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87 TÓPICOS DE ATUAÇÃO PROFISSIONAL – FISIOTERAPIA Unidade II 5 CARACTERIZAÇÃO DO PACIENTE NEUROLÓGICO E SINAIS CLÍNICOS 5.1 Sinais e sintomas da fase aguda e crônica das afecções do sistema nervoso central (SNC) De modo geral, o SNC é composto pelo encéfalo e pela medula espinhal. O encéfalo é formado pelo cérebro, cerebelo e tronco encefálico. O cérebro é dividido em dois hemisférios (direito e esquerdo), e cada um contempla cinco lobos – estes, por sua vez, têm suas respectivas funções e se complementam: • Lobo frontal: tem a função principal de motricidade e de planejar ações voluntárias. • Lobo parietal: responsável pelo processamento sensorial (tato, dor, temperatura, pressão, entre outros) e perceptual (noção espacial). • Lobo temporal: processa estímulos auditivos. • Lobo occipital: processa estímulos visuais. • Lobo da ínsula: percebe emoções e empatia, além de processar o paladar. Portanto, é o cérebro que processa nossas principais funções, como motricidade, sensibilidade, cognição, entre outras. O cerebelo é responsável principalmente pelo equilíbrio, tônus e vigor muscular, noção espacial e coordenação dos movimentos. Já o tronco encefálico é composto por três estruturas: • Mesencéfalo: auxilia na recepção e coordenação da contração muscular e postura corporal. • Ponte: mantém a postura corporal, equilibrando o corpo e o tônus muscular. • Bulbo: centro de controle de batimentos cardíacos, movimentos respiratórios e controle da deglutição. Por fim, temos a medula espinhal, um cordão cilíndrico que parte da base do encéfalo (forame magno) e percorre toda a coluna vertebral até aproximadamente entre as vértebras L1 e L2. Ela recebe as informações de diversas partes do corpo e as envia para o encéfalo, através das vias ascendentes ou sensoriais, e leva informações deste até os músculos do corpo, através das vias descendentes ou 88 Unidade II motoras. Também é da medula que partem os 31 pares de nervos espinhais; ou seja, é ela que conecta o SNC ao sistema nervoso periférico (SNP). Saiba mais Assista à aula a seguir e confira os livros indicados para estudar mais detalhes sobre o SNC: NEUROANATOMIA do sistema nervoso central (SNC) – Rogério Souza #1. 2020. 1 vídeo. (8min45s). Publicado pelo canal Neurofuncional. Disponível em: https://cutt.ly/BJxOX46. Acesso em: 2 jun. 2022. MACHADO, A. B. M. Neuroanatomia funcional. 2. ed. São Paulo: Atheneu, 2007. MÁRCIA, R.; KATO-NARITA, E. M. Neurofisiologia básica para profissionais da área da saúde. São Paulo: Atheneu, 2016. RUBIN, M. Netter: neuroanatomia essencial. Rio de Janeiro: Elsevier, 2008. O SNC, portanto, é imprescindível para o bom funcionamento do corpo, mantendo sua homeostase corporal e trabalhando de forma integrada com os outros sistemas corporais. Como as informações de qualquer parte do corpo chegam ao SNC para ele interpretá-las e tomar consciência do que precisa ser feito, qualquer lesão em uma das suas partes altera essa comunicação nervosa, prejudicando a interpretação do que está acontecendo ou a resposta a ser dada, causando os sinais e sintomas característicos da área lesionada. Várias são as causas de lesões no SNC e, de acordo com a etiologia de cada lesão, temos diferentes patologias. Por exemplo, se uma artéria que irriga o SNC sofre uma isquemia, temos um acidente vascular cerebral (AVC); se o indivíduo sofrer uma pancada na cabeça, denomina-se traumatismo cranioencefálico. Apesar de terem causas diferentes, ambas as patologias lesionam o SNC e geram sinais e sintomas de acordo com a região/estrutura afetada. Alguns são comuns a quase todas as lesões da região e portanto, quando presentes, já sabemos que se trata de alguma afecção do SNC. Esses sinais e sintomas podem ser explorados em detalhe no caso clínico a seguir. Caso clínico 9 Paciente do sexo masculino, 56 anos, chegou a um pronto-socorro trazido pelo serviço de atendimento móvel de urgência (Samu). Estava desacordado, com sinais vitais presentes, porém instáveis. No primeiro contato, foi passado para os socorristas que ele foi encontrado pela trabalhadora doméstica de sua casa no chão de seu quarto, sem sinal de lesão aparente. 89 TÓPICOS DE ATUAÇÃO PROFISSIONAL – FISIOTERAPIA Um exame clínico observou que o paciente apresentava sinal de Babinski positivo do lado esquerdo, e os reflexos profundos estavam diminuídos à esquerda, com tônus muscular diminuído à esquerda. Foi encaminhado para exames de imagem do encéfalo devido à suspeita de alguma afecção do SNC. Identificou-se isquemia de parte da artéria cerebral média direita, recebendo o tratamento adequado para rever essa isquemia. Respondeu rápido e bem aos medicamentos, recobrando a consciência, porém ainda confuso. Após 48 horas do ocorrido, já conseguia movimentar todo o lado direito, porém o lado esquerdo permanecia com diminuição dos reflexos profundos e do tônus muscular, sinal de Babinski presente à esquerda e diminuição da motricidade tanto do membro superior esquerdo (MSE) quanto do membro inferior esquerdo (MIE). Por estar estável, foi encaminhado para o quarto e logo recebeu alta hospitalar. Após a terceira semana, MSE e MIE começaram a apresentar aumento do tônus (hipertonia), e os reflexos profundos, ao serem testados, estavam mais exacerbados (hiper-reflexia) e já apresentavam esboço de movimento, mas sem coordenação e equilíbrio. Tente responder: • Quais são os principais sinais e sintomas da fase aguda e crônica de uma afecção neurológica central nesse caso clínico? • O que levou os profissionais de saúde a pensar numa possível afecção do SNC? Primeiramente, é importante saber os principais sinais e sintomas do paciente que indicam alguma lesão no SNC. Vejamos cada um deles em detalhe a seguir. 5.1.1 Alteração da consciência O estado do paciente nos informa sobre a gravidade do ocorrido, e a alteração da consciência sinaliza que algo grave ocorreu no SNC. Mas o que seria uma alteração de consciência? Primeiramente precisamos definir consciência: segundo Plum e Posner (1984), é a capacidade do indivíduo de reconhecer a si mesmo e aos estímulos do ambiente ao redor. Alterações do nível de consciência podem variar entre dois extremos: desde uma desorientação temporoespacial até um estado de coma profundo. O que muda o estado de consciência de um indivíduo são afecções nas estruturas do tronco cerebral, diencéfalo, córtex cerebral ou nos hemisférios cerebrais, podendo ter origens diversas – traumáticas, cardiovasculares, tóxicas, inflamatórias etc. –, além de doenças psíquicas, uso de drogas, distúrbios metabólicos, entre outros. Identificar a causa da alteração e agir sobre ela para reverter o quadro é essencial, mas nem sempre possível; e, quanto maior o comprometimento do SNC, maior a gravidade em relação à sua funcionalidade, podendo levar o indivíduo à morte cerebral e ao óbito. Portanto, é de extrema importância 90 Unidade II uma investigação minuciosa do que está alterando a consciência para, o quanto antes, agir sobre essa causa. Qualquer alteração no estado de consciência deve ser investigada, inclusive desorientações aparentemente simples. No caso clínico, o indivíduo inconsciente foi indício de alteração no SNC, o que levou a equipe a realizar exames para identificar a causa de lesão no encéfalo, já que não tinha detalhes do ocorrido, pois o paciente já fora encontrado desacordado no chão do quarto, chegando ao diagnóstico de isquemia da artéria cerebral média direita – uma alteração cardiovascular – como causa. Com isso, temos a alteração do estado de consciência como sinal de afecção do SNC. 5.1.2 Sinal de Babinski positivo Um reflexo primitivo chamado reflexo cutâneo plantar está presente no recém-nascido até os dois anos de idade. É testado ao se estimular a planta do pé pela sua borda externa, de trás para frente, lentamente, exercendo uma força moderada. Em resposta ao estímulo, observa-se a hiperextensão do hálux com abertura dos demais artelhos em leque. Essa respostareflexa indica que ainda não ocorreu a mielinização completa do trato corticoespinal, nossa principal via motora. A mielinização completa ocorre entre um e dois anos de idade, e a resposta ao estímulo dado se inverte, observando a flexão plantar dos dedos dos pés. Após o período esperado de mielinização, ao testar o reflexo cutâneo plantar, se a resposta for a hiperextensão do hálux com abertura dos demais artelhos em leque, é chamada sinal de Babinski – sinal patológico que indica lesão na via corticoespinal. Portanto, sempre que o sinal de Babinski for positivo – ou seja, estiver presente –, isso indica lesão no SNC, pois o trato corticoespinal, que faz parte do sistema, estaria com algum dano. No caso clínico, o sinal de Babinski foi positivo do lado esquerdo, o que leva a pensar que a via corticoespinal direita está comprometida. A) B) Figura 54 – Teste de Babinski: A) execução do teste; B) resposta positiva 91 TÓPICOS DE ATUAÇÃO PROFISSIONAL – FISIOTERAPIA 5.1.3 Reflexos profundos (tendinosos) Para verificar a condução das vias nervosas que chegam ao SNC e saem dele até um músculo (SNP), testamos os reflexos profundos – também conhecidos como reflexos tendinosos –, visto que o estímulo é dado sobre os tendões dos músculos. Ao testá-los, o examinador percute o tendão do músculo; a resposta é avaliada por sua contração com ou sem deslocamento articular. De acordo com a resposta reflexa observada, identificamos as condições das vias nervosas e se a lesão decorre de uma alteração do SNC ou do SNP. Esses reflexos podem ser classificados em arreflexia, hiporreflexia, normorreflexia e hiper-reflexia. A presença de arreflexia/hiporreflexia – ausência ou diminuição da resposta reflexa – indica lesão periférica, podendo resultar de uma lesão da raiz nervosa anterior, como na lesão do plexo braquial ou de uma lesão de nervo periférico, caso da polineuropatia diabética. Porém, na fase aguda de uma lesão central (medular, cerebelar, encefálica), os reflexos também podem estar reduzidos, pois precisam se reajustar à lesão sofrida. Já a presença de hiper-reflexia – quando a resposta reflexa se mostra exacerbada e pode gerar uma amplitude excessiva – sempre se relaciona a lesões do SNC, podendo indicar lesões medulares acima do nível de L2, lesões da via corticoespinal e outras áreas motoras. Portanto, o paciente do caso clínico apresentou no primeiro momento uma hiporreflexia à esquerda (fase aguda da lesão) e depois hiper-reflexia à esquerda (fase crônica da lesão) – mais um sinal característico de lesão central. Para recordar os principais reflexos profundos (tendinosos) testados, vejamos as características de cada um deles: Quadro 11 – Principais reflexos profundos Reflexo Manobra Resposta Nível Masseterino Percussão sobre o queixo Fechamento da boca Ponte Bicipital Percussão sobre o tendão do bíceps Flexão do antebraço C5 e C6 Tricipital Percussão sobre o tendão do tríceps Extensão do antebraço C7 Flexores dos dedos da mão Percussão sobre o tendão dos flexores comuns dos dedos Flexão dos dedos C8 Patelar Percussão sobre o tendão patelar Extensão da perna L2, L3 e L4 Aquileu Percussão sobre o tendão de aquiles Flexão plantar L5, S1 e S2 Adaptado de: Luvizutto e Souza (2020, p. 126-127). 