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MULHERES no Sistema Prisional MÓDULO 1 Atenção às mulheres presas EXPEDIENTE BY NC ND GOVERNO FEDERAL Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva Vice-Presidente da República Geraldo José Rodrigues Alckmin Filho Ministro da Justiça e Segurança Pública Flávio Dino de Castro e Costa Secretário da Secretaria Nacional de Políticas Penais – SENAPPEN Rafael Velasco Brandani Diretora da Escola Nacional de Serviços Penais – ESPEN Stephane Silva de Araújo Equipe ESPEN Haynara Jocely Lima de Almeida Italo Rodrigues dos Santos UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA Coordenação Geral Luciano Patrício Souza de Castro Financeiro Fernando Machado Wolf Consultoria Técnica EaD Giovana Schuelter Coordenação de Produção Caroline Daufemback Henrique Francielli Schuelter Coordenação de AVEA Andreia Mara Fiala Revisão Textual Supervisão: Evillyn Kjellin Victor Rocha Freire Silva Vivianne Oliveira Rodrigues Design Instrucional Supervisão: Milene Silva de Castro Joyce Regina Borges Design Gráfico Supervisão: Mary Vonni Meürer de Lima Airton Jordani Jardim Filho Cleber da Luz Monteiro Giovana Aparecida dos Santos Guilherme Comerão Stecca Almeida Julia Morato Leite Lucas Renata Cristina Gonçalves Sonia Trois Tiago Augusto Paiva Programação Supervisão: Alexandre Dal Fabbro Luan Rodrigo Silva Costa Luiz Eduardo Pizzinatto Audiovisual Supervisão: Rafael Poletto Dutra Angie Luiza Moreira de Oliveira Arthur Pereira Neves Dilney Carvalho da Silva Eduardo Corrêa Machado Kimberly Araujo Lazzarin Marcelo Vinícius Netto Spillere Marília Gabriela Salomao Dauer Maycon Douglas da Silva Apresentação Áureo Mafra de Moraes Conteúdo Carlos Rodrigo Martins Dias Todo o conteúdo do curso Mulheres no Sistema Prisional, da Secretaria Nacional de Políticas Penais do Ministério da Justiça e Segurança Pública do governo federal – 2022, está licenciado sob a Licença Pública Creative Commons Atribuição - Não Comercial - Sem Derivações 4.0 Internacional. Para visualizar uma cópia desta licença, acesse: https://creativecommons.org/licenses/by-nc-nd/4.0/deed.pt_BR. A partir de 1º de janeiro de 2023, o Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN) passou a ser denominado Secretaria Nacional de Políticas Penais (SENAPPEN), instituída pelo Art. 59 da Medida Provisória nº 1.154; porém, devido ao fato de o material deste curso ter sido produzido antes da vigência da referida medida provisória, há conteúdos em que a atual SENAPPEN é mencionada como DEPEN. É possível, ainda, que outros órgãos gover- namentais federais citados nos materiais, como ministérios, secretarias e departamentos, disponham de uma nova estrutura regimental e uma nova nomenclatura e sejam mencionados de maneira diferente da atual. ESCLARECIMENTO SUMÁRIO Apresentação ................................................................................................................................................6 Objetivos do módulo 6 Unidade 1: Breve histórico do aprisionamento feminino em contexto nacional ....................................................................................................................................9 1.1 Introdução 9 1.2 O que dizem alguns estudos sobre o sistema prisional feminino 11 1.3 O que dizem os dados do Sistema de Informação do Departamento Penitenciário Nacio- nal (SISDEPEN) 15 Unidade 2: Legislação vigente .........................................................................................22 2.1 O que diz a Constituição Federal 22 2.2 O que diz a Declaração Internacional dos Direitos Humanos 23 2.3 O que diz o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos 24 2.4 O que dizem as Regras de Mandela 24 2.5 O que dizem as Regras de Bangkok 26 2.6 O que diz a Lei de Execução Penal 26 2.7 O que diz a Lei n° 13.869, de 5 de setembro de 2019 27 2.8 O que diz a Portaria Interministerial nº 210, de 16 de janeiro de 2014 28 SUMÁRIO Síntese do módulo .............................................................................................................................. 36 Referências ....................................................................................................................................................37 MULHERES NO SISTEMA PRISIONAL MÓDULO 1 | Atenção às Mulheres Presas 6 APRESENTAÇÃO Olá, cursista! As administrações prisionais estaduais têm demonstrado certa preo- cupação relacionada à rotina penitenciária de mulheres em situação de prisão, no que concerne às previsões legais, em especial, às orientações trazidas pela Portaria Interministerial nº 210, de 16 de janeiro de 2014, que institui a Política Nacional de Atenção às Mulheres em Situação de Privação de Liberdade e Egressas do Sistema Prisional (PNAMPE). Ainda, com Nota Técnica nº 17/2020/DIAMGE/CGCAP/DIRPP/DEPEN/MJ, que trata dos procedimentos quanto à custódia de mulheres no sistema prisional brasileiro, essa preocupação fica evidente. Os referidos princípios legalísticos trouxeram aos estados orientações sobre como proceder na custódia de mulheres para garantir os direitos e, também, a segurança de todos, considerando, entretanto, o previsto na Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984, a Lei de Execução Penal. Diante desta realidade, o Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN) é a instituição responsável por promover e fomentar as políticas penitenciárias em território nacional. Cabe ao DEPEN e às instituições parceiras a formulação de orientações sobre os procedimentos que as unidades precisam executar para garantir dignidade, segurança e auxiliar os servidores na capacitação para compreensão das especificidades de mulheres em privação de liberdade. Este curso faz parte dessa trajetó- ria. Ele é uma continuidade dos estudos e mapeamentos já realizados. Por isso, apresentamos a você, servidor, o curso Atenção às Mulheres Presas. Objetivos do módulo • Tratar sobre as mulheres em situação de prisão, considerando a ne- cessidade de atenção específica durante o cumprimento de pena. • Apresentar um breve histórico do aprisionamento feminino em con- texto nacional, assim como a legislação vigente. MULHERES NO SISTEMA PRISIONAL MÓDULO 1 | Atenção às Mulheres Presas 7 • Expor a respeito do recebimento de mulheres em privação de liberdade e dos procedimentos de custódia. • Destacar a importância quanto à compreensão do conteúdo para que a custódia de mulheres aconteça em observância aos preceitos da Constituição Federal. UNIDADE 1 Breve histórico do aprisionamento feminino em contexto nacional MULHERES NO SISTEMA PRISIONAL MÓDULO 1 | Atenção às Mulheres Presas 9 1. BREVE HISTÓRICO DO APRISIONAMENTO FEMININO EM CONTEXTO NACIONAL Nesta unidade, trataremos o contexto histórico sobre a população fe- minina presa. Para tal, serão tratadas questões que envolvem a invisi- bilidade das especificidades femininas e, também, relações intramuros e extramuros de crianças que eventualmente acompanham suas mães em ambientes prisionais. 