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Psicologia Histórico-Cultural EAD 6

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Teorias Histórico-Críticas 
em Psicologia
Responsável pelo Conteúdo:
Prof.ª Dr.ª Beatriz Borges Brambilla
Revisão Textual:
Prof. Me. Luciano Vieira Francisco
Revisão Técnica:
Prof.ª M.ª Cássia Souza
Teorias Críticas em Psicologia e Atuação 
Profissional em Situações Sociais Críticas
Teorias Críticas em Psicologia e Atuação 
Profissional em Situações Sociais Críticas
 
 
• Conceituar e desnaturalizar a noção de vulnerabilidade social;
• Discutir sobre desigualdade social, sistema de exploração-dominação-opressão e sua dimen-
são subjetiva;
• Debater uma perspectiva ética na atuação clínico-institucional em Psicologia para equidade social.
OBJETIVOS DE APRENDIZADO 
• Introdução;
• Uma Prática Crítica em Psicologia;
• A Psicologia nas Políticas Públicas;
• Uma Ciência e Profissão em Transformação;
• O Trabalho com Direitos Humanos;
• Discutindo um Caso em Psicologia e Direitos Humanos – 
Psicologia e População em Situação de Rua (CARDOSO; ROCHA, 2020).
UNIDADE Teorias Críticas em Psicologia e Atuação Profissional em Situações Sociais Críticas
Introdução
Construídas condições para uma análise crítica da própria Psicologia, como Ciência 
e profissão, identificamos as tensões e disputas em torno das concepções e dos funda-
mentos da Psicologia Social, entre a reprodução social e a crítica. No entanto, temos 
de considerar que a Psicologia Social – em especial, as abordagens de cunho histórico-
-crítico – não se restringiu a apenas produzir uma argumentação crítica à Psicologia 
hegemônica, mas também a construir novos rumos para a atuação profissional, respon-
dendo com compromisso social às demandas de nosso tempo. 
Se, inicialmente, a Psicologia Social Crítica tinha como horizonte construir um projeto de 
educação e cuidado numa perspectiva socialista, como vimos na União Soviética, num se-
gundo momento, na América Latina, enfrentava-se as ditaduras civis-militares e as duras for-
mas de violência e tortura vividas por nossos povos. As mudanças sociais que vivemos nos 
últimos 30 anos, com a abertura democrática no País e os recentes retrocessos nas políticas 
sociais e nas condições de vida de nosso povo, colocam-nos novos desafios para atuação. 
A Psicologia, assim, consolidou-se como saber e técnica em diversas áreas de atuação 
profissional, na saúde, educação, trabalho/emprego, assistência social, habitação, cultu-
ra, esporte e lazer, desenvolvimento e planejamento urbano e Direitos Humanos – áreas 
estas em que, em todas, cabe uma perspectiva crítica, o que procuraremos desenvolver 
nesta Unidade.
Uma Prática Crítica em Psicologia
Um dos principais aspectos de atuação crítica em Psicologia é a integração entre uma 
teoria e um método, coerentes e condizentes a realidade na qual estamos inseridos. 
Para isto, consideremos as últimas transformações sociais que vivemos em nosso 
país. O início da década de 1990 representou um importante momento na história bra-
sileira, decorrente da implantação e regulamentação dos ganhos sociais da Constituição 
de 1988, com afirmação ampla e irrestrita de direitos sociais e instituindo direitos que 
apontavam para uma condição de melhor equidade para setores desprivilegiados, ao 
menos a longo prazo. Neste sentido, a Constituição Federal desdobrou-se em importan-
tes conquistas no campo da saúde, dos direitos das crianças e adolescentes, da assistên-
cia social e da educação.
Em 1990 tivemos a implantação do Sistema Único de Saúde (SUS), como um sistema 
universal, integral e equitativo de saúde em seus diversos níveis de cuidado e atenção. 
No mesmo ano houve a promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), 
que institui a condição cidadã a esta população, consolidando um sistema de garantia 
de direitos e proteção integral. Já no campo da assistência social, a Lei Orgânica da 
Assistência Social garantia uma política a quem necessitasse, conferindo especialmente 
o Benefício de Prestação Continuada (BPC) a idosos, pessoas com deficiência e pes-
soas com invalidez permanente não contributivas da previdência social. Na educação, 
às conquistas vieram em 1996, com a aprovação da Lei de Diretrizes de Bases (LDB), 
regulamentando um sistema de Educação Básica.
8
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É importante reconhecer que, nesse momento, essas lutas foram marcadas pela par-
ticipação de psicólogos. Ainda que inseridos timidamente no campo das políticas sociais 
e de forma contra hegemônica, somaram-se aos movimentos que pautavam a democra-
tização da sociedade brasileira, marcando, assim, uma nova perspectiva na história da 
Psicologia. Anunciava-se, por meio dessa participação da Psicologia na luta por políticas 
sociais públicas, uma trajetória rumo ao projeto mais tarde consolidado como compro-
misso social da Psicologia, que teve na inserção e participação da profissão no campo 
das políticas públicas uma de suas maiores expressões.
