
conjunto de leis, que confirmou que a antiga colônia, agora Império,
seria uma monarquia constitucional.
Fonte: Domingos Sequeira / Wikimedia commons / Domínio público
 Alegoria à Constituição de 1822, Domingos Sequeira, Lisboa.
A duração do Império do Brasil, 67 anos, dois imperadores e alguns
regentes, tem como marca uma Constituição feita a reboque dos
interesses do povo e que não satisfez as necessidades institucionais
desse novo sistema de governo.
Neste módulo, trataremos de como a Justiça no Império foi construída,
consolidando-se como um ambiente hierarquizado e distinto,
dependendo das categorias jurídicas existentes no Império: livres e
escravizados.
Antes desse debate, porém, é necessário lembrar as tradições aqui
presentes.
De um lado, a tradição religiosa

De outro, a aristocracia local
Esse ponto é importante para a compreensão de nossos estudos.
Nossa legislação e organização da Justiça são influenciadas pelo
caráter moralizante, punitivo x penitente, em que a as condolências e o
perdão têm um caráter vinculado a princípios cristianizados.
A tradição da Justiça eclesiástica era muito consolidada, mesmo antes
da aristocrática. Fortalecia-se a partir da organização da Igreja em
Concílios, Regras e Súmulas, conhecido como direito canônico. Já
o direito aristocrático, fruto da burocratização do Estado Medieval e
consolidado nos Estados Modernos, organizava tradições legislativas
antigas — romana, bizantina, germânica, entre outras —, firmando
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bases na tradição e na reprodução social, visando manter a
estabilidade de seu quadro social. Uma das formas mais essenciais era
a punição, seja por prisão, multa, desterramento, que passa desde o
século XVII a ser uma fonte importante de funcionamento dos Estados.
Fonte: Jean-Baptiste Debret / Wikimedia commons / Domínio público
 Coroação do imperador Pedro I, Jean-Baptiste Debret, 1822.
No Brasil Imperial, esses debates se intensificaram com a chegada da
família real e a posterior consolidação da Independência do Brasil.
Passamos, agora, à construção da Justiça imperial.
CONCÍLIOS, REGRAS E
SÚMULAS
Instrumentos legislativos eclesiásticos que regularam a Igreja
durante a Idade Média. O primeiro refere-se a reuniões
deliberativas de cunho regional, raramente ocorrendo de modo
universal. Regras, regulamentos e regimentos destinam-se a
ordens ou grupos a fim de garantir cumprimentos e penas.
Súmulas advêm do bispado de Roma, depois papado, com regras
centralizadas e interpretativas. Para além dessas existem
dezenas de formas que consolidaram a tradição do direito
canônico.
JUSTIÇA DO PRIMEIRO
REINADO – CONSTITUIÇÃO
O termo “império” consolidava a união de dois reinos — vice-reino do
Brasil e do Grão-Pará, fora territórios incorporados. Daí a noção de um
império como reunião de reinos, mas a administração baseava-se nas
tradições da realeza portuguesa.
Por isso, tivemos dois reinados, na prática:
Fonte: John Simpson/ Wikimedia commons / Domínio público
D. PEDRO I
Fonte: Mathew Brady / Wikimedia commons / Domínio público
D. PEDRO II
Fonte: Almanaque Lusofonista / Wikimedia commons / Domínio público
 Capa do Projeto, Almanaque Lusofonista, 1823.
A primeira iniciativa para formar uma Constituição para o Império
recém-proclamado ocorreu em maio de 1823, quando formou-se a
Assembleia Constituinte. Durante sete mesesela funcionou e reuniu
magistrados, bacharéis, militares, religiosos, proprietários rurais, entre
outros. Divididos em dois partidos, português e brasileiro, evidenciavam
um tipo de diversidade existente entre a elite do Império.
Em setembro do mesmo ano, o projeto da Constituição foi apresentado
e entre suas principais características estavam o estabelecimento de
um limite ao poder do imperador e sua submissão ao Poder legislativo.
Outro ponto importante desse projeto eram os 32 artigos que
defendiam a extinção gradual da escravidão, artigos esses defendidos
por José Bonifácio.
Esses e outros pontos provocaram calorosas discussões, além de
tensão na Imprensa e nas ruas, principalmente no que se refere ao
espaço que os portugueses ocupariam no Império. Essas tensões e a
insatisfação do imperador levou-o a dissolver essa Assembleia
Constituinte sete meses depois da sua formação.
Nessa ocasião, foi criado o Conselho do Estado, composto por
conselheiros vitalícios e nomeados pelo imperador, que, somado a seis
ministros e quatro membros, foram os responsáveis pela elaboração de
uma Carta constitucional que duraria todo o Império.
A Constituição foi jurada pelo imperador no dia 25 de março de 1824.
Esse é um marco importante, considerado como uma ruptura dos
chamados modelos de “absolutismo monárquico”, ainda que tenha
mantido formas de exercício. Nesse texto, foram estabelecidas as
bases da estrutura política: forma de governo monárquica, hereditária e
constitucional.
Fonte: Arquivo Nacional / Wikimedia commons
 Juramento de Pedro I à Constituição do Império, Documento sob
guarda do Arquivo Nacional, 1824.
Além disso, o Império teria uma divisão político-administrativa em
províncias e respeitaria a divisão do poder político em quatro níveis:
PODER EXECUTIVO
Exercido pelo imperador e pelos ministros
PODER LEGISLATIVO
Exercido por senadores, deputados gerais e provinciais
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PODER JUDICIÁRIO
Comandado por juízes e tribunais
PODER MODERADOR
Exercido também pelo imperador
Essa Carta constitucional também estabeleceu o catolicismo como
religião oficial e não proibiu o exercício privado de outras religiões. A
Constituição considerou como brasileiros todos os portugueses que
permaneceram no país após a Independência e que tivessem aderido à
causa.
A Constituição não foi direta no que se refere à escravidão, não há
artigo que estabelecesse esse regime, apenas menções indiretas a ela
quando tratou da cidadania.
Ficou estabelecido no sexto artigo da Constituição que eram cidadãos
os que haviam nascido no Brasil e fossem ingênuos ou libertos. Desse
modo, foi indicada a existência de não livres, ou seja, aqueles que não
seriam considerados cidadãos.
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Fonte: Jean-Baptiste Debret / Wikimedia commons / Domínio público
 Uma família brasileira do século XIX sendo servida por escravos,
Jean-Baptiste Debret, 1830.
Outra questão referente aos escravos estava presente no artigo que
determinou quem poderia ser eleitor. Nesse caso, nem se fossem
libertos com renda, os ex-escravos poderiam votar, uma vez que a
Constituição estabeleceu limites para o exercício da cidadania baseada
em renda.
A Carta constitucional associou a cidadania aos nacionais e à
liberdade, deixando em um limbo jurídico os libertos africanos, que
também não eram vistos como estrangeiros.
No título IV, artigo 151 da Carta constitucional, foi estabelecida a
independência do Poder Judiciário e a função de seus membros.
É importante destacar que a formação desse poder se adequou aos
traços de uma antiga tradição, apesar de ter estabelecido mudanças
em relação ao passado colonial.
Uma dessas mudanças foi a necessidade de novos códigos, presente
nesse artigo da Constituição, sendo tal procedimento essencial para a
organização da Justiça imperial, estando prevista a criação do
Supremo Tribunal de Justiça, que seria composto por juízes das
Relações em função de sua antiguidade.
Somado aos novos códigos ocorreu também a criação de novas
instituições. Uma delas foram as Juntas de Justiça Militar, em 1827,
nas províncias do Norte. A Justiça militar pode ser vista como um foro
híbrido que juntou dois universos: o militar e o jurídico.
Sua organização era feita em torno dos conselhos de disciplina, os de
guerra e o supremo militar e da justiça, sendo a comissão militar uma
instituição de exceção. Em 1841, ocorreu a criação dos conselhos de
inquirição, mais uma instituição vinculada à Justiça militar a fim de
criar mecanismos de controle sobre a oficialidade, organizando os
quadros dos oficiais do Exército e da Marinha.