92 Unidade II A) B) C) Figura 55 – Reflexos profundos de membro superior: A) reflexo bicipital; B) reflexo tricipital; C) reflexo estilorradial A) B) C) Figura 56 – Reflexos profundos de membro superior e inferior: A) reflexo aquileu; B) reflexo patelar; C) reflexo dos reflexores dos dedos 93 TÓPICOS DE ATUAÇÃO PROFISSIONAL – FISIOTERAPIA 5.1.4 Tônus muscular São várias as definições de tônus, e a de Maria Stokes (2000) é uma das mais didáticas. Ela o definiu clinicamente como a resistência encontrada quando uma articulação é movida passiva e rapidamente; ou seja, ao mover uma articulação passivamente, devemos observar a resistência contra o movimento pretendido. De acordo com a resposta encontrada, a condição do tônus pode ser classificada em: • Atonia: ausência de tônus muscular. • Hipotonia: tônus muscular diminuído. • Normotonia: tônus muscular normal. • Hipertonia: tônus muscular aumentado. Mas como classificar o tônus através da resistência encontrada? Podemos partir da normotonia. Para manter a postura antigravitacional e ter os movimentos livres, em toda a sua amplitude, precisamos de uma mínima resistência para os músculos manterem uma postura e contração mínima, permitindo o movimento de forma harmônica entre os músculos agonistas e antagonistas, relaxando e contraindo quanto for necessário. Se a resistência encontrada estiver abaixo da mínima, se o músculo tiver dificuldade tanto na contração mínima quanto na postura e se a ADM estiver além do esperado, temos uma hipotonia, que se deve principalmente a lesões do SNP, distúrbios cerebelares, fase aguda das lesões encefálicas, e aquelas de origem muscular, como miopatias. Por outro lado, se a resistência estiver aumentada, com a contração muscular acima do esperado e o paciente com dificuldade em gerar toda a ADM, extensibilidade do músculo diminuída, gerando posicionamentos inadequados, temos uma hipertonia, que se deve a algum comprometimento do SNC e pode se dividir em espasticidade (hipertonia elástica) e rigidez (hipertonia plástica). Espasticidade é clinicamente definida por Lance (1990) como a resistência dependente da velocidade e do estiramento passivo de um músculo, com reflexos profundos exacerbados. Ao testar o tônus, inicialmente o alongamento passivo produz uma resistência alta, seguida por uma inibição súbita ou uma liberação da resistência, denominada resposta (ou sinal de canivete). Esse tipo de hipertonia é encontrado nas alterações do SNC, como AVC, paralisia cerebral, lesão medular, entre outros. Afeta predominantemente músculos antigravitacionais, ou seja, músculos flexores dos membros superiores e extensores dos membros inferiores, além dos rotadores internos e abdutores de ambos. Consequentemente, os membros superiores tendem a assumir postura flexionada, em pronação e aduzida, enquanto os membros inferiores em geral ficam em extensão, rotação interna e adução. 94 Unidade II Já rigidez muscular é a resistência a movimentos passivos, lentos ou rápidos, em todo arco de movimento quando os reflexos tunídeos estão normais. A resistência ao movimento passivo gerada por ela envolve tanto músculos agonistas quanto antagonistas, estando presente nos extensores e flexores, dando uma característica clínica de roda denteada. Decorre de perturbações funcionais dos núcleos da base, como a doença de Parkinson. Como avaliar o tônus muscular? Na prática clínica, podem-se adotar as seguintes formas: • Segurar um membro relaxado do paciente e tentar movê-lo passivamente, observando a resistência contra o movimento, ou seja, quanto esforço é necessário para vencê-la. • Agitar o membro passivamente ou soltá-lo subitamente enquanto se observa a resposta ao movimento, verificando a resistência. Quanto maior a resistência, maior o tônus muscular. Observação O tônus muscular pode ser influenciado por fatores não neurais, como idade, estado emocional, prática de atividade física, fatores biomecânicos, estado nutricional, entre outros. Nem sempre é apenas uma alteração neural. Para identificar o aumento do tônus, uma das medidas mais utilizadas é a escala de Ashworth modificada, adaptada por Bohannon e Smith (1987), que acrescentaram a avaliação do membro superior à original (que examinava apenas membros inferiores). Para isso, devemos observar a resistência sentida à movimentação passiva do segmento e classificá-la de acordo com o quadro 12. Quadro 12 – Escala de Ashworth modificada Classificação Descrição 0 Tônus muscular normal 1 Aumento discreto do tônus muscular, manifestado por resistência mínima no final do arco de movimento 1+ Aumento discreto do tônus muscular, manifestado por contração associada à resistência mínima durantemenos da metade restante do arco de movimento 2 Aumento mais acentuado do tônus muscular durante a maior parte do arco de movimento, porém o segmento é movido facilmente 3 Aumento considerável do tônus muscular; o movimento passivo é realizado com dificuldade, sem completar o arco de movimento esperado 4 O segmento afetado está rígido em flexão ou extensão Adaptado de: Bohannon e Smith (1987, p. 206-207). 95 TÓPICOS DE ATUAÇÃO PROFISSIONAL – FISIOTERAPIA O tônus normal é essencial para o indivíduo ter um controle motor adequado, realizar suas diversas tarefas e manter posturas antigravitacionais, como ficar em pé. Se puder aumentar ou diminuir o tônus, isso interfere na função motora, afetando tarefas cotidianas. Voltando ao caso clínico: ao chegar ao hospital, o paciente apresentou diminuição do tônus (hipotonia) do lado esquerdo em membro superior (MS) e membro inferior (MI); com o passar do tempo, apresentou aumento do tônus na mesma região (hipertonia). Como já colocado, essa mudança se deve à fase aguda de uma lesão do SNC, quando os estímulos se diminuem até o sistema se readequar, exacerbando e descontrolando os estímulos gerados pela área lesada. Por isso a hipotonia está presente no início (fase aguda), dando lugar à hipertonia com o passar dos dias (fase crônica). Recapitulando os sinais clínicos do paciente neurológico com lesão do SNC, temos: a fase aguda de uma lesão neurológica dura aproximadamente de três semanas a um mês (a depender da etiologia e gravidade da lesão), diminuindo a atividade neurológica com a lesão e gerando, portanto, sinais e sintomas característicos que se modificam com o tempo, à medida que o SNC se adapta à nova condição, iniciando a fase crônica, observada geralmente a partir da quatro semanas após a lesão. Alguns sinais e sintomas neurológicos se modificam ao sair da fase aguda para a crônica; vimos que os reflexos profundos e o tônus são as principais evidências dessa modificação. Já o sinal de Babinski está presente nas duas fases, desde que a lesão tenha ocorrido na principal via motora (trato corticoespinal); como a lesão permanece, o sinal também permanece. Portanto: • Fase aguda de lesão nervosa central: hipotonia e hiporreflexia, podendo alterar o estado de consciência e o sinal de Babinski presente (no caso de lesão do trato corticoespinal). O paciente pode ter dificuldade de movimentar-se na região acometida por essas alterações. • Fase crônica de lesão nervosa central: hipertonia e hiper-reflexia, podendo alterar a consciência ou recuperá-la totalmente, e o sinal de Babinski continua presente (no caso de lesão do trato corticoespinal). O paciente pode apresentar dificuldade de movimentar-se (caso o tônus esteja muito aumentado), movimentos ativos (com algumas compensações) ou simplesmente não apresentar sequelas motoras. Isso depende da extensão e da causa da lesão do SNC. Lembrete Já vimos os sinais e sintomas que geralmente decorrem de uma afecção do SNC. Existem outros também, próprios de cada patologia que acomete o sistema. Esses são os principais sinais e sintomas de uma afecção do SNC, e identificamos cada um, com suas características mais importantes. Com isso, podemos diagnosticar um paciente que sofre com essas afecções. 