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Geovana Sanches, TXXIV PROLALPSOS GENITAIS CONCEITOS Prolapso consiste no deslocamento parcial ou total de um órgão do seu sítio habitual, quase sempre em caráter permanente. Os prolapsos genitais também são denominados de distopia e ocorrem quando há descenço (queda) da parede vaginal anterior e/ou posterior. PREVALÊNCIA A melhora das condições de saúde com aumento da expectativa de vida e consequente envelhecimento da população torna a distopia genital um distúrbio cada vez mais comum. • Afeta milhões de mulheres em todo o mundo • Qualidade de vida: impacto psicológico, social e financeiro o Quanto antes o distúrbio se instala, mais interferência na qualidade de vida da mulher • Aos 80 anos, 11% das mulheres têm indicação cirúrgica FATORES DE RISCO Os fatores de risco das distopias se assemelham aos da incontinência de esforço. Obstétricos • Relacionado à assistência ao parto • Multiparidade por parto vaginal • Macrossomia • Trabalho de parto prolongado • Laceração de parto • Uso de fórcipe o Nenhum deles tem comprovação científica, mas a associação aumenta o risco de distopia Idade • A incidência dobra a cada década de vida • Perda do fator protetivo do estrógeno, o qual vai diminuindo conforme o envelhecimento até cair bruscamente após a menopausa. Fatores genéticos • Distúrbios do tecido conjuntivo, com perda da capacidade de contenção • Mulheres com histórico desses distúrbios na família tem maior predisposição à distopia Raça • Mulheres brancas e asiáticas têm menor risco do que as hispânicas • Negras têm o formato da pelve como fator de proteção Aumento da pressão intra-abdominal • Fatores que aumentam a exigência do assoalho pélvico o Obesidade o Constipação crônica o Tosse crônica o Levantamento repetitivo de peso ALTERAÇÕES NA TOPOGRAFIA NORMAL DO APARELHO GENITAL As alterações da topografia do aparelho genital que levam à distopia decorrem de três fatores: endócrino, anatômico e dinâmico. Fator endócrino O principal fator endócrino envolvido na distopia é o estrógeno, hormônio responsável pelo trofismo das estruturas pélvicas (colágeno) – há receptores nos músculos do assoalho pélvico e nos ligamentos. Conforme os níveis desse hormônio reduzem, especialmente após a menopausa, há redução desse trofismo e da capacidade de sustentação das fibras colágenas. Fator Anatômico Aparelho de sustentação da pelve Os músculos e fáscias do assoalho pélvico são responsáveis por sua sustentação. São representados pelos diafragmas pélvico e urogenital e fáscia endopélvica. à Diafragma pélvico O diafragma pélvico é composto pelo músculo coccígeo e músculo elevador do ânus, sendo o último a referência anatômica da pelve – delimita-se do períneo e é composta por: • Feixe pubococcígeo • Feixe ileococcígeo • Feixe puborretal Geovana Sanches, TXXIV Os músculos fazem um emaranhado para sustentar todos os órgãos pélvicos, restando apenas o hiato urogenital, local por onde sairá o canal vaginal. à Diafragma urogenital O diafragma urogenital é composto pelo músculo transverso profundo do períneo, músculo transverso superficial do períneo, músculos publoclitorianos e pelo esfíncter estriado do ânus. Em conjunto com os músculos do diafragma pélvico, fazem toda a sustentação da bexiga, útero e reto (órgãos mais pesados) e também dos ovários, intestinos e o resto dos órgãos pélvicos. à Fáscia endopélvica É um tecido conjuntivo que envolve os músculos e os órgãos pélvicos. Possui dois folhetos (parietal e visceral) e engloba duas fáscias (vesicovaginal e retovaginal) Aparelho de suspensão da pelve Os ligamentos (tecido conjuntivo elástico e musculatura lisa) são responsáveis pela suspensão (elevação) da pelve. São eles: • Ligamentos pubovesicouterinos o Suspensão da bexiga e do útero • Ligamentos cardinais ou de Mackenrodt o Ligamentos redondo e largo • Ligamentos uterossacros Fator dinâmico O fator dinâmico caracteriza-se pela relação entre a pressão intra-abdominal e a integridade dos aparelhos de sustentação e suspensão. Sempre que os músculos abdominais contraem, há contração da musculatura do assoalho pélvico (principalmente do aparelho de sustentação, em especial do M. elevador do ânus). Essa contração reduz o diâmetro do hiato urogenital, reduzindo as chances de um órgão sair por ele. Quando há desequilíbrio entre a pressão