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PODER FAMILIAR O Poder Familiar, anteriormente denominado de “pátrio poder”, consiste em um dever-poder dos pais de proverem os recursos necessários para o desenvolvimento dos filhos, tais como educação, guarda, sustento e saúde, enquanto ainda não forem emancipados ou enquanto não atingem a maioridade. Havendo falta da prática desse dever, os responsáveis serão repreendidos no âmbito cível e também criminal, podendo os pais responderem penalmente pelos crimes de abandono material, moral e intelectual, inseridos dos artigos 244 a 246 do Código Penal. Trata-se de um dever antes de ser poder, prevalecendo a responsabilidade dos pais em harmonia com o binômio do exercício regular e do desenvolvimento integral, preponderando o exercício conjunto entre o homem e a mulher.1 De acordo com Rodrigo da Cunha Pereira, a expressão “autoridade parental” seria o melhor substituto para a nomenclatura de “poder familiar”, expresso nos artigos 1.630 e seguintes do Código Civil vigente, visto que engloba de forma mais aprofundada os princípios da Constituição Federal e os do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)2. 1 COLTRO, Antônio Carlos Mathias; DELGADO, Mário Luiz. Guarda Compartilhada. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2018. 2 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Direito das Famílias: prefácio Edson Fachin. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2021. CD-ROM. Ainda segundo o autor, o “pátrio poder”, utilizado pelo antigo Código Civil de 1916, foi substituído pelo “poder familiar”, o qual consiste em um: Conjunto de deveres/direitos dos pais em relação aos seus filhos menores. É uma atribuição natural a ambos os pais, independentemente de relação conjugal, para criar, educar, proteger, cuidar, colocar limites, enfim dar-lhes o suporte necessário para sua formação moral, psíquica para que adquiram responsabilidade e autonomia3. Além disso, a evolução da denominação de “pátrio poder” para “poder familiar” traduziu na ideia de que ambos os genitores possuem igualdade na criação de seus filhos. Tal alteração só foi possível graças ao advento da Constituição Federal de 1988 e da legislação infraconstitucional, o qual se destacou o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente. Entretanto, Cunha não concorda com a expressão vigente nos dias atuais e afirma que: A palavra poder não expressa a verdadeira intenção de atender ao princípio do melhor interesse da criança e do adolescente, mas sim o sentido de posse. Familiar remeteria também à ideia de que os avós e irmãos estariam revestidos dessa função. A expressão mais adequada para a família atual, que é fundada na igualdade de gêneros e é democrática, seria autoridade parental, a qual exterioriza a ideia de compromisso de ambos os pais com as necessidades dos filhos, de cuidar, proteger, educar, dar assistência e colocar limites4. Conforme apontado por Patrícia Pimentel5, o “pátrio poder” sofreu algumas mudanças ao longo do tempo, dando fim ao caráter opressor para garantir melhores benefícios na criação e desenvolvimento dos filhos. Para isso, o chamado “poder familiar”, inserido nos artigos 1.630 a 1.638 do atual Código Civil e com base legal no artigo 229 da Constituição Federal de 1988, como também no Estatuto da Criança e do Adolescente, substituiu o que era antes denominado de “pátrio poder”, que era exclusivo do pai, o qual exercia o papel 3 Ibid. 4 Ibid. 5 PIMENTEL, P. Poder Familiar e a Guarda Compartilhada. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2016. E- book. de chefe da família, possuindo uma autonomia maior perante os filhos, portanto, não prevalecendo a igualdade entre os cônjuges. Durante o Código Civil de 1916, o marido era soberano na função do pátrio poder, exercendo a figura do chefe da sociedade conjugal e somente na falta dele, tal exercício era atribuído à mulher, de acordo com o que era estabelecido no artigo 380 do Código Civil de 1916, assim, vejamos: Art. 380. Durante o casamento compete o pátrio poder aos pais, exercendo-o o marido com a colaboração da mulher. Na falta ou impedimento de um dos progenitores, passará o outro a exercê- lo com exclusividade. (Redação dada pela Lei nº 4.121, de 27.8.1962) Parágrafo único. Divergindo os progenitores quanto ao exercício do pátrio poder, prevalecerá a decisão do pai, ressalvado à mãe o direito de recorrer ao juiz para solução da divergência. (Parágrafo acrescentado pela Lei nº 4.121, de 27.8.1962) 6 Entretanto, a Constituição Federal de 1988 entendeu que esse poder deve ser exercido igualmente tanto pelo homem como pela mulher, dando fim ao antigo entendimento do pátrio poder, conforme expresso no artigo 225, §5° da atual Constituição Federal: “Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher”7. Assim, atualmente, esse poder confere direitos e deveres, tanto ao pai quanto à mãe, em relação aos filhos, sempre prevalecendo o melhor interesse do menor. Para Conrado Paulino da Rosa: Se estende para proporcionar um desenvolvimento integral de todas as potencialidades das crianças e adolescentes, e os alimentos, por sua vez, são meios de obter melhores condições de crescimento físico, emocional e intelectual dos filhos.8 Tal poder tem caráter solidário, visto que na falta de um dos pais o poder passa a ser exercido exclusivamente pelo outro, conforme expresso no artigo 1.631 do Código Civil e havendo desacordo entre as partes, caberá ao judiciário a solução do conflito, de acordo com o parágrafo único do referido artigo9. Além 6 BRASIL. Lei nº 3.071, de 1 de janeiro de 1916. Código Civil dos Estados Unidos do Brasil. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l3071.htm. 7 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. 8 ROSA, C. P. D. Nova Lei da Guarda Compartilhada. São Paulo: SARAIVA, 2015. E-book. 9 COLTRO, Antônio Carlos Mathias; DELGADO, Mário Luiz. Guarda Compartilhada. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2018. p. 55. disso, ele é indivisível, nos casos em que os pais são separados; imprescritível, não sendo extinto pelo seu desuso, indisponível, ou seja, não pode ser transferido para outras pessoas, bem como irrenunciável, por se tratar de condição indispensável para o desenvolvimento do menor. Ademais, é possível afirmar, conforme aponta Silvio de Salvo Venosa,10 que o poder não desaparece com a separação judicial ou com o divórcio, visto que não deriva do casamento e sim da paternidade e da filiação. Portanto, havendo a dissolução da união entre os cônjuges, o poder familiar não é suspenso, sendo assim, aquele que contrair novas núpcias ou união estável não perde o direito do poder familiar, com base no art. 1.636 do Código Civil. Porém, há a possibilidade de um enfraquecimento desse poder para aquele que não detém a guarda do filho, desse modo, aquele que se sentir ameaçado pode recorrer ao judiciário caso entenda que o exercício de suas atribuições esteja sofrendo grande discrepância em relação ao outro genitor. Se houver morte de um dos pais, o poder passa a ser exercido isoladamente pelo sobrevivente. Nos casos em que o pai da criança for desconhecido, o poder familiar é exercido pela mãe. No entanto, se a mãe não for conhecida ou não for capaz de exercê-lo, deverá ser nomeado um tutor ao menor, conforme dispõe o artigo 1.633 do atual Código Civil. Pelo fato do poder familiar agir sempre em prol do melhor interesse da criança, é possível a intervenção do Estado para suspender o poder do genitor que se encontra impossibilitado de exercê-lo. Situações, por exemplo, em que a mãe da criança é impossibilitada de exercer o poder familiar, colocando em risco o desenvolvimentodo menor e necessitando de assistência especial, tem seu 10 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: família. 17. ed. São Paulo: Atlas, 2017. p. 350. poder destituído, em cumprimento ao princípio do melhor interesse do menor11. O artigo 1.635 elenca as possibilidades de extinção do poder familiar: Art. 1.635. Extingue-se o poder familiar: I - Pela morte dos pais ou do filho; II - Pela emancipação, nos termos do art. 5°, parágrafo único; III - Pela maioridade; IV - Pela adoção; V - Por decisão judicial, na forma do artigo 1.638.12 Como já anteriormente mencionado, havendo a morte de um dos genitores, o poder passa a ser exercido pelo genitor sobrevivente. No caso do filho emancipado, este dispõe de capacidade de direito, assim, extinguindo o poder familiar dos pais, sendo a maioridade a maneira natural da extinção do poder. No que tange à adoção, sua extinção se dá pelo fato do poder da família biológica ser passado para a família adotante, sendo assim, esse poder é transferido e não extinto de fato. O poder familiar também é extinto nos casos em que os pais que castigarem imoderadamente o filho, deixar o menor em abandono, praticar atos contrários à moral e aos bons costumes, incidir, reiteradamente, nas faltas previstas no artigo antecedente, entregar de forma irregular o filho a terceiros para fins de adoção, conforme expresso no artigo 1.638 do Código Civil, considerados incompatíveis ao exercício do poder familiar. A extinção do poder familiar é uma sanção para aqueles que não efetuam devidamente o direito de seu exercício, devendo ser aplicada de ultima ratio13. 11 "APELAÇÃO CÍVEL. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. AÇÃO DE DESTITUIÇÃO DO PODER FAMILIAR. SUSPENSÃO DO PODER FAMILIAR DA GENITORA E DESTITUIÇÃO DO PODER FAMILIAR DO PAI. SENTENÇA MANTIDA. 1. Comprovado que, nada obstante evidenciado o profundo vínculo afetivo existente, a mãe dos infantes não tem condições de exercer, de forma adequada, o poder familiar, necessitando acompanhamento especializado, é de rigor a manutenção do abrigamento das crianças e da suspensão do poder familiar da genitora. 2. Comprovado que o genitor não tem condições de cumprir com os deveres inerentes ao poder familiar, submetendo os filhos à negligência e ao abandono material e afetivo, bem como à condutas sexualmente abusivas, impõe-se a destituição do poder familiar, diante da prevalência do princípio do superior interesse da criança. APELO DESPROVIDO”. (Apelação Cível Nº 70072946411, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sandra Brisolara Medeiros, Julgado em 28/06/2017). Disponível em: https://tj- rs.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/474185864/apelacao-civel-ac-70072946411-rs. 12 BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, ano 139, n. 8, p. 1-74, 11 jan. 2002. 13 COLTRO, Antônio Carlos Mathias; DELGADO, Mário Luiz. Guarda Compartilhada. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2018. Online. Para a efetivação da perda e suspensão do poder familiar, cabe ao Ministério Público ou pessoa interessada dar início ao procedimento, de acordo com os artigos 24 e 155 do Estatuto da Criança e do Adolescente, garantindo o princípio do contraditório e da ampla defesa, sempre prevalecendo o melhor interesse do menor, devendo ser averbada no registro de nascimento da criança ou do adolescente, a sentença que decretar a perda ou suspensão do poder familiar.
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