96 Unidade II 5.2 Reabilitação neurofuncional voltada ao aprendizado neuromotor Analisemos agora questões importantes sobre o aprendizado motor e suas implicações clínicas para recuperar a função de um paciente com lesão no SNC. Para isso, devemos entender primeiro o que é aprendizado motor. Segundo Schmidt e Lee (2005), trata-se de uma série de processos associados à prática ou experiência que resulta em mudanças relativamente permanentes na capacidade de produzir ações hábeis. Portanto, aprendizado motor precisa de tempo e prática para as mudanças necessárias realmente ocorrerem e as habilidades se tornarem permanentes. Muitas vezes o paciente consegue realizar alguma função, movimento ou posicionamento durante a sessão, porém, ao voltar no outro dia, já não consegue mais e necessita novamente do estímulo e da repetição. Por exemplo, durante a fisioterapia, após algumas tentativas já trabalhadas, um paciente conseguiu manter-se sentado, com distribuição adequada de peso, realizando flexão anterior de tronco de forma simétrica, para alcançar um objeto à sua frente com as duas mãos. Ao retornar e tentar a mesma atividade, o paciente projetou o peso para o lado não comprometido, inclinando o tronco para lá, realizando a flexão anterior de forma assimétrica e com pouca amplitude, não alcançando o objeto como na sessão anterior. Foi necessário mais treino durante a sessão para o paciente conseguir novamente o movimento de forma simétrica e alcançar o objeto – o que vemos é o desempenho motor do paciente, e não o aprendizado motor. No outro dia, ele já conseguiu sentar-se de forma simétrica, com distribuição adequada de peso, porém ainda não conseguiu alcançar o objeto na primeira tentativa, precisando de mais tempo. Portanto, o aprendizado motor ocorre, mas não está completo. Com o passar do tempo, ao chegar à fisioterapia, ele conseguiu, já na primeira tentativa, alcançar o objeto com as duas mãos, numa distribuição adequada de peso na postura sentada, indicando de fato o aprendizado motor – que, cabe ressaltar, está presente também em indivíduos sem lesão; ou seja, trata-se da aquisição do movimento, independente de lesão, que acontece muito intensamente nos primeiros anos de vida, por exemplo. Porém, o aprendizado motor é essencial para recuperar funções e readquirir habilidades perdidas por uma lesão, e, para Chapman e McKinnon (2000), diversos fatores podem afetar esse processo, interferindo também no aprendizado motor pós-lesão cerebral. Por isso, cada indivíduo que sofreu lesão cerebral, mesmo que da mesma etiologia, pode apresentar um tempo de recuperação e de aprendizado motor diferente, tanto por fatores endógenos (intrínsecos ao indivíduo) – também chamados de fatores biológicos – quanto fatores exógenos (extrínsecos ao indivíduo) – também chamados de fatores ambientais. Aqueles são inerentes ao indivíduo e não modificáveis, como idade, sexo, genética, fatores tróficos cerebrais e fatores da lesão (tamanho e velocidade); já estes são modificáveis, como estilo de vida, prática de exercício físico, uso de entorpecentes, tabaco, dieta, além do próprio ambiente (como poluição, contato com substâncias tóxicas, entre outros). Os fatores citados são considerados pré-lesão e podem ter influenciado a ocorrência, mas outros também podem auxiliar o paciente a recuperar a mesma função, classificados dentro dos fatores exógenos, que são os pós-lesão, relacionados, por exemplo, ao suporte médico e ao tratamento farmacológico após o ocorrido. 97 TÓPICOS DE ATUAÇÃO PROFISSIONAL – FISIOTERAPIA Portanto, o fato de pacientes com a mesma patologia terem diferentes formas de recuperar as funções, com dificuldades distintas para a mesma tarefa (ou até casos de alguns conseguirem se recuperar e outros não), decorre da influência de fatores endógenos e exógenos sobre a lesão, que resultam em modificações específicas nos indivíduos. Mas, para recuperar uma função através do aprendizado motor, devemos considerar a ocorrência da neuroplasticidade do SNC. O sistema nervoso é formado por inúmeros circuitos neurais que podem ser modificados pela experiência individual; com isso, a interação entre o SNC e o ambiente resulta na organização de comportamentos simples ou complexos, que modificam tanto o ambiente como o próprio sistema. Durante muito tempo acreditou-se que o SNC, após seu desenvolvimento, se tornava uma estrutura rígida, não modificável, e que qualquer lesão seria permanente, pois suas células não poderiam se reconstituir nem se reorganizar. Sabe-se hoje que o SNC tem grande adaptabilidade, e mesmo no cérebro adulto a plasticidade ocorre na tentativa de se regenerar. A plasticidade neural (ou neuroplasticidade) pode ser definidacomo a capacidade do organismo de adaptar-se a mudanças externas e internas, mediadas pela ação conjunta de diferentes órgãos coordenados pelo SNC, respondendo a uma lesão destrutiva ou até mesmo a sutis alterações resultantes dos processos de aprendizagem. É maior durante a infância e declina gradativamente, sem se extinguir na vida adulta, ocorrendo, portanto, tanto no hemisfério intacto quanto no lesionado. Se o encéfalo sofre uma lesão, perdas neurais e distúrbios funcionais podem ocorrer na rede neural, a princípio irreparáveis, mas sujeitos à adaptação. Alguns mecanismos explicam a ocorrência da plasticidade neural, porém ainda não são bem entendidos. Desses mecanismos, os mais comentados são as alterações anatômicas, que incluem o brotamento de novos terminais axônicos e, com isso, formam-se novas sinapses, promovendo uma organização (ou reorganização) cortical frente a um novo aprendizado ou lesão. Mas qual é a relação entre o aprendizado motor e a plasticidade neural na reabilitação neurofuncional? Para o paciente com alguma sequela neurológica recuperar uma função, precisa de um novo aprendizado motor para ela, e a plasticidade neural é necessária para a área lesionada se reorganizar funcionalmente e promover um aprendizado motor. E a reabilitação se dá em cima da possibilidade de gerar essa plasticidade, utilizando estratégias que enfatizem a reorganização cortical. Treinar uma tarefa repetidamente, usando o potencial do paciente, incentivando o movimento da forma mais ativa possível, pode resultar numa maior plasticidade neural, levando a uma reorganização cortical e gerando o aprendizado motor. 6 ACIDENTE VASCULAR CEREBRAL (AVC) Trata-se de uma das alterações neurológicas mais comuns, cujos pacientes representam a maioria nas clínicas de fisioterapia e centros de reabilitação especializados em pacientes neurológicos. A seguir, exploraremos essa afecção do sistema nervoso com casos clínicos para melhor compreendê-la, analisando suas características e como a fisioterapia pode auxiliar na recuperação. 98 Unidade II Caso clínico 10 Mulher de 48 anos estava guardando as compras do supermercado com a filha enquanto conversavam sobre o dia de trabalho quando apresentou um quadro súbito de dor forte de cabeça, com fraqueza em membro superior direito (MSD), seguida de queda da comissura labial para a direita, gerando dificuldade para falar, perdendo momentaneamente a consciência e caindo no chão, porém sem bater a cabeça. Assustada, a filha imediatamente ligou para o Samu, que chegou em 20 minutos. Seguiram com os primeiros socorros, e a mulher foi levada ao pronto-socorro do hospital mais próximo, acompanhada pela filha. No trajeto, ela já havia recobrado a consciência, mas estava desorientada, sem saber o que acontecia. No hospital, a equipe médica colheu informações com a filha, que trouxe os seguintes dados: a mãe é ex-fumante, com dois anos de abstinência, hipertensa controlada por remédios, não praticava atividade física, não cuidava muito da alimentação (devido à praticidade de processados) e trabalhava de forma integral como diretora de uma escola de primeiro e segundo grau. Os médicos suspeitaram de um AVC e solicitaram exames de imagem e laboratoriais, além do exame clínico geral, que incluiu medição de temperatura e da glicemia e exame cardiovascular completo, com avaliação de pressão arterial, ritmo e frequência cardíaca, ausculta cardíaca, palpação dos pulsos periféricos, ausculta cervical e supraclavicular. Os resultados apontaram isquemia decorrente da oclusão na divisão superior da artéria cerebral média esquerda devido a uma embolia, rapidamente tratada, diminuindo as alterações de lesões secundárias. A paciente ficou dois dias em observação na UTI, já mais consciente, porém com alterações neurológicas e motoras no hemicorpo direito, onde os reflexos profundos (tendinosos) e o tônus muscular estavam diminuídos, além de reflexo de Babinski presente no membro inferior direito (MID). Ainda apresentava paresia no hemicorpo direito, com dificuldade na fala. Ao receber alta, continuou o tratamento fisioterapêutico em um centro de reabilitação. Ao iniciar, apresentava as seguintes alterações no hemicorpo direito: • hipertonia elástica (espasticidade) grau 2 em MSD e grau 1 em MID; • reflexos profundos aumentados (hipertonia); • paralisia facial central; • diminuição da força, apresentando grau 2 na musculatura extensora do MSD e grau 3 em dorsiflexores, flexores de joelho e quadril em MID. Também apresenta dificuldade em movimentos funcionais com o MSD, como comer sem deixar a comida cair da colher ou passar batom sem borrar. Apresenta leve dificuldade nas fases da marcha, como choque de calcanhar e balanceio médio, diminuindo a largura do passo, além de não transferir peso corretamente para o MID, afetando um pouco seu equilíbrio, mas se locomove de forma independente. 