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Fisiopatologia e Dietoterapia nas Alterações no Estado Nutricional “Desnutrição” UNESA - Curso de Nutrição Disciplina: Nutrição Clínica e Dietoterapia para o Sist. Digestório Docente: Etiene Picanço ↑ Gasto Calórico e Nutricional ↓ Consumo Alimentar Desnutrição Protéico-Calórica (DPC) • Ocorre quando a quantidade de proteínas e/ou calorias é inadequada para atender às necessidades nutricionais de um indivíduo. Fatores determinantes das manifestações clínicas da Desnutrição • Intensidade relativa do déficit de proteína ou energia • Gravidade e duração das deficiências • Idade do paciente • Causa da deficiência • Associação com outras doenças nutricionais ou infecciosas Etiologia da Desnutrição • Primária: – provém da ingestão alimentar inadequada (déficit de alimentos). • Secundária: – Resulta de doenças que levam a uma baixa ingestão de alimentos, absorção ou uso inadequado dos nutrientes. – Desenvolvimento poderá ser: • Lento: doença crônica; • Rápido: doença aguda; – Causas: • da ingestão calórica e proteica; • das necessidades nutricionais; Causas da DPC Sócio-econômicos AmbientaisBiológicos Fatores causais sócio-econômicos da DPC • Pobreza: – reduz disponibilidade de alimento, condições de vida insalubres, cuidado inadequado de crianças. • Ignorância; • Práticas inadequadas de desmame; • Violência; • Privação materna; • Abandono de idosos; • Práticas culturais e sociais (tabus alimentares). Fatores Ambientais causais da DPC • Condições que conduzem a ESCASSEZ de alimentos: – condições de vida insalubres (POBREZA), com superpopulação: • infecções – padrões de agricultura; secas; – inundações; – Guerras. Fatores Biológicos causais da DPC • Desnutrição materna durante a gravidez; • Doenças infecciosas: – diarréia, – AIDS, – Tuberculose,... • Balanço nitrogenado negativo causado por: – anorexia, – vômitos, – hipercatabolismo, – reduzidacapacidade absortiva Fatores CAUSAIS da DPC • Ingestão insuficiente • Atividade excessiva (aumentado gasto energético) • Baixa absorção e/ou utilização de nutriente • Estresse psicológico ou emocional • Patologias com aumento das necessidades energéticas e nutricionais (estado HIPERCATABÓLICO) Incidência da Desnutrição • DEP pode ocorrer em 19% a 80% dos pacientes hospitalizados por diversos estados mórbidos. • DEP aumenta significativamente o tempo de internação hospitalar. IBRANUTRI, 2001 Causas da DPC em pacientes hospitalizados Redução da ingestão oral: – anorexia, náuseas, disfagia, dor, obstrução GI, dentição deficiente, pobreza, idade avançada, isolamento social, terapia medicamentosa excessiva, depressão,... Aumentada perda de nutrientes: – má-absorção, diarreia, sangramento, glicosúria, nefrose, drenagem de fístula, enteropatia perdedora de proteína; Aumentadas as necessidades nutricionais: – febre, infecção, neoplasias, cirurgia, traumatismo, queimaduras, medicamentos. Consequências da DPC hospitalar no Brasil PRIMÁRIAS • ↑ infecções • ↓ cicatrização de feridas • < força tênsil nas suturas • Hipoproteinemia – edema • ↓ motilidade intestinal • Fraqueza muscular SECUNDÁRIAS • ↑ mortalidade • ↑ morbidade • ↑ tempo de hospitalização • Convalescência prolongada • Custo elevado Fisiopatologia da DPC • Desenvolve-se gradualmente ao longo de semanas ou meses. • Permite uma série de AJUSTES METABÓLICOS e COMPORTAMENTAIS que resultam em demandas reduzidas de nutrientes. • OBJETIVO: a preservação da vida. • A INANIÇÃO altera a distribuição dos