Nos dois governos de Fernando Henrique Cardoso (FHC), os avanços sociais expres-
sos nas legislações brasileiras e em tratados internacionais sofreram grandes abalos com 
o processo de reforma neoliberal e de privatização do Estado brasileiro. A sociedade civil 
organizada mantinha-se firme na luta contra estas reformas neoliberais apresentadas por 
FHC. O novo estatuto das políticas públicas, exigidos pela nova legislação, levou à con-
tratação de psicólogos (além de outros profissionais da saúde), que iniciaram trabalhos em 
prefeituras municipais, atuando prioritariamente nas Unidades Básicas de Saúde (UBS) e 
em ambulatórios de saúde mental. Tivemos o crescimento da participação de Organiza-
ções Não Governamentais (ONG) reescrevendo as práticas em Psicologia Social Comu-
nitária à luz do novo enfoque neoliberal, ofertando atendimento psicológico institucional, 
muitas vezes de cunho voluntário, sobre influência religiosa, caridosa e benevolente.
Caberia refletir sobre o papel do chamado Terceiro Setor e sua influência na execução das 
políticas públicas. Na década de 1990, esse fenômeno ficou muito evidente com a desonera-
ção do Estado e a visão de Estado mínimo que se pretendia implantar. Assim, confira a boa 
análise sobre o novo papel da organização popular feito por Maria da Glória Gohn (2011) no 
livro Movimentos sociais no início do século XXI, assim como a análise de Furtado (2010) 
sobre o papel da social-democracia na implantação do neoliberalismo.
Nesse contexto, entidades organizadas da Psicologia desempenharam um importante 
papel. Levando adiante o projeto do compromisso social da Psicologia, potencializaram as 
experiências construídas pela categoria nesses espaços de trabalho, assim como a produção 
acadêmica que buscava construir novos saberes em Psicologia, pautados por uma perspec-
tiva crítica. O projeto do compromisso social da Psicologia somou-se aos movimentos de 
resistência à guinada neoliberal desse momento histórico, resultando em um reconhecimen-
to social da Psicologia a partir de seu posicionamento crítico. A Psicologia passou a marcar 
presença em órgãos e espaços de controle social de políticas públicas em diferentes áreas e 
levou adiante ações e campanhas em defesa do SUS, do ECA, dos direitos das mulheres, das 
lutas de pessoas Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transgêneros, Queers, Intersexuais e das que 
não se identificam a nenhum gênero e tomam ações para promover os direitos e a inclusão 
(LGBTQI+) e muitas outras. Esse movimento pautou aos psicólogos de forma mais contun-
dente um outro projeto ético-político para a profissão, que tem na justiça social e democracia 
o seu horizonte e para o qual, sem dúvida, a produção de Silvia Lane foi uma referência fun-
damental. Essa construção encontrou, no período seguinte, as condições objetivas que pos-
sibilitaram a transformação das políticas públicas em uma questão do campo da Psicologia.
Após 8 anos de abertura do mercado brasileiro para as empresas estrangeiras, os al-
tos índices de desemprego e violência levavam o povo brasileiro à reinvindicação de um 
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UNIDADE Teorias Críticas em Psicologia e Atuação Profissionalem Situações Sociais Críticas
governo popular e democrático, inaugurando uma “primavera” progressista na América 
Latina e no Brasil, que foi legitimada com a eleição de Luís Inácio Lula da Silva. A ges-
tão Lula resultou em transformações nos mais diversos campos e políticas sociais, com 
modelos democráticos e participativos de elaboração das políticas públicas; a sociedade 
civil, os trabalhadores e a gestão pública, juntos, construíram diretrizes que levaram a 
mudanças significativas da população brasileira.
As reformas sociais propostas no Governo Lula encaminharam grandes mudanças 
no campo da retirada do País da miséria, aumento do acesso de crianças e adolescentes 
ao Ensino Básico, aumento do salário-mínimo e de postos de trabalhos, políticas de 
inclusão social e defesa de direitos de grupos socialmente excluídos como mulheres, 
indígenas, negros, quilombolas e população LGBTQI+.
A implantação do Sistema Único de Assistência Social (Suas), em 2005, colocou o 
Brasil numa agenda de enfrentamento à pobreza com a adoção de modelos de proteção 
social com benefícios de transferência de renda, além do trabalho no campo da dimen-
são subjetiva da construção da autonomia das famílias.
Na área da Psicologia, por influência de Silvia Lane e demais psicólogas sociais que 
reafirmavam o caráter progressista da profissão, os profissionais acompanharam as mu-
danças sociopolíticas do Brasil, marcando o papel estratégico das entidades da profissão 
nesse processo histórico. Em 2005, o Conselho Federal de Psicologia (CFP) apresentou 
resultados da implantação de um banco social de serviços de Psicologia em 6 políticas 
sociais distintas, em que apresentou-se à sociedade e ao Estado, práticas profissionais 
que têm estado pouco visíveis na sociedade brasileira; realizou-se a experiência da par-
ticipação em políticas que visam melhorar as condições de vida em nosso país; abertura 
de novos canais de negociação com o Estado sobre as demarcações e possibilidades 
da profissão do psicólogo; fortalecimento da presença dos psicólogos na construção 
de políticas públicas; e contribuímos na busca de alternativas para os problemas sociais 
brasileiros a partir de nossa profissão. 