99 TÓPICOS DE ATUAÇÃO PROFISSIONAL – FISIOTERAPIA 6.1 Aspectos gerais AVC é considerado hoje a principal causa de morte e de incapacidade no Brasil. Para a Organização Mundial da Saúde (OMS), trata-se do desenvolvimento rápido de distúrbios focais da função cerebral, com sintomas que podem durar 24 horas ou mais, de etiologia vascular, alterando planos sensoriais, motores e cognitivos, conforme a extensão da lesão. Também é relatado por Mello et al. (2020) como um déficit neurológico decorrente da interrupção do fluxo sanguíneo na região encefálica, diminuindo o suprimento neuronal e eliminando células nervosas. Essas definições apontam que, para sofrer um AVC, a pessoa deve apresentar alguma característica que resulte em alterações vasculares que afetem as artérias que irrigam a região encefálica. Alguns fatores de risco a predispõem a um AVC, muitos relacionados ao estilo de vida, e outros a questões genéticas. Alguns dos principais são diabetes melito, hipertensão arterial, sedentarismo, tabagismo, doenças cardíacas, condições comportamentais (emocional e estresse), hipercolesterolemia, obesidade e predisposições genéticas. Vale destacar que a idade também é um fator a ser levado em consideração: quanto mais velho, maior a suscetibilidade ao AVC, pelo próprio envelhecimento fisiológico, que aumenta a chance de desenvolver alguma condição propícia. Porém fatores ambientais e condições comportamentais têm levado adultos mais jovens a sofrer AVC também, principalmente a partir da década de 2010. Apesar de mais raro, o AVC também pode acometer crianças e adolescentes. Vejamos os fatores de risco estabelecidos para um AVC: • Riscos modificáveis: — hipertensão; — diabetes; — fumo; — doenças cardíacas; — sedentarismo; — obesidade. • Riscos não modificáveis: — idade; — sexo; 100 Unidade II — raça; — hereditariedade; — genética (mutação não hereditária). A paciente do caso clínico apresentava vários fatores de risco para um AVC. A idade (48 anos), de forma isolada, não seria um deles, já que a maior incidência de AVC se dá entre 60 e 70 anos, porém devemos considerar seu estilo de vida. Segundo a filha, ela não levava uma vida muito saudável. Apesar de ter parado com o tabagismo por dois anos, as alterações da nicotina no organismo – como o desenvolvimento de aterogênese, mudanças desfavoráveis do perfil lipídico, aumento na viscosidade do sangue, alterações nas funções das plaquetas, fomento de trombose e indução de vasoconstrição da artéria coronária, além de alterações das propriedades elásticas das artérias – não se extinguem imediatamente; pelo contrário, o ex-fumante sofre as consequências da nicotina por muito tempo. Depois de um ano sem cigarro, o risco de infarto e de outras doenças cardiovasculares diminui em 50%, além de melhorar a função pulmonar e diminuir tosse, falta de ar, infecções respiratórias e níveis de colesterol e triglicerídeos. Em cinco anos sem fumar, o risco de AVC cai em 50%; após dez anos, de modo geral (visto que essa condição varia a cada indivíduo), um ex-fumante está praticamentelivre das alterações da nicotina. Ela também é um dos fatores fortes que desenvolvem hipertensão arterial sistêmica (HAS) no fumante, e nossa paciente era hipertensa, necessitando de medicamento para controlar a pressão. Além disso, por conveniência, ela comia alimentos processados, que costumam ter alto teor de sódio, gorduras saturadas e trans (gorduras “ruins”) e concentrar açúcares, conservantes, entre outros componentes que acumulam gordura no sangue, coração e fígado, aumentando a pressão arterial e formando placas de gorduras nas artérias – provável causa da embolia da artéria cerebral média. Além dessas condições, a paciente era sedentária, e o exercício físico nos protege de doenças cardiovasculares, pois provoca uma série de respostas fisiológicas nos sistemas corporais, em especial no sistema cardiovascular, melhorando tanto a oxigenação celular como a circulação corporal, além de ser um ótimo recurso para gastar a gordura acumulada nas células e órgãos do corpo, sendo o principal responsável pelo aumento nos níveis de lipoproteínas de alta densidade (HDL) no sangue. Também é um ótimo aliado para combater o estresse causado principalmente pelo ambiente de trabalho, devido ao relaxamento muscular decorrente da melhora da circulação e da oxigenação celular, incluindo células do sistema nervoso, além de liberar endorfinas. Em resumo, um estilo de vida mais saudável diminuiria as chances de a paciente ter sofrido um AVC. Apesar de seu aparecimento súbito, vários fatores acumulados ajudaram a desencadeá-lo. 6.2 Classificação e fisiopatologia O AVC decorre de uma alteração vascular que prejudica a circulação encefálica, porém existem duas formas de danificar uma artéria: fechar a luz do vaso ou romper suas paredes. 101 TÓPICOS DE ATUAÇÃO PROFISSIONAL – FISIOTERAPIA Portanto, temos dois tipos de AVC: • Isquêmico: responsável por pelo menos 80% dos casos. • Hemorrágico: responsável por cerca de 20% dos casos. A seguir, temos as características de cada um para compreendermos sua fisiopatologia e propriedades. 6.3 Acidente vascular cerebral isquêmico (AVCI) Forma mais incidente da doença, é causada pela diminuição do fluxo sanguíneo em uma ou mais regiões do encéfalo. Seus principais mecanismos são trombose de grandes e pequenas artérias, além da embolia de origem cardíaca. Apesar de menos comuns, outros mecanismos são dissecação arterial, vasculites e trombofilias. Essa isquemia suprime o aporte circulatório de um tronco arterial, o que resulta em infarto no território correspondente quando as colaterais não são eficazes nem dispõem de mecanismos compensatórios, como vasodilatação microcirculatória ou aumento da taxa de extração de O2. A sobrevivência do tecido em risco depende da intensidade (e duração) da isquemia e da disponibilidade de circulação colateral. A falência desses mecanismos em manter nutrientes e oxigênio para as células neuronais determina uma alteração funcional dos neurônios ainda reversível, caracterizando o tecido neuronal em risco, chamado de zona de penumbra. Trata-se da ausência de potenciais espontâneos ou induzidos, embora mantenham a homeostase iônica e o potencial transmembrana. A diminuição mais acentuada do fluxo sanguíneo regional leva a alterações bioquímicas e estruturais do neurônio, determinando a morte celular, que é o infarto cerebral. Observação Isquemia cerebral é a diminuição do fluxo sanguíneo por vários segundos entre dois e três minutos; infarto cerebral é a interrupção desse fluxo por mais de cinco minutos. A isquemia pode ser causada por três mecanismos diferentes: trombose, embolia e diminuição da perfusão cerebral. O AVCI trombótico, que abrange 40% dos casos, se dá quando um coágulo sanguíneo (aterosclerose) interrompe a irrigação sanguínea no encéfalo ou quando um distúrbio hematológico forma um trombo dentro da luz do vaso. Já o AVCI embólico, que abrange 30% dos casos, se dá quando um êmbolo – como ar, gordura, tecido ou qualquer corpo estranho – obstrui a passagem de sangue no encéfalo. O AVC também pode ser causado pela diminuição da perfusão cerebral – fator que contempla apenas 10% dos casos –, diante de insuficiência cardíaca grave (infarto agudo do miocárdio extenso, arritmia) 102 Unidade II ou por hipotensão sistêmica (choque, hipovolemia). Nesses casos, a diminuição da perfusão cerebral é difusa e mais crítica nas chamadas zonas de fronteira vascular, cuja circulação é terminal e tem perfusão local menor. Também há graus diferentes de isquemia, que apresentam nomenclaturas diversas. Por exemplo: • Ataque isquêmico transitório (AIT): síndrome da perda aguda da função cerebral focal, com sintomas que duram menos de 24 horas e de origem vascular. Essa definição foi atualizada para síndrome clínica por perda aguda da função cerebral focal ou retiniana, com sintomas que duram menos de 1 hora. Não deixa déficit neurológico. • AVCI parcial e progressivo: síndrome caracterizada por sintomas/sinais neurológicos focais de rápida evolução que duram mais de 24 horas, gerando déficit neurológico discreto, mas persistente, decorrente de uma isquemia moderada. • AVCI completo: síndrome caracterizada por sintomas/sinais neurológicos focais de rápida evolução que duram mais de 24 horas, gerando déficit neurológico importante/grave e persistente, decorrente de uma isquemia grave. Voltando ao caso clínico: os médicos identificaram que o AVC da paciente foi de causa embólica. Como ela ficou com sequelas neurológicas leves e alguns déficits funcionais discretos, podemos concluir que ela sofreu um AVCI parcial progressivo. Um socorro rápido e um atendimento adequado podem diminuir as alterações secundárias, pois, quanto mais tempo a área cerebral fica sem aporte sanguíneo, maior a gravidade da lesão, podendo atingir, como efeito cascata, áreas ainda maiores. Portanto, quais seriam os sinais e sintomas de uma isquemia aguda? • Diminuição ou perda súbita da força na face, braço ou perna de um lado do corpo. • Alteração súbita da sensibilidade com sensação de formigamento na face, braço ou perna de um lado do corpo. • Alteração aguda da fala, incluindo dificuldade para articular, expressar ou compreender a linguagem. • Perda súbita de visão em um ou nos dois olhos. • Dor de cabeça súbita e intensa sem causa aparente. • Instabilidade, vertigem súbita intensa e desequilíbrio associado a náuseas ou vômitos e até perda momentânea da consciência. 103 TÓPICOS DE ATUAÇÃO PROFISSIONAL – FISIOTERAPIA Ao presenciar esses sintomas, o quanto antes ligarmos para a emergência, mais rápido o paciente será atendido para identificar e tratar a isquemia, gerando sequelas mais discretas. A filha da paciente foi rápida ao ligar para o Samu ao perceber que a mãe não estava bem. Isso fez toda a diferença para conter a piora do quadro. 6.4 Acidente vascular cerebral hemorrágico (AVCH) Menos frequente que o isquêmico, o AVCH rompe uma artéria e extravasa sangue para o espaço intracerebral, gerando alterações neurológicas significativas. Seus principais fatores de risco são hipertensão arterial e aumento da idade. Outras causas, menos frequentes, são malformações arteriovenosas, aneurismas, distúrbios da coagulação, uso de anticoagulantes ou trombolíticos, transformações hemorrágicas de infarto, sangramento de tumores e abuso de substâncias. São sinais e sintomas típicos de um AVCH: • déficits neurológicos focais súbitos (como os do AVCI) que progridem em minutos ou horas; • rebaixamento do nível de consciência; • cefaleia, náusea e vômitos; • elevação da pressão arterial. Um vaso rompido faz a hemorragia se espalhar, deslocando o parênquima cerebral, levando à hipoxia celular, aumentando o volume intracraniano e elevando a pressão intracraniana. Se não for controlada, a ocorrência gera déficit significativo de aporte sanguíneo em mais áreas cerebrais, o que pode levar o paciente a óbito por conta da gravidade e extensão do comprometimento do parênquima cerebral. Porisso, óbitos são mais frequentes no AVCH em relação ao AVCI. Portanto, as diferenças entre os tipos de AVC decorrem do tipo de alteração vascular – isquemia ou ruptura. De acordo com as descrições, podemos concluir que a paciente do caso clínico sofreu um AVCI embólico, do tipo parcial-progressivo. 