 ATENÇÃO
É preciso ressaltar que, apesar do período Joanino ter deixado algum
tipo de experiência administrativa para o que se tornaria o Império, de
fato a estrutura do Brasil Imperial foi construída como forma de se
modernizar, tendo um campo jurídico baseado em lógica. Além disso,
foi pela Assembleia Geral, composta pela Câmara dos Deputados e
pelo Senado, que as leis do Império se formaram. Desse modo, pensar
a estrutura jurídica do Império é também pensar essa Assembleia que o
modernizou por meio de leis e outras estratégias.
ABDICAÇÃO E JUSTIÇA NA
REGÊNCIA
No ano da abdicação do Imperador D. Pedro I, 1831, a Assembleia
Geral não estava em funcionamento e, portanto, nenhuma lei foi
promulgada nesse ano. Por outro lado, no período regencial, iniciado
com a abdicação, a Câmara dos Deputados e o Senado tiveram papel
crucial na administração, promulgando em média 102 leis por ano, de
acordo com Luiz Fernando Saraiva.
Fonte: Aurélio de Figueiredo / Wikimedia commons / Domínio público
 Abdicação de Dom Pedro I do Brasil, Aurélio de Figueiredo, 1911.
Ainda segundo esse autor, até 1833 não havia numeração nas leis.
Entre os anos de 1833 e 1839, as leis eram numeradas a cada ano e
zeradas para o ano seguinte. Apenas em 1840 que a numeração se
tornou contínua. (SARAIVA, 2011)
Uma primeira grande reforma judiciária ocorreu em outubro de 1827 ao
ser criado o juiz de paz na área paroquial, que seria eleito junto com os
vereadores e pelo mesmo período.
E quem era esse juiz?
Esse juiz era um magistrado leigo, sem formação específica, sem
remuneração e exercia funções administrativas, de polícia e de justiça.
A população elegia esse juiz que atuava nas paróquias com a função
de julgar casos variados, desde a destruição de quilombos até prender
homens bêbados que circulavam pelas ruas.
Fonte: Desconhecido / Wikimedia commons / Domínio público
 O "Palácio do Conde dos Arcos", no Rio de Janeiro, primeira sede
do Senado do Brasil, século XIX.
Em janeiro de 1829, por meio da lei de 18 de setembro de 1828,
ocorreu a instalação do Supremo Tribunal do Império do Brasil, com
17 juízes letrados. Primeiramente, funcionou de forma improvisada, em
uma sala do Senado da Câmara da Corte e, depois, ocupou a antiga
instalação da Mesa de Consciência e Ordem, localizada no Largo da
Carioca.
Entre as funções do Supremo estavam:
A manutenção da unidade monárquica.
Ligar as partes políticas do império.
Manter a unidade da legislação.
Servir de centro do poder judiciário, segundo as palavras de seu
presidente, José Albano Fragoso.
Com a criação do Supremo, foram extintas as mesas do Desembargo
do Paço e da Consciência e Ordem, sendo mais um momento de novos
ajustes na administração pública para a consolidação do Império, que
seria feito pela construção de leis e instituições próprias.
A abdicação do imperador ocorreu diante de uma crise política no
Império, combinada com a morte de seu pai em Portugal, o Rei D. João
VI. O trono português vago era um direito de Pedro I, que enviou sua
filha para assumir. O que é negado pelo irmão, que se via no direito de
assumir o trono. Diante de crises e ameaças, D. Pedro retornou e
assumiu o trono português, tornando-se o rei Pedro IV de Portugal e
Algarves.
Ao abdicar em abril de 1831, o imperador deixou seu filho de apenascinco anos como herdeiro do trono, fazendo jus ao que estava
estabelecido na Constituição, de que o Império seria uma monarquia
hereditária. No entanto, por causa da pouca idade, a abdicação deu
início ao período regencial, que terminou apenas em 1840, quando D.
Pedro II, então com 15 anos, assumiu o trono.
Fonte: François-René Moreaux / Wikimedia commons / Domínio público
 A coroação de Pedro II aos 15 anos de idade em 18 de julho de
1841, por François-René Moreaux, no Museu Imperial.
Durante o período regencial permanecia a construção de instituições
que durariam todo o Império. Uma delas foi a Guarda Nacional, criada
em agosto de 1831, que se inseria entre as medidas
descentralizadoras que ocorreram após a saída de D. Pedro I.
E como era formada a Guarda Nacional?
VERIFICAR
A Guarda Nacional era formada por um corpo de “cidadãos”, e
expressava, no plano simbólico, “a ordenação elitista da nação que se
pretendia forjar” (VAINFAS, 2002, p. 319), podendo exercer funções
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policiais caso fosse preciso. Mantinha os critérios de fortuna e cor que
hierarquizavam os cidadãos, já previstos na Constituição.
Foi no período regencial que ocorreram duas modificações no texto
constitucional, as únicas de todo o Império:
EM 1834, COM O ATO ADICIONAL
EM 1840, COM A LEI DE
INTERPRETAÇÃO DO ATO ADICIONAL
O ato adicional ocorreu pela Lei nº 16, de 12 de agosto de 1834; as
alterações foram aprovadas pela Câmara dos Deputados e visavam a
promover descentralização.
Por meio desse ato, o poder central foi esvaziado e os conselhos gerais
das províncias foram transformados em assembleias provinciais, tendo
autonomia para legislar sobre a divisão civil, judiciária e eclesiástica.
Tal reforma foi vista por alguns autores como fazendo parte de um
processo de descentralização iniciado partir da década de 1830.
Apesar da pretensa autonomia, o representante do executivo no âmbito
provincial permaneceu sendo indicação do poder central.
 ATENÇÃO
Outro ponto importante de mudança vindo por meio dessa lei, foi a
transformação do Rio de Janeiro, sede da Corte, em município neutro.
A Regência Una, eletiva e temporária (renovável a cada quatro anos)
também foi estabelecida por essa lei, que também suspendeu o
Conselho de Estado.
De acordo com Magali Engel, o ato foi:
[...] O ÚLTIMO ESFORÇO DOS
MODERADOS NO SENTIDO DE
IMPLEMENTAR O PROJETO POLÍTICO
DOS QUE ASCENDERAM AO PODER EM
ABRIL DE 1831.
(ENGEl apud VAINFAS, 2002, p. 319)
Em 1840, ocorreu a lei de interpretação do ato adicional, quando
alguns poderes foram retirados das assembleias provinciais.
O Conselho de Estado foi restituído em 23 de dezembro de 1841, por
meio da Lei nº 234, tendo as mesmas competências previstas na
Constituição. Após essa restauração, o Conselho passou a ser
ocupado por 24 membros, sendo 12 conselhos ordinários e 12
extraordinários, mais os advogados do Conselho e o Imperador.
Esse órgão se reunia sempre em caso de grandes decisões, não
sendo, porém, o imperador obrigado a seguir suas recomendações.
Ainda assim, muitas leis foram redigidas no Conselho, como a Lei de
Terras e a do Ventre livre. O Conselho foi extinto junto com o Império.
INSTITUCIONALIZAÇÃO DA
ADVOCACIA NO BRASIL
Assista ao vídeo A institucionalização da advocacia no Brasil.
A construção da Justiça passou também pela institucionalização da
profissão dos advogados, que foi iniciada em 1843 com a fundação do
Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB). Essa instituição era um ponto
de intercâmbio entre os estudos relacionados ao direito e ao
funcionamento da justiça no Império. O instituto reforçou o caráter
elitista e aristocrático de seus membros, organizando cerimônias que
contavam com a presença do imperador.
Uma das funções do instituto era manter o monopólio da perícia
profissional com exigência de diplomas universitários para que
houvesse reconhecimento do profissional e validasse seu exercício.