Tal proposta experimental referenciou a presença dos psicólogos nas políticas sociais, 
consolidando uma nova área de investigação e atuação da Ciência e profissão na Psico-
logia Social. Tal conjuntura, popular e democrática, reposicionou o debate da Psicologia 
Social Comunitária, transitando de uma perspectiva extrainstitucional para uma presença 
como ação pública de garantia de direitos previstos legalmente no Estado brasileiro.
Importante!
Estamos tratando este tema em termos gerais. A atuação nas grandes cidades brasileiras, 
por força do quadro repressivo da ditadura militar, dava-se quase que clandestinamente. 
A institucionalização promovida pela retomada do Estado democrático de direito, com 
promulgação da Constituição de 1988 e a convocação de eleições livres e diretas, colocou o 
País em um novo rumo e alterou esse quadro como aqui estamos descrevendo. A Psicologia 
Comunitária, por sua vez, ganhou espaço de disciplina reconhecida e fundou a sua associação 
científica. Em um país imenso como o Brasil, com tantas diferenças regionais, muito há o 
que se fazer, desde o estudo e apoio aos povos tradicionais, populações ribeirinhas, povos 
da floresta etc. Considere ainda que a maioria dos municípios brasileiros tem por volta de 
cinco mil habitantes. A Psicologia Comunitária tem muito o que fazer!
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A Psicologia nas Políticas Públicas 
A entrada oficial da Psicologia nas políticas públicas reafirma o projeto de compro-
misso social da profissão, apontando uma sociedade igualitária, justa e solidária como 
projeto ético-societário. Esta nova forma de organização da Psicologia Social, agora 
não mais no campo da organização comunitária, mas como ação pública das políticas 
sociais, exigem leituras teóricas e metodológicas sólidas para a interpretação da questão 
social e das limitações das políticas sociais. A contribuição da Psicologia na elaboração, 
implantação e consolidação de políticas públicas é temática central no debate do com-
promisso social da Psicologia, que demarca novos rumos para a Ciência e profissão.
Este novo cenário da Psicologia nas políticas públicas exige transformações, refor-
mulações e a construção de novas teorias e técnicas no campo da Psicologia. Gonçalves 
(2010) defende uma presença crítica da Psicologia nas políticas públicas como parte de 
um projeto ético-político que aponte para uma sociedade igualitária, justa e solidária, 
indicando que estamos na “contracorrente”, na contramão do modelo neoliberal; para 
isto, 8 pontos são enfatizados para uma contribuição crítica da Psicologia no campo das 
políticas públicas.
O primeiro deles é a necessidade do posicionamento e da anulação da tese da neutralidade. 
O ponto 2 remete à emergência do amplo acesso à riqueza, material e cultural, seguindo-
-se (terceiro ponto) do reconhecimento necessário do direito de ter direitos. No ponto 4, 
a política pública deve ser para todos, na direção da transformação social e superação da 
desigualdade, devendo haver controle social e participação popular. Como quinto aspecto, 
a diversidade de possibilidades de realização dos sujeitos deve ser respeitada, mas não deve 
encobrir o seu caráter histórico e a desigualdade social. Ponto 6, a subjetividade deve ser 
central, trazendo o sujeito para que participe da construção das políticas públicas. Sétimo, 
a dimensão subjetiva deve estar presente; e por fim, como oitavo ponto, as referências da 
Psicologia sócio-histórica podem orientar a elaboração de políticas públicas e a intervenção 
profissional a serviço da transformação social.
A Psicologia deve reconhecer tais referências para a práxis no campo das políticas 
sociais, em que tal fundamento ontológico, epistemológico, ético, político e metodológi-
co possibilite, inclusive, a ampliação do universo de investigação da Psicologia na inter-
face com as políticas sociais, considerando que atualmente identifica-se a predominância 
de estudos psicológicos sobre políticas públicas de assistência, saúde e educação.
O aprofundamento desse debate no campo da Ciência e profissão é, sem dúvida, 
impulsionado pela ampliação da implementação de políticas públicas neste momento 
histórico e pela ampliação da presença dos psicólogos nessas políticas. É preciso ressal-
tar, contudo, que tal presença, a nosso ver, não se deu gratuitamente. Ao mesmo tempo, 
tem nos debates, nas produções e lutas da Psicologia em torno das políticas públicas um 
determinante fundamental. De algum modo, a trajetória por nós aqui descrita trouxe 
legitimidade para a inserção da Psicologia no campo das políticas públicas e produziu 
o reconhecimento dos psicólogos como interlocutores em um campo no qual, outrora, 
foram considerados estranhos.