6.5 Quadro clínico de acordo com a localização do AVC Quais alterações clínicas podemos encontrar em um indivíduo que sofreu AVC? As sequelas deixadas dependem da área acometida e da artéria danificada. O encéfalo é irrigado por um conjunto de artérias que se comunicam, formando o polígono de Willis, cujas principais artérias recebem o nome de acordo com sua localização e levam aporte sanguíneo a cada área do encéfalo, gerando quadros clínicos com comprometimentos diferentes. São elas: • artérias vertebrais; • artéria basilar; 104 Unidade II • artérias cerebrais anteriores; • artérias cerebrais médias; • artérias cerebrais posteriores; • artérias carótidas internas; • artéria comunicante anterior; • artérias comunicantes posteriores. . Cerebral anterior Comunicante posterior Cerebral posterior Basilar Carótida interna Vertebral Cerebral média Comunicante anterior Figura 57 – Artérias do polígono de Willis A artéria vertebral origina-se da artéria subclávia e percorre a região cervical bilateralmente até a altura do tronco encefálico, onde se junta e forma a artéria basilar, que percorre o tronco encefálico até a base do cérebro, novamente se bifurcando, transformando-se em artéria cerebral posterior esquerda e direita. Da artéria cerebral posterior sai um ramo que forma a artéria comunicante posterior, que, por sua vez, se liga à artéria cerebral média, e esta tem uma conexão direta com a carótida interna. A artéria cerebral média se comunica com a artéria cerebral anterior, cujo ramo – chamado artéria comunicante anterior – se conecta com a artéria cerebral anterior do outro hemisfério, formando o circuito fechado do polígono de Willis. Todas as artérias são bilaterais, direita e esquerda, com exceção da artéria basilar e da comunicante anterior. 105 TÓPICOS DE ATUAÇÃO PROFISSIONAL – FISIOTERAPIA Se qualquer uma dessas artérias se lesionar, temos sinais e sintomas característicos de cada uma, pois cada artéria irriga um território específico, gerando comprometimentos diferentes. Esses sinais e sintomas são parte do quadro clínico geral do AVC. Mas quais são eles? Primeiramente, nem todo paciente que sofre AVC fica com hemiplegia ou hemiparesia, que é o comprometimento motor do hemicorpo contralateral ao hemisfério que sofreu a lesão. Por exemplo, no caso clínico apresentado, a paciente ficou com o hemicorpo direito comprometido em decorrência de um AVCI na artéria cerebral média esquerda. Observação Recordando a diferença entre hemiplegia e hemiparesia: ambas comprometem a metade de apenas um lado do corpo (hemi = metade), podendo ser o hemicorpo direito ou o esquerdo. As duas também têm relação com a motricidade, com o movimento voluntário. No entanto, a hemiplegia é a falta completa de força muscular, ou seja, é a ausência de movimento voluntário de grupos musculares de um lado do corpo. Já hemiparesia é a diminuição da força muscular, ou seja, perda parcial da força muscular, e os movimentos voluntários estão parcialmente presentes em um lado do corpo. Vejamos as sequelas deixadas pelo comprometimento de cada artéria do polígono de Willis. • Artéria cerebral anterior: irriga a parte interna de cada hemisfério cerebral, com exceção do lobo occipital. Se for comprometida, a pessoa sofre hemiparesia/plegia contralateral à lesão, de predomínio crural; ou seja, terá um hemicorpo comprometido, porém o membro inferior fica mais comprometido que o superior. Pode também apresentar alterações psíquicas do tipo frontal (falta de espontaneidade, inatividade motora, ecolalia, amnésia), apraxia e agrafia devido ao comprometimento do corpo caloso, e alterações sensoriais mais intensas no membro inferior. • Artéria cerebral média: irriga a parte externa de cada hemisfério cerebral, com exceção do lobo occipital. Se for comprometida, a pessoa sofre hemiparesia/plegia contralateral à lesão, de predomínio braquiofacial; ou seja, terá um hemicorpo comprometido, porém o membro superior fica mais comprometido que o inferior, e com paralisia facial central. Pode também apresentar alterações sensitivas que acompanham o déficit motor, comprometimento da fala (afasia motora e/ou sensitiva) e apraxia. • Artéria cerebral posterior: irriga o lobo occipital. Se for comprometida, a pessoa apresentará hemianopsia homônima ou cegueira central, agnosias visuais e alexia do lado contralateral à lesão. Nesse caso não há déficit motor, pois o lobo occipital envolve questões visuais. • Artéria carótida interna: uma oclusão de carótida interna, se compensada por anastomoses intracranianas, pode ser assintomática, mas, sem proteção das colaterais, resulta em isquemia focal no território da artéria cerebral média, por estarem conectadas. 106 Unidade II • Artéria basilar: pela localização dessa artéria em tronco encefálico, e por levar suprimento às artérias cerebrais, gera alterações mais graves, pois, quando comprometida, geralmente causa o coma ou a morte do paciente. • Artéria vertebral: parte da região cervical de cada lado do corpo e vai de encontro à artéria basilar. Se apenas uma artéria vertebral se comprometer, a pessoa pode apresentar náuseas, sensação de desmaio, tontura, visão turva, dor na nuca e dores irradiadas nos ombros ou braços. Porém, se o comprometimento for bilateral, os sintomas serão os mesmos da artéria basilar. A artéria cerebral média é a que mais sofre alterações; em seguida, a artéria cerebral anterior; depois a artéria cerebral posterior. As artérias basilar e vertebral são os casos menos frequentes. Sinais e sintomas de um AVC dependem, portanto, da localização e da extensão da lesão. De acordo com a área atingida, o comprometimento pode atingir mais de uma artéria cerebral e misturar suas características. Lembrete Os sinais e sintomas de um AVC dependem da localização e da extensão da lesão ocorrida. Para finalizar, vejamos o quadro típico de um paciente com AVC: Hemiplegias ou hemiparesias (crurais ou braquiofaciais) Hipo ou anestesia (superficial ou profunda) Hipotonia transitória → hipertonia espástica Hiporreflexia profunda transitória → Hiper-reflexia profunda Paralisia facial central Reflexo de Babinski presente Distúrbios associados: comportamental, consciência, afasias, agnosias, apraxias, alterações de pares cranianos, campos visuais e auditivos Figura 58 – Padrão postural de paciente pós-AVC Observação A fase aguda do AVC se chama silêncio elétrico e dura de 20 a 30 dias, gerando alterações neurológicas transitórias. 107 TÓPICOS DE ATUAÇÃO PROFISSIONAL – FISIOTERAPIA 6.6 Avaliação e diagnóstico cinesiológico-funcional Avaliação é a etapa mais importante para um bom resultado no tratamento de um paciente, pois com ela chegamos ao diagnóstico cinesiológico-funcional. Um paciente com sequela de AVC pode ter vários comprometimentos, alguns mais complexos que outros, a depender da área e extensão da lesão. Vejamos os principais itens que devem fazer parte da avaliação de um paciente pós-AVC. A primeira parte da avaliação é a anamnese, que coleta informações importantes sobre o relato da doença e sua evolução, direcionando melhor a avaliação física, e assim entendemos as particularidades do paciente, sua queixa e outras alterações associadas. Nessa parte também podemos descobrir como ele está realizando atividades diárias após a lesão, avaliando suas dificuldades e adaptações necessárias em seu próprio ambiente. Partimos então para o exame físico, identificando as alterações neuromusculoesqueléticas. A inspeção deve ser feita assim que o paciente chegar, para imediatamente identificarmos questões posturais, compensações, locomoção, trocas posturais, entre outros. Muitasquestões não observadas no início podem aparecer ao longo da avaliação, sendo importante observar a presença de movimentos involuntários, alteração de trofismo, pele, expressão facial, entre outros, pois revelam alterações do paciente e indicam o que deve ser avaliado mais precisamente. O paciente com AVC tem uma postura bem característica, mas o grau da doença e sua interferência na vida diária diferem para cada indivíduo. A hemiparesia, por exemplo, altera a distribuição do peso de apoio e desloca o centro de gravidade para o lado menos comprometido; já a espasticidade gera um padrão mais flexor de membro superior e mais extensor de membro inferior. Esses aspectos, todavia, são diferentes para cada indivíduo, pois a espasticidade pode variar em grau e, consequentemente, a intensidade com que o afeta, e isso se reflete na sua funcionalidade, influenciando fatores não neurais, como tendões, articulações, força muscular, entre outros. Por isso devemos avaliar o grau de espasticidade pela escala de Ashworth modificada e identificar também o quanto esse tônus aumentado influencia sua funcionalidade. Outra questão típica é o padrão da marcha. Mesmo considerando alterações de graus diferentes, o paciente com AVC que consegue se locomover apresenta a marcha hemiplégica (marcha ceifante), realizando um movimento circular com o membro hemiparético enquanto caminha, usando principalmente o músculo quadrado lombar para dar o passo e evitar que o pé se arraste no chão; já o membro superior hemiplégico/parético fica em flexão. Devemos então avaliar as compensações no ciclo, na progressão, estabilidade e adaptação da marcha, no comprimento e na largura do passo, identificando os fatores que geram essas alterações. Se o paciente não marcha, devemos verificar seu grau de independência, se é um cadeirante ativo ou passivo, e tentar identificar o que o impede de andar, se é uma condição reversível ou não. A palpação é feita com inspeção; identificada