1.1 Introdução O Sistema de Informações do Departamento Penitenciário Nacional (SISDEPEN), de julho a dezembro de 2021, informa quantas pessoas presas existem no Brasil. Referente à tipificação criminal, as mulheres em situação de prisão respondem e incidem, majoritariamente (14.715 ou 55,86%), por tráfico de drogas, de acordo com a Lei n° 6.368/76 e a Lei n° 11.343/06. A maioria delas (13.711) possuem apenas o ensino fundamental incompleto. Com relação à composição da população por cor/raça, o SISDEPEN, de julho a dezembro de 2020, nos informa que do total de 670.714 pessoas presas com informações sobre raça/cor, têm-se os dados apre- sentados no infográfico a seguir. Assim, conclui-se que a maioria das pessoas presas são negras (homens e mulheres). Pessoas presas no Brasil Total: 670.714 Homens: 640.089 (95,43%) Mulheres: 30.625 (4,57%) MULHERES NO SISTEMA PRISIONAL MÓDULO 1 | Atenção às Mulheres Presas 10 Nesses termos, Borges (2019) chama a atençãopara o fato de que “Até os dias atuais, a questão da seletividade penal com o viés racial tem sido pouco levada em consideração [...]. Para a advogada e pesquisadora Winnie Bueno, pouco se fala sobre “seletividade racial [...]” (BORGES, 2019, p. 73). Os dados nos informam que a maioria da população encar- cerada é negra, pois segundo a definição do Estatuto da Igualdade Racial, a população negra é o conjunto de pessoas que se autodeclaram pretas ou pardas, conforme a definição do Instituto de Geografia e Estatística (IBGE), bem como a autodeclaração equivalente. Foto: © [rafapress] / Shutterstock. É importante mencionar que o Brasil dos séculos XVII e XIX nos legou como herança a compreensão política, filosófica e social de justiça cri- minal. Nessa lógica, Borges (2019) destaca que o código penal brasi- leiro, vigente entre 1500 e 1822, era regido pelas Ordenações Filipinas, que já trazia intersecções entre gênero, pertencimento racial (ex-escravi- zado), configuração de crime e cumprimento da pena, evidenciando que somente em 1830 a lei criminal no Brasil foi promulgada. 325.486 pardas (48,52%) 199.058 brancas (29,67%) 111.199 pretas (16,57%) 4.571 amarelas (0,68%) 1.537 indígenas (0,22%) Informações de raça/cor das pessoas presas MULHERES NO SISTEMA PRISIONAL MÓDULO 1 | Atenção às Mulheres Presas 11 1.2 O que dizem alguns estudos sobre o sistema prisional feminino Borges (2019), Davis (2018) e Varella (2017) nos ajudam na reflexão sobre as especificidades do cárcere feminino e reforçam o fato de que o cumprimento de pena precisa ser compreendido pela privação de liberdade. Portanto, os demais direitos inerentes à pessoa humana não devem ser ceifados pela sentença. A partir da lógica racial que estrutura as prisões, é relevante apontar que: “O sistema de justiça criminal é pouco discutido [...]. Com isso, esse tema arenoso e difícil de ser tratado na sociedade [...]. Acaba por ser deixado de lado [...].” (BORGES, 2019, p. 41). Algumas adequações ainda são necessárias para o acesso ao direito, o aprisionamento de mulheres, segundo a autora, guarda condições estru- turais que precisam ser observadas, principalmente porque os locais são desprovidos, em sua maioria, de equipes multiprofissionais para atendê-las, de áreas próprias para mulheres grávidas e de espaços para visita íntima. Nesse caminhar, as mulheres encarceradas sofrem uma dupla invisibili- dade – por estarem em situação de cárcere e pelo próprio fato de serem mulheres. Nesse sentido, Borges afirma que: “[...] As mulheres têm necessidades diferenciadas e esse uso de res- peito a um tratamento igual intensifica o contexto de violência a que essas mulheres são submetidas no contínuo desrespeito aos diretos humanos nas unidades prisionais.” (BORGES, 2019, p. 98). Juliana Borges, em seu livro “Encarceramento em Massa”, discorre sobre a estrutura racial do sistema de justiça criminal e sua colaboratividade com a lógica de controle social advinda do período escravocrata. Foto: Editora Jandaíra. MULHERES NO SISTEMA PRISIONAL MÓDULO 1 | Atenção às Mulheres Presas 12 Isso, principalmente quando são mulheres, Varella entende que: “De todos os tormentos do cárcere, o abandono é o que mais aflige as detentas. Cumprem suas penas esquecidas pelos familiares, amigos, maridos, e até pelos filhos [...]. A mulher é esquecida.” (VARELLA, 2017, p. 39). Somente após onze anos trabalhando em penitenciárias femininas, Varella (2017) constatou que mulheres realmente são invisibilizadas e necessitam de um tratamento penal que valorize a sua especificidade. Também é importante apontar que as mulheres que rompem com as normas sociais de convivência são tratadas com mais severidade por ingressar em um campo majoritariamente masculino (tráfico e/ou crime). Para a autora em destaque, ter pessoas presas se tornou algo tão co- mum que quando nos propomos a pensar sobre sistema prisional e, consequentemente em reformá-lo, prevalece a ideia de aumentar o número de vagas, excluindo a de implantar políticas penitenciárias de reinserção social – acesso a saneamento básico, saúde, educação, trabalho, Varella (2017), em seu livro “Prisioneiras”, reafirma que o encarceramento feminino no Brasil é repleto de complexidades que muitas vezes se tornam incompreensíveis. Assim, as pessoas que entram para o sistema prisional tornam-se cidadãos e cidadãs de segunda classe. Foto: Companhia das Letras. No livro “Estarão as Prisões Obsoletas?”, de Angela Davis, há a informação de que “O encarceramento em uma penitenciária era considerado algo humano – ou pelo menos muito mais humano [...]”