substratos metabólicos em 2 padrões: – Agudo – Crônico • Sendo mediada pelo desequilíbrio metabólico desencadeado pelas alterações hormonais (insulina, glucagon,...). Características da DESNUTRIÇÃO (Inanição) AGUDA - SEM estresse ▪ Ocorre entre 24 a 72h de jejum (<72h) ▪ 15h de jejum: ▪ adaptações metabólicas devido a HIPOGLICEMIA e a redução de aminoácidos livres no plasma ▪ Alterações hormonais: ▪ insulina; glucagon, catecolaminas, epinefrina ( TMB) ▪ gliconeogênese (fígado e rim) ▪ Substratos da gliconeogênese: ▪ lactato, Glicerol e aminoácidos (glutamina e alanina) Características da DESNUTRIÇÃO (Inanição) PROLONGADA – SEM estresse ▪ Após as primeiras 72h de inanição: ▪ alterações adaptativas que favorecem a mobilização de gordura e conservação da massa proteica. ▪ beta-oxidação e oxidação de glicose: ▪ Gordura passa a ser principal combustível oxidativo do cérebro ▪ os AGs são oxidados de forma menos completa: ▪ formação de Corpos Cetônicos ▪ velocidade da gliconeogênese ▪ Há MENOR catabolismo de proteínas pelo músculo Características da DESNUTRIÇÃO (Inanição PROLONGADA - SEM estresse) ▪ ADAPTAÇÃO: ▪ conserva o teor de proteínas no músculo. ▪ N urinário: ▪ 3 a 4g/dia – 25g de ptn/dia ▪ perda de aproximadamente 100g de massa muscular ▪ TMB (10 a 15%): ▪ Processos bioquímicos e fisiológicos; ▪ Gastos de energia em: Bomba Sódio/Potássio; Renovação protéica; Regulação da temperatura corporal; Resposta inflamatória; Função dos órgãos; Características da DESNUTRIÇÃO (Inanição) COM Estresse ▪ Estado HIPERMETABÓLICO e HIPERCATABÓLICO ▪ Mediado por: ▪ catecolaminas; ▪ glicocorticóides; ▪ glucagon ▪ Catabolismo proteico importante: ▪ perda de massa muscular – PROTÉOLISE COMPARAÇÃO entre as reações metabólicas ao jejum de curta e longa duração: Desnutrição (Inanição) AGUDA (<72h) Desnutrição (Inanição) PROLONGADA (> 72h) ▪ Glicogenólise ▪ oxidação de glicose ▪ Depleção das reservas de glicogênio ▪ oxidação de glicose ▪ lipólise ▪ cetogênese hepática ▪ lipólise ▪ cetogênese hepática ▪ catabolismo protéico ▪ catabolismo protéico ▪ Gasto energético transitoriamente aumentado ▪ Gasto energético CARACTERÍSTICAS FISIOLÓGICAS Desnutrição NÃO Complicada Desnutrição COMPLICADA (associada a doenças) Catecolaminas Glucagon Cortisol Insulina Citocinas variada Velocidade Metabólica Proteólise Gliconeogênese Excreção de Nitrogênio Utilização de AG Adaptação à Desnutrição presente ausente Resposta hormonal e suas consequências Hormônios Concentração durante o jejum Efeito nos tecidos Insulina Diminuída Aumenta a glicemia, aumenta o catabolismo proteico e lipídico, diminui a síntese proteíca Glucagon Aumentada Estimula a gliconeogênese e a glicogenólise, aumenta a degradação proteíca no fígado GH Aumentada Estimula a lipólise, reduz síntese de uréia IGF-1 Diminuída Reduz a síntese proteica e induz degradação de proteína, sem feed-back negativo com GH Glicocorticóides Aumentada Aumenta a degradação proteica, a lipólise e a gliconeogênese Epinefrina Aumentada Diminui proteólise e aumenta lipólise, reduz síntese de uréia T3 e T4 Diminuída Reduz taxa metabólica basal, diminuindo, desta forma, a necessidade de lipólise e proteólise Finn & Dice, 2006 Consequências fisiológicas da Desnutrição Proteico-Calórica Consequências progressivas da depleção proteica sobre a massa corpórea magra: • massa muscular estriada • proteína visceral (albumina, transferrina, ptns transportadoras) • resposta imunológica • cicatrização • da função orgânica: intestino, fígado, coração • adaptação reduzida ao estresse • MORTE (70% do N corpóreo): chances de recuperação devido a morte nitrogenada ÓRGÃOS OU SISTEMAS CARACTERÍSTICAS Peso Corporal ▪ Perda entre 5 a 10%, quando > 40%→ morte; ▪ Depleção de tecido adiposo () e muscular (); Órgãos viscerais; ▪ devido a retenção de Sódio e água corporal; Coração ▪ Alterações cardíacas quantitativas e qualitativas; ▪ volume; contrações e volume do VE; ▪ glicogênio do miocárdio; ▪ atrofia miofibrilar; edema intersticial; Pulmões ▪ Alterações mínimas no parênquima; ▪ de massa e força dos músculos da respiração; ▪ resposta ventilatória à hipóxia Trato Gastrintestinal ▪ motilidade gástrica; secreção do HCl; ▪ massa total do ID (atrofia de mucosa e perdade vilosidades); ▪ renovação de células epiteliais; ▪ atividade das dissacaridases; ▪ infiltração linfocítica; Fígado ▪ massa hepática, com histologia normal; ▪ depleção de lipídios, proteínas e glicogênio; ▪ preserva o no de hepatócitos; ▪ síntese hepática ( albumina e transferrina); Na deficiência protéica grave → Kwashiorkor ▪ Fígados Aumentados por: Infiltração gordurosa e excesso de glicogênio Rins ▪ massa renal, com histologia normal; ▪ função renal preservada, exceto por: comprometer capacidade de concentração decorrente da redução no gradiente osmótico medular; Sistema Endócrino ▪ Tiroxina; Conversão de T4 em T3; ▪ testosterona, LH e FSH em Homens; ▪ Gonadotropina e estrogênios em Mulheres; Sistema Imunológico ▪ contagem de linfócitos periféricos; ▪ % de linfócitos T; imunidade humoral; ▪ neutropenia discreta; Cicatrização de Feridas ▪ Retardo da neovascularização; da proliferação de fibroblasto e síntese de colágeno; ▪ Edema associado à hipoalbuminemia; ▪ Deficiência de micronutrientes; Balanço nitrogenado negativo Manifestações Clínicas da DPC MARASMO KWASHIORKOR ▪ Evolução gradual (meses); ▪ Quando associada a doenças: resulta de doenças crônicas (CA, DPOC,...); ▪ Evolução rápida (semanas); ▪ Resulta de doença aguda potencialmente fatal (traumatismo, queimaduras, sepse,...); ▪ Estágio final do processo de caquexia ▪ Forma ADAPTADA da DEP ▪ Induz menos apatia (adaptado) ▪ Apetite preservado ▪ Deficiência predominante de proteína; ▪ Forma NÃO adaptada da DEP ▪ Apatia e letargia ▪ Diminuição do apetite (anorexia); ▪ depósitos de gordura subcutânea ▪ paciente emagrecido: “pele e osso” ▪ tecido adiposo e massa muscular (desgaste muscular) ▪ Sem dermatite ▪ Paciente NÃO emagrecido (mascarado pelo edema) ▪ Lesões de pele (dermatite), escaras, má cicatrização ▪ Gordura subcutânea preservada ▪ Atrofia muscular (perda de massa muscular) MARASMO KWASHIORKOR ▪ ingestão proteica ▪ ingestão calórica ▪ ingestão proteica ▪ ingestão calórica relativamente normal ▪ Não edematoso ▪ Edema em membros inferiores, extremidades ▪ Edema de face ( + grave) ▪ Edema em alça intestinal (+ grave) ▪ Pele seca e enrugada ▪ Cabelo escasso, fino, sem brilho e seco ▪ Bochechas encovadas ▪ Cabelo seco, despigmentado e quebradiço ▪ Abdome plano ou escavado ▪ Sem sinais de hepatomegalia ▪ Abdome distendido ▪ Hepatomegalia ▪ Infiltração gordurosa (esteatose hepática) ▪ Diarreia e Vômitos ▪ Diarreia (edema de alças intestinais) DPC - Marasmo DPC – Kwashiorkor Conceito NOVO • “Kwashiorkor”: – induzido por um processo inflamatório em paciente que, na maioria dos casos, já era marasmático. • Na falência de múltiplos órgãos, PACIENTE GRAVE, a Síndrome de Kwashiorkor se desenvolve rapidamente, independente do estado nutricional prévio. Cuidado Nutricional na