alguma alteração, devemos palpar e avaliar de forma mais precisa, medindo o trofismo, identificando o grau de espasticidade, testando os reflexos profundos 108 Unidade II (tendinosos) e avaliando o grau de força do paciente e encurtamentos, contraturas, presença de pontos de dor, mobilidade articular, se já tem alguma deformidade instalada, se é fixa ou redutível, entre outras questões. Outra parte importante a avaliar é o sistema sensorial, um dos exames mais difíceis e demorados, que exige paciência, experiência, colaboração e atenção tanto do paciente quanto do examinador. Devem-se seguir etapas, evitando cansar o paciente, explicando muito bem os testes realizados e testando as sensibilidades protetoras – dor, temperatura, tato (pressão superficial) – e a sensibilidade discriminativa – cinestésica, proprioceptiva, grafestesia e esterognosia. A) B) C) Figura 59 – Teste de sensibilidade protetora: A) sensibilidade dolorosa; B) sensibilidade térmica; C) sensibilidade tátil 109 TÓPICOS DE ATUAÇÃO PROFISSIONAL – FISIOTERAPIA A) B) C) Figura 60 – Teste de sensibilidade discriminativa: A) sensibilidade cenestésica; B) grafestesia; C) esterognosia No paciente com AVC, devemos avaliar a sensibilidade geral por segmentos (parte distal, intermédia e proximal de cada um) e de forma comparativa (direita e esquerda). Isso pode trazer informações valiosas sobre o prognóstico funcional, pois muitas vezes a alteração funcional pode decorrer de disfunções sensoriais. Também devemos conferir o sistema perceptual, identificando como as informações sensoriais são interpretadas pelo SNC, verificando a presença de agnosia (incapacidade do indivíduo de reconhecer e interpretar um estímulo sensorial), que pode ser classificada em: • agnosia visual; • agnosia tátil; • agnosia auditiva; • anosognosia; • astereognosia; • prosopagnosia; • negligência espacial unilateral. 110 Unidade II É necessário avaliar também a coordenação motora desses indivíduos, bem como seu equilíbrio estático e dinâmico, além de testar atividades funcionais, identificando tanto funcionalidades quanto incapacidades dentro da realidade de cada um. Para isso, podemos utilizar testes, avaliações padronizadas e até mesmo solicitar que o paciente cumpra alguma função, como pegar um copo e levá-lo a boca, e observar sua execução; a escolha do teste vai de acordo com o comprometimento dele. É importante que esses testes funcionais se relacionem com sua queixa e com os achados da ficha de avaliação. Feita a avaliação, devemos raciocinar em cima dos achados para elaborar o diagnóstico cinético-funcional e verificar as alterações funcionais encontradas no paciente. A seguir, alguns exemplos de questionamento para elaborar um bom diagnóstico cinesiológico-funcional, e com ele traçar um bom plano de tratamento: • O paciente apresentou algum déficit de força? De qual(is) grupo(s) muscular(es)? • A ADM está incompleta em algum segmento? Qual? Quanto? • Apresenta algum déficit sensorial e/ou perceptual? • Como estão suas trocas posturais? E as atividades diárias? • O que interfere na execução da marcha? Voltemos ao caso clínico. Estes são os sinais e sintomas da paciente: • hipertonia elástica (espasticidade) grau 2 em MSD e grau 1 em MID; • reflexos profundos aumentados (hipertonia); • paralisia facial central; • diminuição da força, apresentando grau 2 na musculatura extensora do MSD e grau 3 em dorsiflexores, flexores de joelho e quadril em MID. Também apresenta dificuldade em realizar movimentos funcionais com o MSD, como comer sem deixar a comida cair da colher ou passar batom sem borrar. Apresenta leve dificuldade nas fases da marcha, como choque de calcanhar e balanceio médio, diminuindo a largura do passo, além de não transferir peso corretamente para o MID, afetando um pouco seu equilíbrio, mas se locomove de forma independente. Assim, podemos chegar ao seguinte diagnóstico cinesiológico-funcional: • aumento do tônus em MSD (espasticidade grau 2) e em MID (espasticidade grau 1); • diminuição da força dos extensores do MSD para grau 2 de força; 111 TÓPICOS DE ATUAÇÃO PROFISSIONAL – FISIOTERAPIA • diminuição da força dos dorsiflexores, flexores de joelho e flexores de quadril do MID para grau 3 de força; • alteração na coordenação do MSD, dificultando atividades funcionais como passar batom e levar o talher com comida à boca; • alteração do equilíbrio dinâmico durante a marcha, diminuindo o tempo da fase do balanceio médio; • alteração do equilíbrio estático, transferindo mais peso para MIE. Com o diagnóstico podemos identificar as possíveis causas das alterações funcionais e estabelecer um plano de tratamento. 6.7 Recursos terapêuticos Atualmente, a fisioterapia tem vários recursos para reabilitar pacientes com sequela de AVC. A seguir, são listados os principais recursos utilizados, com comprovação científica de seus efeitos: • Cinesioterapia: exercícios físicos terapêuticos através de movimentação passiva, ativa, assistida ativa e ativa resistida, mobilizando o segmento, melhorando força, coordenação e ADM. Pode ser realizada com auxílio de aparelhos mecânicos, que podem facilitar ou resistir o movimento de acordo com a necessidade do paciente, melhorando sua funcionalidade. • Hidroterapia: utiliza propriedades físicas da água para ganhos funcionais. Indicada para melhorar equilíbrio, força, ortostatismo e marcha, a piscina terapêutica facilita a movimentação do paciente, estimulando músculos com mais dificuldade em se mover contra a gravidade, além de gerar estímulo sensorial em toda a região submersa e ativar a circulação e promover relaxamento muscular das regiões com mais tensão. • Hipoterapia: também conhecida como equoterapia, utiliza movimentos tridimensionais do cavalo, situação em que o paciente precisa fazer ajustes corporais o tempo todo, melhorando a percepção corporal, propriocepção, relaxando músculos espásticos e contraindo músculos fracos, trabalhando a concentração e anoção temporoespacial. • Massoterapia: técnicas que mobilizam tecidos superficiais e profundos para diminuir tensão muscular, pontos de dor e ativar circulação, melhorando o quadro do paciente. • Eletroterapia: todos os aparelhos da eletroterapia são bem-vindos na reabilitação, desde que bem utilizados. A eletroestimulação nervosa transcutânea (FES) é a mais utilizada em pacientes com sequela de AVC; se colocada nos pontos motores adequados, promove contração muscular, ativa o músculo pretendido, melhora a força muscular e, consequentemente, os movimentos funcionais do paciente. 112 Unidade II • Realidade virtual: tecnologia que simula a aprendizagem na vida real e permite maior intensidade de treinamento, proporcionando retorno sensorial aumentado. Utiliza jogos específicos, que trabalham motricidade, equilíbrio, atenção e cognição do paciente. • Facilitação neuromuscular proprioceptiva (FNP): conceito de tratamento cuja filosofia, segundo Kabat (1950 apud ADLER; BECKERS; BUCK, 1993), baseia-se na ideia de que todo ser humano, incluindo os portadores de deficiência, tem um potencial não explorado. Trata-se da aplicação de resistência para facilitar a contração muscular em princípios, auxiliando em ganho de força, ADM e propriocepção. Não existe melhor técnica ou aparelho para reabilitar pacientes com AVC. Cada um tem sua necessidade, e cabe ao fisioterapeuta descobrir o mais adequado, considerando questões físicas, psíquicas e emocionais, na busca de indicações e contraindicações de recursos para uma boa escolha. 7 PATOLOGIAS NEUROLÓGICAS TRAUMÁTICAS Duas das principais patologias neurológicas de etiologia traumática são a lesão medular e o traumatismo cranioencefálico. Vejamos a seguir seus aspectos e como a fisioterapia pode auxiliar na reabilitação desses pacientes. 7.1 Lesão medular Leiamos primeiramente um caso clínico de lesão medular traumática. Caso clínico 11 Senhor de 42 anos, pintor, estava trabalhando na parte externa de um prédio, caiu de um andaime no primeiro andar e bateu a coluna na lateral de uma caçamba de entulho. Imediatamente relatou que não sentia mais as pernas e não conseguia se mexer. Chamaram por socorro, e o corpo de bombeiros chegou em aproximadamente 30 minutos. Os colegas de trabalho tentaram colocá-lo em outro lugar, mas pediu para não mexerem nele, pois já ouvira falar que isso poderia machucar mais a coluna. Os bombeiros o imobilizaram e o levaram ao hospital mais perto. Não houve perda de consciência nem alteração dos sinais vitais, ficando estável; apenas relatou que não conseguia mexer as pernas. Chegando ao hospital, foi encaminhado para radiografia e ressonância magnética. Os exames constataram que ele havia lesionado a vértebra torácica T10, cujas espículas ósseas também haviam lesionado sua medula. Ainda não era possível mensurar o comprometimento da medula, pois a lesão estava na fase aguda, controlando a hemorragia focal (além do edema presente). Ele continuou sem sentir as pernas por mais dez dias. Aos poucos, começou a sentir formigamento nos membros inferiores e no quadril, mas ainda não conseguia se movimentar. Recebeu alta hospitalar, 113 TÓPICOS DE ATUAÇÃO PROFISSIONAL – FISIOTERAPIA pois estava bem clinicamente, e começou acompanhamento em uma clínica de fisioterapia um mês após o ocorrido. O fisioterapeuta identificou que o nível medular acometido foi o T12, e a lesão do paciente foi incompleta, classificando-a como incompleta tipo C. Apresentou reflexo patelar e aquileu aumentado, além de espasticidade grau 1+ em membros inferiores (MMII). Pelo nível da lesão, o paciente está classificado como paraplégico, usando cadeira de rodas devido às alterações motoras no quadril e nos membros inferiores, apesar de responder bem ao tratamento. Talvez possa até andar em casa com um andador ou órteses adequadas. Está afastado do serviço por tempo indeterminado e bastante empenhado em fazer fisioterapia. Apesar do ocorrido, não perdeu o bom humor, mesmo quando achava ruim precisar esvaziar a bexiga, por não poder mais controlá-la. Relata ter medo de uma infecção urinária. 