. (DAVIS 2018, p. 43). Hoje, essa lógica pode ser verificada na ascensão das políticas públicas para mulheres, pois mostra que as suas especificidades estão sendo ponderadas durante o cumprimento da pena, ou seja, começa-se a entender que: “[...] as práticas nas penitenciárias femininas são marcadas pela questão de gênero [...]” (DAVIS, 2018, p. 66). Foto: © Grupo Editorial Record. MULHERES NO SISTEMA PRISIONAL MÓDULO 1 | Atenção às Mulheres Presas 13 acesso a bens sociais e/ou garantia da equidade social, ou até mesmo a ideia da inexistência de prisões. Assim, extrai-se que “Também é pre- ciso salientar que a punição não deixava de ter dimensões de gênero.” (DAVIS, 2018, p. 43). Ou seja, em alguns casos a punição era tão somente por ser uma mulher, depois agregavam-se as demais questões. Portanto, compreender o sistema prisional feminino implica adentrar em sua estrutura orgânica. Implica observar, reconhecer e absorver a sua dinâmica o máximo possível – desde as pessoas que laboram no sistema (servidores) até as pessoas que vivenciam o sistema prisional (mulheres em situação de prisão). Foto: © [Henrique Pereira] / G1. Por essa razão, o sistema prisional tem sido alvo de investimento significa- tivo por parte do poder público, especialmente quando se trata do cárcere feminino. Devido a esse fato, é fundamental destacar que, na realidade brasileira, há raros registros de rebeliões em penitenciárias femininas. QR CODE Aponte a câmera do seu dispositivo móvel (smartphone ou tablet) no QR Code ao lado para assistir ao vídeo sobre a visão de Davis no livro apresentado, e sua relação com o sistema prisional atual, ou acesse o link: https://youtu.be/UgLxkxnvLvo. https://youtu.be/UgLxkxnvLvo MULHERES NO SISTEMA PRISIONAL MÓDULO 1 | Atenção às Mulheres Presas 14 No entanto, mesmo atuando no sistema penal, conhecendo a realidade do dia a dia e, por mais que tenhamos acesso às informações referentes ao aprisionamento feminino, temos que nos colocar sempre na condição de aprendizes, pois: “Podemos pensar que sabemos como o sistema de justiça criminal funciona. A televisão está repleta de dramas ficcionais sobre polícia, crimes e promotores – programas como Law & Order. Assim como o noticiário policial, essas ficções tendem a se concentrar em histórias individuais de crime, vitimização e punição, e são tipicamente contadas do ponto de vista das autoridades de segurança pública. Um policial, um investigador ou um promotor carismático luta com seus próprios demônios enquanto tenta heroicamente resolver um crime horrível. Ele finalmente consegue uma vitória pessoal e moral ao encontrar o cara mau e jogá-lo na cadeia. Essa é versão feita para a TV do sistema de justiça criminal. Ela perpetua o mito de que a principal função do sistema é manter nossas ruas a salvo e nossos lares seguros ao caçar criminosos e puni-los [...]. Aqueles que foram sugados pelo sistema de justiça criminal sabem que o modo como o sistema de fato funciona guarda pouca semelhança com o que acontece na televisão ou nos filmes.” (ALEXANDER, 2017, p. 109). As mulheres em privação de liberdade, conforme legislação vigente, têm os mesmos direitos que qualquer outra mulher. Para tanto, os pro- fissionais que atuam na área prisional feminina devem analisar o perfil dessasmulheres, levando em consideração, entre outras questões: a sua condição de vulnerabilidade no tocante ao acesso da população à prevenção, tratamento e cuidados específicos em saúde; o acesso à educação e ao trabalho; a alocação adequada; a proteção a qualquer tipo de violência; o acesso a itens de higiene específicos; e a manutenção de vínculos entre mãe e filhos. Essas necessidades e direitos serão ampla- mente aludidos neste curso. MULHERES NO SISTEMA PRISIONAL MÓDULO 1 | Atenção às Mulheres Presas 15 SAIBA MAIS Para ter acesso à Nota Técnica nº 17/2020, produzida pela Coordenação de Atenção às Mulheres e Grupos Específicos, vinculada à Coordenação-Geral da Cidadania e Alternavas Pe- nais, da Diretoria de Políticas Penitenciárias, do Departamento Penitenciário Nacional, clique no link, disponível em: https:// www.gov.br/depen/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/ notas-tecnicas/procedimentos-com-custodiados/Procedimen- tos%20quanto%20a%20custodia%20de%20mulheres%20 no%20sistema%20prisional%20brasileiro.pdf/view. 1.3 O que dizem os dados do Sistema de Informação do Departamento Penitenciário Nacional (SISDEPEN) Ao conhecer o sistema prisional feminino, aprendemos que se trata de um tema de extrema relevância, polêmico e interseccional, por agregar questões sensíveis e caras à sociedade brasileira, tais como: gênero, faixa etária, pessoas com deficiência, etnia, classe social, nacionalidade, escolaridade, maternidade, tipificação penal, entre outros aspectos im- portantes e presentes no encarceramento de mulheres. Entendendo que a intersecção é a sobreposição e o cruzamento dos sistemas de opressão vigentes, ou seja: “A interseccionalidade investiga como as relações interseccionais de poder influenciam as relações sociais em sociedades marcadas pela diversidade, bem como as experiências individuais na vida cotidiana. Como ferramenta analítica, a interseccionalidade considera que as categorias de raça, classe, gênero, orientação sexual, nacionalidade, capacidade, etnia e faixa etária – entre outras – são inter-relacionadas e moldam-se mutuamente. A interseccionalidade é uma forma de entender e explicar a complexidade do mundo, das pessoas e das experiências humanas.” (COLLINS, 2021, p. 15). Assim, apesar de já termos apresentado alguns dados, mas diante da necessidade de elucidarmos fatores interseccionais presentes no cárcere feminino, seguem os exemplos de como o aprisionamento de mulheres está configurado. Tipificação penal É como se chama o ato de dizer qual é o tipo de crime que a pessoa cometeu, descrevendo o ilícito e apontando o código (ou lei) que se aplica à conduta. https://www.gov.br/depen/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/notas-tecnicas/procedimentos-com-custodiados/Procedimentos%20quanto%20a%20custodia%20de%20mulheres%20no%20sistema%20prisional%20brasileiro.pdf/view https://www.gov.br/depen/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/notas-tecnicas/procedimentos-com-custodiados/Procedimentos%20quanto%20a%20custodia%20de%20mulheres%20no%20sistema%20prisional%20brasileiro.pdf/view