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UNIDADE Teorias Críticas em Psicologia e Atuação Profissional em Situações Sociais Críticas
Assim, à medida que se ampliavam serviços e se delineavam novas políticas públicas, 
a Psicologia era convocada à produção e atuação em contextos absolutamente novos, 
para a composição de equipes com profissionais que até então a Categoria pouco se 
aproximara, territórios os mais variados e sob marcos definidos pelos espaços democrá-
ticos de formulação e gestão das políticas públicas. Nessa realidade, era preciso produzir 
novas referências para a atuação profissional. Melhor dizendo, era necessário transfor-
mar em referências as práticas inventadas e experimentadas pelos trabalhadores nos 
serviços e na gestão. A produção acadêmica pautada pela Psicologia Social Crítica, sem 
dúvida, cumpria um papel nessa direção.
Contudo, pelo desafio histórico de articulação entre os campos da Ciência e profis-
são na Psicologia, era preciso potencializar a transformação desse espaço vivo e plural, 
verdadeiro laboratório de produção de novas referências para a profissão marcadas pelo 
contato diretocom a população usuária dos serviços, em produção de um conhecimento 
em Psicologia sob novas formas. Assim, foi criado, em 2006, pelo CFP, o Centro de 
Referência Técnica de Psicologia e Políticas Públicas (Crepop).
A criação do Crepop, em 2006, tinha como objetivo consolidar a produção de referências 
para a atuação de psicólogos em políticas públicas por meio de pesquisas coordenadas na-
cionalmente. Tratava-se de promover a qualificação da atuação profissional de psicólogos 
que atuam em políticas públicas por meio de pesquisas e da sistematização e divulgação de 
informações acerca da prática profissional da categoria nestas políticas.
Acesse o site do Crepop, disponível em: https://bit.ly/3wFw0xQ
Em 2016, o CFP e o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeco-
nômicos (Dieese), produziu um relatório referente ao levantamento de informações 
sobre a inserção dos psicólogos no mercado de trabalho brasileiro, indicando uma 
nova trajetória profissional e inserção social.
Considera-se que a atuação prioritária de psicólogos é nas atividades de educação, 
saúde e serviços sociais: quase 110 mil psicólogos, ou 74,8% deles encontravam-se 
ocupados nessas atividades. Em segundo lugar, com mais de 26 mil pessoas, estava a 
administração pública, que representava 18,0% do total.
As transformações nos campos de atuação profissional de psicólogos retratam uma 
nova construção social da Psicologia na sociedade, na medida em que é convocada a 
contribuir com importantes políticas de enfrentamento à desigualdade social historica-
mente estruturante da realidade brasileira.
Essa profunda movimentação no campo da profissão não demorou a provocar efeitos 
no campo da formação em Psicologia. O campo das políticas públicas foi se instituindo 
como exigência para a profissão, inclusive pelo esgotamento de absorção do trabalho 
da categoria como profissional liberal no campo privado, mas acima de tudo como 
exigência pela necessidade de reconhecimento social da Psicologia e por um projeto 
ético-político que direcionasse à conexão com as necessidades da maioria da população 
brasileira. Essa exigência passou, portanto, a ser pauta no campo de formação. Cres-
ceram experiências e invenções de currículos e práticas pedagógicas na formação em 
Psicologia tendo as políticas públicas como eixo de desafio.
12
13
A realidade se impôs ao mundo acadêmico, seja porque os próprios campos de está-
gio começaram, cada vez mais, a implicar na inserção da universidade nas políticas pú-
blicas, seja por conta dos debates sobre a relação da Psicologia com o Estado, de modo 
que o campo dos direitos e das políticas sociais públicas ganharam vida e ocuparam, 
sobretudo pelos estudantes – “filhos da Era de Direitos” –, os bancos da Universidade.
Isso reflete, também, os desafios que ainda enfrentamos. Temos projetos de socieda-
de em disputa e, como resultado, projetos de profissão e formação também em disputa, 
estando o projeto de compromisso da Psicologia com as políticas públicas – como com-
promisso com uma sociedade mais justa e igualitária – ainda no campo da resistência.
Uma Ciência e Profissão em Transformação
Podemos dizer que as transformações nos campos de atuação profissional de psicólo-
gos retratam uma nova construção social da Psicologia, na medida em que é convocada 
a contribuir com importantes políticas de enfrentamento à desigualdade social historica-
mente estruturante da realidade brasileira.
Os psicólogos depararam-se com a necessidade de construção de novas ferramentas 
de intervenção, reconhecendo a urgência de pensamento social crítico que estivesse em 
permanente diálogo com a realidade vivida. A Psicologia tornou-se instrumento para en-
frentar a violência contra as crianças e os adolescentes, contra as mulheres, o racismo, a 
lgbtfobia. A gestão das políticas sociais possibilitou a apreensão da dimensão subjetiva da 
desigualdade, colocando os profissionais em um processo horizontalizado de ruptura de 
estigmas, preconceitos e violências institucionais e sociais contra a população brasileira.