intra-abdominal e a integridade dos aparelhos de sustentação e suspenção, há chance de um prolapso. Isso pode ocorrer por dois mecanismos: • Aumento muito intenso da pressão intra- abdominal, mesmo com aparelhos de sustentação íntegros; • Disfunção muito intensa dos aparelhos de sustentação, em detrimento de um pequeno aumento da pressão abdominal. CLASSIFICAÇÕES Antigamente, davam-se nomes para os prolapsos. Atualmente, essa classificação não é mais usada, utilizando-se o termo distopia (de parede vaginal anterior e/ ou de parede vaginal posterior). • Cistocele: herniação da bexiga na parede vaginal anterior • Retocele: herniação do reto na parede vaginal posterior • Enterocele: herniação de alça intestinal Esses termos caíram em desuso por não se ter a comprovação, em todos os casos, de que é de fato a bexiga ou o reto quem estão empurrando a Geovana Sanches, TXXIV parede vaginal, ou se é uma queda intrínseca ao canal vaginal. Prolapso uterino O útero pode se deslocar, mas se alocando no canal vaginal, ou sair completamente deste. A partir disso, temos as classificações dos prolapsos em diferentes graus: • 1º grau: não pode ser visto pelo introito vaginal • 2º grau: pode ser visto ao introito vaginal • 3º grau (completo): está completamente fora do canal vaginal. Classificações arbitrárias DISTOPIAS PÓS-CIRÚRGICAS As distocias de cúpula vaginal ocorrem geralmente em pacientes que passaram por histerectomia, devido ao “desabamento” do fundo de saco. Pode ocorrer pela ausência de sutura após a retirada do útero ou, mesmo nos casos em que o fundo é fixado. POP-Q: QUANTIFICAÇÃO DE PROLAPSO DOS ÓRGÃOS PÉLVICOS O sistema POP-Q identifica nove pontos na vagina e na vulva (em centímetros) em relação ao hímen, que são usados para classificar o prolapso em seu local de maior avanço. Eles são identificados através do exame físico. O hímen é o ponto 0 – todos os pontos que estiverem para fora dele serão positivos e os que estiverem para dentro do canal vaginal, negativos. Legenda • + para fora do introito vaginal • - para dentro do introito vaginal • a: parede anterior • p: parede posterior • c: localização do colo do útero • d: local do fundo de saco vaginal o cúpula vaginal o ponto de referência em pacientes histerectomizadas o deve ser igual ao Tvl, caso contrário, a cúpula está prolapsada • Tvl: comprimento total da vagina Pontos importantes Parede anterior • Ponto Aa: localiza-se a -3cm do hímen, mais ou menos na altura da transição uretra-bexiga • Ponto Ba: ponto de maior prolapso da parede vaginal anterior. o Se não houver prolapso, Ba = Aa Parede posterior • Ponto Ap: homólogo ao Aa, ou seja, ponto há 3cm do introito vaginal • Ponto Bp: ponto de maior prolapso da parede vaginal posterior o Se não houver prolapso, Bp = Ap Classificações Estágio 0 • Não há prolapso • Aa e Ap= -3 cm Geovana Sanches, TXXIV • Ba = Aa = Ap = Bp = -3 cm • O tamanho do colo é de 2 cm. Assim, para calcular o ponto C, utiliza-se o tamanho da vagina (TVL) menos o tamanho do colo (2cm) o C = TVL – 2 (tamanho do colo) Estágio 1 O ponto de maior prolapso (Ba ou Bp) chega até 1 cm acima do anel himenal. • Ba ou Bp até -1 o Inclui o -1 o Excetuando-se -3 (normalidade), qualquer valor negativo encaixa-se no estágio 1 • Exemplo o TVL= 12cm o C= -10 o Aa = -3 o Ap= -3 o Ba= -2 o Bp= -3 § Prolapsode parede vaginal anterior estágio 1 Estágio 2 O ponto de maior prolapso fica entre 1 cm acima a 1 cm abaixo do anel himenal. • Ba ou Bp entre -1 e +1 o Incluiu o +1 o ]-1,+1] • Exemplo o Aa= -3 o Ap= -3 o Ba= 0 o Bp= -3 § Prolapso de parede anterior estágio 2 Estágio 3 O ponto de maior prolapso estende-se a mais de 1 cm abaixo do anel himenal, mas sem eversão completa. • Ba ou Bp > +1 • Exemplo o Aa= -3 o Ap= -3 o Ba= -3 o Bp= +1 § Prolapso de parede posterior estágio 3 Estágio 4 O ponto de maior prolapso estende-se a mais de 1 cm abaixo do anel himenal e tem eversão completa da vagina. Para fazer a conta do ponto, basta utilizar o tamanho do canal vaginal menos o tamanho do colo uterino (2cm). • Ponto de prolapso > tamanho do útero (TVL – 2) • Útero ou cúpula vaginal completamente exteriorizado → Exemplo 1 • TVL= 12 cm o Comprimento total da vagina • C= - 9 cm o O colo pode estar no máximo 2cm a menos da TVL § Prolapso uterino • Bp= - 4 cm o Há um prolapso de parede posterior (deveria estar -3) • Ba= - 2 cm o