Essa era uma maneira de acabar com uma tradição do período colonial
de rábulas ou daqueles que recebiam autorização do governo para
advogar. No entanto, temos um grande exemplo de como essa
exigência não funcionava a todo momento.
RÁBULAS
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Aqueles que atuavam como advogados por autorização, sem
nenhuma formação – que já existia fora do Brasil –, por valor de
articulação nacional. O termo torna-se pejorativo para advogados
que falam sem o devido conhecimento ou “falastrões”.
Fonte: Arquivo Nacional do Brasil / Flickr / Domínio público
 Luís Gama (1830-1882), herói abolicionista brasileiro, 1880.
Luís Gama (um dos maiores nomes do direito brasileiro) foi um dos que
exerceu a profissão sem ter o diploma, sendo reconhecido advogado
anos depois, como homenagem póstuma. De todo modo, logo no
Segundo Reinado percebia-se a necessidade da regulamentação da
profissão, que teria marcas aristocráticas, uma vez que o acesso a
curso superior ainda era restrito às elites.
A respeito da economia no Império, sua regulação começou com a
criação do Código Comercial do Império, previsto desde a Constituição,
mas efetivado apenas em 25 de junho de 1850, com a Lei nº 556. Esse
código tratou da administração da Justiça nas questões comerciais do
Império. Extinguiu a Junta de Comércio, Agricultura, Fábricas e
Navegações. O código tratava do comércio em geral, do comércio
marítimo e das falências. O tribunal de comércio do Império começou a
funcionar em 1851, no Rio de Janeiro.
O Império do Brasil durou 67 anos e baseou-se em leis. Apesar da
monarquia e dos imperadores, suas ações estavam embasadas em leis
que foram constantemente discutidas e aprovadas por assembleias,
mesmo que nem sempre atendessem aos interesses da maioria da
população.
De qualquer forma, havia a legitimidade baseada nessas leis para
inúmeras ações, entre elas a repressão a revoltas e outras insurreições
que pudessem colocar em risco a soberania do imperador ou a
estabilidade do sistema político e econômico, este último baseado na
escravidão.
VERIFICANDO O APRENDIZADO
1. (ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DE SÃO
PAULO - DIVERSOS CARGOS – 2010) NO RELATÓRIO
QUE O MINISTRO DO IMPÉRIO JOSÉ INÁCIO BORGES
SUBMETEU À APRECIAÇÃO DA ASSEMBLEIA GERAL
LEGISLATIVA, EM 1836, REFERIU-SE ÀS
ASSEMBLEIAS PROVINCIAIS NOS SEGUINTES
TERMOS:
“COM QUANTO ESTES CORPOS DELIBERANTES
TENHÃO PREENCHIDO A EXPECTAÇÃO DA NAÇÃO,
PELO QUE RESPEITA A PROVIDENCIAS, E REMEDIOS
LOCAES, QUE NEM A ASSEMBLÉA GERAL, NEM O
GOVERNO CENTRAL PODERIÃO ACAUTELAR, COM
TUDO ALGUMAS TEM EXORBITADO DAS RAIAS QUE
LHES MARCOU O ACTO ADDICIONAL DAS REFORMAS
À CONSTITUIÇÃO, LEGISLANDO SOBRE MATERIAS,
QUE AQUELLE ACTO NÃO LHES CONFIOU.”
A OBSERVAÇÃO ALUDE:
A) Às restrições que o Ato Adicional impôs à Assembleia Provincial, ao
reduzir as competências que a Constituição de 1824 havia atribuído ao
Conselho Geral da Província.
B) Ao grau de autonomia que as câmaras municipais das vilas da
Província de São Paulo passaram a ter, a partir de 1834, para formular
e aprovar suas leis e posturas.
C) Ao fato de se ter ampliado a área de atuação do Conselho Geral da
Província, criado pela Constituição de 1824 e substituído, em 1834,
pela Assembleia Provincial.
D) Às mudanças que o Ato Adicional provocou no Poder Judiciário, ao
colocar os magistrados sob a dependência do chefe do governo
provincial.
E) À instituição do Poder Moderador, responsável pela manutenção do
equilíbrio e da harmonia entre os poderes políticos.
2. ENTRE AS PRINCIPAIS MEDIDAS DOS PERÍODOS
DE INSTITUCIONALIZAÇÃO DA JUSTIÇA IMPERIAL NO
BRASIL PODEMOS DESTACAR COMO REFERENCIAIS
OS SEGUINTES EVENTOS:
I – A CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA, JURADA PELO
IMPERADOR, E QUE DEMONSTRA A VINCULAÇÃO
INSTITUCIONAL AOS MOVIMENTOS DO SÉCULO XIX.
II – A INSTITUCIONALIZAÇÃO DA PROFISSÃO DE
ADVOGADO COM A CRIAÇÃO DE ÓRGÃO ESPECÍFICO
PARA SUA REGULAÇÃO E ORGANIZAÇÃO (IAB).
III – A CRIAÇÃO DO CONSELHO LAICO DE JUSTIÇA
COMO FORMA DE COMBATE À INFLUÊNCIA DO
DIREITO CANÔNICO.
ESTÃO CORRETAS:
A) Apenasa I e II.
B) Apenas II e III.
C) Apenas I e III.
D) As afirmativas I, II e III estão corretas.
E) Apenas a afirmativa III é correta.
GABARITO
1. (Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo - Diversos
Cargos – 2010) No relatório que o ministro do Império José Inácio
Borges submeteu à apreciação da Assembleia Geral Legislativa,
em 1836, referiu-se às assembleias provinciais nos seguintes
termos:
“Com quanto estes Corpos deliberantes tenhão preenchido a
expectação da Nação, pelo que respeita a providencias, e
remedios locaes, que nem a Assembléa geral, nem o Governo
central poderião acautelar, com tudo algumas tem exorbitado das
raias que lhes marcou o Acto Addicional das reformas à
Constituição, legislando sobre materias, que aquelle Acto não lhes
confiou.”
A observação alude:
A alternativa "C " está correta.
O Ato adicional foi a primeira mudança na Constituição, sendo
importante para a descentralização do poder central por meio das
assembleias provinciais.
2. Entre as principais medidas dos períodos de institucionalização
da justiça imperial no Brasil podemos destacar como referenciais
os seguintes eventos:
I – A Constituição brasileira, jurada pelo imperador, e que
demonstra a vinculação institucional aos movimentos do século
XIX.
II – A institucionalização da profissão de advogado com a criação
de órgão específico para sua regulação e organização (IAB).
III – A criação do Conselho Laico De Justiça como forma de
combate à influência do direito canônico.
Estão corretas:
A alternativa "A " está correta.
A Constituição e a institucionalização da profissão de advogado foram
passos importantes da justiça brasileira, a primeira no período do
Primeiro Reinado e a segunda no período regencial. Já a tensão entre
aspectos laicos e canônicos existiam anteriormente e não deixa de
estar presente em nosso quadro jurídico neste momento.
MÓDULO 3
 Identificar as características dos códigos penais do Império
brasileiro
Assista ao vídeo A Pena de Morte no Brasil Imperial.
CÓDIGOS CRIMINAIS DO
IMPÉRIO
Se a Constituição de 1824, por um lado, determinou as bases do
governo e de seu sistema político, por outro, esse código não
conseguiu dar conta das especificidades da Justiça criminal. Nesse
caso, até a formação de novos códigos, essa Justiça foi baseada no
Livro V das Ordenações Filipinas. As discussões sobre o Código
Criminal iniciaram-se no segundo semestre de 1830, sendo aprovado
pela Câmara dos Deputados em 23 de outubro do mesmo ano e no
Senado em final de novembro.
Um dos autores foi Bernardo Pereira de Vasconcelos, sendo o
Código um exemplo do aprendizado das ideias iluministas ensinadas
em Coimbra.
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Fonte: Assembleia Geral do Império do Brasil / Wikimedia commons /
Domínio público
 Código Criminal do Império do Brasil, Rio de Janeiro, 1830.