Tal guinada na atuação profissional de psicólogos está atrelada a diversas dimensões 
e acontecimentos históricos. Como sabemos, a história da profissão no Brasil é a história 
hegemônica das elites, uma psicologia seletiva, liberal e individualista, instrumento de 
manutenção de poder. O reposicionamento político rumo ao projeto de compromisso 
social inicia-se na experiência da Psicologia Social Comunitária, em um momento em 
que o País estava tomado pela ideologia imperialista estadunidense representada pelos 
militares. A Psicologia, especialmente a Social Comunitária, expressava o vanguardismo, 
representado por Silvia Lane, afirmando as potencialidades da ação comunitária de 
organização popular frente às melhorias das condições de vida do povo brasileiro.
A abertura democrática e os governos democráticos da década de 2000, marcados 
pela implantação de políticas sociais conduzidas pelo Partido dos Trabalhadores (PT) 
com Lula e Dilma Rousseff à frente do Poder Executivo, exigiram da sociedade brasi-
leira uma resposta à possibilidade efetiva de implantação dos direitos sociais previstos 
constitucionalmente. A Psicologia e outras áreas foram convocadas a se apresentar à 
construção deste projeto. No campo da profissão, a mediação institucional do Sistema 
de Conselhos de Psicologia foi fundamental para a efetivação da presença de psicólogos 
nas equipes mínimas de serviços de contato diário e permanente com a população na 
assistência social e saúde. Teorias e técnicas foram revistas, assim como os princípios 
fundamentais ético-políticos da profissão.
13
UNIDADE Teorias Críticas em Psicologia e Atuação Profissional em Situações Sociais Críticas
Desde 2016, no entanto, com o golpe jurídico-institucional vivido pelo impeachment da 
presidenta Dilma, representado pelo Congresso brasileiro e pelo presidente em exer-
cício, Michel Temer, temos visto as conquistas sociais do povo brasileiro esvaindo-se.
Devemos compreender, portanto, quais são as condições históricas e sociais que 
vivemos para melhor entender as relações sociais que expressam a totalidade social. 
Compreender a atual conjuntura do País, de ameaça à democracia, ascensão social do 
ódio, preconceito e conservadorismo, o que significa entender como nos posicionamos 
diante do movimento da realidade.
Trata-se de explicitar a dimensão subjetiva do enfrentamento à desigualdade social no 
País. Explicar como uma sociedade cheia de privilégios, dominação e segregação cons-
trói um modelo social de enfrentamento às desigualdades a partir da inclusão social, au-
mento da participação econômica de grupos historicamente apartados, ainda que nesse 
mesmo período os mais ricos não só se mantiveram ricos, como tornaram-se mais ricos. 
O modelo de inclusão social não afetou os interesses objetivos das classes dominantes, 
mas colocou privilégios em disputa.
O impeachment veio acompanhado de uma série de contrarreformas neoliberais or-
questradas pelo Governo Temer, instituindo a política do retrocesso social e político do 
País. Vivemos a Reforma Trabalhista, a Emenda Constitucional que congela os investi-
mentos públicos por 20 anos na saúde, assistência social e educação, ameaça à Previ-
dência Social, destruição de modelos antipatrimonialistas e assistencialistas no campo das 
políticas de assistência social, retomada do modelo manicomial de assistência às pessoas 
em sofrimento psíquico, saúde pública terceirizada aos convênios médicos, disputa por 
direitos no campo da educação, especialmente de indígenas e quilombolas, expulsão dos 
povos originários de suas terras, genocídio da juventude negra, altos níveis de desempre-
go e ódio de classe.
A história se mantém como tragédia e disputa, de modo que a sociedade brasileira 
está objetivamente polarizada entre a maioria negra, em situação de pobreza, sem aces-
so aos direitos sociais, e a classe dominante que exala ódio contra o povo. E a Psicologia 
nesta conjuntura?Os psicólogos mantêm-se resistindo como trabalhadores das políticas sociais, ombro 
a ombro com a população, fomentando processos comunitários de organização, enfren-
tando o desmonte das políticas sociais e organizando-se politicamente e socialmente 
contra esse projeto neoliberal de Brasil defendido pelas elites.
Importante!
Os movimentos populares têm sido loci de atuação da Psicologia que, ao compreender a 
realidade social, posiciona-se na luta institucional desde dentro, resistindo em modelos 
de atenção psicossocial, refutando a lógica institucionalizada e a violência de Estado; 
mas, também, os psicólogos estão com o povo organizado na luta por moradia, trabalho, 
transporte público, educação, por direitos das mulheres, dos negros e na luta antirracis-
ta, contra a lgbtfobia e por direitos da população LGBTQI+.
14
15
A Psicologia deve estar lado a lado do povo brasileiro, mediando processos democrá-
ticos de produção de conhecimento, valorizando saberes não hegemônicos e construin-
do caminhos de emancipação política e humana.
O Trabalho com Direitos Humanos 
A história dos Direitos Humanos advém da Segunda Guerra Mundial, da violência do 
Holocausto, com perseguição aos judeus e a povos considerados inferiores, como o caso 
das bombas de Hiroshima e Nagasaki, Japão. Em 1948 foi outorgada a Declaração Uni-
versal dos Direitos Humanos (DUDH), que valoriza a perspectiva do direito natural, de 
que todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotadas de ra-
zão e consciência e devem agir em relação umas às outras com espírito de fraternidade.