https://www.gov.br/depen/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/notas-tecnicas/procedimentos-com-custodiados/Procedimentos%20quanto%20a%20custodia%20de%20mulheres%20no%20sistema%20prisional%20brasileiro.pdf/view https://www.gov.br/depen/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/notas-tecnicas/procedimentos-com-custodiados/Procedimentos%20quanto%20a%20custodia%20de%20mulheres%20no%20sistema%20prisional%20brasileiro.pdf/view https://www.gov.br/depen/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/notas-tecnicas/procedimentos-com-custodiados/Procedimentos%20quanto%20a%20custodia%20de%20mulheres%20no%20sistema%20prisional%20brasileiro.pdf/view MULHERES NO SISTEMA PRISIONAL MÓDULO 1 | Atenção às Mulheres Presas 16 Quantidade de mulheres privadas de liberdade 9.530 7.865 6.864 6.759 6.659 3.960 562 81 8 a 24 anos 25 a 29 anos 30 a 34 anos 35 a 45 anos 46 a 60 anos 61 a 70 anos Mais de 70 anos Não informado Deficiência intelectual Deficiência física Deficiência física: cadeirantes Deficiência auditiva Deficiência visual Deficiências múltiplas 106 8 28 64 17 3 Brasileira nata 34.584 626 7.070 Brasileira naturalizada Sem informação Branca 9.933 Preta 5.165 Parda 15.906 Amarela 148 Indígena 116 Não informado 11.012 Fa ix a et ár ia D ef ici ên cia Na cio na lid ad e Co r d e pe le , ra ça , e tn ia MULHERES NO SISTEMA PRISIONAL MÓDULO 1 | Atenção às Mulheres Presas 17 Também, trataremos da Lei nº 11.343, de agosto de 2006 (conhecida como Lei de Drogas, Lei Antidrogas ou Lei de Tóxicos), pois não é viável nos permitir falar sobre o encarceramento feminino sem falar de como essa lei mudou a trajetória do aprisionamento de mulheres. Após aprovação, em 2006, da Lei Nº 11.343 (Lei de Drogas), o tráfico de drogas tem sido o maior responsável pelo aumento massivo de mulheres presas. É importante refletir sobre o fato de que a Lei nº 11.343 não visualiza o tráfico de drogas de forma orgânica e totalizante, desconsiderando seu efeito eco- nômico ao atingir traficantes de baixo potencial. MULHERES NO SISTEMA PRISIONAL MÓDULO 1 | Atenção às Mulheres Presas 18 Nesse sentido, o resultado tem sido a criminalização de grupos vulne- ráveis sociais em que as mulheres são maioria. Nesses termos, em uma lógica reflexiva, o encarceramento de pessoas de menor potencial ofensivo contribui para o aumento de mulheres presas. A seguir, seguem dados quantitativos sobre a incidência criminal de mulheres em privação de liberdade no sistema prisional brasileiro. MULHERES NO SISTEMA PRISIONAL MÓDULO 1 | Atenção às Mulheres Presas 19 QR CODE Aponte a câmera do seu dispositivo móvel (smartphone ou tablet) no QR Code ao lado para assistir a animação sobre o impacto da Lei de Drogas no encarceramento feminino, ou acesse o link: https://youtu.be/We9QFLxDAtg. Como vimos até aqui, o número de mulheres presas é inferior ao número de homens na mesma situação. No entanto, é preciso considerar que o sistema prisional é marcado por discriminações de gênero, fazendo com que as condições do encarceramento sejam vivenciadas pelas mulheres de forma mais severa e excludente. Os efeitos do encarceramento femi- nino geram graves consequências – pessoais e sociais. No campo pessoal, temos a extensão da pena à família – rompimento de laços familiares e afetivos. No campo social, é preciso fortalecer as políticas públicas que auxiliam na reinserção social dessas mulheres. Tipos Penais Crimes contra a pessoa 3.526 Crimes contra o patrimônio 7.179 Crimes contra a dignidade sexual 863 Crimes contra a paz pública 632 Crimes contra a fé pública 203 Crimes contra a administração pública 62 Drogas (Lei 6.368/76 e Lei 11.343/06) 17.134 Estatuto do Desarmamento 588 Crimes de trânsito (Lei 9.503/97) 89 Legislação específica – outros 626 https://youtu.be/We9QFLxDAtg MULHERES NO SISTEMA PRISIONAL MÓDULO 1 | Atenção às Mulheres Presas 20 SAIBA MAIS As políticas públicas se traduzem como acesso ao trabalho, à educação, à moradia, à saúde etc. Algumas dessas ações estão previstas na Portaria Interministerial nº 210, de 16 de janeiro de 2014, nas Regras das Nações Unidas para o tratamento de mu- lheres presas e medidas não privativas de liberdade para mulhe- res infratoras (Regras de Bangkok), na Declaração Internacional de Direitos Humanos e na Lei nº 7.210 (LEP), de 11 de julho de 1984. Para conhecer todos os dados sobre mulheres que foram coletados no último ciclo do SISDEPEN (11º Ciclo), acesse o site, disponível em: https://www.gov.br/depen/pt-br/servicos/sisde- pen/mais-informacoes/relatorios-infopen/relatorios-analiticos/ br/brasil-dez-2021.pdf. https://www.gov.br/depen/pt-br/servicos/sisdepen/mais-informacoes/relatorios-infopen/relatorios-analiticos/br/brasil-dez-2021.pdf https://www.gov.br/depen/pt-br/servicos/sisdepen/mais-informacoes/relatorios-infopen/relatorios-analiticos/br/brasil-dez-2021.pdfhttps://www.gov.br/depen/pt-br/servicos/sisdepen/mais-informacoes/relatorios-infopen/relatorios-analiticos/br/brasil-dez-2021.pdf UNIDADE 2 Legislação vigente MULHERES NO SISTEMA PRISIONAL MÓDULO 1 | Atenção às Mulheres Presas 22 2. LEGISLAÇÃO VIGENTE É visível e assertivo dizer que o Estado brasileiro apoia e fomenta políticas públicas visando a melhoria do encarceramento feminino. Portanto, nessa unidade, trataremos dos principais dispositivos que nor- teiam a atenção específica dada às mulheres em privação de liberdade. É nessa via que citaremos a Constituição Brasileira, a Lei de Execução Penal, a Declaração Internacional dos Direitos Humanos, o Pacto Inter- nacional dos Direitos Civis e Políticos, a Portaria Interministerial nº 210, de 16 de janeiro de 2014 e seus desdobramentos, as Regras das Nações Unidas para o tratamento de mulheres presas e medidas não privativas de liberdade para mulheres infratoras (Regras de Bangkok) e a Lei do Abuso de Autoridade. Também será mencionada a Nota Técnica nº 17/2020, produzida pela Coordenação de Atenção às Mulheres e Grupos Específicos do Depar- tamento Penitenciário Nacional do Ministério da Justiça e Segurança Pública, que trata dos procedimentos de custódia direcionados para mulheres em situação de prisão. 