DPC Estratégias de tratamento 1) Resolver as condições que ameaçam a vida: Distúrbios hidroeletrolíticos (SRO oral ou SNG); infecções; alterações hemodinâmicas (insuf. Cardíaca, edema pulmonar, hipóxia grave); anemia grave; acidose metabólica; hipotermia e hipoglicemia; deficiência grave de Vit. A 2) Restauração homeostática de estado nutricional: - Deve começar tão logo as medidas anteriores tenham sido estabelecidas - Substituir os déficits teciduais de nutrientes rapidamente e de forma segura, evitando rupturas metabólicas deletérias 3) Garantia de reabilitação nutricional: - Após 2 a 3 semanas: introdução gradual de alimentos tradicionais → Esse passo deve ser dado quando desaparecer o edema, melhora das lesões cutâneas, paciente estiver ativo, apetite restaurado - Estimulação emocional e física Estratégias Nutricionais na DPC • Dieta Hipercalórica: – Calcular as necessidades calóricas segundo: • Sexo • Idade • Atividade física • PESO ATUAL • Acréscimo calórico: – 500 a 1000kcal • Refeições em horários fixos • Evitando jejum > 3h • Aumentar oferta nutricional de forma LENTA e GRADUALMENTE, evitando: – Desconforto gástrico – SÍNDROME DE REALIMENTAÇÃO: • “Overfeeding” • Desequilíbrio no funcionamento cardíaco e pulmonar • Desequilíbrio eletrolítico Distribuição dos Macronutrientes na DPC Distribuição calórica: • Proteínas = 12 a 15% • Lipídeos = 30% • Carboidratos = complementar o VET. • Suplementar micronutrientes quando necessários para atingir recomendação diária. Regra de “Bolso”: • Calorias diárias: – 25 a 35kcal/kg • Proteínas: – 1,2 a 1,5g/kg peso atual/dia • Lipídeos: – 0,5 a 1,0g/kg/dia Síndrome da Realimentação Hipofosfatemia (↓ P) Hipomagnesemia (↓ Mg++) Hipocalemia (↓ K+) Deficiência Vitamínica (↓Tiamina - B1) Retenção Hídrica (↑ Na+) Consequências da Síndrome da Realimentação Síndrome da Realimentação Arritmia Cardíaca Edema Insuficiência Cardíaca Desordens Neurológicas Insuficiência Respiratória Rabdomiólise (Hipofosfatemia) Insuficiência renal (Mioglobinúria) Fraqueza muscular Nutrição Enteral na DEP: ❑ Indicação: Pacientes sem condições de mastigação ou deglutição; com TGI funcionante ❑Posicionamento do cateter: SNG ou SNE ❑Velocidade de Infusão: - Aumento gradual de 20 a 30ml/h até meta calórica ser atingida ou tolerância máxima ser alcançada (após 3 a 5 dias) - Atenção para necessidade de suplementação enteral ou parenteral de eletrólitos, minerais e oligoelementos!! Sobotka, 2008 Nutrição Parenteral na DEP: ❑ Indicação: Pacientes com disfunção GI ❑ Cuidado com infusão de Na e água: DEP= Inabilidade em excretar sobrecarga de Na e H20 ❑ Reposição extra de minerais e micronutrientes (K, P, Mg), antecipando reduções agudas! Meta Inicial: Oferta calórica: 35Kcal/ Kg/ dia Oferta Proteica: 1,5g/ Kg/ dia ❑ Aumento gradual Sobotka, 2008 Monitorização do Tratamento da DEP: ❑Peso e Balanço Hídrico diários ❑Avaliação de Sinais e sintomas de déficit e excesso de eletrólitos, vitaminas e elementos-traço ❑Glicemia ❑Controle frequente (diário ou semanal): Uréia, creatinina, eletrólitos (K,P,Mg,Ca) plasmáticos ❑Albumina plasmática semanal e em alguns casos Transferrina e Transtiretina (1/2 vida curta) ❑Testes de função hepática ❑Folato e B12 (esporadicamente) ❑Se e Zn séricos devem ser medidos ❑Lipídios séricos semanal (clearance e valores de colesterol e Tg → 4 horas após interrupção da infusão) Sobotka, 2008 Recomendações na DEP: ❑ Necessidades Finais: ➢Energia: 40 a 45 Kcal/ Kg/ dia ➢Proteína: 1,5g / Kg/ dia Sobotka, 2008