BERNARDO PEREIRA DE
VASCONCELOS
Fonte: Sébastien Auguste Sisson / Wikimedia commons / Domínio
público
 Bernardo Pereira de Vasconcelos, Sébastien Auguste Sisson,
1999.
Pereira de Vasconcelos nasceu em Ouro Preto, Minas Gerais, em
1795. Em 1812, ingressou na Universidade de Coimbra onde
seguiu a carreira jurídica, formando-se em 1819. Retornou ao
Brasil em 1820, e foi nomeado juiz de fora em Guaratinguetá, São
Paulo, e, em 1825 desembargador da Relação do Maranhão,
cargo que não chegou a ocupar. Participou do governo regencial,
como secretário de Estado dos Negócios da Fazenda (1831).
Reeleito deputado geral (1834-1837), apresentou os projetos do
Código Criminal do Império do Brasil (1830) e do Ato Adicional
(1834), que alterou a Constituição de 1824.
Foi reconduzido à pasta do Império em 1840, onde permaneceu
por algumas horas, na tentativa de impedir a maioridade de D.
Pedro. Com o golpe da maioridade afastou-se do governo, mas
manteve sua atuação política no Senado e no Conselho de
Estado. Líder dos regressistas, foram de sua autoria a Lei de
Interpretação do Ato Adicional (1840) e o restabelecimento do
Conselho de Estado (1841). Criou, à frente da pasta do Império, o
Colégio de Pedro II (1838), trabalhou na reforma do Código de
Processo Criminal (1842) e contribuiu na elaboração do Código
Comercial (1850).
É importante destacar que, a partir desses códigos, foram
estabelecidos os tipos de crimes e punições, ressaltando também a
hierarquia existente na sociedade do Império, em que a escravidão
predominava. De todo modo, por meio desses códigos acreditava-se
que o Império poderia escapar de revoltas, insurreições e, caso
ocorressem, os envolvidos seriam punidos exemplarmente.
Entre as modificações que foram promovidas pelo Código Criminal
estavam as penalidades em caso de crimes. Desde o período colonial,
existia a pena do degredo, sendo até mesmo o Brasil o destino para
quem era penalizado em Portugal. Com o Código Criminal, essa pena
foi substituída por outras, mais modernas e civilizadas. Em vez de
receber essa penalidade, o culpado teria que cumprir a pena de prisão
com trabalho; isso fazia com que esses “indesejáveis” tivessem
utilidade, servindo como mão de obra gratuita para serviços públicos.
No entanto, nem todos teriam a mesma penalidade, uma vez que a
graduação das penas era de acordo com o caso, sendo o julgamento
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do juiz feito de forma individualizada. Portanto, possivelmente as
hierarquias presentes na sociedade determinariam a forma como
alguns crimes seriam punidos.
PENA DO DEGREDO
Ocorria quando o sujeito era obrigado a abandonar a estrutura da
colônia ou da metrópole em que estava situado. O sujeito era
transferido com bens e indenizações para outro local, perdendo
direito às terras de origem.
 EXEMPLO
Os castigos corporais, presentes nas Ordenações Filipinas.
No novo código criminal, os açoites tornaram-se penas exclusivas de
escravos, em caso de participação em insurreições. Crimes de lesa-
majestade ou traições ao governo monárquico, eram forjados a partir
de dinâmicas antigas de tradições de quebra de juramento aos
senhores e, por isso, foram comumente utilizadas como forma de
execução pública.
Fonte: Jean-Baptiste Debret / Wikimedia commons / Domínio público
 Castigo de escravo, Jean-Baptiste Debret, entre 1768 e 1848.
 COMENTÁRIO
Os castigos físicos, muitas vezes, são apresentados equivocadamente
em livros didáticos como para os negros. É falso, porque pelourinhos e
outros instrumentos de tortura eram utilizados em praças públicas para
diversas populações. Tinham efeito simbólico e de reafirmação de
poder, como a manutenção de cabeças em portões de entrada nas
cidades, execuções públicas de carrasco e forca, com os corpos
deixados à vista como exemplo.
No entanto, em caso de líder da insurreição a pena seria a maior, a de
morte. Por outro lado, em caso de rebelião feita por não escravos, a
pena seria mais leve; a mais dura era a prisão perpétua com trabalhos
forçados. Dessa forma, rebelar-se ou insurgir-se dependia da condição
jurídica:
ESCRAVO
Para o escravo, qualquer movimentação poderia ser vista como
insurreição, recebendo penas específicas diante de sua condição de
escravizado.

NÃO ESCRAVO
Outros sujeitos, por sua vez, ao se rebelarem, poderiam escapar da
morte e dos castigos corporais, simplesmente por não serem escravos,
mesmo se promovessem uma grande revolta.
A hierarquia colonial acaba deixando esses castigos mais marcados
pela afirmação étnica.
Um ponto importante sobre o Código diz respeito à religiosidade. Ao
mesmo tempo em que a Constituição não condenava o exercício de
outras religiões, desde que fosse no âmbito privado, o Código também
não previa crimes de ordem religiosa, diferentemente da legislação
portuguesa, baseada nas Ordenações Filipinas. Nesse caso, caberia à
Igreja legislar sobre seus dogmas. No entanto, o Código possui uma
moralidade que passa pela ideia religiosa cristã de bons costumes e
manutenção da ordem.
Fonte: Desconhecido / Wikimedia commons / Domínio público
 O prédio da Cadeia Velha, Rio deJaneiro, cerca de 1880.
As penas modernas e previstas no Código Criminal do Império
contaram, a partir de 1850, na Corte, com a Casa de Correção,
inaugurada nesse ano, seguindo um modelo prisional com edifício e
facilitando a aplicação da pena de prisão com trabalho. A prisão no
Império seguia um modelo europeu e visava ser um instrumento de
combate ao crime, à vadiagem e à mendicância.
No entanto, a pena de prisão com trabalho era aplicada em um país
onde a escravidão ainda era vigente e forte como uma política
econômica e social.
As reiteradas condenações ao trabalho associavam-no a uma
penalidade e não a uma ação que deveria estar no cotidiano. Ou seja,
trabalho braçal era feito por escravizados ou criminosos no Império do
Brasil. As relações históricas com o trabalho e o entendimento do
trabalho braçal como algo inferior faz parte da construção da cultura
brasileira.
CÓDIGO DO PROCESSO
CRIMINAL
A aprovação do Código do Processo Criminal deveria ter ocorrido no
ano seguinte ao do Código Criminal.
No entanto, diante das turbulências desse ano geradas pela crise
política, que levou à abdicação do Primeiro Imperador, apenas em
novembro de 1832 foi aprovado o Código de Processo Criminal,
trazendo uma profunda reforma na administração judicial, que regulou
a parte da administração da Justiça Civil, tornando os promotores
públicos responsáveis por ela.
Em linhas gerais, esse novo instrumento extinguiu os cargos de
ouvidores, juízes de fora e ordinários.
Fonte: Araújo Filgueiras Junior / Wikimedia commons / Domínio público
 Código do Processo Criminal de 1832, em edição de Araújo
Filgueiras Junior.
Esse código foi dividido em duas partes. Confira abaixo:
PRIMEIRA PARTE
A primeira, com o título Da organização judiciária, em seus capítulos,
tem a criação do escrivão, dos inspetores de quarteirões e de oficiais
de justiça; o Capítulo 2 trata da administração da Justiça Criminal, em
que se estabeleceram as competências dos poderes policiais, que
teriam o monopólio da vigilância do cotidiano.
Também foi determinado que cada distrito teria um juiz de paz eleito,
um escrivão, inspetores e oficiais de justiça nomeados pelas câmaras
municipais.
Esse código também ampliou os poderes do juiz de paz, que poderia
interrogar, solicitar corpo de delito, emitir denúncias, sentenciar e
inocentar. Um ponto importante desse capítulo foi a criação do “termo
de bem viver”, documento que serviu para coagir a liberdade e
criminalizar a vadiagem.