2.1 O que diz a Constituição Federal A Constituição Federal (CF), também conhecida como Constituição Cidadã, é a atual Carta Magna do Brasil. Lançada em 5 de outubro de 1988, é ela quem serve de diretriz para criação das demais legislações em nosso país. Foto: © [Appreciate] / Shutterstock. MULHERES NO SISTEMA PRISIONAL MÓDULO 1 | Atenção às Mulheres Presas 23 A Constituição Cidadã, além de tratar da organização dos poderes e da democracia, traz uma série de direitos fundamentais a todo cidadão brasileiro e aos estrangeiros residentes no Brasil. Assim, a CF de 88, em seu art. 3º, inciso IV, expressa o seguinte: “Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Fede- rativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; II - garantir o desenvolvimento nacional; III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.” (BRASIL, 1988, grifo nosso). Também, ainda com fito de garantir a cidadania, a Constituição Federal estabelece em seu art. 5º: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.” (BRASIL, 1988). 2.2 O que diz a Declaração Internacional dos Direitos Humanos A Declaração Internacional dos Direitos Humanos diz em seu artigo 2º que: “Todo ser humano tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos nesta Declaração, sem distinção de qual- quer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição.” (ONU, 1948, grifo nosso). MULHERES NO SISTEMA PRISIONAL MÓDULO 1 | Atenção às Mulheres Presas 24 É importante destacar que, em seu art. 5º, é taxativa ao reprovar a pos- sibilidade de maus tratos: “Ninguém será submetido à tortura, nem a tratamento ou castigo cruel, desumano ou degradante.” (ONU, 1948). 2.3 O que diz o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos O Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos é um ato internacional, promulgado em 6 de julho de 1992, por meio do Decreto nº 592, o qual reconhece não somente as liberdades civis e políticas, mas também os direitos econômicos, sociais e culturais do ser humano. Há de se destacar o que diz o artigo 17 do Pacto: “1. Ninguém poderá ser objeto de ingerências arbitrárias ou ilegais em sua vida privada, em sua família, em seu domicílio ou em sua correspondência, nem de ofensas ilegais às suas honra e reputação. 2. Toda pessoa terá direito à proteção da lei contra essas ingerências ou ofensas.” (BRASIL, 1992). 2.4 O que dizem as Regras de Mandela As Regras de Mandela estabelecem parâmetros para o tratamento destinado a pessoas presas. Apesar de sua contribuição significativa, permaneceu sem edição por 55 anos. No entanto, em maio de 2015, as Nações Unidas oficializaram um novo quadro de normas, incorporando novas doutrinas de direitos humanos no sistema penal. Foto: cnj.jus.br. MULHERES NO SISTEMA PRISIONAL MÓDULO 1 | Atenção às Mulheres Presas 25 SAIBA MAIS O nome do referido normativo é uma homenagem ao presidente sul-africano Nelson Rolihlahla Mandela, que experienciou o cár- cere por 27 anos. Para conhecer na íntegra as Regras de Mandela, entre no site, disponível em: https://www.cnj.jus.br/wp-content/ uploads/2019/09/a9426e51735a4d0d8501f06a4ba8b4de.pdf. As Regras de Mandela trazem regulamentos adequados para o tra- tamento dos reclusos e na gestão dos estabelecimentos prisionais. Embora sua abrangência seja geral, ou seja, para toda a população carcerária, faz orientações sobre a custódia de mulheres. Assim sendo, as Regras de Mandela estabelecem que: “Regra 48 2. Os instrumentos de restrição não devem ser utilizados em mulheres em trabalho de parto, nem durante e imediatamente após o parto. Regra 58 2. Onde forem permitidas as visitais conjugais, este direito deve ser garantido sem discriminação, e as mulheres presas exercerão este direito nas mesmas bases que os homens. Devem ser instaurados procedimentos, e locais devem ser disponibilizados, de forma a garantir o justo e igualitário acesso, respeitando-se a segurança e a dignidade. Regra 81 3. As presas devem ser atendidas e supervisionadas somente por agentes femininas. Entretanto, isso não impede que membros homens da equipe, especialmente médicos e professores, desempenhem suas atividades profissionais em unidades prisionais ou nas áreas desti- nadas a mulheres.” (UNODC, 2015, grifo nosso). https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2019/09/a9426e51735a4d0d8501f06a4ba8b4de.pdf https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2019/09/a9426e51735a4d0d8501f06a4ba8b4de.pdf MULHERES NO SISTEMA PRISIONAL MÓDULO 1 | Atenção às Mulheres Presas 26 2.5 O que dizem as Regras de Bangkok As Regras de Bangkok atentam-se para a especificidade de mulheres presas, considerando a alocação, a higiene pessoal, os cuidados à saúde, o atendi- mento médico específico, os cuidados com a saúde mental, a prevenção de doenças sexualmente transmissíveis, as revistas, os instrumentos de contenções, a capacitação adequada de servidores do sistema penal, os cuidados especiais com gestantes, lactantes, estrangeiras, minorias, povos indígenas e pessoas com deficiência. Posto isto: “Observações preliminares 1 – As Regras mínimas para o tratamento de reclusos se aplicam a todos as pessoas sem discriminação; portanto, as necessidades e realidades específicas dessa população, incluindo mulheres presas, devem ser tomadas em consideração na sua aplicação. As Regras, adotadas há mais de 50 anos, não projetavam, contudo, atenção suficiente às necessidades específicas das mulheres. Com o aumento da população presa feminina ao redor do mundo, a necessidade de trazer mais clareza às considerações que devem ser aplicadas no tratamento de mulheres presas adquiriu importância e urgência.” (BRASIL, 2016). 2.6 O que diz a Lei de Execução Penal A Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984, instituiu a famosa Lei de Execução Penal (LEP), que rege os principais aspectos relacionados à execução da pena. Inclusive, a LEP é uma garantidora da dignidade da pessoa humana. Nesse quesito, é importante saber o teor dos artigos 10 e 11: As Regras das Nações Unidas para o Tratamento de Mulheres Presas e Medidas Não Privativas de Liberdade para Mulheres Infratoras – Regras de Bangkok, somam-se aos parâmetros legais que traçam estratégias e recomendaçõespara mulheres em situação de prisão, dando robustez a todo arcabouço de regramentos nacionais e internacionais. Foto: cnj.jus.br. MULHERES NO SISTEMA PRISIONAL MÓDULO 1 | Atenção às Mulheres Presas 27 “Art. 10. A assistência ao preso e ao internado é dever do Estado, objetivando prevenir o crime e orientar o retorno à convivência em sociedade. Parágrafo único. A assistência estende-se ao egresso. Art. 11. A assistência será: I - material; II - à saúde; III -jurídica; IV - educacional; V - social; VI - religiosa.” (BRASIL, 1984). 