7.1.1 Aspectos gerais Alguns pontos importantes sobre anatomia medular: nossa medula é dividida em 31 segmentos (ou seja, 31 pares de nervos espinhais). São estes: • 8 cervicais; • 12 torácicos; • 5 lombares; • 5 sacrais; • 1 coccígeo. Cranialmente a medula se limita com o bulbo (forame magno), iniciando-se em C1, e o limite caudal, no adulto, está entre as vértebras L1 e L2, onde há o cone medular. Abaixo da vértebra L2, temos a cauda equina, cuja função é receber informações de diversas partes do corpo e enviá-las ao encéfalo e vice-versa. Ou seja, ela recebe informações sensoriais das partes do corpo para o encéfalo e leva respostas motoras do encéfalo aos músculos efetores, além de ter relação com o sistema nervoso autônomo. A medula é menor que a coluna vertebral. Por exemplo, se um indivíduo lesou a vértebra T5, isso não quer dizer que lesou o segmento medular T5; como a medula é menor, o nível medular correspondente a essa lesão é o T7. Para saber o nível medular atingido, usamos a regra de Peele: se o indivíduo lesou as vértebras de C2 a T10, somamos 2 e teremos aproximadamente o nível lesado da medula. Já as vértebras T11 e T12 correspondem ao nível medular lombar (alto e baixo); se lesar a vértebra L1, sofrerá comprometimento medular sacral (ou coccígeo). Segundo a Associação Americana de Lesão Medular (Asia), lesão medular é a diminuição (ou perda) da função motora, sensorial e/ou anatômica abaixo do nível da lesão, podendo ser parcial ou total, 114 Unidade II devido ao trauma dos elementos neurais dentro do canal vertebral (RUPP et al., 2021). A maior causa de lesão medular é a traumática (80%), que pode decorrer de: • agressão/trauma direto, acidente de trânsito; • ferimento com arma branca ou arma de fogo; • mergulho em águas rasas, como piscina; • quedas/acidentes de trabalho; • esportes. Também temos a lesão não traumática (20%) como causa da lesão medular. Apesar de não ser o tema desta seção, são exemplos: • processos inflamatórios (como mielite); • processos degenerativos de esclerose lateral amiotrófica; • processos compressivos (como tumor e hérnias de disco); • processos vasculares (como aneurisma); • alterações congênitas (como mielomeningocele). Como a etiologia traumática é altamente prevalente, a faixa etária mais acometida por uma lesão medular é de jovens adultos – entre 18 e 40 anos –, principalmente do sexo masculino. 7.1.2 Classificação e fisiopatologia Após o trauma medular se sucedem rompimentos axonais, que lesam células nervosas e rompem vasos sanguíneos, gerando hemorragia e necrose da substância cinzenta medular – alterações chamadas de lesão primária. Em decorrência desta, começa a lesão secundária, que reduz o fluxo sanguíneo para o local lesado, altera o canal vertebral, reduz a pressão sistêmica e causa a morte das células e axônios não lesados inicialmente. Quanto maior a demora para controlar as lesões secundárias, mais células nervosas são danificadas, piorando a extensão da lesão. 115 TÓPICOS DE ATUAÇÃO PROFISSIONAL – FISIOTERAPIA Trauma Rompimento dos axônios Lesão secundária Morte das células e axônios que não foram inicialmente lesados Lesão das células nervosas Ruptura dos vasos sanguíneos Lesão primária (hemorragia e necrose da substância cinzenta) Redução de fluxo sanguíneo para o local lesado Alteração do canal vertebral Redução da pressão sistêmica Figura 61 – Fisiopatologia da lesão medular A lesão medular pode ser classificada de duas formas: de acordo com o nível ou com o grau da lesão. No primeiro caso, os pacientes podem ser classificados em: • Tetraplégicos: se o nível da lesão medular for de T1 para cima, ou seja, quando acomete qualquer parte do nível cervical e o primeiro nível torácico. Há comprometimento de membros superiores, inferiores e tronco. • Paraplégicos: se o nível da lesão medularfor abaixo de T1, ou seja, de T2 em diante. Há comprometimento de membros inferiores, podendo ou não ter comprometimento torácico. Os membros superiores são preservados. Essa divisão considera a inervação dos músculos do membro superior pelo plexo braquial, que vai de C5 a T1; por isso o paciente com nível de comprometimento medular T1 ainda se enquadra na classificação tetraplégico, pois compromete parte do membro superior. A partir de T2, já não há inervação para o membro superior, sendo, a partir daí, considerado paraplégico. Já o grau da lesão se refere ao comprometimento da medula. Para isso utilizamos a escala de Frankel, que classifica a lesão em cinco níveis, em diferentes estágios de completa e incompleta, recebendo letras de A a E, com o seguinte significado: • A (completa): não há força voluntária nem sensibilidade abaixo do nível da lesão. • B (incompleta): paciente apresenta sensibilidade, mas não tem nenhum controle motor abaixo do nível da lesão. • C (incompleta): apresenta sensibilidade e controle de força em alguns músculos abaixo do nível da lesão, no entanto sua maioria tem força menor que 3. 116 Unidade II • D (incompleta): apresenta sensibilidade e função motora preservada com maior parte dos músculos com força maior que 3 abaixo da lesão. • E (normal): funções motoras e sensitivas sem alteração. Portanto, a depender da resposta aos estímulos motores e sensoriais do paciente, podemos identificar se é uma lesão completa ou incompleta, e ainda graduar quão incompleta ela é. O paciente do nosso caso clínico foi classificado como paraplégico, pois sofreu lesão em nível medular abaixo de T1, especificamente nível medular T12 (com nível vertebral T10, segundo a regra de Peele). Além disso, era uma lesão incompleta letra C, pois, pela escala de Frankel, teve a sensibilidade preservada, porém alguns músculos abaixo da lesão que apresentavam força eram menores que grau 3. Observação A Asia estabeleceu que, para lesão medular, sempre usamos a denominação plegia, mesmo se a lesão for incompleta (tetraplegia ou paraplegia) (RUPP et al., 2021). 7.1.3 Quadro clínico O quadro clínico de quem sofre lesão medular varia de acordo com o nível da lesão e do grau de comprometimento. Vejamos agora o quadro clínico geral, com as principais características possíveis. Mostraremos também, a cada nível de lesão, como estaria o comprometimento motor do paciente. Assim que ocorre a lesão medular, o paciente se encontra na fase chamada choque medular, cuja fisiopatologia ainda é desconhecida. Acredita-se haver uma alteração nas sinapses diante da lesão das células nervosas, ocasionando ausência de controle motor e de sensibilidade, além de arreflexia abaixo do nível da lesão e alteração do sistema nervoso autônomo e do controle esfincteriano. Essa fase pode durar dias ou semanas, a depender da gravidade. Em seguida, de modo geral, pacientes com lesão do motoneurônio superior – ou seja, com lesão acima do cone medular – apresentam hiper-reflexia e hipertonia espástica. Já quem sofre lesão do motoneurônio inferior – lesão no cone medular para baixo – apresenta hiporreflexia e hipotonia. 117 TÓPICOS DE ATUAÇÃO PROFISSIONAL – FISIOTERAPIA Quadro 13 – Comprometimento motor de acordo com o nível de lesão medular Nível Comprometimento Entre C2 e C5 Paralisia de alguns ou de todos os músculos utilizados na respiração, do braço e da perna. É tipicamente fatal, a menos que se utilize ventilação mecânica Entre C5 e C6 Paralisia das pernas, do tronco e do punho. Fraqueza dos músculos que movem o ombro e o cotovelo Entre C6 e C7 Paralisia das pernas, do tronco e parte do punho e mão. Movimento normal dos ombros e cotovelos Entre C7 e C8 Paralisia das pernas, do tronco e das mãos Entre C8 e T1 Paralisia das pernas e do tronco; fraqueza dos músculos que movem dedo e mãos; síndrome de Hormer (pálpebra caída, uma pupila dilatada); movimentos possivelmente normais de ombros e cotovelos T2 e T4 Paralisia das pernas e do tronco; perda de sensação abaixo dos mamilos; movimento normal de ombros e cotovelos T5 e T8 Paralisia das pernas e do tronco inferior; perda da sensação abaixo da caixa torácica T11 e L1 Paralisia e perda de sensações nos quadris e nas pernas L2 e S2 Vários padrões de fraqueza e dormência nas pernas, a depender da altura exata da lesão S3 e S5 Dormência no períneo Como a medula conecta o SNC ao SNP, lesões nessa região podem gerar várias alterações e envolver outros sistemas além dos nervos, mas que dependem deles para funcionar. A seguir, as principais alterações num paciente com lesão medular: • Espasticidade: está presente em quem sofre lesão acima do cone medular (motoneurônio superior). A presença da hipertonia elástica acompanha hiper-reflexia dos reflexos tendinosos. • Alterações respiratórias: lesões acima de C4 acompanham paralisia diafragmática, e o paciente necessita de assistência ventilatória constante. Já quem sofre lesão cervical abaixo de C4 e/ou torácica alta pode ter insuficiência respiratória restritiva por paralisia da musculatura acessória da respiração. • Alterações vesicais: na fase aguda, a bexiga apresenta-se atônica com seus músculos detrusor e esfíncter flácidos, necessitando de cateterismo vesical a cada quatro horas para evitar complicações. Após o choque medular, o funcionamento vesical comporta o seguinte modo: • Lesão do motoneurônio superior: — Completa: paciente sem desejo miccional nem inibição voluntária da micção; reflexo cutâneo anal preservado. — Incompleta: paciente com desejo miccional, mas sem inibição voluntária da micção; reflexo cutâneo anal preservado. 