No código, estabeleceu-se que os juízes de paz tinham competência
para obrigar vadios, mendigos, bêbados e prostitutas, entre outros
tipos, a assinarem o termo de bem viver. Nessa parte do Código, há
também esclarecimento sobre os “inspetores de quarteirões”, que
seriam nomeados pela Câmara Municipal, estando cada rua submetida
à autoridade de um inspetor, vigilante na prevenção a crimes, que
pareciam ser atribuições dos pobres.
O inspetor deveria fazer relatórios mensais sobre os suspeitos ou
presos e seus dados, indo essas informações para o juiz de paz, para o
Ministério do Estado dos Negócios da Justiça, que poderia ser
acessado pelo imperador.
SEGUNDA PARTE
A segunda parte do código é chamada de Da forma do processo, com a
regulamentação burocrática do sistema judicial a respeito de
audiências, provas, formas de pagar um crime. Com o código de
processo criminal foram extintas as Ouvidorias de Comarca, os juízes
de fora e ordinários e a jurisdição criminal de outras autoridades.
O aparelho judiciário ficou dividido nas províncias entre os Distritos de
Paz, Termos e Comarcas, e cada comarca teria juízes de órfãos, juízes
municipais, promotores públicos e um juiz de direito, nomeados pelo
imperador.
Para a administração das cidades mais populosas foi criado o cargo de
chefe de polícia, em substituição ao de intendente de polícia, e a
ampliação da atuação dos juízes de paz. No ano seguinte, foram
criados os guardas policiais nos distritos dos juízes de paz (VAINFAS,
2002, p. 584).
Menos de 10 anos de sua promulgação, em 3 de dezembro de 1841,
ocorreu uma reforma no código (projeto de Bernardo Pereira de
Vasconcelos), com a retirada de poderes dos juízes de paz, atribuindo
aos delegados e subdelegados de polícia mais poderes, que por sua
vez estavam submetidos ao chefe de polícia da província, nomeado e
subordinado ao Ministério da Justiça (virada centralizadora).
Uma das marcas mais importantes do longo processo de
Independência é a organização de uma burocracia estatal, nos moldes
das tradições nobiliárquicas portuguesas, e que criam postos, funções,
ministérios e instituem a afirmação de uma burocracia aristocrática que
domina o jovem Estado brasileiro.
Essa reforma fez com que a Justiça se reorganizasse em torno da
magistratura profissional remunerada. Ela também confirmou o
princípio da autoridade policial perante os outros poderes,
especialmente o de juiz de paz. Nessa reforma, foram extintas as
juntas de paz e o júri de acusação, tendo os juízes de direito poderes
ampliados.
Os juízes de paz eleitos tiveram suas atribuições transferidas para os
juízes municipais e chefes de polícia, tendo estes últimos ampliado
suas funções judiciais.
As mudanças também ocorreram entre os jurados, sendo exigido,
então, que todos fossem alfabetizados.
Fonte: John Morgan / Wikimedia commons / Domínio público
 O Júri, por John Morgan, 1861.
A partir dessa reforma, deixou-se o que era considerado Ministério
Público sob o controle do Executivo e subordinado ao Judiciário. Ou
seja, os promotores poderiam ser nomeados e demitidos por juízes,
pelo imperador, pelos presidentes das províncias, não tendo, portanto,
independência no exercício de suas funções.
Apenas em 1874, houve o reconhecimento oficial do Ministério Público.
Essa reforma foi a base do sistema judiciário, que assim permaneceu
até quase o final do Império, deixando os liberais insatisfeitos.
Em setembro de 1871, na lei que data do dia 20, houve significativas
mudanças na organização da Justiça. Entre elas, ocorreu a separação
das funções judiciais e policiais, fazendo com que delegados e
subdelegados exercessem apenas as atribuições policiais.
A lei regulou a prisão em flagrante delito. Também estabeleceu a fiança
provisória e ampliou a aplicação do habeas corpus.
Outras alterações promovidas pela reforma:
Formação da culpa
Julgamentos
Apelações
A reforma concedeu mais direitos de defesa para os réus em processos
criminais. Deu preferência à polícia e ao controle social almejado pelos
conservadores. Essa reforma foi feita sob a gestão do Ministro da
Justiça Francisco de Paula de Negreiros Sayão Lobato, o Visconde
de Niterói.
Além do Código Criminal estabelecido em 1830, ainda nessa década
foi preciso construir outras posturas a fim de que se regulassem os
crimes cometidos pelos escravos. Isso ocorreu diante das tensões
criadas por revoltas escravas em um cenário de fim do tráfico de
cativos.
A lei assinada em 10 de junho de 1835 (ainda no período regencial)
visava reprimir os crimes cometidos pelos escravos, sendo o principal
instrumento de condenação à morte da população cativa no Brasil,
ampliando as tipologias de crimes que levariam à morte.
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Por meio dessa lei, foi impossibilitado ao escravo recorrer da sentença,
não podendo acionar o Supremo ou Tribunal da Relação. O projeto de
lei teve três discussões na Câmara dos Deputados e três no Senado
entre os anos de 1833 e 1834. Essa lei alterou o Código Criminal e o
Código de Processo Criminal.
FRANCISCO DE PAULA DE
NEGREIROS SAYÃO LOBATO
Francisco de Paula de Negreiros nasceu no Rio de Janeiro, em
25 de maio de 1815. Iniciou o curso jurídico na Faculdade de
Direito do Recife e concluiu-o na Faculdade de Direito de São
Paulo, em 1834. Ocupou diversos cargos na magistratura, entre
eles o de juiz de órfãos em Niterói (1835) e juiz de direito em
diferentes comarcas a partir de 1838, tendo sido ainda chefe de
polícia naBahia (1840) e diretor da alfândega do Rio de Janeiro.
Foi eleito deputado geral por diversos mandatos (1850, 1853,
1861 e 1867) e nomeado senador do Império (1869) e
conselheiro de Estado (1870). Ocupou a pasta da Justiça duas
vezes, durante os gabinetes do Marquês de Caxias (1861) e do
Visconde do Rio Branco (1871), tendo participado da
promulgação da Lei do Ventre Livre.
PENA DE MORTE
No primeiro artigo da lei de 1835 foi estabelecida a pena de morte para
escravos, homens ou mulheres que matassem ou ferissem de forma
grave o seu senhor, administrador, feitor, suas mulheres e seus filhos.
Anteriormente, o escravo que matasse poderia ter outros tipos de
morte; uma vez que poderia evocar atenuantes, podendo ser punido de
outras formas, sem ser a pena capital, de acordo com o Código
Criminal.
Fonte: Johann Moritz Rugendas / Wikimedia commons / Domínio
público
 Escravo sendo açoitado, em pintura de Rugendas, 1835.
De acordo com Ricardo Pirola, ao determinar penas mais severas aos
praticantes de um crime contra um grupo de pessoas (os donos dos
escravos ou os envolvidos na administração), o Estado mostrava
também quem deveria ser protegido por essa nova lei. Caso o escravo
ou escrava cometesse o mesmo crime, assassinato ou ferisse
gravemente alguém livre ou ainda escravo, o julgamento continuaria
baseado no Código criminal (PIROLA, 2012).
De fato, a lei de 1835 servia para garantir a estabilidade da escravidão
e o direito de propriedade dos senhores.
E qual foi a forma da lei para
criar ressonâncias na escravaria?
VERIFICAR
Colocar o julgamento e a condenação do escravo criminoso no local do
crime ou na localidade de residência do réu, fazia com que sua
condenação servisse de exemplo para aqueles que o conheciam,
consequentemente, outros escravos.
No entanto, sabemos o quanto o artifício do exemplo não funciona em
todos os casos, principalmente para escravos que viviam em diferentes
ocasiões, podendo o crime ser cometido devido a inúmeros fatores.