A DUDH reafirma o conjunto de direitos das revoluções burguesas (direitos de 
liberdade, ou direitos civis e políticos) e os estende a uma série de sujeitos que an-
teriormente estavam deles excluídos (proíbe a escravidão, proclama os direitos das 
mulheres, defende os direitos dos estrangeiros etc.); afirma também os direitos da 
tradição socialista (direitos de igualdade, ou direitos econômicos e sociais) e do cris-
tianismo social (direitos de solidariedade) e os estende aos direitos culturais. Foi fruto 
de uma negociação entre os dois grandes blocos do Pós-Guerra, o socialista – que 
defendia os direitos econômicos e sociais – e o capitalista – que defendia os direitos 
civis e políticos. Apesar das divergências e da abstenção dos países socialistas, houve 
um certo consenso sobre alguns princípios básicos, uma vez que a “Guerra Fria” ain-
da não estava tão acirrada como nas décadas seguintes (BOBBIO, 1992).
No Brasil
O conjunto de políticas e direitos sociais já mencionados conquistaram leis como 
as seguintes:
• Constituição Federal (1988);
• Estatuto da Criança e do Adolescente (1990);
• Estatuto do Idoso (2003);
• Estatuto da Pessoa com Deficiência (2015);
• Estatuto da Juventude (2013);
• Estatuto da Igualdade Racial (2010);
• Lei Maria da Penha (2006);
• Estatuto da Diversidade Sexual (PL);
• Brasil 2002 – Política Nacional de Direitos Humanos.
Tem sido determinante para o desenvolvimento de estratégias de promoção de saú-
de e defesa de direitos a ampliação de políticas públicas intersetoriais e transversais de 
direitos humanos.
15
UNIDADE Teorias Críticas em Psicologia e Atuação Profissional em Situações Sociais Críticas
Atualmente, o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos organiza-se 
da seguinte forma:
Crianças e
Adolescentes
Família Juventude Pessoa Idosa
Observatório
Nacional da
Família
Pessoa com
De�ciência
LGBT
Mortos e
Desaparecidos 
Políticos
Programas 
de Proteção
Políticas para
Mulheres
Combate ao 
Trabalho
Escravo
Educação em 
Direitos Humanos
População em
Situação de Rua
Registro Civil
de Nascimento Refugiados
Empresas e
Direitos 
Humanos
Atuação
Internacional
Planejamento
Estratégico
Reconecte
Detox Digital
Liberdade de
Religião ou Crença
DUDH70
Igualdade
Étnico-Racial
Figura 1
Veja a abrangência das possibilidades de atuação da Psicologia nas mais diferentes 
frentes, construindo estratégias de potencialização de grupos, instituições, comunidades 
e indivíduos rumo a um desenvolvimento psicossocial pessoal e coletivo de ruptura de 
condições estigmatizadas ou alienadas de vida. 
Discutindo um Caso em Psicologia e Direitos 
Humanos – Psicologia e População em 
Situação de Rua (CARDOSO; ROCHA, 2020)
José (nome fictício), gênero masculino, 26 anos de idade, natural de Vitória da 
Conquista, BA, mantinha um relacionamento com Rose (nome fictício) há mais ou menos 
3 anos. Relatou que não tinha contato com a sua família há 9 anos e justificou a sua 
saída de casa revelando que o relacionamento com seu padrasto era muito conflituoso, 
pois “[...] ele gostava de tentar mandar em mim [sic]”.
O seu histórico de atos infracionais iniciou-se na adolescência, passando por casas de 
acolhimento destinadas ao público jovem com menos de 18 anos de idade para cumprir 
medidas socioeducativas. Já em sua vida adulta, foi preso mais de uma vez. Relata que se 
deslocou para várias cidades, conheceu muitas pessoas, até que chegou – andando – na 
Cidade de Salvador, onde conheceu Rose. 
Rose, gênero feminino, 31 anos de idade, natural de Salvador, BA, é uma pessoa que 
vive com o vírus da imunodeficiência humana (HIV); apresenta aspectos da comunica-
ção/fala prejudicados, sendo pressuposto que haja déficit cognitivo. Devido a isto, há di-
ficuldade ao tentar manter conversas muito longas e, consequentemente, de estabelecer 
vínculos, pois há resistência, sentimento de vergonha ou limitação por parte de Rose ao 
tentar se comunicar com sujeitos tidos como estranhos para ela.
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Tanto José quanto Rose têm filhos anteriores ao relacionamento entre eles, 3 e 4, res-
pectivamente; porém, ambos não mantiveram contato com os filhos após o nascimento. 
O único filho que conseguiram sustentar o cuidado – mais do que financeiramente – foi 
o que conceberam juntos, Mateus (nome fictício), gênero masculino, 2 anos de idade, 
natural de Salvador, BA. 
O encontro com esta família ocorreu desde o primeiro dia de trabalho, de modo que 
a família aguardava para realizar o processo de higienização pessoal no contêiner (es-
paço de acolhimento a partir de um dispositivo de cuidado à população em situação de 
rua de Salvador) do programa, em que ocorreu esta prática.