2.7 O que diz a Lei n° 13.869, de 5 de setembro de 2019 A Lei n° 13.869/19, também conhecida por Lei do Abuso de Autoridade, define os crimes que os agentes públicos cometem no exercício de suas funções. São aqueles crimes praticados pelos agentes públicos com o fim de prejudicar outra pessoa, se beneficiar ou contribuir de maneira injusta a um terceiro. Nesse termo, o artigo 21 postula que é crime: “Manter presos de ambos os sexos na mesma cela ou espaço de confinamento: Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.” (BRASIL, 2019). Sobre a mesma lei, é importante ressaltar o que se afirmou sobre a exi- bição do corpo da pessoa presa: “Art. 13. Constranger o preso ou o detento, mediante violência, grave ameaça ou redução de sua capacidade de resistência, a: I - exibir-se ou ter seu corpo ou parte dele exibido à curiosidade pública;” (BRASIL, 2019, grifo nosso). MULHERES NO SISTEMA PRISIONAL MÓDULO 1 | Atenção às Mulheres Presas 28 2.8 O que diz a Portaria Interministerial nº 210, de 16 de janeiro de 2014 Para entendermos as orientações vigentes e constantes na Portaria Interministerial nº 210, de 16 de janeiro de 2014, que institui a Política Nacional de Atenção às Mulheres em Situação de Privação de Liberdade e Egressas do Sistema Prisional (PNAMPE) é necessário fazermos um recuo temporal. A partir de 2011, podemos observar que as ações do DEPEN que versam sobre o encarceramento de mulheres ficaram mais incisivas com a efetivação do projeto “Direitos das Mulheres no Sistema Penal”. Esse projeto considerava as especificidades do gênero para, assim, promover a igualdade de gênero e combater a invisibilização que se encontrava a mulher no sistema prisional à época. No ano seguinte, 2012, dando continuidade as ações, o DEPEN instruiu a Comissão Especial do Projeto Mulheres por meio da Portaria nº 154, de 13 de abril. A comissão começou a trabalhar na formulação de novos indicadores, tendo resultado na criação do Infopen Mulheres. Ainda em 2012, foi instruído, por meio da Portaria MJ nº 885, de 22 de maio de 2012, um Grupo de Trabalho Interministerial (GTI). O GTI era composto por 11 ministérios, pela sociedade civil e por convidados eventuais. 2012 2011 2014 Em 16 de janeiro de 2014, como resultado de todas as discussões que pautavam o sistema penal feminino, ocorreu a elaboração e publicação da Portaria Interministerial nº 210/2014, que instituiu a PNAMPE. MULHERES NO SISTEMA PRISIONAL MÓDULO 1 | Atenção às Mulheres Presas 29 Depois da publicação da PNAMPE, houve a necessidade de constituição de um comitê gestor, destacando-se o seguinte: “Art. 10 - Fica instituído, no âmbito do Ministério da Justiça, o Comitê Gestor da PNAMPE, só decretado em 2019, para fins de monitoramento e avaliação de seu cumprimento. Art. 13 - O DEPEN e a Secretaria de Políticas para as Mulheres ob- servarão a PNAMPE na celebração de convênios e nos repasses de recursos aos órgãos e entidades federais e estaduais do sistema prisional brasileiro.” (BRASIL, 2014). A criação do Comitê Gestor da PNAMPE foi crucial para a implementação efetiva da política. A regularidade e atuação desse comitê não só traz o público à tona nos respectivos órgãos, como possibilita articulação intersetorial e planejamento de atividades conjuntas. Atualmente, o Comitê Gestor da PNAMPE, conforme o Decreto nº 9.871, de 27 de junho de 2019, é composto por representantes, titulares e suplentes do Departamento Penitenciário Nacional e pela Secretaria Nacional de Políticas para as Mulheres do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, conforme segue: “Art. 3º O Comitê Gestor da Política Nacional de Atenção às Mulheres em Situação de Privação de Liberdade e Egressas do Sistema Prisional é composto por representantes dos seguintes órgãos: I - cinco do Departamento Penitenciário Nacional do Ministério da Justiça e Segurança Pública, um dos quais o coordenará; e II - dois da Secretaria Nacional de Políticas para as Mulheres do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. § 1º Cada membro do Comitê Gestor da Política Nacional de Atenção às Mulheres em Situação de Privação de Liberdade e Egressas do Sis- tema Prisional terá um suplente, que o substituirá em suas ausências e impedimentos.” (BRASIL, 2019). MULHERES NO SISTEMA PRISIONAL MÓDULO 1 | Atenção às Mulheres Presas 30 Segundo o Decreto nº 9.871/2019, o Comitê Gestor passou a ser coor- denado, exclusivamente, por um dos membros do DEPEN. À Secretaria Nacional de Políticas para as Mulheres (SNPM), cabe promover a arti- culação institucional, especialmente com os organismos estaduais de políticas para as mulheres, que devem integrar as estruturas gestoras das políticas estaduais, e promover a transversalidade de gênero na gestão da política. Ao DEPEN, cabe o fomento às políticas prisionais estaduais por meio do Fundo Penitenciário Nacional, articulação das políticas nacionais na perspectiva de gênero, e a articulação institucional com as secretarias estaduais de administração prisional e demais órgãos voltados à execução penal. PODCAST Na atualidade, dentro da organicidade do DEPEN, existe a Coordenação de Atenção às Mulheres e Grupos Específicos (COAMGE), fomentadora de ações que visam a efetiva implemen- tação da Portaria Interministerial nº 210, de 16 de janeiro de 2014, responsável por instituir a Política Nacional de Atenção às Mu- lheres em Situação de Privação de Liberdade e Egressas do Sistema Prisional (PNAMPE). A portaria também incentiva e orienta os sistemas prisionais a implementarem políticas pró- prias de atenção às mulheres em situação de prisão. Desse modo, a PNAMPE pauta-se em parâmetros que favorecem e fomentam a adoção de normas e procedimentos adequados às especificidades das mulheres no tocante a: gênero, idade, etnia, cor/raça, sexualidade, orientação sexual, nacionalidade, escolaridade, maternidade, religiosidade, deficiências física e mental, entre outros aspectos. Ressalta-se que essa política tem entre suas principais metas a garantia de estrutura física de unidades prisionais adequada à dignidade da mulher em situação de prisão, conforme a Resolução