Mas havia também a possibilidade de perdão do monarca aos
condenados à morte nas galés ou prisão perpétua. Caso ocorresse
esse perdão a um escravo, ele não voltaria aos domínios do seu
senhor.
Essa foi uma decisão de 1872, após discussões no Ministério da
Justiça e no Conselho de Estado. Para alguns autores, como Joaquim
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Nabuco, tal decisão é um exemplo da progressão do processo
emancipacionista no Brasil.
JOAQUIM NABUCO
Pernambucano do Recife, Joaquim Aurélio Barreto Nabuco de
Araújo, mais conhecido como Joaquim Nabuco, nasceu no dia 19
de agosto de 1849 e faleceu em Washington, nos Estados
Unidos, em 17 de janeiro de 1910. Escritor, historiador, jornalista
e diplomata, formou-se em Letras e em Direito. Sua principal obra
na carreira é O abolicionismo, lançada em 1883.
Historiadores que se dedicaram a pensar a Justiça e o acesso a ela por
parte dos escravos, mostra que, com a decisão do monarca, os
escravos recorreriam à polícia depois de cometerem um crime, sendo,
portanto:
[...] UMA GARANTIA DE QUE NÃO
RETORNARIAM À CASA DE SEUS
SENHORES, DEPOIS DE SEREM
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PERDOADOS PELO MONARCA, O QUE
TEVE COMO CONSEQUÊNCIA AMPLIAR
A PERCEPÇÃO DOS CATIVOS A
RESPEITO DAS INSTITUIÇÕES COMO
ARENAS FAVORÁVEIS DE LUTA CONTRA
A ESCRAVIDÃO.
(PIROLA, 2016, p. 141).
Esse caso é um exemplo de como podemos combinar Justiça com
escravidão e liberdade, porque a primeira pode ser usada para a
manutenção de uma ou de outra. Esses pedidos e a concessão do
perdão não eram generalizados e, segundo o autor, estão
concentrados, no século XIX, entre os anos 1870 e 1880.
De acordo com Pirola, o perfil de quem recebia o perdão ou a
comutação das penas estava associado àqueles que cometiam
pequenos delitos, como agressões a pessoas que não eram das
famílias dos seus senhores, ou roubos.
Na década de 1870, houve uma mudança no perfil daqueles que
receberam o benefício, sendo antes os condenados à prisão perpétua e
à pena de morte, mostrando que os crimes cometidos eram mais
graves do que os anteriores, cujos réus eram condenados a pequenas
penas.
 RESUMINDO
A Justiça do Império não pode ser pensada deslocada da principal
característica desse regime, a escravidão. Portanto, o Código Criminal
e a lei de 1835 são exemplos da construção de uma Justiça para uma
sociedade hierarquizada, a partir de uma distinção jurídica: ser ou não
livre.
Desse modo, é fundamental pensar como a Justiça para a liberdade
desses escravos começou a ser construída, a despeito das críticas
feitas a ela por abolicionistas e escravistas.
VERIFICANDO O APRENDIZADO
1. OS CÓDIGOS PENAIS TÊM FUNÇÕES DIVERSAS,
DEPENDENDO DE SEUS CONTEXTOS. PENSANDO EM
UMA SOCIEDADE ESCRAVOCRATA COMO A
BRASILEIRA, PODEMOS NOTAR QUE UMA DE SUAS
FUNÇÕES É:
A) Criar um clima punitivista e de hierarquia social, com elementos que
reforçam a segregação entre trabalhadores braçais e os membros da
sociedade.
B) Criar o estatuto de escravidão, até então tácito, definindo
regulamentos jurídicos e punições para fugitivos.
C) Criar os castigos físicos em praça pública, transformando-se assim
em marca máxima da escravidão brasileira.
D) Estabelecer a criminalização de religiões afro-brasileiras e impedir a
compra das alforrias, que só poderiam ser doadas.
E) Estabelecer modelos de Justiça para membros sociais diferentes,
fazendo existir várias justiças concomitantes no Brasil.
2. A LEI VERSA SOBRE DOIS PROCEDIMENTOS
FUNDAMENTAIS: DEFINIÇÃO E PROCESSO. NESSE
SENTIDO, É EMBLEMÁTICA A DIVISÃO ENTRE
CÓDIGO CRIMINAL E PROCESSO CRIMINAL NO
IMPÉRIO. DESSA SEPARAÇÃO PODEMOS
COMPREENDER COMO UMA DE SUAS RESULTANTES:
A) O processo de institucionalização da Justiça, fundamentando
punições, casas de correções e processos.
B) A manutenção das Ordenações Filipinas como métrica de punição
balizada em castigos físicos.
C) A criação de um processo em separado, em que uma coisa são as
leis e os processos efetivos judiciais; outra, as ações punitivistas dos
chefes de polícia.
D) A Constituição atingiu seu objetivo, pois uma de suas principais
ordens era a criação de códigos de processo que não existiam no
Brasil.
E) A contradição do sistema penal brasileiro no Império, que já tinha um
código histórico consolidado e só vê a criação de um código na
Regência.
GABARITO
1. Os códigos penais têm funções diversas, dependendo de seus
contextos. Pensando em uma sociedade escravocrata como a
brasileira, podemos notar que uma de suas funções é:
A alternativa "A " está correta.
O Código Penal brasileiro faz parte do conjunto de reformas judiciais do
Império que, tanto no Primeiro Reinado como na Regência acabam por
ofertar a singularização das relações, a institucionalização de sistemas
prisionais. Acontece que leis acabam por refletir aspectos sociais e
garantir o ordenamento e a manutenção da sociedade, no caso de uma
sociedade escravocrata.
2. A lei versa sobre dois procedimentos fundamentais: definição e
processo. Nesse sentido, é emblemática a divisão entre Código
Criminal e Processo Criminal no Império. Dessa separação
podemos compreender como uma de suas resultantes:
A alternativa "A " está correta.
Estamos falando de um só documento jurídico, dividido e organizado
de forma a dar sentido a um novo conjunto de materiais e debates de
códigos criminais marcados pela tradição. A Constituição do Império
tratava da necessidade que se materializava naquele momento.
MÓDULO 4
 Reconhecer a trajetória jurídica do fim da escravidão no Brasil
ESCRAVIDÃO E IMPÉRIO
Assista ao vídeo Os abolicionistas brasileiros.
Fonte: François-Auguste Biard / Wikimedia commons
 A abolição da escravatura, François-Auguste Biard, 1849.
O estudo do sistema jurídico do Império passa necessariamente pela
compreensão de como leis e seus executores interferiram no processo
de escravidão e liberdade no Brasil imperial. Os historiadores da
escravidão, na década de 1980, utilizaram fontes judiciais a fim deentender a lógica da escravização de homens e mulheres, mostrando
haver uma especificidade no campo jurídico que legislou sobre um
aspecto crucial do Império: a escravidão.
Compreender que leis são essas e como foram usadas pelo Estado e
por escravizados ou cidadãos a fim de justificar a escravização ou
demandar liberdade serve para ampliar não apenas o conhecimento a
respeito do campo jurídico, mas também como ele pôde ser usado e
manipulado de acordo com interesses de um momento político.
As fontes judiciais tornam-se instrumentos valiosos para se
compreender como as políticas de domínio senhorial pautavam as
relações escravistas e como escravos e libertos utilizavam-nas para
atender a seus interesses de liberdade ou de conquista de direitos
dentro do sistema escravista. Desse modo, é essencial entender como
essas leis foram criadas e usadas no cotidiano político e social do
Império.
Fonte: Jonas de Carvalho / Wikimedia commons / CC BY-SA 2.0
 Carta de alforria em exposição no Museu Histórico Nacional, Jonas
de Carvalho, 1872.
É importante perceber que as leis que instrumentalizam os debates
jurídicos sobre a escravidão são fruto de ações mais amplas dos
juristas vinculados aos movimentos abolicionistas. Uma das questões
vitais foi o da regulamentação das alforrias. Como ex-escravos e
libertos passavam a ter alguns direitos, além do de não escravização?