A psicóloga que acompanhou o caso, logo em sua primeira impressão, considerou 
aspectos sobre a relação familiar, reconhecendo os cuidados com Mateus, porém, ob-
servando indicativos de violência doméstica contra Rose, havendo muita agressividade e 
fortes ameaças à integridade física da mesma.
No decorrer do trabalho, no campo, na rua, foi percebido que José não costumava 
manter-se por muito tempo no contêiner, diferentemente do resto de sua família; mas 
ficava ao lado oposto ao serviço, onde havia um trânsito mais intenso de pessoas. 
Ao notar tal movimentação e, para além disto, a permanência prolongada de assistidos 
do programa naquela área, a psicóloga buscou informações com os técnicos sobre esta 
observação, descobrindo, então, acerca do acentuado comércio ilegal de drogas naque-
la localidade. Diante desta constatação, outra subsequente emergiu: o maior sustento 
financeiro dessa família era provido por meio do tráfico, onde José se responsabilizava 
pelo ganho monetário e Rose pelos cuidados mais cotidianos do filho. Além do contato 
com o tráfico devido à sua atividade comercial, José relatou também fazer uso diário de 
crack e maconha.
Em conversas rápidas, José revelou sentir interesse em voltar para a sua cidade de 
origem, onde teria sua família nuclear por perto para lhe dar o suporte necessário para 
conseguir se organizar de tal modo que se distanciasse de atividades ilegais. Relatou que 
levaria consigo tanto a companheira quanto o filho, narrando: “Quero que meu filho se 
orgulhe de mim. Não quero que ele tenha um pai preso ou ausente, que ele não vai se 
lembrar [sic]”.
A relação estabelecida entre o pai e filho era extremamente afetiva e próxima, sendo 
percebida por toda acomunidade e pelos técnicos do programa. Inclusive, no Plano de 
Acompanhamento do Cuidado (PAC) – instrumento do programa – de José há uma fala 
dele para quando Mateus nasceu: “Meu filho é lindo. Peguei ele no colo, fiquei a noite 
toda com ele, nunca imaginei que eu ia sentir algo assim [sic]”.
No decorrer das semanas, foi notório o distanciamento que ocorria entre José e 
Rose. Um raramente estava na presença do outro e, mesmo quando ambos estavam no 
contêiner, cada um ficava em um lado. José já havia comentado acerca da não concor-
dância do modo de cuidar de seu filho, pois acreditava que Rose tinha comportamentos 
displicentes com a criança, gerando alguns conflitos entre os mesmos. Revelou também 
que, às vezes, sentia vontade de agredi-la fisicamente, porém, não o fazia porque “[...] 
ela é muito fraquinha [sic]”.
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UNIDADE Teorias Críticas em Psicologia e Atuação Profissional em Situações Sociais Críticas
Durante o desenvolvimento do trabalho psicossocial e, principalmente, na reali-
zação de uma roda de conversa, vários usuários, inclusive Rose, trouxeram em seus 
discursos a importância do Programa e contêiner instalado na praça. O dispositivo 
demarca um olhar de cuidado e atenção para com aquela população, ocasionando 
uma dinâmica relacional diferente entre essas pessoas e o restante da sociedade e das 
ditas figuras de poder. 
“Não é um olhar qualquer. É um olhar de profissionais de saúde que se posicionam 
a favor daquele povo, que lhes asseguram direitos. É um olhar de pessoas que têm voz 
e que são escutadas” (CARDOSO; ROCHA, 2020). Esse olhar, de certa forma, inibia 
a ocorrência de violências de múltiplas ordens para com os usuários. Então, a saída 
do território repercute em dimensões maiores do que a da assistência, dos encami-
nhamentos, das escutas psicológicas, dos recursos de banho/higiene e das técnicas de 
redução de danos. A saída foi abrir caminho para novos atos de agressão. Foi revitimi-
zar. Foi tampar, mais uma vez, aquela lacuna que lhes permitiu se sentirem humanos, 
civilizados, existentes.
Perto da finalização de uma das oficinas, Rose notou uma movimentação diferente 
no lado oposto da praça, onde o comércio ilegal costuma se articular, e sinalizou para 
todos que estavam ao redor sobre a situação. Alguns policiais, juntamente com uma 
delegada, estavam circulando pelo território, porém, o motivo da ação era desconhecido 
tanto pelos usuários quanto pelos profissionais do Programa. Rose, demonstrando-se 
muito incomodada, relatou que tinha sentimentos de raiva quando se tratavam de figuras 
policiais, questionando-se a razão de andarem pela praça naquela ocasião, já que costu-
mavam passar apenas olhando de dentro da viatura. 
Tal tensionamento reverberado em Rose pode ser compreendido devido ao históri-
co vasto de violências policiais sofridas pela população em situação de rua. José, por 
sua vez, entrou nas estatísticas. Ele faleceu durante uma ação policial em uma noite de 
quarta-feira, menos de uma semana após a saída do contêiner no território – por conta 
de conflitos na gestão de políticas entre o Município e Estado.