118 Unidade II • Lesão do motoneurônio inferior: — No cone medular: paciente sem desejo nem controle miccional, com reflexo cutâneo anal ausente. É chamada de bexiga flácida, e o tônus da musculatura vesical é diminuído e pode apresentar algumas contrações do detrusor no intuito de esvaziar a bexiga plena, mas de magnitude pouco eficaz. — Lesão da cauda equina: acomete raízes de S2 a S4. O paciente pode apresentar acometimento de nervo sensitivo com bexiga paralítico-sensitiva. Desejo ausente e controle preservado, com reflexo cutâneo anal ausente. — Acometimento do nervo motor com bexiga paralítico-motora: desejo presente, sem controle preservado. Reflexo cutâneo anal ausente. • Alterações intestinais: o paciente com lesão medular apresenta diminuição do peristaltismo intestinal, com tendência à retenção fecal. • Alterações vasculares: na fase aguda, pacientes em repouso prolongado (como tetraplégicos) tornam-se predispostos a sofrer trombose venosa profunda, que pode evoluir para tromboembolismo pulmonar. Pacientes com lesão medular cervical e torácica alta apresentam funcionamento inadequado do sistema nervoso autônomo (SNA), o que pode repercutir clinicamente de duas formas: • Hipotensão ortostática: a disfunção do SNA leva à perda do tônus vascular diante de mudanças bruscas de posição, gerando um quadro de mal-estar e até síncope. • Crise autonômica hipertensiva: desencadeada por estímulos nociceptivos, sendo os mais importantes as distensões de vísceras ocas (bexiga cheia), gerando resposta equivocada do SNA e fazendo aparecer rubor e sudorese facial, bradicardia, cefaleia e hipertensão de instalação súbita. Alteração das funções sexuais Do ponto de vista do desejo sexual e da sexualidade, o paciente mantém sua identidade, porém passa por alterações do ponto de vista físico. Homens que apresentam lesão completa no motoneurônio superior mantêm a ereção reflexa; diante de lesão completa do motoneurônio inferior, apresentam ereção psicogênica (mais fugaz e de menor amplitude), e os pacientes incompletos apresentam ereções com ambos os componentes. Com exceção das lesões incompletas, a maioria dos pacientes apresenta deficiência ejaculatória. Durante a fase aguda, 50% das mulheres acometidas podem apresentar amenorreia temporária, voltando ao normal em seguida. A lesão medular não interfere nofuncionamento ginecológico/ obstétrico, portanto a fertilidade está preservada. 119 TÓPICOS DE ATUAÇÃO PROFISSIONAL – FISIOTERAPIA Úlceras de pressão São complicações de alta morbidade geralmente em pacientes sem sensibilidade preservada e que permanecem por muito tempo na mesma posição. A pele é comprimida em regiões com saliência óssea, prejudicando a circulação sanguínea, levando à isquemia e necrose da pele adjacente. Síndromes medulares São um conjunto de sinais e sintomas que aparecem nas lesões incompletas da medula e, de acordo com a região medular comprometida, apresentam características próprias do comprometimento das vias nervosas que por ali passam. Elas recebem o nome da região medular acometida. São estas: • Síndrome medular anterior: ocorre em lesões por hiperflexão e caracteriza-se pela perda motora completa e perda da discriminação de dor e temperatura abaixo do nível da lesão. A sensibilidade profunda (vibratória e noção da posição de partes do corpo no espaço) está preservada, e há vias que passam nessa região da medula e sofrem alteração, como: — corticoespinal anterior; — espinotalâmica anterior; — corticoespinal anterior; — espinotalâmica lateral; — espinocerebelares. • Síndrome medular posterior: lesão rara, geralmente associada a traumas em extensão. Envolve as colunas dorsais, perda da sensibilidade vibratória e de propriocepção; outras funções motoras e sensitivas estão normais. As vias envolvidas nessa síndrome são o fascículo grácil e o cuneiforme. • Síndrome medular central: lesão relacionada com o movimento de hiperextensão cervical (como chicote cervical), comprometendo a importante substância cinzenta cervical, enfraquecendo e atrofiando membros superiores, com menor envolvimento motor de membros inferiores e sem alteração sensitiva importante. A via envolvida é o trato corticoespinal lateral na porção responsável pelos membros superiores, a mais central do trato. • Síndrome de Brown-Séquard (hemissecção medular): lesão que atinge apenas um lado da medula, geralmente causada por arma branca, que resulta em déficit motor e de propriocepção ipsilateral à lesão e perda da sensibilidade térmica e dolorosa contralateral à lesão. As vias envolvidas são a corticoespinal anterior (homolateral), espinotalâmica anterior e lateral (contralateral) e fascículos grácil e cuneiforme (homolateral). • Síndrome do cone medular: lesão do cone medular cujo paciente apresenta plegia e sensibilidade comprometida abaixo da lesão, com anestesia em sela (região interna da perna, da coxa e das raízes sacrais), arreflexia de bexiga (bexiga flácida) e ausência de ereção reflexa. 120 Unidade II • Síndrome da cauda equina: a cauda equina faz parte do SNP, e lesões nessa região levam a um quadro clínico que dependerá da quantidade de raízes comprometidas. Pode apresentar anestesia, paralisia, hipotonia e comprometimento das funções urinária, intestinal e sexual. 7.1.4 Avaliação e diagnóstico cinesiológico-funcional A Asia elaborou uma escala para avaliar pacientes com lesão medular de forma padronizada. Com o nome da própria associação, através dela conseguimos identificar o nível neurológico da lesão, pois caracteriza o sistema sensitivo e motor, identifica se a lesão é completa ou incompleta (a escala de Frankel está inserida nela) e auxilia o fisioterapeuta a elaborar o diagnóstico cinético-funcional e analisar o prognóstico do paciente. É aplicada em cima da avaliação dos miótomos e verifica a força muscular e dos dermátomos, conferindo a sensibilidade tátil e dolorosa (RUPP et al., 2021). Figura 62 – Escala Asia Adaptada de: Rupp et al. (2021, p. 21). 121 TÓPICOS DE ATUAÇÃO PROFISSIONAL – FISIOTERAPIA Para avaliar dermátomos, usamos regiões-chave que representam o nível pretendido, sendo 28 no total. Confira o quadro a seguir para relembrá-los: Quadro 14 – Dermátomos-chave de cada nível medular Nível Dermátomo-chave Nível Dermátomo-chave C2 Protuberância occipital T8 T8 – rebordo costal C3 Fossa supraclavicular T9 T9 – 9º espaço intercostal C4 Articulação acromioclavicular T10 T10 – cicatriz umbilical C5 Borda lateral da fossa antecubital T11 T11 – região abaixo da cicatriz C6 Superfície dorsal da falange proximal do polegar T12 Linha média do ligamento inguinal C7 Superfície dorsal da falange proximal do dedo médio L1 Região inguinal (virilha) C8 Superfície dorsal da falange proximal do dedo mínimo L2 Face medial da coxa, mais internamente T1 T1 – borda medial da fossa antecubital L3 Côndilo femural medial, acima do joelho T2 T2 – ápice da axila L4 Maléolo medial T3 T3 – 3º espaço intercostal L5 Dorso do pé na terceira articulação metatarsofalângica T4 T4 – linha medioclavicular, 4° espaço intercostal, linha mamilar S1 Borda lateral do calcanhar T5 T5 – 5º espaço intercostal S2 Fossa poplítea T6 T6 – apêndice xifoide S3 Tuberosidade isquiática T7 T7 – 7º espaço intercostal S4 Região perianal Adaptado de: Rupp et al. (2021, p. 21). Para avaliar miótomos, usamos movimentos de músculos-chave que representam um nível medular. Temos cinco nos membros superiores e cinco nos inferiores: Quadro 15 – Dermátomos-chave de cada nível medular Nível Dermátomo-chave (superiores) Nível Dermátomo-chave (inferiores) C5 Flexores de cotovelo L2 Flexores de quadril C6 Extensores de punho L3 Extensores de joelho C7 Extensores de cotovelo L4 Dorsiflexores C8 Flexores de dedo (dedo médio) L5 Extensores do hálux T1 Abdutor de dedo mínimo S1 Flexores plantares Adaptado de: Rupp et al. (2021, p. 21). É necessário treinar para usar a escala Asia e entender suas regras, principalmente para avaliar a motricidade (miótomos) e a sensibilidade (dermátomos) do paciente com lesão medular. 122 Unidade II Saiba mais Confira as videoaulas a seguir para assimilar a escala Asia e exercitar seu conhecimento: NÍVEIS modulares e atividades/funções (aula completa) – lesão medular #2. 2018. 1 vídeo. (13min39s). Publicado pelo canal Neurofuncional. Disponível em: https://cutt.ly/XJxAcBO. Acesso em: 2 jun. 2022. ASIA – avaliação na lesão medular – TRM – gabarite questões de concurso. Prof Mara Ribeiro. Aula 1. 2020. 1 vídeo. (54min30s). Publicado pelo canal Prof Mara Ribeiro. Disponível em: https://cutt.ly/HJxS8qQ. Acesso em: 2 jun. 2022. 7.1.5 Abordagem fisioterapêutica Pacientes com lesão medular têm um quadro clínico complexo devido ao comprometimento de vários sistemas, não só do neuromuscular; portanto, é importante o acompanhamento de uma equipe multidisciplinar, que vise melhorar a qualidade de vida deles. Vejamos como a fisioterapia pode auxiliar na reabilitação de pacientes pós-choque medular. A fisioterapia engloba diversas atividades que devem se adequar às necessidades e potencialidades de cada paciente. Durante a avaliação, o fisioterapeuta deve observar os seguintes aspectos: • tônus muscular, verificando como a alteração deste influencia suas atividades; • ADM, identificando fatores que possam prejudicar o arco de movimento; • força muscular, testada através dos músculos-chave, observando os grupos musculares preservados; • função sensorial, verificando a recepção dos estímulos sensoriais pelos dermátomos; • alterações e padrões posturais; • atividade motora com ou sem independência; • atividades diárias, observando as dificuldades e o que se consegue fazer. A depender do nível neurológico da lesão, vários comprometimentos funcionais são possíveis, e para cada paciente devemos avaliar e identificar as alterações apresentadas, sem esquecer de avaliar os fatores ambientais, pois ele pode necessitar de adaptações em casa. Vejamos portanto, de forma geral, os principais pontos a que devemos nos ater durante essa avaliação. 123 TÓPICOS DE ATUAÇÃO PROFISSIONAL – FISIOTERAPIA Como foi mostrado, pacientes com lesão acima de C4 sofrem paralisia diafragmática e necessitam de assistência ventilatória constante. Então a fisioterapia tenta evitar complicações respiratórias usando manobras de tapotagem e
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