As alforrias eram registradas em cartório e por vezes enfrentavam
importantes querelas jurídicas. Se antes somente os membros da
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sociedade — senhores e seus representantes — tinham voz, ao longo
do tempo consolidam-se grupos que fazem essas defesas. No Império,
um grupo de funcionários públicos tinha a função de analisar tais
questões e emitirem pareceres sobre quem estava com a razão.
ALFORRIAS
Carta jurídica colonial usada pelo senhor para reconhecer que
seu escravo ganhou a condição de liberdade por concessão ou
compra. A decisão era dos senhores e os agentes das compras
poderiam ser os próprios escravos, a partir de ações que lhe
permitiam ganhos como atuação nas minas e de serviços nas
cidades. A Igreja, por meio de irmandades de homens negros,
com alforriados e beneméritos também compravam alforrias.
 VOCÊ SABIA
Um dos funcionários públicos notórios nessa função foi Machado de
Assis, tendo elaborado importantes pareceres pró-homens negros
pleiteantes.
Esse ponto é importante para notarmos que as batalhas jurídicas que
se seguem não foram articuladas como benesse ou caridade, mas
fruto de uma luta histórica. Já havia nomes importantes sobre a
questão da escravidão no Brasil, parte em defesa da modernização do
país, mas parte oriunda de descendência, adoção, estudos e que
passam a militar pelos direitos.
Esses aspectos podem ser reforçados quando percebemos que,
quando terminou o estatuto de escravo em grandes cidades no Brasil, a
maior parte da população negra já havia conseguido sua liberdade.
LEI FEIJÓ
A primeira lei que interferiu nas relações escravistas no Brasil foi a de
1831, promulgada em 7 de novembro, e que ficou conhecida como Lei
Feijó. Essa lei foi a primeira que proibiu a entrada de escravos
africanos no Império, sendo uma ação realizada nos meses seguintes à
abdicação do imperador. Foi construída a partir de arranjos com a
Inglaterra, a fim de que a Independência do Brasil pudesse ser
reconhecida.
A repressão ao tráfico já vinha ocorrendo desde o início do século nas
colônias inglesas e isso afetava o Brasil, à medida que proibir o tráfico
seria acabar com um lucrativo comércio. Apesar disso, a lei de 1831
causou um impacto significativo no trânsito de pessoas africanas para
escravização.
Fonte: Johann Moritz Rugendas / Wikimedia commons / Domínio
público
 Navio Negreiro, Johann Moritz Rugendas, 1830.
Se por um lado, após essa data qualquer africano que entrasse no
Brasil para ser escravizado estaria aqui de forma ilegal, por outro, os
que permaneceram nesse negócio, o tráfico de escravos, tiveram que
aprimorar esse trânsito para ter um aumento significativo em seus
lucros.
É interessante pensar em como uma lei, que muitos dizem que era
para “inglês ver”, mobilizou o parlamento nos anos seguintes, a fim de
se discutir sua possível revogação, exatamente por ferir interesses
daqueles que eram dependentes do tráfico e que lucravam com esse
comércio.
No entanto, a aplicação da lei não foi eficiente para acabar com a
entrada de africanos, piorando sensivelmente a forma como eles
chegavam, já que não havia mais fiscalização, inspeção de saúde e
outros trâmites dos tempos da legalidade desse comércio.
LEI EUSÉBIO DE QUEIRÓS
Fonte: Shutterstock.com
 Escravidão na África, Journal des Voyage, Travel Journal, (1880-
81).
Em 1850, a Lei nº 581 proibiu novamente o tráfico e logo confirmou a
validade da lei de 1831.
O contexto da aprovação da Lei Eusébio de Queiroz, a de 1850, fez
parte de um momento de tensão internacional, quando um forte
sentimento antibritânico favoreceu a tomada de medidas que
pudessem dar autonomia ao Império para resolver questões internas e
não ficar submetido à pressão internacional.
A fim de ser cumprida, a nova lei modificou também alguns pontos da
anterior, entre eles, os que seriam responsabilizados criminalmente
pelo contrabando, não sendo mais os fazendeiros que comprassem os
escravizados ilegais. Outro ponto importante da lei de 1850 é que ela
não revogou a de 1831, mas garantiu os direitos de propriedade
daqueles que adquiriram escravos entre as duas leis.
Após 14 dias da aprovação da Lei Eusébio de Queirós, outra foi
aprovada, a de número 601, de 18 de setembro, conhecida como Lei
de Terras. Nela, havia a determinação de que as terras devolutas não
poderiam ser ocupadas por qualquer outro título que não o de compra
ao Estado em hasta pública, garantindo, porém, os direitos dos
ocupantes de terra por posse mansa e pacífica e dos possuidores de
sesmarias com empreendimentos agrícolas instalados até aquela data
(VAINFAS, 2002. p. 466).
Essa lei fazia parte de um movimento de mudança na política de terras,
projeto visado desde a Independência, uma vez que houve a
revogação do instituto de doação de sesmarias. Tal medida impedia a
posse da terra que não fosse a da compra, fazendo com que seu
acesso fosse limitado para libertos e imigrantes. Apesar do fim do
tráfico, a escravidão saía dessa década fortalecida, principalmente no
campo, que passava a ser propriedade de poucos.
LEI DO VENTRE LIVRE
A lei de número 2040 foi assinada em 28 de setembro de 1871 e ficou
conhecida como Lei do Ventre livre por causa de sua principal
característica: determinar a liberdade do ventre da mulher escrava —
forma como a escravidão se perpetuava. No entanto, a longa lei previa
algumas condições e indenizações para que de fato as crianças
nascidas de uma mulher escravizada fossem realmente livres. Assim,
os artigos da lei regularam a forma como ocorreria essa liberdade.
Os filhos nascidos dessas mulheres, chamados de “ingênuos”,
deveriam ficar com a mãe até os oito anos de idade, sob os cuidados
dos senhores das mães; após esse período, o senhor poderia optar por
entregar a criança ao Estado e receber uma indenização, ou ficar com
a criança até ela completar 21 anos de idade, usando seus serviços ao
longo do tempo como forma de indenização.
Fonte: Arquivo Nacional / Wikimedia commons / Domínio público
 Capa da Lei do Ventre Livre, Documento sob a guarda do Arquivo
Nacional (Brasil), 1871.
A lei tinha outros artigos, como a criação do fundo de emancipação, o
reconhecimento do direito do escravo em formar pecúlio e, também,
estabeleceu a necessidade de o Estado fazer uma matrícula geral de
todos os escravos do Império.
Apesar de a lei ser conservadora quanto a estabelecer a liberdade dos
escravos, causou profundo debate na sociedade e no parlamento, que
a via como uma grande interferência nas relações entre senhor e
escravo. Por meio dessa lei, de fato, o Estadopassava a interferir no
cotidiano da escravidão ao determinar o destino daqueles nascidos das
mulheres escravizadas.
Essa lei ficou conhecida também como Lei Rio Branco, por ter sido o
Visconde do Rio Branco, chefe do gabinete conservador, o responsável
pelo encaminhamento do projeto para debate e luta no parlamento. Os
efeitos dessa lei para o destino da escravidão são difíceis de analisar
no calor dos acontecimentos naquela época.
No entanto, foi um importante passo para a conquista da liberdade,
uma vez que, para além do ventre, a lei regulava a possibilidade de
alforria, prática que não era regulamentada até então.
Para historiadores especialistas na temática, a lei, criticada por
senhores e abolicionistas, deu um parâmetro de como deveria ocorrer o
processo da abolição, principalmente na defesa de um processo dentro
da ordem legal.
LEI DOS SEXAGENÁRIOS
Se os filhos das escravas estavam “libertos” por meio de uma lei, outra
era necessária para libertar os mais velhos. A lei de 28 de setembro de
1885, de número 3270, foi chamada de Lei dos Sexagenários por
libertar os escravos com mais de 60 anos, sendo mais uma do conjunto
jurídico que orientava o fim da escravidão, mas não sendo esta sua
única finalidade.