Após receber tal notícia, a psicóloga deslocou-se até a praça, mesmo sem o funciona-
mento do Programa naquele território, durante aquele horário. Mais do que a efetuação de 
um acolhimento para Rose, era necessário assistir e auxiliar nos futuros processos que a 
morte de José acarretaria. Logo na primeira etapa, houve um impasse: o reconhecimento 
do corpo para a liberação do mesmo. Como fazer se só quem pode efetuar esse processo 
é alguém com vínculos consanguíneos ou um(a) companheiro(a) reconhecido(a) legalmen-
te? Sendo assim, foi necessário desenvolver um relatório institucional atestando que José 
era assistido do Programa e que Rose era, de fato, a sua companheira há anos, liberando-a 
para fazer o reconhecimento do corpo, dando início ao processo do enterro.
Comumente, o trabalho dos profissionais é o de emprestar-se ao sujeito assistido, é 
o de colocar-se disponível para o outro. Diante dessa situação, Rose precisou da figura 
técnica, capacitada e validada socialmente para manejar as ocorrências, de modo a 
realizar o funeral o mais rápido possível, a não ter custos com isto, a entrar em contato 
com a família de José para dar a notícia etc. Enquanto as questões burocráticas eram re-
solvidas, Rose expressou o seguinte, durante uma conversa: “Não sei o que fazer agora. 
Não sei como vou voltar ‘pra’ minha casa [ocupação] sem ele. Eu não entro lá sem ele. 
Não me sinto segura [sic]”.
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O desamparo e a desorientação desta mulher após a morte de seu companheiro 
foram evidentes, pois todos os planos que tinha eram vinculados a José, inclusive o 
de “recomeçar” em outra cidade. Uma técnica do Programa relatou que: “Rose era 
completamente desorganizada antes de conhecer ele. Ela se estruturou muito durante 
o relacionamento. Eles funcionavam muito bem juntos, apesar dos conflitos [sic]”. Dian-
te disto, fez-se necessário um acompanhamento mais aproximado do caso da usuária 
porque, além de emocionalmente, ela e o filho eram financeiramente dependentes de 
José. “Ele, invisível, morreu enquanto morte. A família, invisível, morreu enquanto vida” 
(CARDOSO; ROCHA, 2020).
Por fim, como encerramento deste caso, foi produzida uma poesia, como ritual 
de enlutamento:
Segrego-me. Não porque assim quis. Segregam-me, em meio ao caos 
social, jogaram-me entre aqueles que violentam. Não, não fui sempre 
assim. Ensinaram-me a ser. Ensinaram-me que este é o único jeito pos-
sível de ser. Cercam-me a todo instante, invadem todo o meu ser. De-
sesperado, desanimado, acomodado, assim estou. A arma que me fere, 
dispara a bala do preconceito. Meu corpo machucado, ensanguentado, 
cai. E aqueles ditos violentados por mim, ao verem o meu corpo estirado, 
derramam as lágrimas da indiferença. E ali, caído, o crime social que me 
rodeou, sepulta-me. Meu corpo se esvai, minha vida se vai, e torno-me 
invisível e silenciado, embora eu tenha gritado.
Vemos no caso em questão que a Psicologia, na interface com os Direitos Humanos, 
é um horizonte de encontro com as situações de violências e fragilidades sociais, que 
expõe sujeitos e grupos em situação de sofrimento ético-político e humilhação social. 
O que vemos é que sem políticas públicas consolidadas, processuais e permanentes, 
a população segue em condições aviltantes para a sua saúde, e à Psicologia emerge a 
necessidade de uma práxis de cuidado que não apenas “cuide” diretamente do sujeito, 
mas problematize a sua realidade social.
Ou seja, com acesso, verdadeiramente, a direitos, em um cenário de segurança e 
proteção social, associado à presença e contribuição da Psicologia, transforma indivídu-
os, grupos e instituições a partir de um projeto ético-político pautado na afetividade e 
dimensão subjetiva dos fenômenos sociais. 
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UNIDADE Teorias Críticas em Psicologia e Atuação Profissional em Situações Sociais Críticas
Material Complementar
Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade:
 Vídeos
Psicologia em Defesa do Suas – CRP-SP
https://youtu.be/x8n8Dl8vZOs
Psicologia todo dia, em todo lugar: o fazer Psi em caravanas pelo Estado de São Paulo
https://youtu.be/vCvE2P1aR4c
Seminário de Psicologia e Políticas Públicas: Psicologia para todo mundo se faz com políticas públicas
https://youtu.be/2c4cJ3uGZy4
Direitos Humanos – o tecido e o tear
A Comissão de Direitos Humanos do CRP-SP apresenta este vídeo, em que conta 
a história da luta por Direitos Humanos e trata da necessidade de toda a sociedade 
se unir para tecer a trama de defesa e garantia dos direitos das pessoas em suas 
mais variadas formas. O material também aborda a violência do preconceito e de 
práticas repressivas, tal como a tortura e o papel do psicólogo neste contexto. O 
vídeo apresenta ainda os canais que a sociedade pode utilizar para denunciar a 
violação de direitos.
https://youtu.be/eWevQkIuaYY
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Referências
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