Há um prolapso de parede anterior (deveria estar -3) • Diagnóstico o Prolapso uterino, prolapso de parede anterior, prolapso de parede posterior o Distopia de parede vaginal anterior estágio 1 → Exemplo 2 • TVL= 10 o Comprimento total da vagina • C = + 5 o Colo uterino deve estar a no máximo 2cm de distância do TVL = -8 • Bp= + 3 • Ba= + 3 o Distopia de parede vaginal anterior, posterior e de útero estágio 4 à Exemplo 3 • Ba= 0 • Bp= -1 • TVL= -11 • C= -7 o Local ideal = -9 • Diagnósticos o Distopia de parede anterior estágio II o Distopia de parede posterior estágio I o Distopia do útero estágio I Geovana Sanches, TXXIV à Exemplo 4 • Tvl= 10 • C= -8 • Ba= +1 • Bp= -3 o Distopia de parede anterior estágio II à Exemplo 5 • Bp = 0 • Tvl= 10 • C= -8 o Distopia de parede vaginal posterior estágio II QUADRO CLÍNICO Aproximadamente 50% das mulheres com prolapso genital têm mais de 50 anos, e menos de 20% delas buscam tratamento. Em geral, as pacientes são assintomáticas, especialmente nos estágios vaginais. Entretanto, pode manifestar-se por: • Sensação de peso na vagina • Exteriorização de estrutura pela vagina • Dor pélvica ou lombar • Desconforto pélvico difuso • Dispareunia Há menor intensidade dos sintomas pela manhã e piora no decorrer do dia, assim como com esforço físico ou outras atividades que aumentem a pressão intra-abdominal. Há melhora, ainda, em decúbito. Sintomas urinários • Não necessariamente estão presentes • Associação com incontinência urinária de esforço (correlação com flacidez do assoalho pélvico, deixando a uretra mais móvel) • Distopia intensa o Bexiga fora de sua localização o Angulação uretral o Retenção urinária o ITU de repetição (urina residual) Sintomas intestinais • Não necessariamente estão presentes • Distopia de parede posterior por descenso retal ou herniação de alça intestinal • Constipação crônica o Acúmulo de fezes, que ficam ressecadas e endurecidas com o tempo o Manobra digital para eliminação de fezes DIAGNÓSTICO O diagnóstico é clínico, podendo a distopia ser identificada apenas à inspeção estática do exame físico ou por meio de manobras de esforço, como a manobra de Valsalva. • Inspeção estática • Inspeção dinâmica o Manobra de Valsalva • Espéculo de Sims o Específico para avaliação da distopia o Consegue avaliar isoladamente as paredes anterior e posterior da vagina • Espéculo de Graves o Segmento apical da vagina • Toque vaginal • Toque retal • Toque reto-vaginal • Exame em ortostase o Repouso o Valsalva TRATAMENTO Não cirúrgico O tratamento não cirúrgico tem como objetivo melhorar a sintomatologia das pacientes que não podem operar e interromper a progressão do prolapso. • Mudança do estilo de vida o Evitar grandes esforços físicos, como pegar peso • Treinamento da musculatura pélvica o Fisioterapia o Fortalecimento da musculatura, com melhora sintomática e prevenção de piora • Dispositivos intravaginais: pessários o Suporte com alívio dos sintomas o Pode ser utilizado para segurar prolapsos mais leves dentro do canal vaginal Geovana Sanches, TXXIV Cirúrgico As cirurgias de correção de distopias não são complexas, demoradas ou com grandes complicações pós-operatórias. Todavia, como as mulheres normalmente são idosas e tem outras doenças associadas, nem sempre estão aptas para serem operadas. Distopias de parede anterior • Colporrafia anterior: rafia (redução) da parede vaginal anterior • Sling: fita vaginal libra de tensão o Utilizada para correção cirúrgica de incontinência urinária, quando há associação Distopias de parede posterior • Colporrafia posterior: rafia da parede posterior • Perineorrafia: redução do diâmetro do introito vaginal o Geralmente é feita após o parto vaginal, aproximando-se tecidos lesionados que acabaram alargando o introito vaginal (diminui o introito, mas não trata a distopia) • Correção cirúrgica de enterocele: operação de Moschcowitz Prolapso uterino • Histerectomia vaginal • Operação de Manchester ou Donald- Fothergill) o Cirurgia de reconstrução complexa o Colporrafia anterior, amputação plana no colo, fixação dos ligamentos cardinais, colpoperineorrafia Prolapso de cúpula vaginal • Colpopexia sacral abdominal: fixação da cúpula vaginal no sacro • Operação de Le Fort: colpocleise PROFILAXIA • Boa assistência ao parto • Tratar fatores predisponentes, como os que aumentam a pressão intra-abdominal