Essa lei também regulava a sociedade livre, principalmente nas
relações entre libertos e ex-senhores, de acordo com Mendonça (2008.
p. 41).
Fonte: Arquivo Nacional / Wikimedia commons / Domínio público
 Cartaz comemorativo à Abolição da Escravidão no Brasil, ocorrida
três anos após a promulgação da Lei dos Sexagenários, Arquivo
Nacional, 1888.
No que se refere à libertação dos escravos, era preciso que houvesse
uma indenização aos senhores, que receberiam três anos de serviço
do escravo a ser libertado. Além disso, quem fosse libertado deveria
permanecer por cinco anos nos municípios onde eram escravizados e
assinar um contrato de trabalho sob pena de prisão.
Esse foi o fim de um projeto anterior, que sofreu críticas no parlamento
e uma batalha política intensa. Tal lei seria a última forma de combater
o movimento abolicionista acreditando-se nela como um importante
instrumento para eliminar a escravidão de forma gradual, lenta e sem
traumas econômicos para os senhores, proprietários de escravos.
LEI ÁUREA
Fonte: Senado Imperial / Wikimedia commons / Domínio público
 Lei Áurea, Documento sob guarda do Arquivo Nacional, Senado
Imperial, 1888.
A última lei da Justiça do Império que teve a escravidão como tema foi
a que acabou com a escravidão em definitivo e que ficou conhecida
como Lei Áurea. As leis anteriores haviam marcado uma espécie de
gradualismo para o fim da escravidão. Desde 1831, com a lei que
determinou a proibição de africanos para a escravização; com a de
1871, quando não nasceriam mais escravos; até a de 1885, que
libertou os mais velhos, acreditava-se que já estava pronto o terreno
jurídico para o fim da escravidão.
Era preciso aguardar o tempo e, simultaneamente, preparar os futuros
libertos para a vida em liberdade. No entanto, seriam precisos muitos
anos para que o Brasil deixasse de ter escravos, caso não houvesse
uma ação imediata.
O fim da escravidão ocorreu também por meio de uma lei, a de número
3.353, que tinha apenas dois artigos e era bastante curta se comparada
às outras, sem deixar possibilidade para contestação ou subterfúgios
para a permanência da escravidão no Brasil, a partir de 13 de maio de
1888, data de sua assinatura.
Um artigo extinguiu a escravidão, sem dar maiores detalhes, e o
segundo artigo revogava as disposições em contrário, ou seja, anulava
qualquer possibilidade de uso da mão de obra escrava que havia sido
permitida pelas leis anteriores.
Podemos considerá-la como a lei mais importante do Império por
terminar com a principal característica desse regime: a escravidão.
Apesar de finda a escravidão, restavam aqueles que foram penalizados
por crimes cometidos ainda quando eram escravos. Uma vez que a
escravidão não mais existiria, precisaria haver também a revisão
dessas penalidades. Em 13 de maio de 1889, o monarca pediu a
revisão geral dos processos de réus condenados pela lei de 1835. De
acordo com Pirola (2016, p.139), algumas penas foram revistas e
publicadas no aniversário do primeiro ano da abolição.
 ATENÇÃO
É importante mencionar que recorrer à Justiça em busca de liberdade
antes de 1888 foi a escolha de muitos homens e mulheres
escravizados, que utilizaram essas leis como forma de reivindicar o
direito de liberdade. Muitos historiadores já se debruçaram sobre vasta
documentação que menciona as ações de escravizados em busca de
direitos, baseando-se em artigos de leis ou em outros artifícios, tais
como promessas de liberdade feitas por senhores no leito de morte ou
testamentos não cumpridos, quando havia clara intenção de liberdade,
mas com os herdeiros não cumprindo a vontade do senhor falecido.
A Justiça do Império ocupou-se de diversas ações de homens e
mulheres que não se viam mais como escravizados por entenderem
que alguns artigos de algumas leis davam a eles o direito de gozar o
restante da vida em liberdade. O processo abolicionista no Brasil pode
e deve ser visto tendo a Justiça como parâmetro e como uma solução
para a conquista da liberdade antes de 1888.
Assista ao vídeo A batalha por direitos e o processo jurídico para o fim
da escravidão.
VERIFICANDO O APRENDIZADO
1. (TRT – 3ª REGIÃO – SÃO PAULO – 2015) A JUSTIÇA
CONDENOU EM 2004 UM FAZENDEIRO DO PARÁ A
PAGAR 1,3 MILHÃO DE REAIS DE MULTA POR
MANTER EM SUAS TERRAS TRABALHADORES EM
SITUAÇÃO ANÁLOGA À ESCRAVIDÃO. ESSA FOI A
MAIOR PENA FINANCEIRA JÁ APLICADA NO PAÍS
PARA UM CRIME DESSE TIPO. (AZEVEDO, G.;
SERIACOPI, R. HISTÓRIA. SÃO PAULO: ÁTICA, 2005, P.
357. SÉRIE BRASIL.)
NO BRASIL, AS RELAÇÕES DE PRODUÇÃO A QUE O
TEXTO SE REFERE FORAM LEGALMENTE:
A) Instituídas em dispositivos da Constituição de 1824.
B) Criadas por imposição do Bill Aberdeen, em 1845.
C) Revogadas pela Lei Eusébio de Queiroz, em 1850.
D) Proibidas por conta da Lei do Ventre Livre, em 1871.
E) Extintas com a assinatura da Lei Áurea, em 1888.
2. A DINÂMICA DA FORMAÇÃO DA JUSTIÇA IMPERIAL
ACABOU POR PERMITIR A AÇÃO DO CONTRADITÓRIO
DE FORMA MAIS SISTEMÁTICA. ISSO SIGNIFICA QUE
AÇÕES CONTRA O STATUS QUO PASSARAM A SER
MAIS RECORRENTES. NESSE SENTIDO, FORAM
IMPORTANTES OS PROCESSOS DE JURISTAS
VINCULADOS AO MOVIMENTO ABOLICIONISTA, UMA
VEZ QUE, CONSCIENTES DA SITUAÇÃO E DE SUAS
POSSIBILIDADES JURÍDICAS, PASSARAM A
PRESSIONAR POR MUDANÇAS. UMA DAS AÇÕES
EMBLEMÁTICAS E CORRETAMENTE CARACTERIZADA
É:
A) A consolidação de um campo jurídico em termos de pareceres
relacionados a querelas entre alforriados e antigos senhores que
discutiam a liberdade e demonstravam um processo vivo de exigência
de mudanças.
B) As ações progressistas das leis Eusébio de Queirós, Sexagenário e
Ventre Livre mostram a predominância desse grupo político que articula
o fim da escravidão.
C) As ações paliativas não tiveram efeito prático de nenhuma monta,
sendo a ação necessária a da Princesa Isabel, valendo-se do Poder
Moderador para propor a libertação dos escravos.
D) A crise institucional causou imensas revoltas negras no Brasil,
levando a contínuas insurreições e à necessidade de os governos
criarem medidas jurídicas para aplacar a força de suas exigências.
E) A instituição de um regime de alforrias foi o primeiro processo
jurídico do período do Império, permitindo um processo contínuo de fim
da escravidão, em um projeto sem rupturas.
GABARITO
1. (TRT – 3ª região – São Paulo – 2015) A Justiça condenou em
2004 um fazendeiro do Pará a pagar 1,3 milhão de reais de multa
por manter em suas terras trabalhadores em situação análoga à
escravidão. Essa foi a maior pena financeira já aplicada no país
para um crime desse tipo. (AZEVEDO, G.; SERIACOPI, R. História.
São Paulo: Ática, 2005, p. 357. Série Brasil.)
No Brasil, as relações de produção a que o texto se refere foram
legalmente:
A alternativa "E " está

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