nº 9, de 18 de novembro de 2011, do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), que versa sobre a necessidade de aperfeiçoamento das diretrizes para elaboração de projetos, construção, reforma e ampliação de unidades penais no Brasil. Considerando o cuidado dedicado às especificidades das mulheres em situação de prisão, destaca-se que: MULHERES NO SISTEMA PRISIONAL MÓDULO 1 | Atenção às Mulheres Presas 31 “O MINISTRO DE ESTADO DA JUSTIÇA E A MINISTRA DE ES- TADO-CHEFE DA SECRETARIA DE POLÍTICAS PARA AS MU- LHERES DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA, no uso das atribuições previstas no art. 87, parágrafo único, inciso II, da Constituição, e tendo em vista o disposto nos arts. 10, 14, § 3º, 19, parágrafo único, 77, § 2º, 82, § 1º, 83, §§ 2º e 3º, e 89 da Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984, resolvem: Art. 1º - Fica instituída a Política Nacional de Atenção às Mulheres em Situação de Privação de Liberdade e Egressas do Sistema Prisio- nal - PNAMPE, com o objetivo de reformular as práticas do sistema prisional brasileiro, contribuindo para a garantia dos direitos das mulheres, nacionais e estrangeiras, previstos nos arts. 10, 14, § 3º, 19, parágrafo único, 77, § 2º, 82, § 1º, 83, §§ 2º e 3º, e 89 daLei nº 7.210, de 11 de julho de 1984.” (BRASIL, 2014). É atribuição da Política de Atenção à Mulher Presa planejar, articular e propor ações e projetos de forma a valorar a humanidade das mulheres privadas de liberdade e egressas dos sistemas penitenciário e prisional brasileiro, portanto: “Art. 4º - São metas da PNAMPE: I - Criação e reformulação de bancos de dados em âmbito estadual e nacional sobre o sistema prisional, que contemplem: a) quantidade de estabelecimentos femininos e mistos que custo- diam mulheres, indicando número de mulheres por estabelecimento, regime e quantidade de vagas; b) existência de local adequado para visitação, frequência e procedi- mentos necessários para ingresso do visitante social e íntimo; c) quantidade de profissionais inseridos no sistema prisional feminino, por estabelecimento e área de atuação; d) quantidade de mulheres gestantes, lactantes e parturientes; MULHERES NO SISTEMA PRISIONAL MÓDULO 1 | Atenção às Mulheres Presas 32 e) quantidade e idade dos filhos em ambiente intra e extramuros, bem como pessoas ou órgãos responsáveis pelos seus cuidados; f) indicação do perfil da mulher privada de liberdade, considerando estado civil, faixa etária, cor ou etnia, deficiência, nacionalidade, religião, grau de instrução, profissão, rendas mensais da família an- terior ao aprisionamento e atual, documentação civil, tempo total das penas, tipos de crimes, procedência de área rural ou urbana, regime prisional e reiteração criminal; g) quantidade de mulheres inseridas em atividades laborais internas e externas e educacionais, formais e profissionalizantes; h) quantidade de mulheres que recebem assistência jurídica regular, da Defensoria Pública, outro órgão ou advogado particular, e frequ- ência desses procedimentos na unidade prisional; i) quantidade e motivo de óbitos relacionados à mulher e à criança, no âmbito do sistema prisional; j) dados relativos à incidência de hipertensão, diabetes, tuberculose, hanseníase, Doenças Sexualmente Transmissíveis - DST, Síndrome da Imunodeficiência Adquirida - AIDS-HIV e outras doenças; k) quantidade de mulheres inseridas em programas de atenção à saúde mental e dependência química; l) quantidade e local de permanência das mulheres internadas em cumprimento de medidas de segurança e total de vagas; e m) quantidade de mulheres que deixaram o sistema prisional por motivos de alvará de soltura, indulto, fuga, progressão de regime ou aplicação de medidas cautelares diversas da prisão.” (BRASIL, 2014). Diante de todo o mencionado até agora, é imperativo aludir às ações implementadas pelo Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN) por meio da Coordenação de Atenção às Mulheres e Grupos Específicos para a efetivação dos direitos das mulheres no sistema carcerário, a exemplo: MULHERES NO SISTEMA PRISIONAL MÓDULO 1 | Atenção às Mulheres Presas 33 • Desde a aprovação do Habeas Corpus Coletivo 143.641/SP, o DEPEN vem tomando medidas que viabilizem a sua aplicação – levantamento de dados sobre mulheres que foram colocadas em prisão domiciliar nos anos de 2018, 2019 e 2020, bem como articulação com as defen- sorias públicas, para requerer a prisão domiciliar das mulheres reclusas, que atendiam aos critérios do habeas corpus coletivo. • • • • Foto: © [Tânia Rêgo] / Ag. Brasil. • Formalização de acordos de cooperação técnica com a Secretaria Nacional de Políticas para Mulheres e a Secretaria Nacional de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, para oferta de cursos direcionados a servidores da execução penal, priorizando a custódia de mulheres e a qualificação das ações. • • • Foto: © [Tânia Rêgo] / Ag. Brasil. MULHERES NO SISTEMA PRISIONAL MÓDULO 1 | Atenção às Mulheres Presas 34 • Contratação de consultores do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), para auxiliar os estados na construção dos seus Planos Estaduais de Atenção às Mulheres Privadas de Liberdade e Egressas do Sistema Prisional (ciclo 2021-2023). Os planos contêm metas e ações que garantem que esse público não tenha os seus direitos violados, e tenha acesso às políticas públicas para o enfrentamento das suas vulnerabilidades. • • • • • Fonte: coopavam. • Doação de veículos adaptados aos órgãos estaduais de administração prisional de uso exclusivo ao transporte de mulheres privadas de liber- dade – em período gestacional, parturientes, idosas, com deficiência – e de crianças que acompanham as mães no sistema prisional; e doação de equipamento de segurança para transporte de crianças (bebê conforto). • • • • • • • Foto: © A crítica. MULHERES NO SISTEMA PRISIONAL MÓDULO 1 | Atenção às Mulheres Presas 35 • Com a intenção de colaborar com a oferta de atividades que estimulem o aleitamento materno, assim como a implementação de um ambiente lúdico para o melhor desenvolvimento infantil e o fortalecimento do vínculo mãe e filho, o DEPEN realizou a doação de itens para apare- lhamento de salas de aleitamento e brinquedoteca, entre 2017 e 2019. • • • • • • Foto: DEPEN, MG. Veja a seguir uma retomada dos principais pontos abordados neste módulo. SÍNTESE DO MÓDULO 36 Neste módulo do curso, foram abordadas questões relativas ao aprisio- namento de mulheres e suas nuances. Na Unidade 1, foram apresentados alguns estudos sobre o aprisionamento de mulheres no Brasil e o que dizem os dados coletados pelo Departa- mento Penitenciário Nacional, por meio do Sistema de Informação do Departamento Penitenciário Nacional (SISDEPEN). Na oportunidade, apresentamos uma evolução sobre o aprisiona- mento feminino que passa desde a invisibilidade dos corpos femini- nos até o reconhecimento de necessidade de atendimento específico, considerando, inclusive, as crianças filhas de mulheres presas. Na Unidade 2, abordamos as legislações, os pactos e acordos interna- cionais dos quais o Brasil é signatário. Compreender esses normativos traz às mulheres presas a possibilidade do acesso ao que é de direito, considerando as especificidades do universo feminino. Diante dos normativos expostos, em especial a Política Nacional de Atenção às Mulheres em Situação de Privação de Liberdade e Egressas do Sistema Prisional (PNAMPE), publicada por meio da Portaria Interminis- terial nº 210, de 16 de janeiro de 2014, é possível direcionar não somente para o reconhecimento da necessidade de atendimento diferente do dado à pessoa presa masculina, mas também à execução de atividades previstas em diretrizes, objetivos e metas que visam a consolidação da individualização da pena, considerando os corpos femininos, e também a emancipação e autonomia da mulher egressa. Você finalizou o Módulo 1! No próximo módulo, trataremos sobre a atenção específica às mulheres em situação de prisão. REFERÊNCIAS ALEXANDER, M. A nova segregação: racismo e encarceramento em massa. São Paulo: Boitempo, 2017. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Promulgada em 5 de outubro de 1988. Organização do texto: Juarez de Oliveira. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1990. 168 p. (Série Legislação Brasileira). BRASIL. Lei nº 7210, de 11 de julho de 1984. Institui a Lei de Execução Penal. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, p. 10.227, 13 jul. 1984. PL 1656/1984. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/ l7210.htm. Acesso em: 22 jul. 2022. BRASIL. Decreto-Lei nº 592, de 6 de julho de 1992. Pacto internacional sobre direitos civis e políticos. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, p. 8.716, 7 jul. 1992. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/ decreto/1990-1994/d0592.htm. Acesso em: 10 ago. 2022. BRASIL. Portaria Interministerial nº 210, de 16 de janeiro de 2014. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, p. 75, 16 jan. 2014. Disponível em: https://carceraria.org.br/wp-content/uploads/2018/01/documento-por- taria-interm-mj-mspm-210-160114.pdf. Acesso em: 10 ago. 2022.BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Regras de Bangkok: regras das Nações Unidas para o tratamento de mulheres presas e medidas não privativas de liberdade para mulheres infratoras. Brasília, DF: CNJ, 2016. Disponível em: https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2019/09/ cd8bc11ffdcbc397c32eecdc40afbb74.pdf. Acesso em: 10 ago. 2022. BRASIL. Decreto-lei nº 9.871, de 27 de junho de 2019. Comitê Gestor da Política Nacional de Atenção às Mulheres em Situação de Privação de Liberdade e Egressas do Sistema Prisional. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, p. 11, 28 jun. 2019. Disponível em: https://www.in.gov.br/ en/web/dou/-/decreto-n-9.871-de-27-de-junho-de-2019-179409475. Acesso em: 10 ago. 2022. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7210.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7210.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/d0592.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/d0592.htm https://carceraria.org.br/wp-content/uploads/2018/01/documento-portaria-interm-mj-mspm-210-160114.pdf https://carceraria.org.br/wp-content/uploads/2018/01/documento-portaria-interm-mj-mspm-210-160114.pdf https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2019/09/cd8bc11ffdcbc397c32eecdc40afbb74.pdf https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2019/09/cd8bc11ffdcbc397c32eecdc40afbb74.pdf https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/decreto-n-9.871-de-27-de-junho-de-2019-179409475 https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/decreto-n-9.871-de-27-de-junho-de-2019-179409475 REFERÊNCIAS BRASIL. Lei n° 13.869, de 05 de setembro de 2019. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, p. 1, 5 set. 2019. PL 7596/2017. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/lei/L13869.htm. Acesso em: 22 jul. 2022. BORGES, J. Encarceramento em massa. São Paulo: Polen, 2019. COLLINS, P. H. Interseccionalidade. São Paulo: Boitempo, 2021. CORRÊA, S. O.; MUNTARBHORN, V. (Org.). Princípios de Yogyakarta: Princípios sobre a aplicação da legislação internacional de direitos huma- nos em relação à orientação sexual e identidade de gênero. 2006. Disponível em: http://www.clam.org.br/uploads/conteudo/principios_de_yogyakarta.pdf. Acesso em: 07 jan. 2022 DAVIS, A. Estarão as prisões obsoletas? 2. ed. Rio de Janeiro: Difel, 2018. ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Declaração Universal dos Direitos Humanos, 1948. Disponível em: https://www.unicef.org/brazil/ declaracao-universal-dos-direitos-humanos. Acesso em: 10 ago. 2022. UNODC. Regras Mínimas das Nações Unidas para o Tratamento de Reclusos (Regras de Nelson Mandela). 2015. 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Breve histórico do aprisionamento feminino em contexto nacional 1.1 Introdução 1.2 O que dizem alguns estudos sobre o sistema prisional feminino 1.3 O que dizem os dados do Sistema de Informação do Departamento Penitenciário Nacional (SISDEPEN) 2. Legislação vigente 2.1 O que diz a Constituição Federal 2.2 O que diz a Declaração Internacional dos Direitos Humanos 2.3 O que diz o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos 2.4 O que dizem as Regras de Mandela 2.5 O que dizem as Regras de Bangkok 2.6 O que diz a Lei de Execução Penal 2.7 O que diz a Lei n° 13.869, de 5 de setembro de 2019 2.8 O que diz a Portaria Interministerial nº 210, de 16 de janeiro de 2014 Referências
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